Saint Seiya Memórias: História Oculta Do Santuário escrita por Katrinnae Aesgarius


Capítulo 48
Livro 2 :: Dualidade - Ato 8


Notas iniciais do capítulo

Finalmente de volta ao Santuário, O cavaleiro de Ouro, Aiolos de Sagitário, sabe que alguns pontos devem ser esclarecidos, e Saga de G~emeos deve ser o primeiro a conhecer os fatos.



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Os dias pareciam se arrastar naquela última semana. Mentalmente Saga contava um mês desde que os dois partiram em missão, duas semanas que descobrira que Aiolos encontrara o rastro de Halfeti, o antigo Cavaleiro de Ouro de Peixes condenado por conspiração e que deveria ter sido isolado na Ilha dos Espectros.

Descobrir aquela rosa entre os pertences do Sagitariano enfureceu o Geminiano, fazendo-o mergulhar em apreensão até sentir aquele choque de poder. Tinha certeza de que sentiu ser de Selene. Até mesmo Kanon mostrou-se preocupado mesmo quando estava a alimentar grande rancor pela Amazona.

"Orgulhoso, mas no fundo ele teme tanto quanto eu", pensou Saga quando o viu deixar Gêmeos naquela noite.

Ao longo daqueles últimos dias buscou ocupar o máximo sua mente. Fosse em treinos excessivos ou assumindo pequenas missões próxima ao Santuário. Porém, cada vez que passava por Áries para seguir a Gêmeos, buscava saber de Mu alguma novidade, mas o jovem mostrava-se tão preocupado quanto ele pela demora da 'irmã'.

— Aiolos é um homem experiente, você mesmo disse. Não há o que se preocupar, capisce? — disse Mephisto há algumas noites.

Naquele dia, em especial, estava ainda mais tenso após uma noite conturbada. Primeiro começara com enxaquecas, gerando pequenas vertigens onde tinha a impressão de ver sombras se movendo em Gêmeos, acompanhada de sussurros.

Ouvira, certa vez, dos fantasmas que havia no Santuário, algo que o próprio Sólon comentava, mas que eram apenas 'histórias'. Quando ganharam vozes, aquilo o transtornou. "Será que estou ficando louco?", pensou na ocasião quando estava a discutir sozinho e encontrar Kanon na terceira Casa. Conversar com irmão mais novo pareceu aliviar tamanha carga de tensão.

Estava ajudando-o a abstrair aquela ansiedade quando o encontrara na Terceira Casa esperando alguma novidade. Saga sorriu de canto em pensar que os dois pudessem, finalmente, se acertar. Ledo engano. A conversa há dois dias com o orgulhoso gêmeo não terminara bem, fechando com mais um desentendimento e não o vendo desde então.

Por um instante, olhou para o lado e viu as anotações do amigo arrumadas sobre a mesa próxima. Esticou-se um pouco, apanhando uma folha que estava mais deslocada e a olhou. Era o mapa que ele estava organizando, com a localização de algumas das armaduras que não se encontravam mais no Santuário.

Olhou em direção da seção do amigo e suspirou. Ficara tão transtornado ao encontrar aquela rosa entre seus pertences que tinha evitado aproximar-se, acabando por acumular alguns materiais em sua mesa.

Percebendo o avançar do entardecer e o início da noite, levantou-se para deixar ao menos parte daquilo na mesa do Sagitariano, arrumando sobre a mesa de modo a não bagunçar suas notas. Ouviu passos, mas imaginando ser algum soldado que sempre aparecia para trocar a guarda.

— Digam que ficarei um pouco mais... — dizia Saga ainda de costas.

"Olá, Saga!", ecoou na sala, fazendo o Geminiano paralisar ao ouvir a voz. Seria mais uma alucinação ou aquelas vertigens das últimas semanas? Aquilo o fez hesitar em voltar-se para a porta. Virou os olhos, acompanhado da cabeça, somente então depois o corpo, encontrando Aiolos parado ali ainda com suas vestes de viagem. Tinha um semblante sério que o preocupou.

