Imperfeitos escrita por Felipe Perdigão


Capítulo 18
XVI — O Poder.




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/327868/chapter/18

A madrugada adentrava cada vez mais e trazia consigo o frio. Uma neblina se formava timidamente sobre o bosque deixando os quatro amigos cada vez mais assustados.

Oliver criara a ilusão de que Jane estava bem, que só quisera ficar sozinha e que a qualquer hora ligaria pra falar que está tudo bem. Ele não conseguia aceitar a hipótese de Unknown ter raptado a garota da qual ele tanto gostava.

Julian havia ido até a casa de seus tios, onde estava hospedado para buscar seu grimório e alguns itens que o ajudaria durante o ritual das The Wonders. Os quatro amigos haviam chegado à conclusão que seria melhor pedir a ajuda da natureza para enfrentar aquele que estava a infernizar suas vidas nos últimos tempos.

Ainda com o círculo invocado, o coven de Oliver e seus amigos estava atordoado enquanto aguardavam a volta de Julian.

O rapaz não havia demorado. Carregava consigo um livro de couro negro brilhante com vários detalhes em ouro em uma das mãos e na outra uma mochila. Ele parecia apreensivo, como se temesse algo.

— Bem, aqui tudo que tem o que precisam. — Julian estendeu a mão pra Oliver entregando uma mochila. Assim que o garoto a abriu retirou uma agulha, capas negras com um tecido aveludado na parte externa, cada com uma cor diferente referente a seu elemento, uma vela negra, um cálice de um bronze brilhante e um recipiente que continha um pó negro.

Oliver pegou sua capa e passou as outras para Alice para que ela passasse para Matt e ele respectivamente para Antony e ele para Julian, mas havia só quatro capas.

— Julian, não vai usar uma capa não? — Alice disse enquanto se ajeitava dentro da capa.

O garoto negou com a cabeça.

— Por quê? — Oliver analisava o primo.

— Porque não faço parte deste clã. Isso é com vocês.

— Não sabemos a mínima ideia de como fazer. — disse Antony indignado.

— Por isso eu trouxe isso. — Julian mostrou a eles seu grimório. — Indica mihi, quod volo. — O rapaz disse e então o livro começou a se folhear até a parar em uma página com inúmeros desenhos e várias instruções. Como uma receita.

— Ah, eu disse que se não conseguirem realizar as The Wonders vocês irão morrer? — Julian deu de ombros se afastando do círculo.

— Ótimo. disse Matt com a voz tremula.

— Unknown não consegue nos matar, mas morremos por nossas próprias mãos. — Antony resmungou.

— Relaxem, se morrerem, pelo menos não sentirão dor.

— Assim você nos ajuda muito. — Oliver estava cada vez mais apavorado.

— Você daria um ótimo animador de festa infantil, sabia? — Matt quase silabara animador.

— A vida de vocês daqui pra frente vai oscilar entre o péssimo e o horrível. — disse Julian com uma cara de tédio, mas no fundo ele estava realmente preocupado. Ele sabia dos riscos. — Espero que consigam.

Julian se afastou um pouco mais dos quatro e antes que dissera que começaria a dar as instruções se lembrou de algo.

— Seus guardiões já se manifestaram pra vocês?

— Sim.

— Invoque-os. Eles os guiarão durante o rito.

E então os quatro sentaram no chão. Deram as mãos e uma energia tranquilamente boa surgiu no ambiente acalmando um pouco os quatros bruxos.

Seus poderes estavam ligados. As chamas das velas e da fogueira feita com gravetos de sabugueiro estavam cada vez mais agitadas, mais flores plantas nasciam ao redor dos quatros e o vento se agitara levando e trazendo o ar frio.

— Aeris.

— Ignis

— Aquae.

—Terrae.

— Protegat nos. Protegat nos. Protegat nos. — Os quatro disseram juntos e então uma esfera de energias surgiu no centro.

A esfera oscilava na sua coloração, começara em um amarelo bem claro, escurecera até o tom de um vermelho vivo, voltara clarear até um azul e depois se transformara em um verde reluzente, e assim ele alternava sua cor coordenadamente.

Depois de alguns segundos a luminosidade cessou por alguns instantes. Os bruxos soltaram a mão e então a esfera voltara a brilhar.

Uma esfera menor surgira dela e fora em direção de Matt, e então a esfera luminescente parara sobre o ombro do garoto se transformando em sua guardiã, um silfo do tamanho de uma boneca Barbie. Trajava um vestido feito sem manga de folhas secas amareladas e longos cabelos brancos caídos sobre os ombros. Com uma das mãos ela brincava com uma pequena bolha de ar que cintilava de acordo com seus movimentos. Sem sombra de dúvidas era uma elemental extrovertida e pensativa. Podia se dizer até que tinha déficit de atenção e hiperatividade pelos pés e mãos agitadas que brincavam com o ar.

