Imperfeitos escrita por Felipe Perdigão


Capítulo 8
VI — Pequenos laços.




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A manhã de sábado acabara de nascer. Alice acordou antes de todos na casa de Antony e foi pra sua casa. Todos dormiram até tarde, a noite anterior fora um tanto quanto agitada de mais.

Já era quase 13h00 e Oliver fora o primeiro a despertar. Ele estava pensando dignamente em ir embora só pra não ter que dar todas as explicações pra Antony, mas enquanto ele trocava de roupa pra dar a escapulida, o mesmo acordou e o impediu cobrando a explicação. 15h00 e Oliver e Matth já tinha cuspido tudo que haviam descoberto sobre aquilo tudo. Não era muito, mas dava pra criar várias teses. O clima estava tenso, os meninos pensavam no quão a vida deles havia mudado este ano.

Mais uma vez o silencio havia tomado conta do ambiente. Estava tudo calmo de mais, os pais de Antony e seu irmão haviam saído. Oliver pensava agora em Unknown. Talvez esse dom ou maldição, viera no melhor momento. Eles poderiam aprimorar isso e usar contra quem estava mandando aquelas mensagens.

Os meninos foram pro andar de inferior. Oliver estava morrendo de preguiça, queria ir pra sua cama e dormir até o dia seguinte. Matth, por sua vez, como ele mesmo dizia “eu to numa larica”, estava morto de fome e olhava Antony cozinhar como um cachorro olha aqueles fornos de assar frango nas manhãs de domingo. Oliver havia se lembrado que Alice não havia o contado o que estava acontecendo entre ela e Etan. Ele, com toda educação do mundo perguntou pro seu amigo se podia a convidar.

— Tony. — Ele o encarou sem graça, mas o garoto parecia não ter escutado. — Antony?

— Fala logo menino.

— Grosso.

— É minha... — Oliver desviara o olhar de onde Antony apalpava.

— Ai — o menino suspirou —, pode chamar a Ali pra vim aqui? Aquela vaca sumiu a festa inteira com o Etan e não me contou nada.

— É claro, mas qual Etan? O do ultimo ano? — A indignação estava estampada no rosto de Antony.

— É, esse mesmo. Vadia de mais essa menina! Só espero que ele não dê um pé na bunda, já que experimentou a carne fresca. — Oliver assentiu com um sorriso no canto da boca franzindo o cenho.

— Acho que não. Ele é romântico de mais pra isso — ele parou de falar por algum instante enquanto mexia na panela—... Não ia ligar pra ela?


A menina não pudera ir. Seus pais a obrigaram a ir à missa da tarde pra conhecerem a igreja da cidade nova. Não havia nada que Oliver podia fazer além de tentar não morrer de curiosidade. Ele havia comido o que seu “amigo” preparava há alguns minutos então convidou os amigos para irem pra piscina antes dele e Matth irem embora.



Oliver fora o primeiro a pular com toda intensidade fazendo toda água se agitar. Os meninos rebatiam com a bola de praia quando Matth teve a horrível idéia de convencer Oliver a rogar pela água dentro da piscina. O mesmo não aceitou, achou que seria perigoso. Ele nunca tinha lidado com tamanha quantidade de água. Oliver havia recusado, mas Antony teve a curiosidade de tentar controlar o fogo. Ele foi até o quarto de sua mãe e pegou algodão e acetona. Depois que encharcou o algodão de acetona, ele a colocou sobre a mesa de ferro que tinha no meio do jardim e chamou seus amigos para se juntarem a ele. Ele sabia fazer aquilo, seus amigos haviam o mostrado como fazer. Sim, ele realmente sabia o que fazer. A chama que havia sido conjurada era rebelde, havia fúria no jeito que possuía o algodão. Antony estava amando aquilo.


Oliver já tinha parado de se questionar sobre aqueles dons, ele simplesmente os aceitou. Ele estava em êxtase em ver aquele algodão queimar cada vez mais intensamente por controle de seu amigo. Ele já estava ficando com vontade de praticar um pouco de seu talento, mas teve a idéia dos três praticarem juntos.

