Constelações escrita por Mitzrael Girl


Capítulo 2
Draco




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Constelações

Draco

Ela andou apressada pelos corredores, ainda estava com o vestido vermelho de sua formatura. O relógio de pulso marcava mais de três da manhã. Kagome, Inuyasha, Hakudoushi e sua esposa, Akio, iam à frente, quase correndo.

Àquela altura da madrugada, poucas pessoas passavam pelo local, e a maioria delas vestia sempre as mesmas roupas completamente brancas, que estavam começando a deixar Rin apreensiva. Eles finalmente pararam de correr, e Inuyasha tinha apoiado as mãos no balcão da recepção, onde duas mulheres estavam, também vestidas em branco, concentradas em digitar alguma coisa no computador e arrumar umas fichas que estavam em cima da mesinha.

– Posso ajudá-lo, senhor? – a mulher que estava de frente para o computador perguntou, deixando o trabalho que estivera fazendo de lado.

– Taisho, Sesshoumaru Taisho deu entrada nesse hospital, não foi? – Inuyasha perguntou, mantendo a calma diante dos olhos dos demais.

– Um momento senhor. – a atendente virou-se para a colega e, depois de trocar algumas palavras e buscar a informação no computador, finalmente se voltou para o grupo de pessoas ali. – Sim, Taisho Sesshoumaru. Ele deu entrada nesse hospital há 4h45min.

– E como ele está? – dessa vez Hakudoushi deu um passo à frente, apoiando-se no balcão. – Nós podemos vê-lo?

– Vocês são da família? – ela perguntou, olhando um por um.

– Sou. – Inuyasha foi o único a responder.

– Eu vou chamar o Dr. Toshiro. Um minuto. – ela se levantou e saiu de trás do balcão, andando ao longo de um corredor.

Nos pequenos momentos em que ficaram esperando, Rin sentiu a garganta apertar. Não sabia por que exatamente, mas estava muito preocupada com o que tinha acontecido. E tinham demorado tanto para descobrir sobre o estado de Sesshoumaru…

O grupo de cinco pessoas ficou esperando na sala vazia do hospital. O ambiente não estava muito aconchegante, estava frio e escuro, com algumas poucas luzes nos corredores acesas. Eles tinham sido mandados da emergência para aquele andar, mas ninguém realmente tinha prestado atenção em que andar era aquele… mas pelo modo silencioso em que estava… não parecia o lugar mais reconfortante do grande hospital.

Tiveram que esperar mais de meia hora até que o tal médico chegasse para falar com ele. A primeira coisa em que Rin prestou atenção foi nas roupas dele: se todos os anos que passara na faculdade não tinham sido inúteis, aquela roupa indicava que ele tinha acabado de sair de uma cirurgia.

– Com licença… qual de vocês é parente de Sesshoumaru Taisho? – o homem perguntou, aproximando-se dos cinco, com uma face o mais inexpressiva possível.

– Eu sou. – Inuyasha se levantou da cadeira, ficando de frente para o médico. – Ele é meu irmão. O que aconteceu?

– Bom… senhor… Taisho, posso convidá-lo à minha sala, por favor? – o médico mexeu as mãos de uma maneira incomodada, e Rin foi a única a notar aquilo. Na verdade, estava prestando atenção a cada mínimo movimento que ele fazia desde que os tinha visto sentados ali. Não parecia que tudo estava bem.

Inuyasha desviou os olhos do médico e encarou Kagome. Ela apenas acenou positivamente com a cabeça, do mesmo jeito que Hakudoushi, quando os olhos dourados do Taisho mais novo encararam os dele. Inuyasha não falou nada, simplesmente meneou com a cabeça e seguiu o médico pelo corredor pouco iluminado.

– O que será que aconteceu com Sesshoumaru-sama? Será que é assim tão grave? Ele chamou Inuyasha pra falar em particular… – Kagome comentou em tom de voz baixo, quando os dois se afastaram o suficiente. Ela demonstrava estar bem mais apreensiva do que qualquer um dos outros na sala… mas Rin sabia que também estava bem apreensiva.

Ela sabia que o estado tinha que ser muito grave para o médico chamar apenas os familiares para conversar… só não esperava que fosse tanto.

Inuyasha voltou quase meia hora mais tarde, e Kagome já estava de pé andando de um lado para outro, enquanto Akio se preocupava em afagar os cabelos de Hakudoushi e repetir incansavelmente que tudo estava bem, como se o homem fosse uma criança que não entendesse a gravidade da situação; entretanto, aquilo incrivelmente parecia acalmar Hakudoushi. Mesmo com toda a impaciência dos outros, Rin foi a primeira a virar o rosto e perceber que Inuyasha e o médico estavam voltando. Ela sabia que as coisas não tinham ido tão bem… e as expressões de Inuyasha e do médico só contribuíram para confirmar seu medo.

– Inu! O que aconteceu? O Sesshoumaru está bem? – Kagome adiantou-se na direção do, agora, marido.

Inuyasha hesitou, e Rin percebeu o esforço que ele fez para não desviar os olhos da esposa.

– O que foi, Inu? – Kagome voltou a perguntar, e com o silêncio de Inuyasha, Hakudoushi e Akio já tinham se levantado, Rin continuou sentada, pois sabia que se tentasse ficar de pé, as pernas começariam a tremer… não era possível que fosse mesmo ouvir o que estava pensando. – Fale logo! Não nos deixe esperando!

– Ele… ele sofreu um acidente de carro e… – Inuyasha hesitou de novo, e mais uma vez Rin percebeu ele querer desviar os olhos de Kagome. Ela apertou o pano do vestido com as mãos.

– E o quê, Inuyasha?! – Kagome insistiu, num tom mais nervoso.

– Ele… teve alguma coisa na cabeça que eu não sei explicar, e… e parece que não resistiu muito, ele entrou em estado de coma. – finalmente Inuyasha desviou os olhos de Kagome, fitando o espaço vazio entre os próprios olhos e o chão.

Os minutos que se seguiram àquelas últimas palavras foram de completo silêncio. Rin afrouxou o aperto no tecido do vestido quase que instantaneamente. Os outros estavam completamente sem reação, como se a mente deles tentasse processar aquela sentença.

– Inuyasha… o que você está falando é… o Sesshoumaru? – Hakudoushi foi o primeiro a quebrar o silêncio, e embora as reações dos outros fosse imediata de encarar o homem, Rin continuou a encarar o chão, não ouvindo mais nada ao seu redor.

Inuyasha não respondeu, parecia que ele não queria repetir aquilo, quase como se fizesse do fato ainda mais verdade. O médico então interrompeu.

– Ele chegou aqui num estado já crítico. – o homem começou a falar e Rin não queria levantar o rosto para descobrir se os outros estavam prestando atenção no que ele dizia. – Tinha perdido uma quantidade considerável de sangue, e sofreu uma pancada forte na cabeça. Como eu disse ao Sr. Taisho, durante a cirurgia, tudo correu bem… ou assim esperávamos. Ele acabou entrando em estado de coma. Agora basta esperar que ele acorde, ainda há muitas chances que isso aconteça. Só poderemos saber se sofreu maiores danos quando ele recobrar a consciência. Ainda há esperança…

Apenas ao ouvir aquelas últimas palavras, Rin ergueu a cabeça para encarar o homem de roupa azul. Sabia exatamente o que ia encontrar, todavia. Ele podia ter falado de esperança… mas aquela era a última expressão que tinha no rosto dele.

– Eu sei que vocês estão muito preocupados… mas eu indico no momento que vocês vão pra casa e descansem. – ele voltou a falar. – É melhor deixar o paciente em repouso agora. Amanhã podem voltar no horário de visita e vou providenciar para que possam vê-lo por alguns minutos. Nesses primeiros momentos, é melhor evitarmos acompanhantes, mas logo poderão visitá-lo quanto tempo quiserem.

– Se-Sesshoumaru-sama… ele… ele está em coma? – Kagome sentou-se para evitar que as pernas fraquejassem. Inuyasha se aproximou dela e abraçou-a… era quase como se ela mostrasse as reações que ele deveria expressar. Ele podia sempre implicar com Sesshoumaru e ambos faziam toda a questão do mundo de ressaltar que eram apenas meio-irmãos. Mas aquilo não mudava o fato de que tinham convivido juntos uma vida inteira, e que no fundo, realmente se preocupavam um com o outro.

Rin ainda ficou desligada dos outros por um bom tempo, até que eles terminassem de associar aquele fato, e então, só se levantou quando percebeu que Hakudoushi já estava conversando com Inuyasha havia certo tempo agora.

– É melhor… irmos pra casa agora. – Hakudoushi disse, tentando parecer composto diante da situação, mas era um tanto quanto difícil. – Não há mais nada que possamos fazer aqui agora.

– Mas… alguém deveria ficar… pra receber alguma notícia. – Kagome falou, os olhos estavam vermelhos. Rin sabia o quão a irmã mais velha era emotiva, e mesmo não se dando tão bem com o Taisho mais velho, ela devia estar sentindo muito pelo que havia acontecido. Inuyasha ainda a abraçava forte, conhecendo-a como conhecia, era daquilo que Kagome precisava no momento.

– Onee-chan… é melhor ir pra casa agora. – Rin finalmente falou, aproximando-se dela. – Qualquer notícia, eles vão avisar de imediato, eu tenho certeza.

– Ainda assim… – Kagome tentou insistir, mas dessa vez Inuyasha a interrompeu.

– Vamos pra casa, Kagome. – ele disse, decidido. – Vai dar tudo certo.

