Steve puxou uma cadeira que estava ajeitada ao lado de uma mesa de interrogatório e sentou-se defronte a mim. Aquele talvez fosse o momento mais difícil de todos que eu teria de enfrentar, mas me manteria forte e suportaria tudo que estivesse por vir. Sei que cada palavra maldosa que eu dissesse significaria que um pedaço de meu coração estaria se destroçando em milhares de pedaços e ao mesmo tempo o brilho apaixonado naquele olhar de Steve iria se apagando aos poucos. Por um momento eu me forçaria a esquecer de que aquele homem que estava em minha frente era o homem de meus sonhos e quem eu amava incondicionalmente.

-Acha realmente que temos algo para conversar? – Falei secamente. – Não parece óbvio demais o que estou fazendo?

-Não, pois jamais esperaria uma coisa de uma pessoa como você. – Aquelas palavras e o tom de decepção na voz de Steve foi sem dúvida o pior golpe que eu poderia ter sofrido em toda minha vida. – Porque está fazendo uma coisa dessas?

-A vida não é feita de escolhas? Então eu fiz a minha. – Steve me encarava sério, com uma expressão que eu jamais havia visto naquele belo rosto. Era uma terrível mistura de incredulidade e raiva. Estava muito claro que essa raiva não era de mim e sim de Loki por ter me levado ao lado vermelho da força.

-Você não fez essa escolha por contra própria ou simplesmente por sua vontade. Posso ver isso em seus olhos, Abbe. – Disse ele retomando um pouco da esperança de que tudo aquilo fosse uma brincadeira. Uma ideia maldosa para acabar com isso passou por minha cabeça. Forcei meus olhos a enxergarem através de Steve e do que estava naquela sala. Soube que meus olhos se dilataram assustadoramente quando notei que o Capitão me olhou impressionado.

-Ainda consegue ver isso em meus olhos? – Eu já estava me irritando por não conseguir ser o suficientemente convincente para Steve. O tempo estava se passando e nenhum plano de como escapar daquele avião surgia em minha mente.

-Porque? – Perguntou ele.

-Simplesmente porque pensei que ao lado de Loki eu teria chances de sair vitoriosa após essa guerra. Acha realmente que eu ia querer continuar fazendo parte daquele grupo de esquisitos? – Já que minha tentativa de ser educada estava quase falhando, apelaria para o estilo Tony Stark.

-Você parecia ter orgulho em participar desse grupo.

-As coisas mudam, Steve. Uma coisa que aprendi com Loki...

-Loki! Esse é e sempre foi o maior problema de tudo. Como pode estar ajudando o homem que está colocando em risco a vida das pessoas na Terra em risco. – Aquele era o ponto da conversa que eu temia que chegasse.

-E quem disse que me importo com elas? – Senti minha voz tremer ao dizer aquelas palavras, sabia que não estava conseguindo ser verdadeira.

-Como pode dizer uma coisa dessas?

-Com a boca? – A piada realmente não era necessária, mas eu não sabia o que responder para aquela pergunta.

-Essa não é você. Sua família está correndo riscos também. Suas irmãs, seus sobrinhos...

-Essa sou eu! Só estou em uma versão nova. – Steve franziu o cenho e percebeu que eu estava evitando responder aquelas perguntas. Ele se levantou e aproximou seu rosto do meu, colocando cada uma de suas mãos ao lado das minhas que estavam acorrentadas na cadeira. Aquele hálito quente que eu tanto amava e sentia saudades estava ali na frente agora. Seus olhos azuis me conduziam a querer arrancar minhas mãos daquelas correntes para puxa-lo até meu encontro e provar o sabor daqueles lábios macios. Eu sabia que estava dando meu máximo para me controlar.

-Não é você essa pessoa sentada em minha frente. É apenas alguém que quer que eu acredite que seja.- Ele estava se aproximando cada vez mais de mim, sua boca estava tão próxima a minha...

-Mas quem disse que algum dia você conheceu a pessoa de verdade que eu sou? – As palavras saiam automaticamente, meus olhos estavam vidrados nos seus e minha respiração se tornava cada vez mais ofegante a cada milímetro que Steve se aproximava. – Loki sabe quem realmente sou, por isso me escolheu.

-Está dizendo que eu não a conheço de verdade? Depois de tudo que passamos juntos? – Ele se afastou e voltou a sentar-se na cadeira onde estava antes. Aquelas palavras fizeram com que uma projeção de imagens e cenas de dias especiais ao lado de Steve surgisse em minha mente. Eu não era tão forte quanto achei que fosse, talvez eu devesse falar toda a verdade e pedir a ajuda dos Vingadores para que Misha e sua filha saíssem sem se ferir. Não havia outra opção, minhas mentiras estavam sendo descobertas e todo meu cansaço, tanto físico quanto mental, estava me vencendo aos poucos.

Suspirei pesadamente e reuni tudo que seria necessário para contar a verdade. Fomos bruscamente interrompidos por uma batida forte na porta e uma mulher de cabelos castanhos, magra e alta, com uma aparência bastante jovial entrou carregando uma bandeja com um copo de água. Seus trajes mostravam que ela era uma agente da SHIELD, com uma águia estampada no braço. Uma pequena identificação grudada ao seu peito dizia “Agente Julia Parker”.

-O Senhor Fury pediu que eu trouxesse água para ela. – Informou ela se dirigindo a Steve e indicando a mim com a um aceno da cabeça. O Capitão não disse nada, apenas assentiu e esperou que a moça colocasse o copo de plástico ao meu lado. Percebi que ao a garota fazer o movimento, em seu braço esquerdo havia uma pequena pulseira que continha um pingente idêntico ao que havia no meu colar. Olhei assustada para ela que me devolveu esse olhar maliciosamente como se fosse uma forma de aviso. “Estou vigiando o que você faz”. Ela se ajeitou e virou-se para Steve.

-Com licença, Capitão. – Pediu se retirando da sala. Agora eu entendia muito bem o que Loki queria dizer com “Há pessoas infiltradas na SHIELD que trabalham para mim.”. Desde que eu entrara naquele avião estava sendo vigiada por ambos os lados e isso me irritava profundamente, pois tudo que eu fosse fazer só teria a ajuda de Misha e ninguém mais.

-Respondendo a sua pergunta... Sim eu posso dizer mesmo com o tempo que passamos juntos, porque também tive meus momentos com Loki! – A ultima cartada sempre fora a mais cruel e mortal. O silêncio que se estabilizou naquela sala me fez ser capaz de ouvir a respiração de cada agente que estava naquele avião, menos a respiração de Steve que estava chocado ao ter me ouvido falar uma coisa daquelas. Ele se levantou e caminhou até a porta e saiu silenciosamente. Adoraria poder chamar por seu nome e dizer que estava sendo tudo uma grande mentira, poder abraça-lo com todas as forças que me restavam e encostar minha cabeça em seu peito para chorar tudo que estive segurando esse tempo todo.

Gritar exasperadamente era a coisa que eu mais desejava poder fazer agora, mas não existiam mais vestígios de voz em minha garganta, eu a havia gastado dizendo as mentiras mais horríveis que meu ser permitiu.