Spirited Away 2 escrita por otempora


Capítulo 17
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Chihiro correu, sabia que não poderia se esconder de Boh, mas não podia encará-lo, não agora. Não quando seu coração se obscurecia na mesma medida que o céu, que passava de um brilhante avermelhado para um azul com algum negrume. Tropeçou numa raiz e caiu de frente machucando suas mãos que receberam o impacto do corpo, soltou um gemido de dor e virou de barriga para cima, sentindo o tapete de folhas e terra em suas costas, deixando-se ficar estirada no chão. Olhou para o céu, não havia nenhuma estrela adornando-o, somente a noite escura. Estava exausta demais para continuar numa fuga inútil. Virou-se de lado, abraçou suas pernas com os braços e obrigou seu cérebro a pensar no que não queria. Na verdade que já sabia em seu íntimo, mas que não conseguia confessar nem a si mesma, quanto mais em voz alta. “O que farei se Haku aparecer?” – perguntou. “E se Boh estiver certo? Se Haku não for mais a mesma pessoa?” – forçava-se a duvidar. Prendia-se a fracos artifícios para não ter que pronunciar as palavras que a atormentariam, que trariam afastamento. A obrigariam a voltar para aquele estado de semi-inconsciência em que estava antes do aparecimento de Boh.   


Simplesmente não conseguiria olhar mais para Boh, não acreditava que tão facilmente havia se entregado a seu carinho, numa relação de amor unilateral. “Egoísta”, a palavra pungia implacável, penetrando como veneno ardendo em suas veias, instalando-se em seu coração.


- Eu não me importo. – escutou a voz familiar junto a seu ouvido, o tremor acompanhou-a. Tentou infrutiferamente repeli-lo – Juro que não me importo se você ficar com ele.


Ele não podia falar essas coisas, devia estar furioso com ela! Deveria gritar, não tratá-la daquela maneira, consolando-a em seus braços. Ela iria magoá-lo, inevitavelmente, pois sabia o que aconteceria quando visse Haku. Não poderia deixá-lo partir uma vez mais, não permitiria. Encolheu-se, havia falado a verdade que se instalou em seu cérebro. Não deixarei Haku partir.


- Eu sabia que meu amor não iria ser suficiente. – sussurrou ele. Chihiro olhou para ele pela primeira vez.


- Sinto muito, Boh.    


- Não mais que eu. Não devia ter me aproximado daquela maneira.


- Não se culpe, por favor. Se não fosse... – calou-se subitamente, preocupada com o que pudesse falar.


- Se não fosse Haku, não é? – a garota baixou o rosto, tentando escondê-lo nas folhas, mas assentiu. Sentiu o toque cálido de Boh em seu rosto.


- Não quero que me odeie. – ele riu sem humor algum.


- Nunca serei capaz de fazer isso. Eu sou forte, não se preocupe comigo.


- Mesmo assim, eu irei me preocupar. Não quero que se arrisque. – havia uma possessão em seu tom de voz, que ela reprimiu cerrando a boca firmemente.


- É preciso que eu faça isso. – os dedos de Boh se moveram traçando o caminho desde sua testa até seus lábios, impedindo um protesto. – Se Haku é o único que pode salvar meu mundo, vou fazer. Ele já salvou minha vida muito mais que uma vez.


- Não é sua obrigação.


- Eu preciso... Preciso arranjar uma maneira de partir, Chihiro. Não conseguirei de outra forma. – arrependeu-se de suas palavras doloridas, mas não iria desmentir a verdade.


- Isso é suicídio.


- É uma troca, creio.


- Como assim, troca? Quer ficar no mundo dos mortos no lugar dele?


- É provável que seja assim, mas não prestou atenção no que a mulher disse?


- Que parte?


- A parte dos mundos...


- Sim, ela disse que existiam três mundos: o mundo dos vivos, o mundo dos espíritos e o mundo dos mortos. E que eles ligam...


- Não, ela não disse isso.


- Mas...


- Há uma sutil diferença; ela falou que o terceiro mundo era o mundo da morte. Não o mundo dos mortos.


- Ah! – falou quando a compreensão do fato a atingiu. – Mas o que isso mudaria?


- Significa que aqueles territórios possuem um dono.


- Vai ter que me levar junto, Boh. – pediu.


- Sabe que isso está fora de cogitação. Não vou levá-la comigo.


- Por favor, não pode me deixar sozinha.


Ela não viu o olhar de mágoa de Boh e ele deu uma resposta conclusiva:


- Não, Chihiro. Deixe-me fazer isso sozinho. Estou fazendo isso por você, não arrisque sua vida como se não valesse à pena! Não posso permitir que se machuque. Tenho que estar pronto.


Chihiro balançou a cabeça.


- Por que esta me repelindo dessa maneira?


Ele respirou fundo, segurando o ar o mais que pode. Abraçou a menina e enterrou o rosto nos cabelos dela, por alguns instantes.


- Me perdoe, mas não posso mais... não dessa maneira. – parou com seus lábios entreabertos a centímetros dos delas. Beijou-a com sofreguidão. O que inicialmente não foi correspondido. Encarou-a com a testa franzida, porém não perguntou. Passou os dedos pelo rosto dela, como que tentando decorar as feições.


- Sabe que te amo, de alguma maneira eu amo. Não precisa fazer isso. – implorou a ele.


- Eu sei, mas não é o suficiente. - a voz de Boh morreu.


- Acabou então? 


- Não, Chihiro. Não até que eu morra.


Abraçou-a, segurando o mais forte que pudesse para prolongar aquele momento.


- Boh... – Chihiro começou, mas foi detida pela voz de Boh.


- Não diga nada, só me deixe ficar assim um pouquinho mais. – os olhos da menina se arregalaram, mas ela assentiu levemente. Cerrou as pálpebras e levantou os braços, enlaçando-o.


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