Aquelas foram as últimas palavras que Rin pôde ouvir naquele grande hospital silencioso. Dali em diante, o grupo seguiu até o estacionamento, entraram em carros separados e logo estavam de volta aos seus lares, não tão bem quanto desejavam depois de um baile de formatura. Rin ainda precisou ficar completamente sozinha naquela casa enorme que herdara dos pais, agora Kagome não estava mais lá para lhe fazer companhia. A única coisa que conseguiu fazer foi se jogar no sofá da sala e respirar fundo… ainda não conseguia acreditar que Sesshoumaru estava mesmo a um passo da morte… mais ainda, não conseguia acreditar como aquilo fazia seu coração apertar tanto.

xXx

Rin passou a mão na testa para limpar o suor. Sorriu satisfeita ao ver como a pequena sala tinha ficado. O chão estava completamente coberto de jornais agora sujos com uma cor azulada. As paredes estavam bem pintadas na mesma cor e algumas latas de tinta estavam juntas ao canto da parede.

– Ufa! – ela sentou-se, ainda observando as paredes com certo brilho nos olhos. – Finalmente consegui terminar essa sala… agora, só preciso trazer os móveis, e logo terei uma nova casa!

Ela se permitiu deitar sobre os jornais e fitar o teto branco por alguns minutos. Estava satisfeita com o resultado de seu trabalho duro. Tinha conseguido o apartamento por um preço muito bom e só precisava reformá-lo ao seu gosto. A localização também era ótima, bem perto do hospital em que fazia residência havia quase um mês… o mesmo em que Sesshoumaru continuava internado, sem melhoras em seu estado, sem sinais de que sequer abriria os olhos.

– Três semanas… – ela deixou que as palavras escapassem de seus lábios, num tom pesaroso. Não havia problema algum com aquilo, ninguém estava lá para lhe ouvir naquele momento.

Inuyasha e Kagome visitavam o hospital com freqüência na esperança de que Sesshoumaru acordasse. Hakudoushi estava tão ocupado cuidando da empresa de advocacia sozinho, que era mais difícil poder visitar o amigo, mas o fazia sempre que podia. E Rin… não haveria outro motivo, senão vê-lo abrir os olhos, pelo qual ela tinha escolhido aquele hospital especificamente para fazer sua residência.

Ela não soube exatamente quanto tempo passou perdida em pensamentos ali, deitada no chão de seu novo apartamento, até que o som estridente do toque de seu celular a trouxesse de volta à realidade. Depois de achar o aparelho entre as folhas de jornal, completamente sujo de tinta, atendeu com pressa, sem mesmo ver quem estava ligando.

Rin-chan! Onde você está, menina? Vamos almoçar sem você, hein! Eu to morrendo de fome, porque você não chega logo? – Kagome reclamava do outro lado da linha, a plenos pulmões.

– Ah! Desculpa, Kagome! – Rin bateu na testa ao lembrar que tinha marcado de almoçar com a irmã e o cunhado. – Podem ir almoçando, eu chego mais tarde, ta? Eu demorei mais do que previa aqui terminando de pintar esse lugar.

Você devia ter contratado algum pintor! Você é muito sem noção, sabia, Rin-chan! – Kagome continuou a reclamar do outro lado da linha.

– Eu já repeti mil vezes que queria fazer sozinha, não seja implicante, Kagome! É minha casa agora. – Rin retrucou, já se levantando e imaginando por que já não tinha arrumado toda a bagunça ao invés de ficar só olhando para o teto o tempo todo.

Não enquanto a tinta não secar. Então volte logo pra sua casa provisória que eu quero almoçar! – Kagome completou.

– Hai, hai. – Rin suspirou demoradamente e desligou o celular. Ela ainda olhou ao redor e ponderou sobre a possibilidade de ficar ali e terminar de arrumar toda a bagunça e depois receber uma bronca de Kagome ou simplesmente cumprir com seus compromissos e ir encontrar a irmã. A resposta surgiu rápido quando sentiu seu estômago roncar de fome. – É… acho melhor eu ir.

Ela tentou se arrumar do jeito mais prático possível. Tirou a camisa grande e folgada que usara para não se sujar muito e colocou um casaco por cima da blusa simples que tinha por baixo. O short velho que ficava completamente escondido pela camisa foi deixado de lado em lugar da calça jeans com a qual chegara ao apartamento. Ainda tinha manchas de tinta pelo corpo e tirara o máximo possível das que havia no rosto para poder finalmente sair do local e seguir para a casa de Inuyasha e Kagome.

Rin ainda sentiu o estômago reclamar mais e mais durante os trinta minutos que demorara dentro do metrô para ainda ter que andar mais dez minutos e alcançar a casa dos dois, um pouco mais longe do centro da cidade.

– Que demora, Rin-chan! – Kagome reclamou assim que viu a irmã entrar em casa, passando direto para as escadarias no canto da sala de estar. – Sabia que eu to aqui morrendo de fome! E pra onde você pensa que vai?! Vamos almoçar logo!

– Eu disse pra almoçar antes, Kagome! – Rin respondeu, sentindo a irmã puxá-la pelo braço antes que conseguisse alcançar as escadas. – E eu pretendia ir tomar um banho, ainda estou toda suja de tinta.

– Toma depois! – a mais velha disse, puxando-a para a sala de jantar.

Quando elas chegaram lá, a sala estava vazia e a comida posta na mesa. Rin piscou duas vezes, imaginando se não estava faltando alguma coisa na cena, ou alguém.

– Ué… cadê o Inuyasha? – Rin perguntou, sentando-se numa das cadeiras enquanto Kagome sentava exatamente diante dela.

– Ele precisou sair mais cedo pra resolver uns assuntos do trabalho, estou esperando até agora. – Kagome respondeu, começando a se servir.

– Ahh… – Rin deixou escapar, num tom de compreensão. – Agora entendi porque queria tanto que eu viesse logo almoçar. Se tivesse com Inuyasha, não teria me esperado, claro.

– Não diga besteiras, Rin-chan! – Kagome reclamou, colocando suco no copo bem ao seu lado. – E então, como estão as coisas no novo apartamento?

– Estão do jeito que eu imaginava. – Rin sorriu, animada e começou a se servir também. – Logo logo eu vou me mudar pra lá. Se você não estivesse com crise de abstinência do Inuyasha por algumas meras horas a ponto de me obrigar a vir almoçar, eu poderia ter terminado de limpar tudo hoje e amanhã já estaria me mudando.

– Rin-chan! Você quer mesmo me deixar sozinha, não é? – Kagome reclamou, emburrada.

– Não, Onee-chan. Quero lhe deixar casada. – Rin corrigiu. – Vai ser bom me mudar pra lá, é bem perto do hospital e isso vai contribuir quando eu precisar ficar de plantão.

– Sim, sim… – Kagome concordou. – Fico feliz que esteja conseguindo organizar sua vida. Agora só falta arrumar um homem pra casar!

Rin quase engasgou com a comida ao ouvir o comentário da irmã mais velha. Controlou-se ao máximo e terminou de engolir tudo lentamente.

– Eu vou ignorar isso, Ka-chan. – ela disse, tentando se recompor do choque.

Mas o que mais a assustara não tinha sido o simples comentário de Kagome, mas sim a primeira pessoa que surgira em sua cabeça em resposta àquele comentário.

– Mas é verdade, veja. Você não pode ficar morando sozinha num lugar daqueles! É perigoso! – Kagome ressaltou.

– Não tem nada de perigoso. – Rin respondeu. – E eu vou me acostumar logo. Amanhã mesmo eu limpo tudo e começo a mudança. Segunda eu já posso ficar lá.

– Se é o que você quer. – Kagome suspirou, derrotada, e depois de uns minutos em silêncio, apenas saboreando a comida, ela voltou a falar. – Ei, Rin-chan… alguma novidade do estado de Sesshoumaru-sama?

Rin parou o movimento de levar o talher até a boca com aquela pergunta. Ficou fitando a comida por alguns instantes até conseguir responder.

– Nada. – ela disse, desistindo de comer e pegando o copo de suco. – Continua o mesmo de sempre, está estável, nenhuma melhora, nenhum sinal… nada que possa nos dar esperança.

– Não fale assim, Rin-chan! – Kagome reclamou. – Até parece o médico que falou com a gente naquela noite. Vai dar tudo certo. Logo logo Sesshoumaru-sama vai acordar e vai estar bem melhor.

– Claro, ele vai sim. – ela sorriu fracamente e então, deixou o copo de lado. – Eu acho que já terminei.

– Eh? Mas você não comeu quase nada. – Kagome piscou duas vezes, ao ver a irmã se levantando com o prato cheio na mão, na direção da pia.

– Não estou com fome, Ka-chan. E eu preciso mesmo tomar um banho e descansar um pouco. – Rin respondeu, enquanto jogava a comida fora e deixava o prato na pia.

Antes que Kagome pudesse responder, ouviram o som da porta de entrada sendo fechada e passos que se aproximavam cada vez mais.

– Olha aí, agora tem o Inuyasha pra lhe fazer companhia. – Rin disse, antes de sair da cozinha e mesmo confirmar que o dono dos passos era o cunhado.

– Kagome? – a voz do homem invadiu o ambiente quando ele passou pelo portal de entrada da cozinha. – Ah, oi, Rin.

– Eu vou subindo. – Rin passou por ele acenando rapidamente enquanto Kagome a acompanhava com os olhos.

– Eu estou morto de fome! O que tem pra comer, hein? – Inuyasha perguntou, já começando a checar as panelas e travessas que estavam na mesa. – Aqueles idiotas só sabem atrasar a minha vida! Eu passei a manhã todinha naquele escritório sem nem ter tomado café da manhã direito! Eles queriam era me matar, isso sim!

– A Rin está estranha. – Kagome falou, sem ter prestado atenção em sequer uma das palavras de Inuyasha desde que a irmã saíra da sala.

