Illusion escrita por Harmonie


Capítulo 1
Um assassinato em potencial.




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/329522/chapter/1

“Quero que perceba que não há cor no mundo natural e não há sons – nada desse tipo; nenhuma textura, nenhum padrão, beleza ou cheiro... O “mundo lá fora” é sintetizado na nossa consciência.” – Sir John C. Eccles

– O que compõe o ambiente a nossa volta? – Dr. Pierce deu alguns passos em sua sala de aula e desviou o olhar dos alunos a sua esquerda para olhar ao redor. – Paredes, portas, pessoas... – de frente para os alunos, olhou em direção à janela localizada à esquerda. – O odor das flores, o canto dos pássaros, construções. Existe um mundo inteiro de cores, sons e odores esperando para ser percebido, não é mesmo? – seu olhar voltou a ser direcionado aos alunos. – Mas e se a resposta para essa pergunta for “não”? Seria possível questionar a existência de tudo o que afirmamos perceber? Seria possível questionar a aparência de coisas que acreditamos, veementemente, poder descrever com precisão? – Daniel pausou para observar seus alunos que o olhavam esperando uma resposta, ou apenas refletiam sobre o que haviam acabado de ouvir. Virou-lhes as costas e foi em direção ao quadro negro. – O que exatamente é a sensação? – escreveu a última palavra dita e se voltou aos alunos. – Alguém?

– A interpretação de estímulos que recebemos? – uma garota sentada na extrema direita, os cabelos escuros presos em um rabo de cavalo e os olhos claros e penetrantes, havia respondido, embora fizesse sua resposta soar como uma pergunta.

– Não exatamente. A sensação é apenas o recebimento, conversão e transmissão de informações encontradas no mundo exterior. A interpretação é característica da percepção. – a última palavra foi também escrita no quadro por Pierce que, assim como da última vez, se voltou aos alunos ao terminar. – Estímulos, como ondas sonoras e luminosas, quando captados por nós, são transformados em sinais elétricos que se transformam em impulsos e são interpretados no cérebro. O cérebro dá significado a toda informação sensorial que recebemos transformando-as naquilo que percebemos. Sendo assim, no mundo não existem cores, sons ou odores. Tudo o que conhecemos é criado, sintetizado na nossa consciência. E cada pessoa interpreta as informações recebidas de maneira distinta, por isso o conceito de beleza não é igual para todos, assim como um mesmo odor pode ser caracterizado como sendo bom ou ruim se questionarmos diferentes pessoas. Você pode mudar o seu mundo se simplesmente mudar a sua percepção. – Daniel olhou bem seus alunos e terminou: - Nosso cérebro cria o mundo em que vivemos. Será mesmo que existe uma maneira única de caracterizá-lo?

Dr. Pierce manteve o contato visual com seus alunos por mais alguns segundos até que o sinal soou, anunciando o fim daquela última aula. – Não se esqueçam, os trabalhos devem ser entregues na segunda-feira. – lembrou Daniel a seus alunos, que juntavam seus pertences e seguiam apressados em direção à porta, ansiosos pela chegada do fim de semana. – Aproveitem o fim de semana.

Ouvindo alguns “você também” de alunos bem-humorados como resposta, Daniel deu alguns passos em direção à mesa de Lewicki, onde ficou parado por alguns segundos esperando que este terminasse suas anotações. – Você parece ocupado. – disse por fim, impaciente com a demora. – Vou ao meu escritório. Você pode me encontrar lá quando terminar.

– Certo. Só não quero levar trabalho para casa no fim de semana. – Max lançou um olhar rápido a Daniel, que já pegava suas coisas para sair dali, e voltou aos seus afazeres. – Te encontro lá.

Tendo seus pertences em mãos, o professor seguiu até a saída, não sem antes olhar de relance para a janela através da qual podia ver um agradável e ensolarado dia de primavera.

Lá fora, o mínimo movimento nos corredores denunciava a chegada do fim de semana e, enquanto avançava até sua sala, Daniel pensou que os preferia assim, quando não havia gritaria, pressa ou qualquer coisa que o impedisse de chegar rapidamente onde quer que fosse.

Já em sua sala – um ambiente de luminosidade pouco intensa e livre de ruídos muito incômodos -, sentou-se na cadeira em frente à sua mesa e não hesitou em colocar seus fones de ouvido; alcançou uma boa quantidade de folhas de papel empilhadas a sua direita e trouxe para perto de si algumas delas juntas por um clipe; sentou-se corretamente e acionou seu toca-fitas, deixando que a melodia preenchesse o vazio daquele silêncio.

Por fim, Dr. Pierce lia um artigo científico sobre neurofisiologia ao som da Nona Sinfonia de Beethoven. Enquanto lia, podia associar perfeita e naturalmente os impulsos elétricos captados e transmitidos por células nervosas durante as milhares de sinapses ao andamento da música que ouvia; imaginava algo como resultados de exames de eletroneuromiografia associados à constante variação do padrão das notas musicais que compunham a melodia.

Escolhera o artigo para preencher seu tempo uma vez que já havia resolvido as palavras cruzadas reservadas para aquele dia, porém, deixou-o de lado antes que pudesse terminar a leitura. Assim que repousou a folha de papel sobre a mesa, recostou-se na cadeira de madeira escura e fechou os olhos. Agora podia se concentrar exclusivamente na Nona e, de olhos fechados, reger aquela grande orquestra que poderia, sem esforço e com imaginação - coisa que ele com certeza tinha -, estar logo a sua frente. Entretanto, o exercício de sua atividade como regente durou apenas o tempo de Kate Moretti avançar no corredor, abrir a porta da sala de Daniel e, após observá-lo com um sorriso, avançar em sua direção para, com um toque em seu ombro, trazê-lo de volta à realidade.

– Kate. – disse ao se tornar ciente de sua presença, sobressaltado. Em seguida, tirou os fones dos ouvidos e pausou sua fita repleta de clássicos.

– Olá, Daniel. – sorriu - Preciso da sua ajuda. – ela se sentou na cadeira em frente a Daniel e colocou sobre a mesa a pasta de cor parda que carregava consigo. – Temos um assassinato em potencial aqui no campus.

– Potencial? – Dr. Pierce a olhou interrogativamente.

– Na manhã de hoje, Rosie Powell, uma aluna da universidade, contatou a polícia e fez a denúncia do assassinato de sua colega de quarto, Karin Bernadotte, cidadã sueca que afirmava ter ligação de parentesco com o rei Carlos XVI Gustavo da Suécia. – enquanto falava, Kate abriu sua pasta e mostrou fotografias de Karin, uma garota loira, os olhos de um azul tão claro quanto o céu em um dia típico de primavera.

– Membro da realeza sueca? Um pouco pretensiosa... – Daniel comentou. – E onde está o problema, além da mentira?

– Ainda não sabemos se é mentira. – Kate comentou. - Rosie afirma com convicção ter encontrado o corpo sem vida da colega quando voltou ao quarto depois de sua última aula a fim de pegar coisas de que precisava para passar o fim de semana na casa dos pais. Ela relatou ter visto uma grande quantidade de sangue sobre a cama onde Karin estava deitada e ter saído do quarto imediatamente para chamar a polícia. O problema é que, ao voltar ao quarto com os policiais, não havia ninguém lá. – outra fotografia foi mostrada na qual era possível ver uma cama, certamente a de Karin, com os lençóis sujos de sangue.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Illusion" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.