Juntando toda a coragem que tinha, eu me aproximei do vigia. Ao notar a minha presença naquela deserta rua, ele cruzou os braços e me encarou sério.

- Eu deveria ter trazido uma arma – reclamei baixinho comigo mesma.

Ao me aproximar do homem eu lhe sorri, mas o vigia apenas continuava me olhando sério. Eu apontei para a porta e depois apontei para a minha garganta; eu estava tentando me passar por muda.

- Você é muda? – perguntou-me o homem num inglês com sotaque britânico, a voz grave dele estava num tom bem baixo.

Fiquei espantada em saber que o homem falava inglês. Fingi tossir e com a voz rouca comecei a falar.

- Desculpe-me senhor, eu sou a nova empregada do lugar.

Com as roupas que eu vestia só me restava tentar entrar como empregada. Além do mais, eu não pretendia me passar por uma mulher da vida apenas para seguir o Naruto.

- Não fui avisado que haveria uma nova empregada – disse o homem com a cara fechada.

Eu tinha que arrumar alguma desculpa para entrar. Numa rápida olhada em seu rosto, notei uma enorme cicatriz ao lado de seu olho direito, além disso, eu também percebi que seu corte de cabelo parecia com o corte usado por soldados britânicos.

- A Rainha deve estar orgulhosa do senhor.

O homem pareceu surpreso com meu repentino comentário que parecia não ter significado dentro do contexto.

- Por que diz isso? – o homem ficou mais curioso com o meu comentário do que eu imaginava.

- O senhor deve ter sido um bravo soldado que lutou por seu país... – fingi tossir – Essa cicatriz em seu olho é uma marca de guerra, não é mesmo?

- Ataque alemão, minha família morreu nesse ataque – disse o homem com orgulho estufando bem o peito.

Fingi comoção por sua história.

- Minha família também morreu na guerra, malditos alemães! – Decidi mostrar-lhe que eu partilhava de sua dor.

Eu queria saber o que o homem pensaria se soubesse que meu passaporte e identidade me designavam como uma cidadã alemã.

O homem me olhou por um tempo em silêncio até que finalmente me disse as palavras que eu ansiava ouvir desde o momento que me aproximei dele.

- Pode entrar, garota.

Eu consegui o queria. Um truque espião, na verdade, é mais uma estratégia psicológica: as pessoas se sentem mais próximas umas as outras quando partilham à mesma dor.

Eu finalmente entrei no lugar. A porta de madeira dava acesso a um bar ao estilo americano antigo. Havia um enorme lustre que despendia do teto e deixava o ambiente era bem iluminado; isso não era bom, pois podia ser mais facilmente vista por Naruto, no entanto por estar bem cheio eu poderia me ocultar entre as pessoas.

A primeira vista, percebi que estava enganada sobre o fato do lugar ser uma casa de prostíbulo, ali funcionava o que parecia ser um bar. Havia mesas de madeira escura espalhadas pelo ambiente, um balcão ocupava toda uma parte da parede do lado direito e havia também um pequeno palco ao fundo. Numa varredura minuciosa com o olhar pelo bar, eu vi que Naruto não estava lá.

Eu retirei meu sobretudo e o pendurei ao lado da porta de entrada em um gancho deixado ali para tal finalidade. Voltei a percorrer com o olhar o ambiente, e notei que próximo ao palco havia uma porta de madeira com vidro opaco em metade da porta.

Naruto deveria estar atrás daquela porta, eu sentia isso. Um homem passou por mim apressado e se dirigiu a porta ao fundo, quando ele a abriu eu vi fumaça de cigarro saindo do ambiente por trás da porta. 

Eu passei por entre as pessoas, decidida a entrar naquele lugar que parecia ser do tipo “reservado”. Eu abri a porta e vi que uma nuvem de fumaça cobria o ambiente. Homens elegantemente trajados jogavam pôquer com diversas bebidas e cigarros espalhadas pela mesa. Peguei uma bandeja de uma das mesas e comecei a circular entre as mesas.

A fumaça de cigarro entrava em meus pulmões e eu tive vontade de tossir, meus olhos ficaram lacrimenjantes.

- Ei gracinha, me traz mais wisky – disse um homem de cabelos escuros na mesa ao lado se dirigindo a minha pessoa.

Eu sorri e acenei positivamente com a cabeça.

Todos ali pareciam falar inglês, só havia uma mesa mais ao fundo onde os homens ali sentados falavam francês; aquele lugar era freqüentado por estrangeiros. Surpreendeu-me saber que havia tantos estrangeiros na União Soviética.

Por mais que eu andasse por entre as mesas, eu não conseguia encontrar Naruto.

Comecei a sentir-me ridícula em estar ali procurando por ele, afinal o que eu esperava encontrar? Naruto jogando pôquer com alguma vadia como faziam os outros que estavam nas mesas.

Continuei andando até que vi Naruto sentado numa mesa bem ao fundo da sala na lateral direita; minha raiva aumentou instantaneamente. A sua frente estava sentado o estranho homem que entrara no bar com a mulher ruiva logo após Naruto entrado, agora sem o chapéu eu vi que o homem tinha o cabelo bem claro e em seu olho direito havia um tapa-olho de couro negro. Ao lado de meu parceiro estava a mulher de longos cabelos negros com olhos tão azuis que pareciam ausentes de íris que eu vira sair com Naruto da rua do apartamento.

