Spirited Away 2 escrita por otempora


Capítulo 35
Algumas coisas você nunca esquece




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Chihiro realmente acreditou que aquilo que havia acontecido fora produzido por sua mente. Assustou a si mesma quando desejou que fosse uma mentira.


Rendera-se aos encantos de Haku tão facilmente; descobriu a saudades que tinha dele, oculta nas câmaras mais obscuras de seu cérebro. Mesmo que agora tivesse que lidar com a vergonha que tinha de si.


Suspirou, pensando o que faria quando visse Boh.


- Está se sentindo bem? – uma voz grossa perguntou ao seu lado.


Chihiro abriu os olhos, surpresa. Abriu a boca para dizer algo, porém não conseguiu pensar em nada; mordeu com força o lábio inferior.


Haku estendeu a mão para tocá-la na face, a menina virou o rosto, cerrando as pálpebras, tentando impedir que as lágrimas saíssem.


- Chihiro. – não havia fúria na voz dele pela recusa da menina. – Olhe para mim.


E ela não ousou desobedecer. Embora tivesse consciência do estado lastimável em que se encontrava, queria olhar para Haku novamente...


Tentar memorizar todas as feições dele, antes que ele se fosse; dessa vez para sempre. Notou que existia uma mínima diferença nos olhos dele. Estavam mais calorosos e brilhantes, do que ela se recordava. Os longos cabelos azulados presos numa trança atrás das costas, ele parecia ter a idade de Boh. Mas eram completamente diferentes.


Em Haku havia uma força inegável intrínseca. Uma maturidade presente em suas feições, como se ele fosse tão velho, que tudo se passava de maneira imensurável.


Ofegou, se lembrando de algo importante.


- Você não deveria estar velho? – perguntou com medo de ofendê-lo.


- Sim. – Haku permaneceu impassível, os cantos da boca virados para cima enquanto ele contemplava o semblante da menina.


Estendeu novamente os dedos e dessa vez Chihiro não o repeliu. Não tinha forças para fazer isso, para ponderar sobre o certo e o errado. Sentiu-se enrubescer.  


- Você está ainda mais bonita do que eu me lembrava. – a garota quis acreditar nele. Ignorou a dor pungente em seu coração e balançou a cabeça.


- Não diga isso...


- Mas é verdade. – ele disse sem deixá-la completar a frase.


- Não diga isso se não pretende ficar.


Haku se ofendeu com as palavras dela. Como se a tivesse deixado por escolha. Como se não houvesse uma ferida aberta todos os dias no lugar onde deveria repousar seu coração.


- Teremos que deixar muitas coisas para trás... – a voz contida.


- Haku, eu... – ele viu Chihiro fechar os olhos e respirar profundamente, gesticulando seus lábios numa contagem muda. Temia que ela falasse que não queria ficar perto dele.


Deliberadamente, deslizou sua mão para a nuca dela, trazendo-a mais para perto. Beijando-a gentilmente, sentiu Chihiro amolecer em seus braços, sem notar que poderia haver alguma coisa errada.


Ela pousou a mão no peito de Haku, afastando-o para que pudesse respirar. Não conseguia olhar para os olhos dele. Já por duas vezes agia daquela forma irracional perto dele. Como se a moralidade não existisse enquanto respiravam o mesmo ar.


Concentrou toda a sua atenção nos lençóis estranhos e macios. Alisou uma pequena parte com a ponta dos dedos.


- Onde estamos? – perguntou distraída, ainda sem encarar Haku.


- É o meu refúgio.


A forma que ele falou aquelas palavras a fez olhá-lo com estranheza. As dúvidas que possuía tomaram uma forma latente e desesperadora. Ele notou o sofrimento que Chihiro não conseguiu ocultar.


- Nem todos são perfeitos. – disse, num pedido de desculpas.


- Entende que eu preciso saber?


O semblante de Haku ficou imensamente triste, a vontade de tocá-lo se apoderou de Chihiro, mas ela manteve suas mãos firmemente presas ao leve tecido que a cobria.


- O coração é um fardo pesado... – fez um comentário deslocado. Sem conseguir exprimir suas sensações.


A menina se surpreendeu com o que ele havia dito.