— Gente, eu tava aqui pensando — ele pausou e pensou mais uma vez se a idéia era realmente boa —, e se a gente invocasse os três elementos juntos?

— Mas eu não tenho capacidade pra isso biscate.

— Por quê? — Oliver franziu o cenho encarando Tony.

— Porque vocês têm mais controle do que eu nesse negocio de conjuração, afinal, estão praticando há mais tempo.

— Cê ta tirando com minha cara, heim? — Matth desdenhava Antony.

— Ok, mas se da alguma coisa errada, a culpa é toda é da Azeitona.

Oliver estava com o rosto quente de vergonha. Azeitona era um apelido que o deixava sem graça, escutar a pessoa da qual ele amava lhe chamar disso o deixou de pernas bambas.

— Deixa de frescura Toninho! Depois o gay sou eu. — Os três riram.

— Mais como é que vamos fazer essa parada ai que tu esta falando? — Matth foi crucificado com o olhar de Oliver por conta de seu português.

— Eu estava pensando em pegar três velas. Bem, se tiver aqui uma verde, vermelha e outra amarela está ótimo, mas se não tiver pode ser aquelas comuns. — Antony se levantou e foi pra cozinha procurar as velas e rapidamente voltou com quatro velas, a quarta era verde — Pra que essa vela aqui? — Oliver apontou com o olhar.

— Água, Fogo, Ar e... — Ele foi interrompido por Matth.

— Terra. É, faz sentido.

Oliver estava apreensivo. Ele já havia lido coisas sobre isso em algum dos livros velhos que seus pais escondiam no fundo do sótão. Ele tentava lembrar o que mais havia em rituais elementares como aquele que estava preste a acontecer.

— Tony, tem um recipiente de cristal ou alguma pedra?

— Sim. Pra que?

— Pedras, cristais, essas coisas e tudo mais devem ajudar a manter a estabilidade do circulo que vamos tentar invocar. Ah, se puder trazer mais algodão, mas dessa vez sem acetona.

O menino subira até o andar superior de sua casa. Ele estava nervoso com o que estava prestes a acontecer. Ele não queria que aquilo desse errado, ele sempre tentava mostrar o seu lado competitivo que sempre estava disposto a vencer.

Enquanto descia as escadas correndo ele lembrou de encher o pequeno recipiente que era de sodalita, uma das pedras do elemento Água e também pegou uma travessa de citrino para colocar os algodões que queimariam.

Agora estava tudo pronto. Eles poderiam conjurar pela primeira vez o circulo mágico. Oliver havia se sentado ao Oeste da mesa, junto com sua vela azul. Ao Leste estava Matth com a vela amarela e ao Sul Antony com a vela vermelha que estava em direção oposta da vela verde ao Norte. O garoto mais concentrado da roda, começou a falar para que seus amigos fizessem o mesmo.

— Ar, Água, Fogo e Terra. Pedimos que se manifestasse. — Os meninos repetiram. Matth deu as mãos a seus amigos e os outros fizeram o mesmo fechando o circulo.

Os meninos agora estavam inteiramente ligados. Podiam sentir a respiração do outro, nunca tiveram tão unidos. Eles estavam de olhos muito bem fechados e suas mãos dadas estavam cada vez mais suadas.

— Com a harmonia de nossa amizade, com a essência de nossos poderes. Invocamos os elementos e pedimos que eles nos de mais poderes. — O garoto que guiava aquele ritual respirou fundo enquanto sentia cada vez mais o cheiro do mar e conseguia ouvir em sua mente o barulho de uma cachoeira. Matth apertava as mãos de seus colegas cada vez mais fortes. Sua respiração estava muito acelerada e ele soava frio. Ele se sentia fraco ao mesmo tempo em que muito leve, como se ele e o Ar fossem um só. Ele estava quase quebrando o circulo quando sentiu sua visão ficar cada vez mais embaçada, como se olhasse diretamente pro sol. De um brilho amarelo e radiante, surgiu uma esfera fria e transparente. Dentro havia uma espécie de inseto com asas, talvez um anjo bem cintilante. Ela perfurou a camada fina da esfera e saiu fazendo um pequeno redemoinho que brevemente desapareceu, como fumaça.