– Eh? – Inuyasha piscou duas vezes enquanto desviava os olhos para a mulher. – Por quê? Pra mim ela é a mesma de sempre.

– Você é um insensível, Inuyasha! – Kagome reclamou, batendo com a colher na mão dele quando ele tentou pegar sua comida. – Estou preocupada que ela vá morar sozinha desse jeito.

– Desse jeito como, Kagome? Você está paranóica! – Inuyasha reclamou, alisando a costa da mão.

– Não sei… ela parece meio distante. – a mulher arqueou as sobrancelhas, pensativa.

– É exatamente como ela deveria parecer, bem distante da gente, como seu outro irmão. – o dono dos olhos dourados respondeu e desejou não tê-lo feito quando sentiu a colher bater bem na sua testa.

– Você é um idiota, Inuyasha! – Kagome reclamou. – Não vê que estou mesmo preocupada com a Rin-chan?!

– Certo, certo. – ele respirou fundo. – O que acha que tem de errado com ela, Kagome?

– Não sei… – ela respondeu. – Mas ela me parece estranha.

– Se não sabe, não tem como ajudar, então, não se meta onde não foi chamada. – Inuyasha respondeu, ríspido como sempre, começando a se servir nas maiores quantidades possíveis de comida.

Kagome precisou respirar fundo três vezes e contar até dez, balançando a cabeça negativamente.

– Você não tem jeito mesmo, Inu.

Enquanto Kagome e Inuyasha terminavam de almoçar, Rin já estava tomando um demorado banho, tendo uma certa dificuldade pra tirar as manchas de tinta da pele, para poder então sair, deitar e aproveitar o resto do sábado livre descansando. Ainda tinha o domingo livre antes de voltar pra correria do hospital e usaria aquela folga para terminar de arrumar o apartamento. Era tudo o que queria naquele momento, começar a sua vida independente e rumo a uma grande carreira de medicina… mas já fazia algum tempo que esse sonho ficava um tanto quanto ofuscado com a imagem daquele homem deitado numa cama de hospital, sem nenhuma reação aparente. Queria que ele acordasse logo, mas como médica residente, sabia que quanto mais tempo se passava naquele estado, maior era a certeza de que ele talvez nunca mais acordasse, e aquela idéia a estava assustando. Nem Kagome nem qualquer outra pessoa que estivesse preocupada com o estado de Sesshoumaru sabia daquela possibilidade, e ela não estava disposta a contar pra ninguém também. Esperaria mais algum tempo, e talvez ninguém precisasse ficar sabendo daquilo.

Ela não sentiu muita necessidade de sair do quarto de visitas da nova casa da irmã. Apenas no final da tarde para pegar alguma coisa pra comer e também no meio da noite, pelo mesmo motivo. Não queria incomodar a vida de recém-casados de Inuyasha e Kagome, e quanto mais cedo saísse dali, melhor seria.

Foi com uma animação surgida do nada que Rin acordou na manhã de domingo. Só de saber que iria pra casa limpar tudo e levar os móveis, naquela tarde mesmo, a deixava realmente satisfeita. Ela saiu de casa tão cedo que não se impressionou ao ver o nome da irmã no identificador de chamadas do celular perto das dez da manhã.

Onde é que você se meteu a essa hora da manhã, pelo amor de todos os deuses?! – Kagome reclamou de uma só vez do outro lado da linha.

– Bom dia pra você também, Ka-chan. – Rin respondeu, passando a mão pela testa para limpar o suor e olhando para a sala que agora estava quase completamente limpa. – Sabia que você dorme demais?

Hoje é domingo! Onde é que você está?! Quer me matar de preocupação?! – Kagome continuou a falar com o tom irritado.

– Estou terminando de limpar o apartamento. E eu deixei um bilhete pra você na porta da geladeira. Se você não viu, o Inuyasha com certeza deve ter visto. – a mais nova respondeu, sentando-se em posição de lótus.

Kagome incrivelmente ficou em silêncio por uns meros segundos. Rin ouviu então um breve suspiro antes da irmã voltar a falar, mais calma.

Você realmente quer se mudar, não é?

– As coisas mudaram, Ka-chan. – a mais nova sorriu em resposta. – Não é mais como antes. Não somos mais eu e você. Agora se trata de você e Inuyasha. Vocês estão começando uma vida juntos e eu não vou ficar no meio para interferir.

Mas você não…

– Além do mais… – Rin interrompeu a irmã antes que ela conseguisse completar a sentença. – Eu também preciso começar a minha vida. Não precisa se preocupar, vai dar tudo certo! Acho que consigo viver sozinha.

Não estou preocupada exatamente se vai viver sozinha, Rin-chan… estou preocupada com outras coisas sobre você. – Kagome respondeu.

– Eh?

Bom… então, já terminou de arrumar as coisas aí? Vai estar em casa para o almoço? – ela perguntou, não fazendo cerimônia em mudar de assunto. Rin a conhecia e sabia que por mais que insistisse, ela não ia explicar nada, então não ia adiantar perder tempo.

– Estou terminando. Acho que vou almoçar por aqui mesmo, eu já avisei ao pessoal da mudança que estaria aqui de tarde pra eles trazerem tudo, então, é melhor eu voltar cedo. – Rin respondeu. – Mas eu volto pra casa de noite, pela última vez.

Certo então. Eu vou esperar. Até mais, Rin-chan. E cuidado!

– Hai, hai.

Ela desligou o telefone e colocou-o no chão, bem ao seu lado. Levantou a cabeça para fitar o teto, pensativa.

– Por que será que Kagome está preocupada comigo? – perguntou-se, arqueando as sobrancelhas em confusão.

Balançou a cabeça para os lados um pouco e se levantou para terminar de limpar a sala. Só faltava aquilo e finalmente poderia se mudar.

O resto do domingo de Rin não foi tão tranqüilo quanto um domingo normalmente seria. Ela precisou coordenar a mudança, ou sabia que tudo acabaria no lugar errado e seria pior para ela arrumar depois. Entretanto, não havia tanta coisa pesada para mudar, ela só estava começando sua vida ali, então, os móveis eram alguns que tinham sobrado da antiga casa dos pais, e o essencial pra que ela sobrevivesse lá. Depois de passar a tarde toda ajudando a mudar as coisas e colocando tudo no lugar, ela precisou voltar para a casa da irmã mais velha para descobrir que havia uma recepção inteira pra ela. Além dos moradores da casa – e Inuyasha estava com uma cara um pouco mais emburrada que o normal –, Hakudoushi e a esposa estavam lá, assim como outros amigos de longa data dela e de Kagome: Sango e Miroku.

– Demorou, hein, Rin! – a morena de cabelos amarrados num rabo-de-cavalo falou, levantando uma taça de vinho na direção dela. – Estamos te esperando há mais de uma hora!

– Desculpem. – Rin sorriu sem graça. – Na verdade, eu nem sabia que estavam aqui.

– Inuyasha bondosamente cedeu a casa dele hoje pra fazermos uma pequena bagunça. – Hakudoushi respondeu, pegando uma taça de champanhe e sentando-se ao lado da mulher novamente.

– Feh! – Inuyasha virou a cara e engoliu todo o resto do vinho que estava em sua taça.

– Claro que cedeu. – a Higurashi mais nova sorriu em resposta.

– O que ainda está esperando aí em pé? – Kagome acenou com a mão. – Vamos, sente-se! Vamos comemorar que finalmente vai se mudar para o seu novo apartamento!

– É! Semana que vem, a bagunça é na casa da Rin! – Miroku falou alto o suficiente para sobrepor a voz de todos.

– Hey… amanhã eu tenho que ir trabalhar cedo… é melhor eu ir…

– Nem pensar, Rin-chan! – Kagome balançou a cabeça veemente. – Vai ficar aqui e comemorar com a gente, não seja chata!

– Certo… então. – ela finalmente concordou, aceitando o vinho que Sango estava lhe empurrando insistentemente.

A noite foi longa o suficiente para todos. Quando Rin ficou feliz de ir para a cama, viu que já era uma da manhã. E ainda tinha que acordar cedo naquele mesmo dia para estar no hospital às 8h. Assim que saiu do banho, colocou o celular para despertar pelo menos em três horários diferentes a partir das cinco horas, assim tinha certeza que se levantaria em algum dos alarmes.

Mas, naquela manhã de segunda, talvez o que ela realmente tivesse precisado era de algum alarme para quando estivesse dentro do metrô, assim certamente não teria passado da estação em que desceria.

A morena bateu a mão na testa com força ao descer do metrô e ver que já eram mais de 7h30min, além de estar a algumas estações de distância do hospital.

– Droga! Tudo culpa daquele vinho de ontem! Eu realmente devia ter ido dormir assim que cheguei em casa e teria me poupado o trabalho de vir parar em Shinjuku! – ela reclamou consigo mesma. – Droga! Droga! Droga! Vou chegar atrasada e nem tenho um mês de residência ainda.

Ela suspirou fundo e olhou ao redor por um momento. Naquele horário, havia uma quantidade bem grande de pessoas circulando pela estação, desde estudantes a advogados, e todos pareciam bem apressados para chegarem em seus destinos, mas nenhum parecia estar no lugar errado a não ser ela.

– Okay, se eu ficar parada aqui não vai adiantar nada, agora tenho que esperar a próxima linha, e talvez eu chegue a tempo, nem é tão distante assim daqui… – começou a falar consigo mesma, começando a calcular nos dedos a distância que estava do hospital e se demoraria mais de vinte minutos para chegar lá.

Rin teria continuado os cálculos se não tivesse sentido um estranho tremor que ia dos seus pés à cabeça. Poderia ter achado que havia alguma coisa errada consigo mesma, se todo mundo ao seu redor não tivesse parado, olhando para os lados de maneira confusa.