— Precisamos conversar. — começou Aiolos, fitando expressão dura do amigo, acolhido parcialmente na penumbra da sala. Umedeceu os lábios e baixou levemente a cabeça. — Um soldado disse que o encontraria aqui, então...

Aiolos nem mesmo terminou de falar. Apenas sentiu as mãos pesadas de Saga sobre ele, tomando-o pelo colarinho de sua roupa e empurrando-o para trás com incrível velocidade e violência. Derrubou livros de registros, rolos de pergaminhos e outros documentos que se espalharam pelo chão. O sagitariano assustou-se com aquela ação do amigo, reagindo somente em segurar seus pulsos enquanto o sentia empurrá-lo mais e mais.

— VOCÊ NÃO TINHA ESSE DIREITO! — exclamou um Saga furioso, os olhos brilhando enraivecido.

Sagitário tentava falar, mas estava se sentindo sufocado pelas mãos do geminiano pressionando sua jugular com seus punhos fechados enquanto o segurava pelo colarinho. No entanto, aquilo não impediu Aiolos de ver um brilho nos olhos do amigo, gerando um calafrio por uma lembrança bem recente.

— POR QUE NÃO DISSE A MIM QUE O HAVIA ENCONTRADO? POR QUE ESCONDEU ISSO DE MIM SABENDO QUE EU O QUERIA?!! — continuou Saga empurrando-o, sentindo as mãos do amigo segurarem-no no pulso.

— S-Saga... favor... e-escute-me...! — balbuciava Aiolos ofegante, tentando se libertar daquele aperto. — E-Eu... não podia... não... digno... ao... Mestre... você...!

Saga piscou aturdido ouvindo aquilo. As palavras eram confusas, falhas, mas ajudou-o a voltar à razão, acabando por soltá-lo gradativamente e recuando seus passos até chegar à mesa atrás de si e apoiando-se nesta.

Olhava para as mãos que quase enforcara o amigo e respirando pesado. Ficou cabisbaixo, os cabelos nublando sua face envergonhada por sua fúria que explodiu, desculpando-se incessantemente.

— D-Desculpe...! — disse o geminiano num murmúrio, levando a mão à cabeça. — E-Eu... Eu não sei o que deu em mim, Aiolos.

 O sagitariano ainda ficou a observá-lo por alguns instantes, recuperando o fôlego, assentindo. Tentou responder por duas vezes, mas apenas conseguiu tossir. Por mais que tentasse imaginar a reação de Saga, não imaginou aquele rompante tão agressivo. Ainda assim, tentou compreender o lado do amigo após tantos anos de convivência. Realmente, esconder aquilo não foi justo.

 — T-Tudo bem... — disse rouco, pigarreando para recuperar a entonação. — Eu... realmente... mereço... essa repreensão... — e suspirou, movendo o braço direito para massagear o ombro que levou a pancada contra o móvel. — Confesso que... Confesso que  odiaria também se fosse você a me esconder algo assim.

 — Você sabia, mais que qualquer um, do quanto eu queria encontrá-lo. — comentou Saga voltando-se para Aiolos, apoiado na mesa. — Não tinha o direito de mentir pra mim...!

 — Não menti pra você, Saga. — corrigiu Aiolos após recuperar-se. — Eu omiti, o que é bem diferente.

 — Que seja! — inquiriu o geminiano em um quase novo rompante, mas se conteve, desviando momentaneamente o olhar e respirando fundo. — Eu que deveria tê-lo acompanhado, não ela...!! — voltou-se para o amigo. — Você foi atrás do Halfeti sabendo que ele era capaz... Você arriscou-se indo sozinho... e arriscou a vida da Selene nesse seu ato impensado!

 Sagitário abaixou o olhar mediante aquelas palavras. Não eram inverdades, mas fatos. Fora realmente uma decisão impensada e o perigo do qual foi exposto por muito pouco não custou sua vida se não fosse a compaixão do próprio Cavaleiro em seu último momento. "Ele poderia matar-me de vez, mas não o fez...", lembrou do que Selene havia lhe dito da ação de Halfeti.