O pequeno ser voava circularmente sobre os ombros de Matth. Ele tentava recuperar o fôlego enquanto tentava entender o que havia acontecido. “Esse bicho é meu? Faz parte de mim? Eu que o invoquei?” esses questionamentos não saiam da cabeça do garoto que estava confuso.

— Isso... — Oliver encarava aquele delicado ser com bastante duvida. Ele já havia visto algo parecido em um dos seus livros sobre mitologia dos quais ganhara de seu pai. — Isso é um Silfo, tenho certeza.

— Que porra é essa? — Matth balançava o ombro pra tentar afastar o ser que posara em seu ombro.

— É uma espécie de fada, eu acho. Uma fada do ar. Pelo que sabemos... Ela pode ter nascido da nossa suplica aos elementos.

— Que bicho gay. — Antony ria da cara de desespero de Matth.

— Vamos dispensar os elementos. Preciso ir embora. Realmente preciso ir.

— É, eu tenho coisas pra fazer pra minha avó.

— Ah, seus bichos! Fiquem mais, por favor?

— Realmente não da Tony, preciso ficar com minha irmã, como sempre. Ah, e ainda tenho que ir ver Alice.

— E eu tenho que ir do outro lado da cidade pra vovó.

— Então vamos acabar logo com isso.

Os amigos fecharam o olho novamente para retomar a concentração. A intensidade que as chamas das velas queimavam aumentara. Sem muita delonga, Oliver que ainda comandava o circulo, se livrou dos elementos em ordem celestial e consecutivamente as velas foram apagando.

Para o azar de Matth, o pequeno Silfo não havia desaparecido quando o Ar acabara de cumprir seu papel para com o circulo. Ele pensara em algum método de esconder aquilo. Seus bolsos eram apertados, a coitada morreria esmagada entre suas vestes e seu corpo. Em segundos, sua mente foi aberta e algo brilhante veio em sua mente. Ele pegou a vela amarela em suas mãos e a reacendeu com seu isqueiro. Ele invocou o seu elemento e pensara em uma Athame, uma espécie de punhal. A pequena Silfo voava em direção de sua testa. Ele desejara que ela virasse uma Athame e assim foi feito. Sobre a mesa caiu uma pequena punhal de cabo preto com duas luas viradas banhadas a ouro e no meio uma brilhante pedra de topázio. Agora sim ele podia carregar a Silfo e poderá invocá-la quando quiser. Agora, com o auxílio de um ser mitológico, Matth se tornará o mais forte daquele circulo.



Oliver já havia cuidado de sua irmã como combinara com seus pais. Ele agora teria tempo de ir à casa de sua amiga questiona-lá sobre a noite passada. O menino estava se roendo de curiosidade. Assim que pode ele pegou o caminho da casa da amiga e foi correndo e sem muita demanda subiu pro quarto da amiga.





A menina estava sentada de pernas delicadamente cruzadas e seu rosto estava completamente corado. Ela sabia que não conseguiria esconder por muito tempo de seu amigo o que havia acontecido horas atrás com Etan. O menino já não agüentava mais de ansiedade, se a amiga fizesse cu doce ele teria que se controlar pra não estapeá-la até ouvir tudo que tinha pra ouvir.



— Sua vaca, se não demorar pra começar eu lhe agradeço. — Ele a ameaçava com o olhar e ela havia entendido.

— Ai! Não sei nem por onde começar. — Ela suspirou e antes que voltasse a falar o amigo impaciente berrou.

— Começa a falar o que estava fazendo no banheiro com Etan e depois como conseguiu isso. — Ele balançava a cabeça pra cima e pra baixo encolhendo os lábios com o cenho franzido para mostrar a inquietação.