– O que…

Antes que ela terminasse de se questionar sobre o acontecido, o tremor voltou, mas bem mais forte que da primeira vez. Os gritos de desespero da maioria das pessoas alcançaram seus ouvidos e não pôde pensar em mais nada além de se abaixar e cobrir a cabeça, mas sentiu várias pessoas começarem a correr e logo tinha sido jogada no chão. No ato instintivo de se proteger, colocou uma das mãos para se apoiar da queda, mas não foi uma boa idéia. Com todo o peso do corpo sobre o braço, sentiu o pulso doer enquanto o chão ainda continuava a tremer sem dar o sinal de que iria parar tão cedo. Quando ela conseguiu se ajeitar e colocar as mãos sobre a cabeça, várias pessoas já tinham feito o mesmo ou procurado algum lugar sob o qual se proteger, mas o terremoto parecia que ia ficar ainda mais forte. O barulho do chão estremecendo era assustador e alguns objetos começavam a cair e quebrar, tornando as coisas ainda mais desagradáveis.

Por um momento, Rin achou que fosse apenas sua imaginação, mas as coisas pareciam ter parado de tremer. Ela precisou levantar a cabeça para confirmar aquilo. As pessoas ao redor também já estavam começando a levantar as cabeças, mas ninguém se arriscava a ficar de pé ainda, tão acostumados com os terremotos que sabiam que poderia voltar com mais força e potência em poucos segundos. Foram precisos mais de cinco minutos para que alguém tomasse coragem para se levantar, certo de que o terremoto não voltaria. Mas Rin só se levantou mesmo quando viu o seu metrô parando e abrindo as portas. Com ou sem terremoto, se não embarcasse nele, não chegaria no horário para o trabalho.

Quando Rin entrou correndo pelas portas automáticas do hospital, o relógio marcava exatamente 8h02min. Ela parou ofegante, apoiando-se no balcão da recepção.

– Rin-chan… o que aconteceu? Veio correndo de casa? – uma das recepcionistas perguntou ao ver o estado lastimável da médica-residente.

– Quase isso. – Rin respondeu quando conseguiu acumular ar suficiente para a resposta. – Pelo menos consegui chegar dentro do horário. Eu vou subindo.

– Okay. Tenha um bom dia, Rin. – a recepcionista acenou para ela enquanto a jovem desaparecia ao fim do corredor.

Rin tentou acenar de volta, mas sentiu a mão direita doer só com a idéia de movimento. Entrou no elevador para sair no terceiro andar. O pulso estava um pouco inchado e vermelho, talvez precisasse cuidar daquilo antes de começar o trabalho. Seria um problema cuidar dos outros com a mão daquele jeito.

Quando desembarcou do elevador, ainda estava analisando o estado lastimável do seu pulso e como tinha conseguido fazer aquilo. Só desviou a atenção do próprio braço quando ouviu uma voz conhecida lhe chamando atenção.

– Isso deve ter sido uma queda bem feia, hein, Rin-chan.

– Ah, Ayame. – Rin sorriu ao cumprimentar a dona dos cabelos avermelhados amarrados em dois rabos-de-cavalo laterais. – Que bom que está aqui. Pode me ajudar com isso? Eu caí de mau jeito.

– Claro. Vamos pra enfermaria. – Ayame fez um sinal para que Rin a acompanhasse. – Então, o que aconteceu?

– Acredita que eu dormi no metrô e fui parar em Shinjuku? – Rin começou a falar enquanto caminhavam lado a lado pelo corredor pouco movimentado. – E pra completar a minha desgraça… teve um terremoto lá.

– Um terremoto?! – Ayame perguntou, assustada. – Você tem certeza que está bem? Muita gente se feriu? O que aconteceu?

– Calma… não foi nada grande. Só um tremor pra assustar as pessoas a ponto de elas correrem e esbarrarem em outras pessoas desatentas que acabaram caindo sobre o braço. – Rin disse, dando de ombros.

– Ah… ainda bem que não aconteceu nada. – Ayame disse, abrindo uma das portas no corredor.

Não havia ninguém na sala, uma mesa grande estava no centro rodeada de várias cadeiras e havia também alguns armários encostados à parede. Rin colocou a bolsa num dos armários e vestiu o jaleco enquanto Ayame buscava algumas faixas e medicamentos para dar um jeito no braço da amiga.

– Do jeito que seu braço está, não vai poder fazer muita coisa hoje. – Ayame disse, sentando-se numa das cadeiras de frente para Rin. – Pode ficar como minha assistente. Você é canhota, então pode anotar as coisas pra mim. Quando chegar em casa, coloque gelo pra ver se melhora o inchaço e daqui pra quarta você já deve estar com o braço bom de novo.

– Okay, obrigada pela ajuda. – a morena respondeu, levantando o braço em seguida para ver como ficara enfaixado.

– Eu vou indo pra clínica. – Ayame disse, se levantando. – Descanse um pouco e depois pode me encontrar lá. Você não está com cara de quem está muito acordada pra trabalhar hoje.

– Nem imagina o quanto. – Rin balançou a cabeça de forma pesarosa. Ayame apenas acenou brevemente para ela antes de sair da sala.

Rin olhou para o pulso por um tempo e ainda pensou em fechar os olhos para descansar um pouco, mas imaginou que se fizesse aquilo, poderia acabar dormindo. Mas não precisou pensar nem duas vezes e seus pés já estavam guiando-a automaticamente para o lugar que ia todos os dias. A ala ficava no quarto andar e não demorou até que estivesse entrando num dos quartos mais silenciosos do lugar. Na verdade, aquela era a ala mais silenciosa do hospital, e andar por ela dava um certo frio na barriga. Se havia barulho demais naquela ala, dois motivos eram coerentes, ou alguém abrira os olhos, ou não abriria nunca mais… e infelizmente, a segunda opção era a mais plausível em termos de estatística.

Ela fechou a porta do quarto com cuidado, ao passar. Havia apenas uma cama naquele quarto, um sofá para visitas e uma cadeira que ficava bem ao lado da cama. O único som era o barulho de todas as máquinas ligadas ao corpo do homem completamente inerte sobre a cama de lençóis brancos impecáveis. Rin sentou na cadeira ao lado da cama e ficou fitando o rosto de expressão serena dele. Depois de duas semanas já tinha se acostumado com a nova imagem sem todo aquele lindo cabelo prateado ao redor do rosto dele, por conta da cirurgia na cabeça, não sobrara nenhum vestígio dele, e logo estaria voltando a crescer ao seu tamanho original – embora ela imaginasse que aquilo levasse mais uma vida.

– E então, como estamos hoje? – ela começou a falar, se endireitando na cadeira e se aproximando mais da cama. – Acho que você ainda não é muito de falar, não é? Como sempre. Mas eu cuido disso pra você enquanto não pode responder, não se preocupe.

Ela se ajeitou mais na cadeira, parecendo um pouco incomodada, mas logo se recostou e voltou a falar, depois de uma rápida olhada pelo vitral da porta.

– Sabe, ontem eu finalmente terminei a mudança pra o meu novo apartamento. Hoje eu vou voltar direto pra lá, nem vou mais ver a cara enjoada do Inuyasha nem atrapalhar a vida deles dois. Acho que seu irmão ficou feliz com a idéia. – ela começou a falar, bem mais à vontade. – Eu gosto do meu novo apartamento. Ele é pequeno e ainda não tem muita coisa, só o essencial, mas é só meu, e ninguém vai me tirar isso agora. Eu pintei as paredes de azul… é minha cor favorita, eu já tinha dito isso? Bom, deixa pra lá… porque será que eu to falando tanto de mim, hein? Você tem cara de quem gosta de saber das notícias. O Hakudoushi deixou bem claro isso, tanto que ele sempre traz algum jornal pra deixar aqui. Eu acho que você ainda não está muito disposto a ler, então, deixe-me dar uma olhada nessas notícias…

Ela pegou um jornal que estava em cima de um criado-mudo, bem ao lado da cama.

– Bom, esse é da semana passada, mas acho que você ainda não sabe o que aconteceu semana passada. – Rin começou a folhear o jornal. – Nada de importante, na verdade. Hm… a cotação da bolsa caiu de novo, mas isso não é mistério pra ninguém. Prenderam uns ladrões de jóias também, perto de Shibuya, pegaram eles no flagra… hm… eu nem sabia que tinham ladrões de jóia soltos por aí. – ela continuou a folhear o jornal, mas logo o deixou de lado. – Hm, eu tenho uma notícia pra você de hoje, olha. Teve um terremoto em Shinjuku. Eu estava lá hoje, passei as estações acidentalmente. Antes de pegar outro metrô, começou tudo a tremer. Não foi tão grande o terremoto, então provavelmente ninguém saiu ferido, exceto a idiota aqui, não é? Alguém esbarrou em mim e eu acabei machucando o pulso. Ayame disse que deve melhorar até quarta. Eu espero que sim, ou vou ficar restrita apenas a fazer anotações, laudos, receitas e coisas assim, ainda bem que sou canhota.

Ela parou de falar por uns momentos, observando a imagem inerte dele, como se esperasse que ele respondesse algum de seus comentários.

– Bom… eu acho melhor eu ir agora. Ayame ainda deve estar me esperando lá na clínica. – Rin disse, se levantando. – Eu volto outra hora pra contar mais notícias pra você. Acho que Inuyasha deve vir te visitar… até que ele não te odeia tanto quanto parece, na verdade, está bem preocupado com o seu estado. Bom… todos nós estamos, então, seria bom se acordasse logo, okay? Até… depois.

