Spirited Away 2 escrita por otempora


Capítulo 37
Abismo




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“Em amor, não há ultimo adeus, senão aquele que não se diz”  (Alexandre Dumas)

 

 

Haku voltou depois de algumas horas para verificar como a garota estava. Encontrou-a dormindo profundamente. Chihiro balbuciou algo que ele não pode compreender. Aproximou-se da cama com um cuidado excessivo para não a acordar. Observou seu semblante com preocupação, ela estava muito abatida. A vontade de tocá-la mais uma vez cresceu, seu coração batendo mais fortemente com a possibilidade. Era tudo tão novo para ele... mesmo que sua alma fosse terrivelmente velha.

Era agradável e estranho tornar a estar naquele corpo jovem, nunca esperava que isso iria acontecer. Apesar de isso ser o seu maior anseio...

Não gostaria de ser visto por Chihiro da maneira que estava antes, se envergonharia de surgir na frente dela com aquela aparência gasta.

Viu a garota se mexer na cama, a testa se enrugando como se estivesse com dor... afastou a franja de suas pálpebras cerradas de Chihiro com um mínimo gesto, o qual a fez estremecer. Ouviu seu suspiro cansado e ela murmurar novamente aquela mesma palavra que dissera antes, a que ele não compreendera.

- Bou... – havia tanto amor e preocupação naquele mínimo balbuciar, que lhe faltou o ar. Estava enganado se pensara que Chihiro permaneceria a mesma; inalterável aguardando por ele.

Ela se tornara uma garota forte, mais do que ele poderia imaginar. Calada e bonita de uma maneira estranha. Recordou daqueles olhos grandes e avaliadores pousando sobre si, a franja, longa demais, cobrindo-os parcialmente.

Aguardou mais alguma manifestação da parte de Chihiro, esperando com ansiedade que ela dissesse seu nome, ao menos uma vez. Ansiou alguma manifestação de amor. Ele a olhou silenciosamente, sua alegria de algumas horas atrás, por tê-la tido nos braços, se tornando o pranto.

Tomou a cabeça dela em seu colo, sem fazer com que acordasse. Buscando naquele semblante triste os sorrisos de outrora. Acalentando-a, para que pudesse consolar a si próprio. Com a consciência que não mais conseguiria fugir. Ter, novamente, que dizer adeus. Vendo-a partir para sempre, como areia escorrendo entre seus dedos. Esperando que ela se voltasse para trás, com lágrimas nos olhos, desesperadamente... mas ela estava ali, quieta, aguardando que Boh viesse buscá-la.

Doía-lhe fisicamente aquela ausência que sentia da parte dela. A voz fina, quando lhe falara, pressentindo uma partida.

Surgiu um novo sussurro. E Haku traduziu erroneamente a palavra que ela soltara, em seus sonhos escabrosos, buscando no nome de Boh o seu próprio, retirando para si as sombras de afeição.

Pousou sua palma na testa de Chihiro, procurando ver as imagens que tinha em sono.

Observou, com a sensação de temor que ela experimentara, o céu escurecido. Prelúdio da destruição que aconteceria mais tarde.

Notou que a atenção de Chihiro era sempre desviada para os passos apressados que passavam atrás de si, na sala da casa de Zeniba.

Haku sabia que era Boh e, apesar da vontade que a dominava, a garota não se moveu. Os olhos presos na névoa. A porta bateu; Boh havia ido embora.

O ruído de seus passos ecoando pelo aposento eternamente fugindo na mente de Chihiro.

A cena se repetia inúmeras vezes, impiedosa; açoitando-a.

Haku decidiu que já era o bastante. Sacudiu vigorosamente o corpo frágil da menina, até que ela se visse forçada a despertar, retirando-a daquela nostalgia.

- Chihiro! – gritava sem perceber. Sabendo que o sonho não saíra da mente dela ainda... – Fique comigo!