 — Eu assumo minha irresponsabilidade quanto isso. — disse Aiolos somente, calando Saga que ficou a fitá-lo. Umedeceu os lábios e ficando momentaneamente pensativo. — E-Eu não tinha esperança de encontrá-lo, embora suspeitasse que... ele que nos guiou até ele... eu acho... No entanto... — e olhou para o amigo que o fuzilava com o olhar. — Se você permitir, conto tudo que aconteceu. Por isso quis vê-lo primeiro, porque sabia que te devia isso. Então, me escute!

 E Gêmeos assentiu, cruzando os braços, ficando a fitá-lo e esperando ele começar a contar, do início.

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Abrir a porta da pequena casa e encontrar tudo limpo e organizado, não deveria ser uma surpresa para Selene. Porém, ela ficou perplexa em encontrar até mesmo água fresca num jarro, o que ajudou bastante para aliviar a sede após tomarem um caminho mais longo para que levasse o garoto até sua casa num campo restrito às mulheres — embora achasse que não encontrariam problema devido a feição tão delicada do garoto.

A Prata colocou o cesto com as verduras, legumes, frutas, pão e carne sobre uma mesa — pego quando passaram por Rodório e para reabastecer-se após tantas semanas ausentes. Aelia apenas fizera o básico de manter limpo, mas a água certamente foi uma ideia da amiga esperando que ela chegasse a qualquer momento. "Ao menos não terei de ir ao poço buscar água sendo tão longe e tão cansada que estou...", pensou Selene lançando um olhar para o garoto.

Ele olhava tudo ainda desconfiado, removendo o capuz, mostrando os cabelos cheios e ondulados descendo até seus ombros. As vestes eram simples e limpas, bem diferente daquelas de quando o encontrou sendo maior que o garoto. Voltou-se para a Amazona quando ela lhe entregou um copo de água.

— Não se preocupe. — comentou ela abrindo um sorriso. — Está seguro aqui, tanto quanto onde estávamos. Não te farão mal. — e o viu pegando a água, bebendo longamente. Esticou o braço, num pedido silencioso e sendo atendido. — Bom, como já nos conhecemos sem estar usando a máscara, acho que não há problema. — e voltou-se pra ele, vendo-o remover a capa e deixar numa cadeira. — Deve estar com fome. Vou preparar algo rápido, tudo bem? — não houve uma resposta, apenas o viu aproximar-se da mesa e ajudá-la a tirar tudo do cesto.

Desde que o encontrara, mantivera-se mudo, comunicando-se com olhar e simples gestos. Estava retraído, muito arisco com relação a qualquer um.

Quando Aiolos tentou uma aproximação, ele escondeu-se atrás de Selene, isso quando não se mantinha isolado no quarto ocupado pela Amazona ao longo daqueles dias. Ela buscou acalmá-lo, criar uma confiança que deu resultado, deixando-o mais à vontade quando estavam sozinhos.

Quando o ajudou com o banho nos primeiros dias, por conta de sua pele alva, notara hematomas em suas costas, na parte de trás do pescoço, no antebraço e nas pernas. Selene até mesmo tentou saber, mas ela levantou algumas hipóteses que preferiu guardar pra si por hora. Afinal, aquilo soava muito familiar e esperava que estivesse enganada quanto aquilo.

Mais que nunca, precisaria ser compreensiva e paciência para dar espaço ao pequeno para falar quando assim quisesse.

Preparou o ensopado encorpado com carne e batatas, com pão a molhar o caldo. "Ao menos ele está se alimentando bem...", pensou a Amazona aliviada, vendo-o repetir a refeição. Na hora de dormir, acomodou-o numa cama ao lado da sua, deixando cobertores para a noite que era quase sempre fria e deixando a lareira acesa com um chá de camomila exalando no ambiente. Aquilo ajudou-o a adormecê-lo. Ela, no entanto, ficou a observá-lo longamente, preocupada. Queria estar errada sobre o que estava pensando.

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— Compreende agora? — indagou Aiolos sentado numa cadeira, com o encosto voltado para frente onde apoiava os braços. Tinha um semblante sério fitando o amigo diante dele.