Ela saiu do quarto com o passo rápido, fechando a porta devagar, como se o mínimo som ali se convertesse no maior dos barulhos. Seguiu apressada até o elevador para voltar ao primeiro andar e ajudar Ayame o resto do dia. Só não imaginava que aquilo se tornaria tão problemático por conta de um acidente de carro.

Quando a mulher finalmente se viu livre de todo o trabalho duro, depois de ter cuidado dos casos do acidente, ter voltado pra clínica e ter cuidado de mais umas emergências, o relógio já marcava 21h53min. Ela voltou para a mesma sala no terceiro andar em que deixara sua bolsa e cumprimentou duas médicas que estavam saindo de lá. Tirou o jaleco e jogou dentro do armário, pegando a bolsa no lugar e logo seguindo para sair da sala. A mão não tinha melhorado nem um pouco e ela não esperava menos depois de todo o trabalho que tivera durante o dia, e seu braço direito não tinha sido poupado do esforço.

Rin andou lentamente até o elevador e o movimento estava consideravelmente menor naquele horário, claro, porque não havia nenhum acidente ou emergência bagunçando todo o primeiro andar a ponto de atingir o terceiro andar onde ela estava. Assim que entrou no elevador e ia apertar o botão do térreo, parou de súbito, lembrando-se de um pequeno detalhe… apertou o botão do quarto andar em vez disso e com passadas largas, logo estava de volta ao mesmo quarto que visitara pela manhã. O silêncio continuava mórbido.

– Eu quase me esqueci disso. – a morena falou, ao entrar no quarto e apenas encostar a porta. Andou reto até a janela do outro lado do quarto, cujas cortinas fechadas ela abriu sem demora. – Prontinho. Assim você vai poder ver as constelações se resolver acordar. É bom que se apresse… escorpião ainda está lá em cima, mas não vai demorar muito pra sumir. Acho que você ia querer ver mais uma vez antes que desaparecesse, não é? Eu ia querer que você visse de novo… – sussurrou a última frase no que lhe parecia ser um tom inaudível, mas naquele lugar silencioso, soou bem mais alto do que ela pretendia. – Bom, de qualquer jeito, eu tenho que ir agora, está tarde. Eu venho ver você amanhã. Tenha bons sonhos, Sess…

Depois daquela última visita, ela saiu direto do hospital para a estação de metrô. Aquela era praticamente uma rotina que tinha estabelecido sem o conhecimento de Kagome, Inuyasha ou qualquer outro que não trabalhasse naquela ala do hospital. Desde que começara a trabalhar, visitava o homem com freqüência e contava coisas que julgava completamente irrelevantes de sua vida e também sobre notícias do mundo todo. De início, queria apenas ter a esperança de que estaria por perto se ele acordasse dois dias, três dias… uma semana depois do acidente. Mas já estava passando tempo demais e ela estava começando a ficar preocupada, entretanto, aquilo era motivo apenas para continuar a visitá-lo com maior freqüência que seus outros amigos conseguiriam, afinal, todos estavam trabalhando longe demais. Sempre que Hakudoushi podia, ele passava no hospital para dar notícias sobre um caso que Rin lembrava que Sesshoumaru estava trabalhando, com a Toudai. Pelo que ela ouvira, ainda não tinha sido encerrado, e as notícias continuavam chegando.

Ela não queria ter que admitir, mas a freqüência das visitas diárias dos amigos e parentes estava diminuindo. Agora eles apareciam três vezes por semana, no máximo. Pelo menos ela tinha certeza de que estaria lá para ele… todos os dias.

O que está acontecendo com você, Rin? – ela se perguntou, sentada numa das cadeiras vazias do metrô que já ia à direção de sua nova casa. – O que está acontecendo comigo? Eu não o conheço…

"Mas queria", aquele pensamento completou a sua sentença sussurrada e ela suspirou demoradamente.

– Eu só posso estar ficando louca. – sorriu brevemente da idéia. – Bom… dizem que pessoas nesse estado podem ouvir e até talvez, lembrar do que as pessoas falam… espero que ele fique muito irritado com a minha voz e acorde pra reclamar. Se for tão parecido com Inuyasha… talvez não demore tanto.

Desceu do metrô na estação seguinte, a apenas dez minutos de distância do hospital. Permitiu-se sorrir com aqueles pensamentos e andou despreocupadamente por duas quadras até alcançar o novo apartamento. Realmente era bem mais prático morar lá do que ter que esperar mais de meia hora no metrô para chegar até a casa de Kagome. Ela já não tinha do que reclamar, com o carro de Inuyasha para levá-la onde quisesse, a hora que quisesse.

Por sorte, já tinha geladeira na sua casa e estava ligada desde o dia anterior, ou não teria como colocar gelo sobre o machucado do punho. Ela não se demorou muito para dormir, o sono acumulado ainda da noite anterior, assim poderia descansar tempo mais que suficiente para ir ao hospital na manhã seguinte.

Como Ayame dissera, por volta da quarta o seu braço já estava melhor, o inchaço tinha sumido, mas ainda doía um pouco, o que limitava parte de suas ações. Em todos aqueles dias, tinha feito a mesma coisa, visitava Sesshoumaru durante a manhã e depois durante a noite, mas não havia sinais de melhoras… nenhum.

Foi às sete horas da noite de sexta-feira que pretendia ir descansar da semana corrida – agora já com o braço completamente recuperado – e ter certeza de que conseguiria manter os amigos longe de seu novo apartamento bem arrumado que suas esperanças foram por água abaixo. Ayame conseguiu alcançá-la antes que ela entrasse no elevador depois de ter levado as últimas amostras de sangue coletado naquela tarde para o laboratório no quinto andar.

– Rin-chan! Que bom que consegui encontrá-la ainda aqui! – ela disse, com um ar satisfeito demais para que Rin ficasse feliz com qualquer notícia que viria a seguir. – Você precisa me ajudar.

– O que aconteceu?

– A Kaguya ficou doente hoje e não pôde vir para ficar de plantão e eu já tinha marcado um compromisso para hoje a noite, por favor, por favor, diz que pode quebrar meu galho! – Ayame pediu, de maneira quase desesperada.

– Mas…

– Eu sei que é sexta-feira à noite, eu sei que todo mundo gosta de sair, mas é um compromisso realmente importante! Eu prometo que recompenso você por isso! – ela disse, num tom de súplica. – Se eu não estiver lá para ser pedida em casamento, acho que nunca mais acontece!

– Você vai ser pedida em casamento…? – Rin perguntou, piscando os olhos duas vezes com a súbita informação.

– Bom, eu espero que sim. Geralmente é o que indica um jantar romântico, não é? – a ruiva comentou. – Não responda, não tire minhas últimas esperanças.

– Okay, eu fico hoje. – Rin concordou, dando de ombros. – Vai lá ter seu encontro. Eu não tenho nada pra fazer hoje mesmo.

– Muito obrigada, Rin-chan! Você salvou minha vida!!! Eu vou pagar por isso, com certeza! – Ayame disse, já correndo na direção do elevador. – Segunda eu te conto o que aconteceu!

– Certo, certo. – Rin sorriu com a animação dela e voltou a caminhar ao longo do corredor. – Bom… eu não tenho ninguém pra me chamar pra sair mesmo. Ele só não acordou, ainda…

A mulher subitamente começou a balançar a cabeça para os lados, batendo na testa algumas vezes. "De onde inferno veio isso?!", perguntava-se, voltando a andar a passos longos pelo corredor para chegar ao laboratório e terminar de fazer os laudos que planejava deixar para segunda. Ia ter tempo demais durante aquela noite longa para se distrair… e queria tanto poder chegar em casa, esticar as pernas, comer chocolate e assistir TV pelo resto da noite sabendo que não precisaria ir trabalhar no sábado.

Por mais que imaginasse que a noite era tediosa e sem nada o que fazer no hospital, as pessoas pareciam ter adivinhado que ela não estava disposta a trabalhar, porque a clínica estava bem movimentada de pessoas que estavam sentindo dores nos mais variados lugares e simplesmente não poderiam suportar até a manhã seguinte. Mesmo com ela e mais três médicos, todo mundo parecia ter escolhido aquele dia exclusivamente para lhe ocupar. O último paciente que atendeu, precisou apenas diagnosticar um resfriado e já passava das três da manhã. Estava tão cansada que a única coisa que passava pela sua cabeça enquanto atendia o garoto era como uma mãe obrigava o seu filho a sair de casa àquela hora da madrugada por uns simples espirros… ele nem estava com febre!

– Essas pessoas estão ficando cada vez mais paranóicas. – Rin comentou com uma das médicas que fazia plantão com ela enquanto as duas seguiam para o terceiro andar.

– Demais. – a outra respondeu. – Eu tive que convencer um cara de mais de vinte anos que não tinha nada crescendo na garganta dele e que aquilo era só uma inflamação.

– Não seria mais fácil tê-lo convencido a ir ver um psiquiatra? – Rin perguntou, arqueando as sobrancelhas.

– Até que não seria má idéia. Eu vou descansar um pouco agora. – a médica disse, quando as portas do elevador se abriram no terceiro andar. – Você não vem?

– Não, eu vou dar uma passada lá em cima antes. – a morena respondeu, fazendo um sinal indicando o próximo andar.

– Okay. Até mais tarde então.

As portas do elevador fecharam e Rin desembarcou no quarto andar, aliviada. Mais uma vez tinha voltado à calma e ao silêncio com os quais já estava acostumada todas as noites e todas as manhãs. Estava realmente com sono, mas Ayame tinha impedido-a de ir visitar Sesshoumaru mais cedo, fazendo com que ela ficasse presa no plantão, e agora era a sua chance de ir fazê-lo.

