O Chamado das Borboletas escrita por Ryskalla


Capítulo 18
Capítulo 17 - Aqueles Que Não Conheciam o Amor


Notas iniciais do capítulo

Primeiramente, desculpa pela demora para postar. Não tenho desculpas, sinto muito. Tenho que aprender a organizar meu tempo, devo isso a vocês. Apesar do tamanho, foi um dos capítulos que mais gostei de escrever e espero que vocês gostem dele também! :]



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/333339/chapter/18

Volto agora, meus queridos amigos, o foco de nossa atenção para aquele ladrão que tanto gostamos. Sim, é hora para o nosso querido protagonista reaparecer nessa história.

Aquele momento foi um dos poucos em que nosso ladrão sentiu desespero. Fora encarregado de uma missão que em nada lhe agradava e, mais grave ainda, não conseguia falar com Analiese. Por mais que mandasse diversos bilhetes com palavras desesperadas... a princesa não saia de seu quarto. Henry o vigiava todo o tempo, impedindo-o de invadir o quarto da moça. Tudo parecia estar dando errado e o tempo não estava ao seu favor, logo o navio estaria pronto e ele seria obrigado a partir. Seria obrigado a abandonar Clara mais uma vez.

O ladrão andava de um lado para o outro no quarto enquanto sentia a irritação aumentar. O olhar perseguidor daquele que um dia foi seu amigo era o que mais lhe aborrecia. Havia outros quatro guardas dentro do quarto, porém nenhum deles ficava lhe encarando.

— Quer, pelo amor de Moros, parar de me encarar? — Perguntou, incapaz de se conter. Os guardas se sobressaltaram, no entanto, Henry não moveu um músculo sequer.

A resposta de Henry, para o alívio de Leharuin, foi interrompida pela chegada de Analiese. A princesa já não parecia a mesma, tinha uma expressão abatida... quase depressiva.

— Deixem-nos a sós, por favor. — Até mesmo seu tom de voz mudara. Estava duro, autoritário... frio. Todos abandonaram o cômodo, exceto um relutante Henry que não sabia ao certo o que fazer, contudo após um olhar tranquilizador por parte de Analiese o rapaz finalmente saiu do quarto. — Então, qual o motivo dos bilhetes?

— O que houve? — A princesa desviou o olhar e se dirigiu para a janela. Uma fina chuva caía sobre o mundo lá fora. Sentia a urgência de ajudar Clara, porém havia algo dentro dele que o atrapalhava... não era a curiosidade, não dessa vez. O que atrapalhava nosso querido ladrão era o sentimento de piedade. — O que a sereia fez com você?

— Nada... apenas expôs duras verdades. — Leharuin detestava a forma como a princesa falava. Não era ela. Mas por qual razão aquilo o irritava? — Agora, me diga a razão de tanto desespero.

— Queria sua ajuda, contudo a última vez que pedi sua ajuda você voltou assim... não creio que seja justo colocá-la em risco outra vez. — Como a princesa nada respondeu, o ladrão se sentou na cama e abraços seus joelhos. — Seu pai quer que eu mate o Grande Rei, sabe? Não sou um assassino... pelo contrário, acredito que serei morto caso eu vá. De todas as formas, vocês saem ganhando.  

— Sabe que não concordo com os objetivos do meu pai... e sabe que não há nada que eu possa fazer quanto a isso. Além disso, dentre todos os seus crimes, você já foi acusado várias vezes por assassinato... — Suas falas eram quase que comandadas. Ora, talvez ela também tenha se tornado uma discípula fiel à Moros. Isso, é claro, era algo que Leharuin não poderia permitir acontecer.