— É, ficar nessa inquietação não adiantará em nada. — Ela deu uma mordida no chocolate que estava comendo pra disfarçar a timidez. — Eu e ele ficamos e — novamente ela foi interrompida.

— Ficamos? — os olhos do menino estavam vidrados — VOCÊ DEU PRA ELE!

— Ah, agora grita mais alto! — Ela abaixou a cabeça enquanto se desfazia da vergonha — Não! Não faz isso. — eles riram — É, mas demorou bastante! A gente ficou conversando um tempão até começarmos a ficar. — ela desviava o olhar do amigo que estava com vontade de estapeá-la. — Ah, e também ele foi super fofo comigo, talvez a gente até comece a namorar.

— Mas é claro que ele foi fofo, ele queria te comer!

— Não fala desse jeito Oliver.

— Ah, desculpa. Ele queria com toda inocência do mundo te levar para o banheiro e introduzir com toda delicadeza do mundo seu pênis em sua vagina. — Ele suspirou encarando a amiga que ria de sua cara.

— Falo nada!

— Ai, depois que deu não tem que falar nada mesmo não. Ali é sua primeira festa aqui na cidade e tu já saiu com “minha piriquita tem gosto de coca-cola” escrito na testa.

— Oliver! Não é pra muito, eu sei que você já fazia coisas muito piores quando tinha minha idade.

— Ah, claro que não. Sou santo e puro. Também imaculado, humilde, devia ser até santificado.

— Aham, o santo da modéstia!

— Enfim, o sexo é seu e faz o que quiser com ele. Só não quero afilhado tão cedo, ok? — Ele riu enquanto bagunçava o cabelo da amiga que estava deitada em seu colo.

— Tomamos todo cuidado possível. — Ela riu ficando vermelha novamente lembrando-se da noite passada.

— Mas e aí? Foi bom?

— Foi, e muito. MAS NÃO PERGUNTA MAIS NADA CARAMBA. — Ela colocou a mão no rosto enquanto deixava de ser um pimentão de tamanha vergonha. — Quer me matar de vergonha?

— Talvez, mas sou super amável e não vou perguntar mais nada, só me responde uma coisa.

— Ah, super amável! — ela o desdenhou — Pergunte.

— É grande?

— Oliver, que piranhagem!

— Verdade, mas não é da minha parte. — Ele riu dando de ombros — Era sua primeira vez Ali, alguma coisa tinha que valer a pena.

Os meninos ficaram ali conversando sobre a noite passada por um bom tempo. Oliver falava sobre os lugares da cidade que era bom pra pensar na vida, os de fazer compras, os de sair pra pegar e dava nome de pessoas legais que talvez ela gostasse. A menina estava ansiosa pro seu primeiro dia de aula. Às vezes o pai de Alice entrava em seu quarto dando alguma desculpa, mas os meninos sabiam que aquilo todo era medo deles estarem fazendo algo errado.

A noite já havia chegado há muito tempo e Alice e Oliver precisavam ir dormir, afinal, no dia seguinte eles teriam aula. O garoto se despediu de sua amiga e foi até a sala despedir dos seus pais. A menina o acompanhou até a porta, e quando ela foi abraçar ele sussurrou em seu ouvido.

— Merda. Esqueci de ir ao banheiro do seu quarto ver se tinha alguém te esperando.

— Idiota. — A menina se afastou dando um tapa em sua testa o empurrando para fora de sua casa. — Te mando mensagem mais tarde.



Aquele fim de semana havia passado bem rápido. Unknown não havia dado as caras e o grupo de amigos fora a praia à tardinha rebater e ficar para ver o por do sol na praia naquele caloroso domingo. Oliver e seus amigos estavam bem animados com o novo fim de semana que não demoraria muito pra chegar. Era uma quarta feira e era a segunda vez na semana que os amigos praticavam suas habilidades.