- Como conseguiu seu coração de volta? – perguntou sem pensar.


Haku parecia preso entre a tristeza e o divertimento. Um sorriso fraco se aflorou em seus lábios e foi lentamente morrendo, enquanto ele raciocinava.


- Já deveria saber... – falava pausadamente, tendo dificuldade para articular as palavras. – Que você não ficaria simplesmente parada, esperando...


Desta vez, Chihiro não refreou suas ações, segurou uma das mãos de Haku assim como costumava fazer com Boh. Notou o quanto aqueles dedos estavam gelados. Os orbes azuis escuros de Haku a fitaram intensamente. Ela olhou para cima, sem saber que seus olhos se encontrariam. Ruborizou imediatamente, mas não desviou os olhos.


- Vai responder? – ela indagou a Haku.


- Sim, Chihiro. Não vou esconder nada de você. Já me arrependi por ter feito isso uma vez...


- Como assim? – Chihiro se assustou.


Numa parte inacessível de seu cérebro, estava armazenada a verdade. Tudo que havia aprendido naquele imensurável tempo em que ficara presa pela magnífica força do prendedor. Contudo, todo aquele material era forte demais para ela, poderia destruí-la, ou fazer com que praticasse coisas realmente ruins. Nenhum ser conseguiria ter o controle sobre aquele saber, as verdades o tornariam insano e terrivelmente maléfico.


Foi melhor para Chihiro que ela tivesse esquecido tudo completamente, que não restasse um resquício que fosse para ela pensar.


- Uma pergunta de cada vez... – Haku fez uma tentativa inútil de brincadeira. Como a garota permanecesse séria a sua frente ergueu uma das mãos, passando-a pelo rosto num gesto frustrado.  – Devo te contar tudo, Chihiro. Até o fim... – falou decidido. – Depois, se desejar, não a impedirei de partir. – lhe custava muito dizer aquelas palavras; muito mais do que a menina podia imaginar. A tristeza imensurável dominando seu rosto.  


E ela somente assentiu, tomada por um terror estranho por tudo, finalmente lhe ser revelado. Não tinha certeza se estava pronta para isso. Apertou os dedos de Haku com força, mantendo a respiração presa, sem nem menos perceber.


- Quando você partiu... – ele balançou a cabeça, clareando a sua mente. – Disse-lhe para que não olhasse para trás.


- O que... – Chihiro se censurou pela interrupção. Os grandes olhos interrogadores de Haku a incitaram a continuar. – Por que havia me dito isso, Haku? – estremeceu ao dizer o nome dele.


- Para que pudesse partir. Sabia que se olhasse para trás você não iria mais embora.


A garota ponderou por um instante, não necessitou de muito tempo para que percebesse que ele estava certo. Kohaku continuou:


- Fui ver Yubaba. Chihiro... havia um motivo para que eu não pudesse ir com você. E doía em mim todos os dias... saber que nunca poderia lhe amar sem ele. Por mais que desejasse.


- Já faz tanto tempo... – falou Chihiro para quebrar o silêncio que se instalara entre os dois.


- Algumas coisas você nunca esquece. – ele comentou em voz baixa. Aquela dor surgindo, latente. Haku encarou a menina nos olhos por um tempo imensurável. – Mas agora eu sei. Como é.... te amar. – pronunciou lentamente. Tocou, quase dolorosamente, a face de Chihiro. A qual não sabia o que fazer, mas seu coração se aquecera com aquelas palavras.


- Haku... – começou a falar. Porém não foi capaz de continuar; Haku puxara sua mão em direção ao coração, que agora ele possuía.


Ele silenciou-a com aquele gesto, como pensou que o faria. Conhecia-a tão bem, como se tivessem passado muitas vidas juntos. Agora, precisava novamente correr o risco de perdê-la.


Contou a Chihiro toda a verdade.


A maneira que os dias pareciam longos de mais. Que o nascer e o pôr do sol não lhe inspiravam nenhuma emoção. E que por fim vinha à noite escura, e ele, exausto e cambaleante, implorava a lua que a trouxesse de volta, que desta vez iria se esforçar para que pudesse vê-la com os olhos injetados de amor, embriagado com aquela mera presença. Considerava-se culpado por causa disso.


E sobreveio uma esperança....


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