— Aquilo não era assassinato… na maior parte do tempo foi legítima defesa. Sabe como é o mundo para mim lá fora. — O ladrão libertou seus joelhos, entretanto permaneceu sentado na cama. Ele assistia o rosto impassível de Analiese pouco a pouco desmoronar. Ser chamado de assassino não o incomodava, claro, tudo dependia do ponto de vista. Entretanto, por mais que se esforçasse… aquele primeiro comentário não poderia passar em branco. Não importava se Analiese estivesse sofrendo… ele não conseguia suportar aquela hipocrisia. — Não há nada? Oh, certamente, princesinha! Você apenas tem o mundo nas mãos, no que isso poderia ajudar? 

— Eu não tenho o mundo nas mãos. Sou apenas uma princesa, que poder tenho para findar guerras? — A raiva ia transparecendo em sua voz, como um inseto preso dentro de uma caixa de vidro até perceber que já não havia vidro para prendê-lo.

— Creio que um poder maior que o meu, princesinha. Sou apenas filho de uma sereia. É isso que me torna especial? — Ela abriu a boca para falar, porém tornou a fechá-la. — Logo, se eu fosse filho de uma humana comum de nada serviria, correto?

— Entretanto você não é filho de uma humana comum. Você não é um humano comum, Leharuin, mesmo que não queira admitir. Não concordo com meu pai, mas sei que só você teria uma chance de acabar com essa guerra e lembre-se que essas pessoas também são seu povo, sua família. Não gostaria de ajudá-los? De se tornar um herói? — Agora era a vez da raiva de Leharuin fugir da caixa. Ele levantou-se, de súbito, e prendeu a princesa contra a parede cuja voz fugira devido ao choque.

— Meu povo? Diga-me, Analiese, qual era sua opinião a meu respeito antes de me conhecer? Que provavelmente eu era algum tipo de monstro, uma aberração. O demônio dos roubos, não foi como me nomeou? Esse povo nunca me aceitou, pelo contrário! Sou caçado dia e noite, minha cabeça vale mais do que de todos os ladrões e assassinos juntos. Algumas pessoas realmente acreditam que sou um demônio, um demônio que nasceu das cinzas de uma família assassinada. Acredita mesmo que eu levaria crédito por colocar um fim na vida do Grande Rei? Certamente que não! Seu pai só quer me enviar para o matadouro! — Os olhos do ladrão estavam vermelhos, embora nenhuma lágrima se fizesse presente. Não seria aquela vez que as lágrimas molhariam o rosto de nosso querido ladrão, meus amigos, embora eu desejasse que assim fosse…

— Ótimo! Diga então de que forma eu poderia acabar com essa guerra! — A princesa o empurrou para longe dela. Ambos respiravam profundamente, numa tentativa quase frustrada de controlar a raiva. — Diga, Leharuin, uma forma e eu tentarei.

Um sorriso de escárnio se formou no rosto do rapaz, ele tornou a se aproximar da princesa, dessa vez lentamente. Um calafrio percorreu o corpo da jovem quando os dedos de Leharuin afastaram seus cachos negros de sua orelha.

— É bem simples... veja, apenas precisa matar o seu pai. — Tais palavras foram recebidas com um tapa e uma expressão horrorizada no rosto da princesa. O ladrão soltou uma curta risada sem humor algum. — Você vê? Se parar para pensar, seu pai é o único a merecer a morte, contudo... você jamais concordaria com isso, porque você o ama. Talvez exista alguém que ame o Grande Rei. E o que ele está fazendo de errado contra vocês, afinal? Ele apenas está mantendo a coroa para ele mesmo. Seu reino se tornou fechado e é quase como se não existisse... quem está criando uma guerra, princesa? Seu próprio pai e seu grande amigo, o rei de Calirhoe. Não seria mais prudente deixar Anankes de lado? Deixar que eles próprios se destruam com os impostos abusivos?

Pela segunda vez, nosso querido ladrão deixou a princesa sem palavras. Ela se sentou na cama, abalada e permaneceu silêncio por alguns minutos. As borboletas voavam ao redor de Leharuin que observava Analiese com crescente curiosidade.