A primeira coisa que fez ao entrar no quarto foi abrir as cortinas. As enfermeiras sempre precisavam fechar no período da tarde por conta do sol forte, e ela sempre voltava a abrir durante a noite. Sentou-se na cadeira ao lado da cama mais uma vez, sorrindo ao olhar para a mesma expressão calma dele.

– Eu acho que prefiro visitar você durante a noite, sabe? – ela começou a falar, num tom de voz baixo. – Parece que você só está dormindo mesmo e vai acordar na manhã seguinte. Mas mesmo que eu venha aqui todas as noites… durante a manhã você ainda vai estar dormindo, não é? Mas um dia eu sei que vou poder chegar aqui e lhe dar bom dia de verdade.

A mulher parou de falar por alguns segundos, apenas para respirar demorada e então, voltar a falar.

– A Ayame me obrigou a ficar de plantão aqui hoje. Espero que ela consiga mesmo a tal proposta de casamento que acha que vai ter. – o tom de voz continuava baixo e o sorriso singelo ainda estava nos lábios de Rin enquanto ela falava. – As coisas são mais corridas do que eu imaginava aqui durante a noite… ou talvez só tenham sido desse jeito porque descobriram que eu estou de plantão aqui. Mas agora eu estou livre… eu demorei a vir abrir as cortinas, mas eu vim. A essa altura, escorpião não está mais no céu, mas um dia eu te mostro uma constelação nova, quando ele desaparecer por completo…

Ela manteve o sorriso no rosto e calou-se por uns momentos, encarando o rosto dele demoradamente. Desviou os olhos até que parassem sobre a mão esquerda dele, repousada sobre o lençol que cobria o resto do corpo, inerte.

– Você tem mãos bonitas. – disse, estendendo o braço para poder tocar suavemente na mão dele. – Talvez sua letra seja bonita também… você tem cara de quem gosta de coisas muito certinhas e organizadas, vai ver é exigente até com a própria letra. Bom… você é advogado, não é? Então deve assinar muitas coisas… o tipo de assinatura de todo homem bem sucedido: parece uma coisa incrivelmente bonita, mas ninguém nunca entende nada mesmo. – ela riu, e se curvou sobre a cama para apoiar a cabeça no canto desta, ainda olhando a mão dele, mas agora de perto, escorregando os dedos suavemente pela pele dele, fazendo desenhos aleatórios. – Acho que estou um pouco cansada. Não se importa se eu ficar aqui por mais alguns minutos, não é? Prometo que não vou incomodar. Além da minha voz… que você já deve estar bem cansado dela.

xXx

Rin?

Aquela voz chamando por seu nome soava um tanto quanto distante, mas era uma voz conhecida. Onde ela estava exatamente?

– Rin-chan? Rin-chan, acorde.

A médica abriu os olhos surpresa, levantando-se de súbito ao ver Kagome parada bem ao seu lado. Demorou um pouco para que ela conseguisse associar a gama de informações ao seu redor, mas com o pouco que conseguia raciocinar… ela tinha dormido no quarto de Sesshoumaru?! Bom… aquela era a melhor explicação para a dor que estava sentindo nas costas. O que não se encaixava na imagem era Kagome ter lhe acordado.

– Ka… Ka-chan? – Rin passou a mão pelos olhos e se levantou, para ficar de frente para a irmã. – O que faz aqui? Tão cedo…?

– Eu estava indo arrancar você da sua hibernação de sábado para levá-la pra almoçarmos fora. Como o hospital estava no caminho, resolvi passar aqui para fazer uma visita a Sesshoumaru-sama antes… bom, que surpresa. – ela disse, os braços cruzados diante do corpo e uma expressão convencida.

– Almoçar? Mas ainda são…

são mais de dez e meia. – Kagome consertou. – Você deve ter dormido um bocado então, não?

– Eu… só estava um pouco cansada. Tive que ficar de plantão ontem no lugar da Ayame. – Rin disse, já seguindo na direção da porta. – Mas bom, já que falou de almoço, vamos indo logo. Estou morrendo de fome… nós passamos no meu apartamento e eu tomo um banho, daí a gente pode ir almoçar. O Inuyasha não está com você?

– Não, ele precisou ir ao escritório hoje de novo. – ela respondeu, já seguindo a irmã para fora do quarto, com um sorriso no canto da boca. – Ele me deixou ficar com o carro, então a gente almoça e eu vou buscá-lo só mais tarde.

– Meu Deus… Inuyasha realmente não tem juízo de deixar o carro com você. – Rin disse, apressando o passo na direção do elevador.

– Hey! Olha que vou deixar você voltar andando, hein! – Kagome também se apressou para poder alcançá-la.

Durante o caminho até o apartamento de Rin, as duas conversaram sobre os mais diversos assuntos, na tentativa desesperada da Higurashi mais nova de fazer com que Kagome se esquecesse do que acabara de ver. Claro que a pergunta mais óbvia que já devia ter sido feita desde o começo era sobre o motivo de ela estar dormindo exatamente no quarto de Sesshoumaru. As broncas de dormir durante o plantão viriam de seus amigos médicos mais tarde. Mas ela sabia que assim que parasse de falar, Kagome a bombardearia com perguntas nada agradáveis, e com a mente da irmã, sabia que aquilo ia demorar… só não conseguia entender porque estava se sentindo tão culpada por ter dormido no quarto de Sesshoumaru.

Assim que elas chegaram ao apartamento, Rin não deu nem espaço para apresentar o local reformado à irmã, apenas andou o mais rápido que conseguiu até o quarto para deixar as coisas do hospital e pegar a toalha para ir tomar um banho.

– Eu vou tomar banho e não demoro. – Rin disse, depois de sair do quarto, esticando a cabeça pelo portal da sala de estar. – Nem preciso dizer que você está em casa, né?

– Não tenha pressa, Rin… ainda nem é meio-dia. – Kagome respondeu, sentando-se num confortável sofá de dois lugares que lembrava muito bem ser o mesmo que ocupava a sala de estar de sua antiga casa, quando ainda morava com Rin.

Rin respirou aliviada quando trancou a porta do banheiro. Estava se sentindo como uma adolescente que tinha sido flagrada pelos pais tentando escapar pela janela para ir numa festa altas horas da noite. O problema é que nem ela sabia o motivo de estar fazendo aquilo, fugindo da irmã… ou talvez soubesse e só não quisesse admitir.

Demorou o máximo que conseguiu no banho e quando foi trocar de roupa já estava bem mais relaxada e com os pensamentos no lugar. Definitivamente estava se preocupando com nada. Saiu do quarto já pronta para ir almoçar. Vestia uma calça jeans simples, uma blusa branca de alças e uma sandália baixa, um visual realmente confortável. Quando apareceu na sala de estar, se impressionou ao ver que já passava de meio-dia. Kagome estava distraída com algum programa na televisão.

– Bom, podemos ir agora. Estou morta de fome. – Rin disse, sentando-se no braço do sofá ao lado de Kagome.

A outra desligou a televisão e fez a coisa que Rin já estava esperando: encarou-a com aquele olhar de quem estava curiosa demais para continuar esperando. Imediatamente Rin se sentou no assento livre ao lado dela, sabendo que aquilo poderia demorar.

– Já sei, Ka-chan. Vai começar a formular teorias mirabolantes sobre o motivo de eu ter dormido lá no quarto do Sesshoumaru-sama. – Rin começou a falar automaticamente. – Eu estava morta de cansada, passei no quarto apenas para conferir o estado dele, já que estava naquela ala, e ia voltar para a clínica pra descansar um pouco e ver se tinha mais alguma coisa pra cuidar. Acabei dormindo lá mesmo por acidente.

– Rin-chan, você está gostando de Sesshoumaru-sama?

A pergunta de Kagome veio e uma forma tão direta e inesperada que Rin simplesmente não soube como reagir. Arregalou ligeiramente os olhos antes de piscar duas vezes na direção da irmã. A expressão que ela tinha no rosto não era de curiosa… era quase como uma expressão materna, mesclava preocupação e compreensão de uma maneira que impossibilitava Rin de distinguir o motivo daquela pergunta.

– Co-como assim, Kagome? – ela sorriu sem graça.

– Rin, você está muito aérea esses dias… esses dias desde que Sesshoumaru sofreu o acidente. – Kagome disse. – Já faz um mês. Quando alguém fala do estado dele, você parece que sai de órbita, muito mais preocupada do que eu imaginaria que podia estar, quer dizer, você conheceu Sesshoumaru realmente só naquela festa que a obriguei a ir. Antes você era tão preocupada com o próprio trabalho que eu tinha que praticamente bater em você pra você voltar à vida real. Agora parece que as coisas estão mais insignificantes, não é?

– Não, Ka-chan. Não é nada disso. – Rin balançou a cabeça negativamente.

– Eu vi você lá, dormindo ao lado dele. Estava segurando a mão dele também… e não parecia que ia soltar nem tão cedo. – a mais velha falou, o mesmo ar de compreensão na voz.

– Kagome, vamos ser coerentes. – Rin sorriu mais calma daquela vez, as palavras da irmã ainda rondando a sua cabeça. – Não tem como eu estar gostando de Sesshoumaru-sama. Eu não o conheço. Eu estou apenas preocupada com o estado dele… estou acompanhando cada mudança possível e assim eu posso voltar e dizer a vocês que ele melhorou. Eu não posso estar gostando dele.

– Não pode? – Kagome questionou num tom que Rin não gostou… sabia que em seguida viria algum tipo de explicação que ela não conseguiria rebater, ou provavelmente se confundiria tentando. – Eu lembro muito bem da noite do baile, Rin. O seu olhar estava muito distante da festa… na verdade, estava muito ansioso procurando por alguém. E veja, ele realmente estava indo pra lá. Você ficou com aquele olhar o tempo todo, não importava com quantas pessoas estivesse falando.