Saga estava calado, com a cabeça baixa e o olhar parado sobre um livro que caíra aberto quando avançou contra o sagitariano. No entanto, não estava a contemplar o objeto em si, mas assimilar a todos os fatos narrados pelo amigo até ali — desde suas suspeitas nos primeiros estágios da missão até àquela fatídica conclusão que o deixou acamado na última semana devido sua exposição demasiada no jardim de rosas venenosas do Peixe Negro.

A resposta de imediato foi um suspiro, seguido de um  levantar da cabeça. Encolheu os lábios, umedecia-os com a língua que parava no céu da boca como se isso o ajudasse a escolher as palavras para aquele momento, mas não havia.

 Na verdade, o Geminiano ainda estava perdido em suas convicções mesmo diante dos fatos apresentados, mesmo sabendo que o amigo não inventaria uma história tão mirabolante para se justificar.

— Eu realmente não sei o que pensar de tudo isso. — disse Saga soltando um suspiro pesado. — A imagem dele... aqueles olhos... a expressão de raiva...! — dizia gesticulando com as mãos como se tentasse denotar algo, até ceder e deixar uma cair sobre a perna encolhida e a outra levar à fronte. — Não, não consigo apagar aquela imagem da minha cabeça...

— Acredite, eu também demorei aceitar mesmo após o que vivi e vivenciei durante meu combate com ele, até mesmo após Selene dizer o que ele fez por mim, mas Saga... — Aiolos parecia desesperado em fazê-lo compreender. — Se você visse os olhos dele, Saga... Eu vi a culpa naqueles olhos, o remorso...! — pontuou, ainda impressionado, abrindo as mãos como se pudesse mostrar a cena. — Não... Ele não podia fingir aquilo. E-Eu... Eu ouvi sua súplica, o clamor de sua alma para acabar com aquele seu sofrimento...!

— Você mesmo disse que estava sob efeito do veneno das rosas... — disse Saga fitando o amigo com ceticismo. — Como pode saber se não foi mais uma ilusão dele...?!! — e fechou os olhos, jogando o cabelo para trás. Piscava, olhando para toda sala, até parar sobre o amigo. — Eu juro que quero compreender, mas... É difícil!!

— Eu sei o que vi, Saga! — afirmou o sagitariano, fitando o amigo incisivamente. Brincou com a língua no canto da boca, sentindo ainda o ferimento e pequenas casquinhas nos lábios após dias febris. — Eu vi com você e Kanon essa mesma imagem, olhar e expressão dele quando confrontou Sólon naquele anfiteatro naquele dia, mas agora... — ajeitou-se na cadeira, jogando o corpo mais para trás, olhando para o chão perdidamente. — Eu vi novamente aquele Halfeti de Peixes, não um demônio.

Saga soltou um riso contido, chamando atenção de Aiolos que olhava momentaneamente para o chão e o caos que havia ali após a ação violenta do amigo contra ele. O geminiano olhava de lado, o cabelo caindo sobre o rosto, ombros e peito. O olhar dele era saudosista, perceptível ao Sagitariano.

— Naquele dia eu fiquei assustado. — disse espontaneamente. — Kanon e ficamos surpresos em ver aquele Halfeti transformado, tão diferente daquele do qual estávamos acostumados ver todos os dias... — e riu, voltando-se para Aiolos. — Lembra-se de quando os dois se desentendiam e diziam 'Vamos resolver isso num x1'?

Aiolos se viu rindo daquilo, assentindo. Como esquecer os dois discutindo sobre que atividade para aquele dia sem que acabasse num embate entre os dois e o vencedor estabelecer as regras do dia?

Muitas vezes as discussões eram calorosas, mas assistir aos dois lutando era um treino por si só para postura e os aprendizes discutirem qual melhor estratégia um ou outro usar para findar aquele combate — o que era realmente a pretensão de ambos.

No entanto, naquele dia fatídico a discussão ganhou outros ares, bem mais intimidador. Não se tratava de uma mera divergência, mas um confronto de ideias e acusações que levou a um embate perigoso que, por muito pouco, não feriu aprendizes — quando Saga e Kanon estavam na linha de fogo e Sólon serviu de escudo para ambos.