Era noite, os meninos voltavam do mesmo parque que encontraram semanas atrás quando Unknown começara a infernizá-los. Eles haviam encontrado um bom lugar pra praticar sem ser incomodados. Agora aquele circulo mágico, hipoteticamente um triangulo, tinha mais um integrante. Toda vez que Matth convocava o Ar, a Athame que ele sempre carregava consigo se transformava em um Silfo que ajudava a estabilizar seus poderes. Oliver e Antony ficaram meios desapontados por nenhum ser mágico/mitológico terem se manifestado por eles.



O caminho se partiria em três, eles tinham que chegar logo em casa, cada um com uma obrigação a fazer. Oliver primeiro se despediu de Matth com um abraço seco que lhe fora retribuído com bastante afeição. Quando foi despedir-se de Antony, ele apenas acenou com um sorriso seco e vazio. Antes de dar as costas a seus amigos ele preparava seu fone de ouvido. Alguma de suas músicas alienadas e psicodélicas tocava em um barulho razoavelmente alto o suficiente pra ele não conseguir ser perturbado pelo pensamento. As coisas pro garoto haviam começado bastante difíceis naquela semana. Unknown não dera o ar da graça, mas seus pensamentos sociopatas, os problemas familiares, seu mau humor espontâneo e o sentimento de culpa por ter deixado se apaixonar pelo melhor amigo sim.

Já estava tarde. O menino acabara de desligar seu computador e fora pra cama. Ele não tava com humor pra ir dar boa noite pra sua irmãzinha como fazia na maioria dos dias. Já em sua cama, ele começou a escrever coisas aleatórias no bloco de notas do seu celular. Havia algo preso em sua garganta, algo que ele não conseguia formular.

O sono não vinha de jeito nenhum. Já era madrugada, uma vontade de fugir de si próprio não saia do pensamento de Oliver. Novamente ele pegou seu celular e começara a escrever alguns questionamentos que virou uma carta de desabafo.

“Por que fui me apaixonar justo por você? Não basta ter ciúmes do seu melhor amigo, tive que me apaixonar por você e ter ciúmes de qualquer mosca que encosta-se a você? Não basta ter que escutar você falando dos seus amigos, das gargalhadas que você deu com eles, do seu sorriso perfeito quando você fala daquele amigo que odeio ou odiava, sei lá, e ter que suportar o fato de nunca termos tempo pra falarmos de nós? Sempre que estamos juntos meu coração fica acelerado, mas é bem melhor com você do meu lado do que com aqueles seus amigos retardados. Sei que é uma tremenda ilusão ainda te ter na minha mente, no meu coração. Não sei nem se você me considera seu melhor amigo, se considera, deveria demonstrar mais. Você me faz sentir como se eu fosse nulo, como se você falasse comigo só quando não tivesse nada mais interessante pra fazer. Será babaquice minha, digo, com certeza é babaquice minha ainda alimentar esse amor, talvez também seja dar esperanças a nossa amizade. Eu gostava deste dilema até antes daquela amizade de colegas de classe virar amor pelo melhor amigo.”

O garoto cochilara assim que digitara “melhor amigo”. Aquilo tudo estava deixando sua mente cada dia mais confusa.

Era sexta feira. Um dos dias mais esperados por todos e o mais odiado por Oliver. Ele tentava demonstrar o máximo de felicidade possível, era aniversário de Matth, seu melhor amigo de infância. Todos tinham sido bons de mais com ele pela manhã, mesmo não demonstrando, ele amava aquilo. Seu armário estava cheio de presentes que guardara pro seu amigo. As pessoas mais tímidas ou ocupadas do colégio pediram-lhe para entregar ao amigo quando desse. Apesar de estar se sentindo alguém do correio por estar fazendo aquilo, ele não havia pensando em resmungar, afinal, tudo aquilo era pro seu melhor amigo.