– Ka-chan. Eu realmente não estou gostando de Sesshoumaru-sama. – Rin reafirmou com mais veemência, levantando-se. – E sabe de uma coisa? Mesmo que eu estivesse… talvez quando ele acordar, nem se lembre de mim, pelo pouco tempo que me conheceu.

– Rin-chan…

– E então, vamos indo? Eu realmente estou morrendo de fome! Não comi nada desde o jantar ontem antes de começar o plantão. – ela começou a andar para a porta de entrada, evitando olhar Kagome nos olhos.

Kagome se levantou e seguiu a irmã mais nova. Rin ficou imensamente feliz de saber que ela não voltaria a tocar naquele assunto novamente. Elas almoçaram juntas e conversaram durante o tempo em que Kagome não precisava sair para buscar Inuyasha. A Higurashi mais nova conseguiu voltar ao seu apartamento pouco antes das quatro da tarde, com umas sacolas de compras que tinha feito mais a irmã no shopping apenas por "distração". Mas mesmo com todas as conversas e assuntos aleatórios das duas, nada conseguia tirar aquela idéia da cabeça de Rin… de que realmente, de algum jeito surreal, estivesse gostando de Sesshoumaru. E foi aquela idéia que ocupou parte de seus pensamentos durante todos os dias em que ainda ia visitar Sesshoumaru, durante a manhã e a noite, sempre contando das notícias, contando novidades sobre o caso da Toudai quando Hakudoushi não podia ir fazê-lo, contando coisas de sua própria vida… e quanto mais os dias passavam, mais longos os monólogos de Rin ficavam, e ainda mais preocupados. A cada dia que passava, aquela idéia de Kagome se concretizava mais e mais em seus pensamentos… só não conseguia entender como estava começando a gostar mais e mais de uma pessoa que talvez nem se lembrasse dela ao acordar… uma pessoa que talvez nunca mais acordasse, na realidade.

xXx

Aquela manhã de segunda estava um pouco fria. O outono estava chegando e Rin já conseguia sentir aquilo nos ossos. Sempre fora muito sensível ao frio, e qualquer mudança de temperatura era o suficiente para que ela dormisse com pelo menos três cobertores. Ela cumprimentou vários conhecidos enquanto entrava no hospital, seguindo direto para o elevador, com um casaco grande lhe cobrindo o corpo.

Como era habitual, saltou no terceiro andar e seguiu até a sala de estar perto da enfermaria, para guardar suas coisas e substituir o casaco quente e confortável pelo jaleco. Não tinha ninguém lá quando ela entrou, e ficou internamente feliz com aquele detalhe, assim poderia ir logo para o quarto andar, visitar Sesshoumaru mais uma vez e, em seguida, começar o seu trabalho.

A ala norte do quarto andar continuava sendo a ala mais silenciosa de todo o hospital, e às vezes mesmo o som dos sapatos no chão ecoavam pelo corredor. Ela cumprimentou uma das enfermeiras ao longo do caminho e foi direto para o quarto já conhecido. As cortinas estavam abertas.

– Bom dia, Sess. – ela se aproximou da cadeira, mas não se sentou, apenas apoiou as mãos no encosto. – Como estamos hoje? Espero que melhorando não é? Eu acho que já está em tempo de você acordar, sabia…?

Ela parou de falar, desviando os olhos do rosto dele e rodeando a cadeira para se sentar. Aquela sensação de angústia apertou seu peito, como vinha fazendo havia algum tempo.

– Já são cinco meses, Sess… por que você não quer acordar, hein? – ela manteve os olhos fixos na mão dele, depois de estender a própria mão para pousar sobre a dele. – Sabe… eu tenho uma notícia pra te dar. – hesitou. – Eu estou sendo transferida para Kyoto. Eu começo lá na próxima segunda… já providenciei o novo apartamento, e só estão faltando algumas papeladas pra resolver da residência pra eu poder ir pra lá. Hmm, talvez seja uma boa idéia, conhecer novas pessoas, e dizem que eu posso aprender muita coisa lá.

Ela parou de falar mais uma vez, fechando os olhos e respirando lentamente.

– Vai ser melhor assim… – continuou. – Eu sinto muito não continuar vindo aqui todos os dias, mas eu ainda venho te visitar durante essa semana, certo? Como eu sempre fiz. Mas eu não posso ficar aqui…

Ela se levantou, finalmente voltando os olhos para o rosto dele. Não havia mais faixas nem sinais de que ele tinha sofrido o acidente, ou alguma cicatriz visível… o cabelo prateado já tinha crescido consideravelmente e ainda assim, ela continuava o achando tão bonito quanto da vez em que o vira no casamento de Kagome.

– Parece que o que Kagome disse era verdade afinal. – ela sorriu fracamente. – Eu não sei como aconteceu, mas… eu realmente estou gostando de você. E não posso ficar aqui para descobrir que quando abrir os olhos, não vai se lembrar de mim. Do mesmo jeito que, por mais que eu prefira acreditar que só não vai se lembrar de mim, não posso ficar aqui esperando que abra os olhos… quando há a possibilidade de nunca mais acontecer.

Ela continuou ali, parada, encarando o rosto dele, como se esperasse que ele finalmente abrisse os olhos, que lhe dissesse que se lembrava dela, que dissesse para ela não ir. Mas não aconteceu… o único som que invadiu aquele quarto de hospital foi o do seu bip preso ao cinto da calça, informando que alguém estava precisando dela em algum lugar bem distante daquela ala em particular.

– Bom… eu tenho que ir agora. – ela andou até a porta. – Como eu disse, eu ainda vou voltar essa semana… toda. Até depois, Sess.

Ela saiu do quarto e andou apressada na direção do elevador, pela insistência do bip, provavelmente seria alguma emergência, algum acidente… mas nem aquela correria do hospital poderia apagar a última esperança que tinha de que pelo menos naquela semana… ele finalmente abrisse os olhos e a impedisse de ir. Talvez ele o fizesse, se realmente a estivesse ouvindo em algum lugar, mas aquela possibilidade também era remota, e logo logo, estaria em Kyoto, tentando esquecer tudo aquilo de uma vez por todas.

Como era de se esperar, havia acontecido um acidente e estavam precisando de muita ajuda lá embaixo. E um acidente dos feios… um carro tinha batido num caminhão e as quatro pessoas que estavam dentro do carro tinham saído gravemente feridas. Rin foi chamada para ajudar com os feridos no acidente, enquanto outro médico-residente a substituía no seu lugar na clínica. Ela passou o resto do dia apenas assistindo nas cirurgias aos feridos, e depois de horas de cirurgia, a mulher que sentava no banco da frente do carro tinha entrado em estado de coma profundo, e pelo estado grave em que se encontrava… realmente talvez não acordasse nunca mais.

Quando a Higurashi mais nova finalmente pôde sentar-se para descansar na sala de estar do terceiro andar, já passava das três da tarde e sequer tinha almoçado. Estava sem comer desde que tomara café da manhã. Ayame estava lá com ela, mas parecia bem mais disposta, mesmo que estivesse trabalhando o dobro, por já ser médica-cirurgiã contratada.

– Aquele acidente foi realmente feio, hein. – Ayame disse, sentando-se na cadeira de frente para Rin. – E a família toda estava no carro. Sorte que as crianças não sofreram tantos ferimentos. Pelo menos alguém ainda tem consciência para obrigar os filhos a usarem cintos no banco de trás.

– Em compensação… o que vai ser deles quando acordarem e virem os pais naquele estado? – Rin disse, num tom abatido. – O motorista não resistiu… e a mãe deles entrou em estado de coma. Talvez não resista até o fim da semana.

– Não seja tão pessimista, Rin. – Ayame a repreendeu. – Ainda há chances para ela.

– É… ainda há chances. – Rin concordou.

– Não houve sinais de melhora, não foi? – Ayame disse, finalmente fazendo com que Rin desviasse a atenção para ela. – O cara do 406. Por isso que pediu transferência.

Rin não respondeu, apenas desviou o olhar do rosto da amiga para fitar os dedos de maneira interessada.

– Ele também ainda tem chances, Rin. – a ruiva disse, tentando animar a amiga. O único problema é que Rin também era médica.

– Depois de um coma de cinco meses, Ayame? – Rin sorriu fracamente. – Ir para Kyoto é a minha melhor escolha agora. Os papéis devem estar prontos até quinta-feira. Eu me mudo no fim de semana.

– Nem uma festa de despedida? – ela perguntou, tentando animar Rin.

– Sabe que não gosto de festas. – Rin completou, levantando-se para sair da sala. – Eu preciso ir almoçar agora, pode arrumar alguém pra me substituir na clínica por enquanto? Se eu continuar trabalhando, acho que vou me tornar mais uma paciente.

– Pode deixar. – Ayame respondeu, animada como sempre.

Rin saiu do hospital e conseguiu almoçar num restaurante por perto. Sorte que ainda havia comida suficiente pra ela mesmo depois das três da tarde. Não demorou muito para voltar ao hospital, e não teve que trabalhar por muito tempo mais, pois seu expediente terminava às sete. Depois de deixar o jaleco no armário e pegar suas coisas, claro, seguiu antes para o quarto andar para poder ir embora. Tinha se tornado normal para todos ali que ela fosse visitar Sesshoumaru, então não tinha problema nem em fazer barulho. Como sempre, a primeira coisa que fez foi abrir as cortinas do quarto, mas não se dirigiu de imediato para a cadeira ao lado da cama, ainda ficou fitando o céu por um tempo.

– Veja… – começou a falar. – Draco está no céu. Também é uma linda constelação. Queria poder te mostrar… não é tão parecida quanto Escorpião, mas também é perfeita.