Saga sempre foi mais contido e reservado, mas Kanon não deixava de expor sua revolta com tudo que havia acontecido e jurando uma retaliação contra Halfeti. Porém, Aiolos era capaz de ver, embora jamais tivesse comentado ou feito menção sobre isso, de que por trás daquele desejo de vingança havia o sentimento de culpa, ambos se responsabilizando pela morte do mestre ainda que nada pudessem fazer para evitar aquela.

— Nós dois deveríamos estar mortos. — admitiu o geminiano com alguma hesitação, e aquilo surpreendeu ao amigo. — Kanon e eu devíamos estar mortos...! — Ele estava a comentar sobre o que o Sagitariano estava a refletir naquele momento? — Ele visou nos atacar, ele foi um covarde... Buscou difamar Sólon, não se esqueça disso...! — e voltou-se para Sagitário.

— Não, eu não esqueci do que aconteceu, não é algo que devemos apagar. — Aiolos suspirou. Percebia a hesitação do geminiano, mas não o culpava. Ele não viu o que ele tinha visto naquele embate com o Peixe Negro, não tinha como fazê-lo enxergar aquilo. — Eu também deveria estar morto agora.

Os olhos do sagitariano, naquele momento se encheram de lágrimas. Foi um medo repentino que o fez se arrepiar com a mera hipótese de que poderia ter sucumbido naquele templo se não fosse a compaixão de seu antigo mestre. "Aiolia agora estaria sozinho por minha irresponsabilidade...!", pensou de imediato naquele momento.

— E-Eu deveria estar morto, mas ele me salvou, implorando perdão...! — e voltou-se para o amigo. — Ele implorou perdão, suplicou para que fosse salvo...! — pontuou Aiolos levemente desesperado. — Não... Não há como negar isso, Saga...

Sagitário respirou fundo. Apoiou o braço no encosto da cadeira e levando a mão no alto da cabeça. Sem que percebesse, acabou puxando a faixa que usava para prender seus cabelos cheios, removendo-o. Olhou aquilo e sorriu, lembrando de quando Halfeti lhe presenteou. Apertava entre os dedos e levando próximo aos lábios.

— Sei que é difícil acreditar, aceitar isso, não vou censurá-lo, mas eu vi aquele Halfeti de Peixes, o Cavaleiro de Ouro, ali diante de mim. Havia uma sombra sobre ele, mas ainda pude ver um fio de luz em seus olhos...!!

Gêmeos ficou a observá-lo, tentando sorrir, assentir.

— Ok...! Eu acredito em você. — disse Saga por vencido. — Eu posso aceitar isso, mas Kanon... jamais!! — admitiu ele, meneando negativamente. — Quando comentei sobre a missão envolvendo Halfeti, ele pirou!

Aiolos franziu o cenho para o amigo. Certamente o Geminiano nem tinha percebido o que tinha dito. Ainda que estivesse fora na ocasião, o sagitariano estava ciente do caso delicado do gêmeo de Saga — foragido e aquilo era uma violação das regras do Santuário.

— Eu imagino... — comentou Aiolos, sem mencionar diretamente aquela situação. — Se bem me lembro, Kanon sempre teve um gênio difícil. — e riu contidamente. — Por mais dedicado que fosse, também sempre buscava um jeito de sumir nos treinos...

Saga riu daquilo, o primeiro riso sincero de toda aquela noite.

— Sim... Ele odiava ter que ser colocado para treinar com os aprendizes 'abaixo dele', como tanto dizia. — disse o geminiano fazendo uma careta imitando o irmão mais novo. — Enciumado, eu acho, quando Sólon ou Halfeti nos colocava em dupla nos treinos, ele querendo que fosse um trio... acabava fugindo, quase sempre. — e suspirou. — Sempre de volta aquele rio... E eu acabava acompanhando-o diversas vezes.

— Isso é algo que sempre me perguntei...— questionou Aiolos intrigado. — Diversas vezes vi você e Kanon junto ao rio que corta a cidade, principalmente na ponte que liga as duas Rodório... Por quê?