Aquela tarde de sexta não demorou a chegar. O dia havia sido corrido. Varias atividades para adiantar para não acumular no fim de semana, o presente de seu amigo que ele havia esquecido de comprar, convencer Alice de ir na comemoração de aniversário de Matth e ainda levar sua gata no pet shop.



Não demorou muito e a noite chegou. De chinelo de dedo e uma bermuda preta e uma camisa branca estampada com algum símbolo de um de seus livros favoritos, Oliver fora se encontrar com os amigos. Era uma noite quente e o mar estava agitado. Os meninos comemoravam o aniversário de Matth com um luau na praia. Não era uma festa grande, na verdade, estava apenas Alice, Antony e Oliver comendo drunk foods e dividindo duas garrafas de rum. Matth já havia chegado bêbado. Oliver estava feliz por seu amigo estar completando mais um ano de vida, mas não fazia questão de demonstrar isso. Quando ele chegou, entregou seu presente embrulhado em um papel amarelo e deu um abraço seco em seu amigo. O menino ficou feliz com o perfume que receberá de seu amigo. Alice que já não era muito intima do menino, mas sempre tinha crises de rir do mesmo trouxe em uma caixa estampada com os pontos turísticos do Japão, o país favorito de Matth. Dentro havia um par de sapatos do Carmim, a grife favorita do garoto. Já Antony, por sua vez trouxe em uma sacola prateada uma camisa social. O aniversariante estava em êxtase com aqueles presentes. No meio de um dos goles ele aos berros demonstrou o quanto amava seus amigos.


— Eu amo vocês — ele pausou pra dar mais um gole —, e não há nada que vá nos separar! — ele sorria encarando os três amigos — Vocês sempre serão minhas biscates favoritas.


A madrugada já havia chegado. Alice já mandara uma mensagem de texto para Oliver avisando que o taxi que havia pegado tinha a deixado em casa. Os três meninos estavam no final da segunda garrafa de rum. Eles não sabiam se comiam aquele tanto de besteira que Matth havia furtado em alguma loja ou se bebiam. Ambos já estavam bêbados o suficiente para arrumar confusão.



Matth estava com uns assuntos muito inconvenientes, como sempre. Oliver tentava ignorá-los na maioria das vezes, mas o álcool havia tomado toda sua estabilidade mental. Antony já estava estourando de raiva de Matth, se pudesse o socaria. Oliver já queria ir embora há algumas horas, mas os meninos insistiam pra ele ficar. Quando ele levantou pra ir embora, Antony se irritou com a insensibilidade do menino e começou a resmungar com o amigo.


— Vá pro inferno também Oliver!

— Claro. Vou lá visitar meu melhor amigo.

— Idiota. Você só sabe pensar em você?

— O que está falando? O que eu fiz?

— Não pode ficar com seus amigos mais um pouco?

— Isso tudo por que quero ir embora?

Matth estava ficando injuriado.

— Você sempre só pensa em você. Nunca faz nada pensando se os outros ficar bem com isso ou não. — o menino respirou fundo para retomar todo fôlego que gastou pra gritar aquelas palavras. — Às vezes me pergunto quem realmente você é! Quanto que você gasta com toda essa maquiagem que gasta pra gente gostar de você? O quão a gente sabe de você?

Oliver não sabia por qual motivo aquilo o menino estava fazendo aquele escândalo. Sua mão soava e seus lábios tremiam.

— Sempre fui assim, se você falava comigo até hoje é porque gosta de mim. Ou melhor, fingia gostar... Pelo que vi aqui.

— Você nunca tentou me fazer feliz. Você sempre esteve fechado no seu mundo me escondendo as coisas.

— O que? Eu nunca que tentei te fazer feliz? Todas as coisas que fiz desde que mudei pra escola nova foi pensando em nossa amizade. Sempre dei o melhor de mim pra ser o dono do seu riso.

— Não parecia.

— Desculpa se você tem pessoas melhores que conseguem fazer por você muito mais do que eu fiz esse tempo.

— Então vá embora e nunca mais volte pra minha vida.