Eu recuei um pouco para sair do campo de visão deles, e fiquei apenas observando Naruto conversar com o estranho homem a sua frente. A mulher a seu lado era muito bonita, eu tinha que admitir, e ela parecia estar um pouco encabulada em estar ali tão próxima a Naruto, suas bochechas estavam bem coradas.

Quem eram eles? E o que Naruto estava fazendo ali?

Considerando o lugar, cogitei a possibilidade de ela ser uma “dama de companhia”, mesmo num bar elas estavam presentes. Fiquei com raiva ao pensar isso... Naruto estava se fazendo de mártir por eu estar jogando charme para o Sasuke, e ele todo esse tempo estava era se divertindo embaixo da saia de uma mulher.

Um homem apareceu às minhas costas.

- Bárbara Fields, Bárbara Fields...  – ele gritava insistentemente o nome da mulher – seu show vai começar, Bárbara Fields...  

A mulher ruiva, assim como todos que estavam na mesa, incluindo Naruto, olharam para o homem, que como eu disse anteriormente, estava atrás de mim.

A ruiva levantou-se ao mesmo que Naruto o fez olhando fixamente para mim. Eu deixei a bandeja cair e saí andando apressada por entre as mesas. Em meio a minha fuga, copos que estavam na borda da mesa caíram e pessoas tentando sair do caminho acabavam por tropeçar e cair em cima de outras.

- Sakura! – agora era Naruto quem gritava por meu nome.

Eu andei o mais rápido que podia até alcançar a porta de saída daquele lugar reservado ao jogo. Naruto continuou me seguindo e chamando por meu nome, eu não tinha coragem de olhá-lo frente a frente.

- Sakura, espere!

Peguei meu sobretudo e quando fui colocar a mão na maçaneta senti Naruto me segurar pelo braço. Todos no bar olhavam para nós, alguns sorriam maliciosamente, outros apenas esperavam ansiosos para saberem o que sucederia. Na porta de acesso ao reservado de jogos “amigos” de Naruto viam tudo.

A cena protagonizada por mim e Naruto mais parecia uma montagem teatral, novamente eu me sentia uma atriz sem desejar sê-lo.

- Naruto, me solta agora! – falei num tom de voz baixo e cheio de ódio.

- Sakura, eu...

Eu o cortei.

- Vai me explicar o que está fazendo num bar de estrangeiros? – meu descontrole emocional fazia o tom de minha voz aumentar sem querer – que lugar é esse, afinal?

Eu puxei meu braço, mas Naruto não o soltou.

- Solte-me agora! – o ordenei.

- Sakura, me escute...

- Boa noite, senhores.

Voltei meu olhar para o palco, onde a mulher ruiva agora com o microfone a sua frente saudava os convidados. Ao contrario do que acredito que ela esperava a atenção dos homens continuava em mim e no Naruto.

- Está atraindo a atenção de todos – repreendi Naruto pela situação constragedora que eu vivia naquele momento.

- Eu quero falar com você.

- Tarde demais!

- Não tem mais jeito. A sua garota te descobriu – gritou em inglês um dos homens bêbados debochando de Naruto.

- A sua garota te pegou no flagra! – debochou outro homem careca quetinha uma barba preta. 

Naruto os encarou com raiva no olhar, ele soltou meu braço.

- Calem a boca! – gritou furioso.

Dessa vez fui eu quem segurou no braço de Naruto.

- Não dê atenção a eles.

O que eu menos queria naquele momento é que houvesse uma briga entre Naruto e aqueles homens. Naruto deu as costas aos homens e eu também.

Um terceiro homem sentado numa mesa próximo a nós se atreveu a continuar o deboche.

- Deixou a belezinha da mulher sozinha, a esposa vai arrumar outro assim... – disse o homem rindo alto.

Naruto se virou para encará-lo, mas eu o ultrapassei. Aproximei-me da mesa que o homem estava, e pegando na parte lateral da mesa a virei; copos e garrafas caíram no chão.

- Imbecil, nós não somos casados!

Girei os calcanhares e saí pisando firme. Naruto fez menção de me seguir, mas eu o encarei.

- Nem ouse me seguir.

- Sakura, é perigoso voltar para casa sozinha.

- Eu não sou feita de cristal, eu sei me virar muito bem sem você.

A ruiva se aproximou de mim pela lateral direita.

- É melhor se acalmar.

Eu a olhei com raiva.

- Quem é você?

- Meu nome é Bárbara Fields. Eu sou cantora desse lugar.

Eu abri um sorriso malicioso.

- Excelente! Assim essa noite você pode dar abrigo para o meu querido marido.

A mulher me olhou com espanto, e sem esperar por mais mediadores de relação eu saí do bar. O segurança da porta ficou me olhando ao ver-me passar por ele sem dizer sequer tchau.

Eu vesti meu sobretudo e caminhei de volta para casa. Em meu âmago a raiva me consumia.

- Idiota, idiota... como eu pude confiar nele? Idiota...

Àquela altura da noite eu não sabia quem era o idiota, o Naruto ou eu.