Passou os dedos longos pelo rosto dela, alisando-o. Pousou os dedos sobre os dela, penetrando no campo dos sonhos, fazendo com que ela despertasse.

- Bou? – ela perguntou ainda grogue, aparentemente sem notar a intromissão de Kohaku. Colocou a mão na frente da boca quando viu que Haku a segurava entre seus braços.

- Vim ver se estava bem. – se explicou. O sofrimento, o qual não conseguiu ocultar, se revelava em seus traços. Tentou esconder o rosto, mas foi detido pelos dedos de Chihiro que, sem precisar usar força alguma, fez com que a olhasse.

- É por causa dele? – indagou, não sem algum azedume.

Viu o assentimento mudo de Chihiro.

- Preciso dele. – ouvir aquilo fez com que Haku se incendiasse de um ódio recém-descoberto. Arrependeu-se de quando tinha a chance não ter matado a Boh com as próprias mãos. Cerrou os dedos em punhos.

Não conseguiu pensar numa réplica para Chihiro, a voz ficou presa. Surpreendeu-se com as lágrimas ardidas de raiva, as quais não conseguiu conter.

- O que aconteceu conosco? – perguntou sem pensar.

- Haku... – ela dizia seu nome pela primeira vez, apelando para que fosse sensato.

Porém, ele não deixou que Chihiro ponderasse.

- Eu te amo, Chihiro. – sua voz soava acusadora. – Prometo te amar por toda minha vida.

Lembrou-se das horas em que vagara sob a frágil luz da lua imaginando através da memória do vulto dela. Trôpego, com as mãos tremendo convulsivamente. Entornando-se no chão, deixando que o orvalho do início da manhã o cobrisse e acalentasse seus pesadelos, nos quais Chihiro sempre lhe escapava entre os dedos, era imensamente bela e cruel. Correndo dele eternamente, o corpo luminoso com uma áurea indefinida.

- O que esta escondendo de mim, Kohaku? – a pessoa que estava ali à sua frente era tão diferente de sua alucinação. Embebeu-se daquela consternação e fragilidade, como se tivesse acabado de abrir os olhos para o sol pela primeira vez.

Até que aquele ardor cedeu num abismo que o separou de Chihiro.

- Por que esta dizendo isso? – hesitou durante alguns segundos para que pudesse pensar.

- Não minta para mim... – a voz dela era quase um sussurro.

Haku estendeu os dedos para ela, mas a garota estava fria, a palidez se acentuando.

- Não estou fazendo isso. – falou. Porém ele soube que não a havia convencido. Viu-a assentir, desolada. A cabeça caindo, escondendo seu rosto.

Ele manteve seus dedos, esperando desesperadamente uma palavra de Chihiro, qualquer coisa, menos aquele silêncio, tão gelado quanto ela. Suspirou, antes de perceber as lágrimas da garota.

- Sabe onde está Bou? – novamente aquele nome surgia, se interpondo entre os dois. Ele teve ciúmes pela agonia de Chihiro. O sofrimento emanando de sua pequena figura, que tinha os olhos apertados e a mão na frente do coração.

- Como saberia? – retrucou com azedume.

- Você vinha nos rastreando. – Haku se paralisou diante daquela sinceridade. – Boh sentia a sua energia...

- Sim. – limitou-se a responder.

- Haku. Consegue dizer onde ele está? – perguntou já irritada.

- Não.

- Porque não?

Ela já sabia o que ele iria dizer... o impacto chegou muito antes das palavras, se abatendo sobre seu estômago, seco. Assim como a voz de Haku falando:

- Ele está morto.

- Você o matou, não foi?! – gritou nervosa. – Ele está aqui! Você o trouxe!

Irrompeu do quarto em um segundo. Deixando um aturdido Haku, encarando o quarto monocromático, tentando, em sua angústia se fundir com as paredes.

“Como ela sabia?” – pensou.


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