— Eu nem sei se eu o amo... foi o que a sereia disse para mim, sabe? Que não sou capaz de amar... talvez eu não ame meu pai. Talvez eu seja incapaz de amar alguém. — Então era isso, Leharuin pensava enquanto assistia uma tímida lágrima rolar pelo rosto delicado da jovem. Ele se ajoelhou em frente a ela e limpou a lágrima solitária.

— No passado, eu acreditava que não podia ser amado. Sereias encantam os homens, você deve saber. Então eu deduzi que o amor fosse algo que eu nunca poderia encontrar... que nunca encontraria alguém que me amasse pelo que eu sou e sim pelo encanto de sereia que herdei de minha mãe — soltou uma curta risada, como se aquilo fosse algo estúpido. É algo comum, companheiros, percebemos o quão estúpidas foram nossas atitudes com o passar dos anos. — Agora vejo que estive errado... tem uma jovem, eu estive fugindo dela por muito tempo, mas ela sempre me esperou. E ela está fraca de tanto esperar... ela é a razão dos bilhetes, queria que você cuidasse dela até o meu retorno. Tenho medo, princesa... medo de que ela não resista tanto tempo. Eu jamais me perdoaria se ela morresse... porque ela foi a única que me aceitou e acho que será a única que me aceitará.

Quem sabe fosse o olhar de Leharuin, ou mesmo o jeito doce como aquelas palavras soaram, no entanto, de algum modo, uma mudança ocorreu naquele momento. Analiese foi capaz de entender, pela primeira vez, no que consistia um ser humano: uma frágil criatura com medo do que não poderia controlar.

As mãos de Analiese puxaram Leharuin para si, dando-lhe um forte abraço para a surpresa do rapaz. Não era apropriado para uma princesa ter tal atitude.

— É engraçado ver como todos estão enganados ao seu respeito... não adianta tentar me fazer pensar o contrário, você é a melhor pessoa que eu já conheci. — E sem se permitir demorar mais, a princesa o libertou de seus braços. Foi engraçado, para ela, constatar naquela hora que, contrariando o que todos esperavam, tinha um ladrão como único e melhor amigo. — Diga-me onde encontrá-la e eu cuidarei dela por você, por quanto tempo precisar.

Leharuin poderia ter chorado de alívio, mas não chorou. Invés disso, abraçou aquela tão inocente e sensível princesa. Talvez o mundo dos humanos não estivesse tão corrompido, afinal. De fato, Liese talvez fosse a mais pura das almas.

— Nem a eternidade seria o suficiente para continuar a te agradecer por isso, princesinha. — Como estava leve! Aquela carga pesada foi tirada de seus ombros quando ele pensava que já não seria mais capaz de sustentá-la. — E você não precisa se preocupar... eu era aquele que não podia ser amado, do mesmo modo que você é aquela que não pode amar. Sei que amará alguém um dia, da mesma forma que eu me tornei aquele que pode ser amado... você se tornará aquela que pode amar.

Após o rompimento do abraço, um plano foi traçado para que Analiese conseguisse encontrar Clara. Leharuin escreveria uma carta para que a princesa entregasse e então Analiese levaria Clara para o castelo, se tudo ocorresse como o planejado.

— Analiese, só mais uma coisa. Nunca deixe de ser quem você é. Eu gosto bem mais de você quanto é sincera com seus sentimentos. — Quando Analiese saiu do quarto, deu um aceno tranquilizador para Henry, ele pareceu aliviado ao vê-la bem. Teriam os guardas escutado os gritos? Se escutaram, então o moreno foi o responsável por evitar que fossem interrompidos. Um ato de confiança, contudo insensato…

  Ainda assim, deveria agradecê-lo, pois, se os guardas tivessem entrado, aquela discussão não teria seguido o rumo que deveria. E, refletindo sobre as palavras de seu então melhor amigo, percebeu que ele talvez estivesse certo... mesmo que estivesse errado sobre outras coisas. Afinal... Clara não fora a única que o aceitara como era.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!