Saga ficou a olhar para o amigo por alguns instantes, sorrindo de canto. Jamais tinha conversado aquilo com alguém. Não que fosse um segredo.

Sólon e Halfeti sabiam, pois foi ali que encontraram os dois irmãos após uma noite inteira de busca para nada. Ao longo daqueles anos tornara-se um hábito, ansiando por findar um pesadelo.

— Chegamos ao Santuário...  o que... uns sete anos...? — perguntou para si mesmo tentando contar um tempo. — Era festa à Athena, a Plyntheria. Kanon e eu não chegamos aqui ao acaso. — ele pausou momentaneamente em suas palavras. — Selene que nos guiou até aqui.

— Se-Selene...? — perguntou o sagitariano mais como uma reação surpresa. — Ok...! Estou perdido.

Até aquele momento, Saga jamais havia contado a qualquer um, nem mesmo à Selene, que ele e seu gêmeos fugiram de casa para chegarem ao Santuário.

Explicou que foram movidos pelas história de seu avô sobre serem da linhagem de um Cavaleiro que teria vivido na Ilha de Canon — o que teria dado origem ao nome do gêmeo mais novo. Lembrou do apego de Selene, do qual os dois pensavam ser um garoto, a ele e como Kanon o provocava até o fatídico dia.

— Kanon era quem mais se consumia de culpa, mas sabe o quanto ele é orgulhoso. — pontuou Gêmeos segurando um bastão que estava no chão. — Não queria demonstrar isso, mas sabia o quanto se sentia responsável por sua imprudência naquele momento. Naquela noite ele entrou no rio, naquela água fria, esperando encontrá-la...

Aiolos ouvia tudo com atenção, assentindo a cada ênfase do Cavaleiro à sua frente, sobretudo quando este comentou sobre os garotos maiores que atacaram Selene num antigo prédio abandonado e depois na noite que culminou no acidente.

Somente durante a missão o sagitariano confirmou que a Prata tinha sangue lemuriano, o que certamente somou para evitar que o acontecimento tivesse se transformado numa tragédia. Isso explicaria também na sua habilidade psicocinética no trem e na visão da aura dos povos do vilarejo.

— Foi Sólon e Halfeti que nos encontraram no início daquela manhã. — lembrava-se o geminiano. — Estávamos famintos, molhados, com frio... mas desesperados querendo encontrá-la.

Aiolos lembrou-se de imediato quando viu os dois Cavaleiros chegarem com os irmãos cabisbaixos usando as capas dos dois homens.

Estava fazendo os exercícios de todas as manhãs quando Sólon apresentou os gêmeos. Não houve uma afinidade de primeira, mas algo que o Sagitariano lembrou que precisou ser vencido pouco a pouco.

O caçula sempre foi o mais orgulhoso e independente — além de pretensioso nos treinos e indisciplinar — enquanto o mais velho seguia mais os exercícios impostos pelos dois Cavaleiros que alternava os treinos dos jovens.

Nunca os dois comentaram sobre aquele incidente, embora diversas vezes Aiolos via os dois irmãos seguirem até a ponte que dividia as duas cidades de Rodório. A altura era acerca de 5m, e conforme o momento dito por Saga era momento de cheia, quando a correnteza era forte.

Todos os anos assistia os dois irmãos jogar flores de íris no rio, com um Kanon sempre a se demorar mais.

— Agora entendo tamanha preocupação sua quando ela foi nomeada a me acompanhar... — comentou o sagitariano fitando ao geminiano, vendo-o assentir.

— Eu estava aceitando bem a missão até encontrar aquela maldita rosa...! — disse Saga olhando para a mesa de baixo pra cima, às suas costas. — Kanon, apesar de estar bem descontente com ela, também ficou muito preocupado. No entanto, como disse, ele é orgulho demais para demonstrar isso.

— Quando ele voltou? — questionou Sagitário. Gêmeos o olhou por alguns instantes, mas baixou os olhos, desviando. — Eu soube mais ou menos o que aconteceu pelo que contaram. Ele fugiu durante seu teste e desapareceu...