Afastou-se da janela e parou ao lado da cama, de pé. Dessa vez, estendeu a mão para tocar o rosto dele, delicadamente, quase como se qualquer movimento brusco pudesse piorar o estado dele.

– Agora que Draco está aqui para te guiar, talvez você acorde, talvez ele te dê forças. – continuou. – E daí, você pode se levantar, como um dragão de verdade, com a força de um. – ela parou e riu. – Eu sei que eu sou meio anormal, mas acho que não posso evitar. Eu preciso ir agora, descansar um pouco. Prometo que chego mais cedo amanhã e te conto as notícias, antes do início do meu expediente. Até amanhã.

Ela se afastou da cama, e sem olhar novamente para o homem, deixou o quarto.

Como o prometido – não sabia se para Sesshoumaru, ou para si mesma –, tinha ido o resto da semana visitá-lo, pela manhã e pela noite, antes do início do expediente e depois dele, algumas vezes um pouco atrasada por conta das emergências, mas não faltava com sua palavra. Contava todas as notícias, ficou feliz principalmente de contar que o caso da Toudai finalmente estava encerrado, e que, claro, eles tinham ganhado depois de tantos processos e audiências. Ficava feliz também de saber que a freqüência das visitas de Inuyasha e dos outros não tinha diminuído, como temia, e naquela semana, até mesmo Hakudoushi conseguira aparecer assim que voltara de uma viagem à Hokkaido. Mas não estava nada feliz quando precisou entrar naquele quarto na noite de sexta-feira… até mesmo hesitou ao tocar no trinco da porta.

Daquela vez, e só daquela vez, ela não foi direto até as cortinas para abri-las, mas parou bem ao lado da porta depois de fechada e ficou parada ali, por alguns minutos.

– Bom… eu acho que realmente é a última vez que eu venho aqui. – disse, encarando os próprios sapatos, como se tivesse medo de encarar algum tipo de olhar reprovador. – E… infelizmente você não pode dar tchau pra mim. Nem me impedir de ir…

Ela se calou, andando na direção da janela finalmente e abrindo as cortinas lentamente. Era como se quisesse que o tempo demorasse mais pra passar, assim, ainda havia uma última esperança de que ele acordasse. Demorou-se ainda fitando a mesma constelação que estava lá no meio do céu naquela semana, Draco.

– Eu não vou mais ficar aqui pra cuidar de você nem conversar com você, mas Draco está lá em cima pra fazer isso por mim agora. – a morena falou, afastando-se da janela e seguindo até a cama. Parou exatamente ao lado dele, encarando-o fixamente no rosto. – As minhas últimas esperanças já se foram… pois é, você não vai mais acordar pra mim.

Ela hesitou por um momento, e sem saber pelo que exatamente estava sendo conduzida, curvou-se sobre o corpo dele e aproximou o rosto o máximo que pôde do dele. Hesitou mais um minuto e então, deixou que seus lábios tocassem os do homem delicadamente… ainda havia calor. A morena se afastou apenas alguns centímetros, encarando os olhos fechados e a mesma expressão adormecida.

Nesse momento… eu queria estar dentro de um conto de fadas para estar dormindo no seu lugar. E assim, certamente seu beijo me acordaria. – ela riu da idéia infantil, mas continuou na mesma distância e voltou a falar num sussurro. – Mas estamos na vida real… e a mágica nem sempre funciona. A esperança também vai embora um dia.

Rin se recompôs e então, caminhou na direção da porta, mas ainda parou para olhar o homem deitado sobre a cama.

– Adeus, Sesshoumaru. – sorriu tristemente na direção dele. – Melhore. Mesmo que eu esteja indo embora, há pessoas que precisam de você aqui… e elas vão continuar aqui, as pessoas de quem você vai se lembrar quando abrir os olhos.

Ela saiu do quarto e fechou a porta. Andou ao longo do corredor na direção do elevador. Entrou e apertou o botão do térreo pelo que seria a última vez. Todos os papéis da transferência estavam prontos e ela não precisaria voltar mais lá. Quando as portas do elevador abriram, sorriu como sempre e andou para fora do prédio, cumprimentando os conhecidos e se despedindo deles. Perto da entrada do hospital, encontrou Ayame que a alcançara vindo da clínica.

– Então, essa é a última vez que nos vemos mesmo? – Ayame perguntou, parando ao lado da amiga.

– Ainda vamos almoçar juntas no domingo, não é? – Rin comentou, sorrindo. – E só depois do almoço eu vou pra Kyoto.

– Tem razão. Mas é a última vez que nos vemos como colegas de trabalho aqui. – Ayame disse.

– Infelizmente.

– Bom, te vejo no domingo então. – a ruiva sorria também. – Espero que se dê bem lá em Kyoto. Se não se der bem, não se preocupe, eu dou um jeito pra você voltar!

– Obrigada, mas acho que eu vou me dar bem. Eu tenho que ir agora, ou vou perder o metrô. Nos vemos no domingo então. – Rin disse, já seguindo para a porta e virando para acenar em despedida.

– Hey, Rin! – Ayame fez com que ela se virasse para encarar-lhe. – Não se preocupe, eu abro as cortinas por você.

Rin ficou calada por uns segundos, e então, finalmente conseguiu sorrir em resposta, sorrir de verdade.

– Obrigada. – e saiu do hospital, deixando que as portas se fechassem atrás de si.

Durante todo o caminho até chegar em casa, não levantou a cabeça uma só vez para ver o céu de poucas estrelas. Quase não conseguia ver as estrelas que formavam a constelação de Draco quando estava no quarto de Sesshoumaru durante a noite, e não queria ter que olhar pra cima de novo.

Aquela parecia ser a noite mais longa de toda a sua vida. Demorou mais de três horas pra conseguir dormir, e de uma maneira inconsciente continuava olhando para o celular, como se esperasse que ligassem pra ela avisando que ele finalmente tinha acordado. Mas se rendeu ao sono perto de uma da manhã, e o celular não tocou a noite inteira, nem no dia seguinte. Durante a tarde de sábado, Kagome foi até seu apartamento, para ajudá-la a empacotar as coisas para a mudança. Elas pararam o trabalho por volta de três da tarde.

– Tem certeza que quer se mudar pra Kyoto, Rin-chan? – Kagome perguntou, pelo que Rin calculava ser a trigésima primeira vez.

– Tenho, Ka-chan. – ela respondeu, cansada de dizer sempre a mesma coisa, sentando-se largada no sofá da sala. – Quantas vezes quer que eu repita isso?

– Mas… mas você vai pra Kyoto! – Kagome insistiu, a mesma coisa que insistia sempre.

– Sim, vou para Kyoto, não para o outro lado do mundo. É bem ali, são só umas horas de viagem. Deixe de ser exagerada, mulher. – Rin reclamou, colocando um dos braços sobre os olhos.

– Você não tinha que se mudar…

– Eu tinha sim. – a mais nova respondeu, agora mais séria. – Eu realmente não sei como aconteceu, Ka-chan… mas aconteceu. Não posso continuar aqui.

– Rin…?

– Eu estou gostando mesmo dele. – Rin completou, antes que perdesse a coragem de falar aquilo em voz alta de novo.

– Ah… Rin… – Kagome tentou pensar em alguma coisa para falar, mas a irmã foi mais rápida.

– Eu não posso continuar aqui. Eu vou pra Kyoto e vou recomeçar minha vida lá. – Rin disse, sentando-se de vez no sofá. Os olhos estavam vermelhos. – E tudo vai dar certo.

– Se é assim que você quer… eu não digo mais nada. – Kagome sorriu em resposta, incentivando a irmã. E mesmo que ela dissesse aquilo, continuou a repetir a mesma questão se Rin tinha certeza de que iria para Kyoto pelo menos até chegar à qüinquagésima vez.

Kagome voltou pra casa por volta das quatro da tarde. Tinha marcado de sair com Inuyasha naquela noite, e Rin precisaria ficar sozinha uma noite antes de ir embora.

Estava impaciente demais para alguém que precisava ir dormir cedo, sabia que ia acabar dormindo tarde demais. Ficou na sala, assistindo televisão, mudando de canal a ponto de passar pelos mesmos canais pelo menos três vezes. Depois do jantar, ainda voltou na cozinha duas vezes apenas para abrir a geladeira e os armários ao redor, procurando alguma coisa que nem sabia o que era exatamente, só não queria ter que ficar parada, porque sabia que se ficasse, seus pensamentos ficariam cheios demais… com alguém em quem não queria pensar no momento.

Depois de três horas rodando pela casa, impaciente, finalmente parou no quarto, cansada de tentar escapar de sua própria mente. Passou direto pela cama e parou bem diante da janela, finalmente erguendo os olhos para encarar o céu. Draco ainda estava lá… as luzes das estrelas um pouco falhas por conta da iluminação da capital japonesa, mas ainda assim, para quem conhecia os céus como ela, dava para saber que estava bem ali, lhe encarando fixamente.

– Agora… eu vou confiar em você pra cuidar do Sess… – disse, sua voz sumindo com o vento frio daquela noite de outono. – Tenho certeza que vai estar olhando quando ele acordar…

Então, se afastou do parapeito da janela, deitando-se na cama e fechando os olhos para tentar dormir. Em sua mente, várias lembranças se passaram desde que mostrara aquela constelação de Escorpião a ele, no dia do aniversário dele, e então, a última imagem que pôde se lembrar de ter visto antes de cair no sono, foi a constelação de Draco, lentamente se esvaindo para dar lugar aos sonhos inconscientes que dominariam seu sono, e que ela tinha certeza absoluta… sonhos em que ele estaria.

Continua...


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