— É o melhor que eu posso fazer. — Oliver tremia — Sua vida é um lugar que eu nunca devia ter entrado. Seu escroto! Sua carência sempre fode com tudo! Seu medo de ficar sozinho e não ser correspondido sempre lhe impede de conviver com as pessoas. De vez nossa amizade está bi perdida. Todo amor que eu sentia até hoje por você se tornou puro nojo e desprezo. Espero que saiba o que signifique “nunca mais”.

Com o ódio estampado em seu cenho franzido, Oliver tomava o caminho escuro para casa. Sua cabeça doía de tanta vontade de chorar, mas o orgulho não deixava aquilo acontecer. Ele estava sentindo nojo de si por ter feito tantas coisas por alguém que não tinha maturidade por reconhecer.


Já havia amanhecido há muito tempo. Oliver não pregara os olhos na noite seguinte. Sua cabeça estourava. Aquela manhã de sábado estava mais desprezível do que as demais. Ele queria ligar pra Alice e contar tudo, mas sentia um nó na garganta só de lembrar que havia brigado com uma das pessoas das quais ele mais amava. A única vez que ele teve coragem de ligar, ele viu a foto do fundo do seu celular e desistira. Era ele e seu amigo se abraçando de lado e sorrindo.



A verdade havia demorado a chegar, mas quando bateu na porta de Oliver não fez questão de avisar. O menino só pensava em fugir. Fugir para um local sem amigos, sem família, sem atividades avaliativas, sem uma sociedade hipócrita que sempre julga antes de tentar entender os dois lados da moeda. Oliver já havia tomado uns cinco analgésicos, nenhuma forte o suficiente pra dormir. Ele não conseguia achar a droga certa pra fazê-lo esquecer, pra apagar aquele grande vácuo em seu peito do qual o amigo deixara. Ele se sentia mais vazio do que normalmente.


Não havia nada que fosse capaz de tirar o menino do quarto. Trancado com seus fones de ouvido ele morria de dor de cabeça de tanto chorar. Seus pais haviam viajado para casa de seus avôs, então não havia problema ele se entregar e soltar todo aquele choro que estava guardado há tanto tempo.

Sem levantar da cama pra ir comer alguma coisa ou ir ao banheiro, ele ficou lá até o anoitecer. Ele pegou um grande pote de sorvete de flocos, alguns analgésicos e voltou pro quarto. Ele queria mandar um e-mail pra Antony, ele não queria acreditar que tudo aquilo era verdade.

“Lembra da primeira vez que você me chamou de amigo? Eu fiquei sorrindo por horas. O que eu queria tinha acabado de acontecer, eu tinha cumprido mais uma meta na vida. No primeiro dia em que nos conhecemos eu me encantei com seu sorriso e estava determinado a me tornar seu amigo e havia conseguido. Agora eu poderia ser dono de um dos seus sorrisos, poderia lhe ajudar com seus problemas e também compartilhar suas felicidades. Eu ia poder esquecer meus problemas e poderia dedicar meu tempo a nossa amizade. É, eu pensei que ela realmente me faria bem, alias, fazia até ontem, mas o único lado bom de ter se tornado seu amigo foi que pude crescer com os erros que cometi nessa amizade. Nunca mais me entregarei a alguém como fiz contigo. Sinceramente? Não vou derramar mais nenhuma lagrima por causa de você! Já insisti de mais nessa amizade, espero que você esteja morrendo de ressaca, que não haja nada no seu pulmão além das fumaças dos milhares de cigarros que deve ter tragado. Eu devia ter socado sua cara, mas por favor não me faça desistir dessa amizade, ficarei muito mal em saber que o único amigo dessa relação era eu.”

“Não. Eu não posso mandar isso”. O menino fechara o email antes mesmo de apertar pra enviar. O pote de sorvete havia acabado, seus olhos estavam inchados de tanto choro e sua cabeça estava pesada, como se ele estivesse constipado, mas dessa vez o vírus não era influenza, era amor.


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