— Selene o teleportou quando cruzamos nossos ataques. — relatou Saga cortando Aiolos de imediato, surpreendendo-o. — Ela fez isso para salvá-lo, e isso que Kanon não aceita. Acusa de que ela favoreceu a mim. O Grande Mestre a puniu exilando-a do Santuário por semanas, mas estava disposto a perdoar Kanon se ele voltasse. — E fechou os olhos, coçando entre os olhos. — Por mais que tente explicar, ele não quer aceitar... entender isso...

— Estou certa de que ela não o favoreceu. — afirmou o sagitariano, seguido de um suspiro. — Durante essa missão, percebi que Selene faz o tipo protetora, mesmo que seja arriscado. — franziu o cenho, mas sorriu. — Essa noite mesmo ela está com o jovem que nos guiou até Halfeti. Ele ainda está muito arisco... exceto com ela.

— Selene é assim. — o geminiano sorriu novamente de maneira tola. — Ela tem isso de despertar a confiança das pessoas. — e riu. — Admito que quando chegou aqui, sério, dizendo que precisávamos conversar, imaginei o pior...!

— Lembrar da próxima vez ser mais cuidadoso na abordagem. — Sagitário comentou, e olhou para a sala. — Não quero ser atravessado pela parede com outra reação sua.

— Já me desculpei por isso... — Gêmeos disse rindo. — Ou quem sabe posso me desculpar com um passeio em Rodório qualquer dia desses... Tomar aquele vinho... — arqueou o semblante com um indicativo.

— Opa! 'Tô dentro! — respondeu Aiolos tão prontamente, como se nada tivesse acontecido antes. — Mas será que você vai aguentar? Não vai passar vexame, viu? Da última vez que fizemos isso...

Um breve silêncio com os dois se encarando, com um Saga sério. Porém, logo começarem a rir com aquela situação e lembrando da última vez que saíram e beberam, a última em companhia de Kanon.

Horas avançaram enquanto conversavam e nem mesmo haviam se dado conta. Levantaram-se para reunir a bagunça gerada pela ação do amigo contra Aiolos. Quando Saga tomou sua túnica, ficou a fitá-lo, olhando para o Cavaleiro de costas para ele e acabando de arrumar sua mesa.

— Sobre aquilo que disse... — comentou Saga com o cenho franzido, intrigado. — Não estava falando sério, estava?

— Sobre não ser digno que o próximo Grande Mestre ser tomado pela raiva...? — Aiolos perguntou de volta, virando-se para ele. — Sim, eu disse e repito: Não seria digno vê-lo corrompido por um desejo de vingança.

— E de onde tirou a ideia de que serei o próximo Grande Mestre? — questionou Saga com ceticismo.

— E por que não seria? — respondeu Sagitário com outra pergunta. — Você age mais racional que eu, Saga. Sou extremista demais, não seria um bom Grande Mestre. Não se esqueça que o Patriarca já está com uma idade muito avançada e nós dois somos os primeiros dessa geração de Cavaleiros. Logo, qualquer um de nós dois pode ser nomeado.

— Ele pode muito bem escolhê-lo, Aiolos. — comentou o geminiano com um sorriso de canto. — A decisão de não me contar sobre Halfeti foi bem racional.

— Não...! — sorriu ele. — Tenho Aiolia para cuidar. Assumir um Santuário e tudo isso seria demais. — riu daquilo. — Porém, posso ser seu Conselheiro, se assim quiser. Por que não?

Saga meneou negativamente para o amigo, rindo em seguida. Olhou a túnica escura entre os dedos e ficou a pensar sobre aquilo que achava tamanho absurdo.


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Notas finais do capítulo

Primeiramente, agradecer os comentários - sempre!
Vi que muitos esperava, exatamente, uma maior interação da relação de Aiolos e Saga, e inconscientemente já o fazia para mostrar como era a relação entre eles. O resultado é esse capítulo. Espero que gostem :)

Nos próximos capítulos:
Selene aprende conhecer o jovem aprendiz de Halfeti.Um reencontro rancoroso com declarações implícitas, enquanto uma aura negra recai, pouco a pouco sobre o Santuário.



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