A segunda esfera fora em direção de Alice. Ela não era pequena igual à primeira, seu tamanho era do tamanho de uma bola de handball e enquanto dançava pelo ar transmitia um cheiro de terra molhada. Um pequeno trono surgira no chão e então da esfera pulou um gnomo, seus trajes eram verdes, uma calça justa e uma regata longa que chegava até a metade de suas coxas. Ele tinha um chapéu verde-oliva pontudo que dobrava para trás por causa do tamanho e uma bolsa tira colo marrom. Seu olhar severo era irônico, pois seu sorriso era incrivelmente gentil.

A esfera perdera o brilho novamente. Antony e Oliver trocaram olhares preocupados. O que havia de errado? Por que seus guardiões não haviam aparecido?

A única garota daquele clã franzira o cenho.

— Os chamem de novo. — disse Alice, preocupada.

— Não insista. — retrucou Julian.

Eles encaravam a esfera que começara a se desfazer deixando os dois amigos com um nó na boca do estomago.

De repente e inesperadamente, um clarão surgiu da esfera e ela sumiu. Havia duas esferas menores. A vermelha parecia perseguir a azul esverdeada.

Os bruxos olhavam fascinados os espetáculos que os dois elementais estavam dando.

Uma brisa gelada passara pelo círculo e então cada uma tomou seu rumo.

A esfera que guardava o guardião elemental de Oliver seguira ate ele e explodira jogando água para todas as direções. Uma Ondina do mesmo tamanho da Silfo de Matt. Sua veste era um vestido-bata de um tom claro de um azul esverdeado perolado. Seus cabelos selvagens eram úmidos era de um verde pastel seapunk. Seu olhar desconfiado era vazio, apesar de ser fascinante, como o mar.

A última das quatro esferas brilhava em um vermelho intenso. Ela voara até Antony até que pegara fogo. Um ser humanoide com aparência masculina um pouco menor que a Ondina e a Silfo saíra de dentro da esfera pousando sobre os pés do garoto. Possuía um par de asas de fogo e trajes vermelhos que se incendiavam a cada movimento. O guardião tinha o mesmo olhar sedutor e vingativo, porém, ainda transmitia a sensação de segurança.

Talvez agora os quatro bruxos daquele coven estivessem prontos pra serem abençoados — ou amaldiçoados — pelas The Wonders.

O primo mais velho, de longe encarava os quatro guardiões que acabara de serem invocados. Era um olhar espantoso do qual Julian nunca havia dado, mas seu sorriso demonstrava admiração e respeito, não medo.

Quando ele se deu conta do que fazia naquele bosque colocou o livro aberto sobre a grama, estendeu a mão esquerda para cima e ergueu a direita com apenas o dedo indicador e médio eretos. Ele fechara o olho se concentrando e pedindo auxilio da deusa, era lua cheia, ele rogara pra que fora permitido o poder aos quatro, junto de uma proteção divina e acima de tudo, carinho maternal que só a bondosa deusa poderiam lhe fornecer naquele momento.

Julian estava pronto.

Ele esperava que os quatro também estivessem.

E então, o garoto pegou o livro com a mão esquerda e deu uns passos para trás. Com os dois dedos da mão direita eretos, ele os apontou em direção ao círculo mágico de seu primo. Em instantes um imenso círculo de fogo surgira envolvendo os bruxos.

As chamas não eram muito altas, dependendo da posição que você olhasse dava pra ver as runas que compunham aquele círculo de fogo.

Antony se sentia confortável, mas os outros três, mesmo com as chamas estando longe de seus corpos, sentiam um desagradável frio na barriga.

Os guardiões entenderam porque estavam ali. Sem nenhum pedido cada foi até o centro do círculo onde estava uma vela negra acessa e deram as mãos e começaram a dançar em círculos. Depois que começaram a cantar um mantra saudando a Gaia, começaram a flutuar há um metro e meio do chão com as mãos dadas dançando suavemente sobre o calor da vela.

O único som que os cinco conseguiam ouvir era das chamas, o cantar sereno dos guardiões e o sussurro do vento que se agitara fazendo as folhas, cipós e galhos das árvores se agitarem.

Julian entendera que aquela era a hora.

Ele voltara a atenção pro livro e sussurrara pra Oliver pra que ele fizesse tudo que ele dissesse sem hesitar.

Juramos lealdade aos elementos, aos deuses e acima de tudo ao nosso coven. — Julian olhou pros bruxos que estavam de mãos dadas e repitam cada palavra enquanto suas vozes tremiam.

Selarás a tua confiança naquele em que mais confia e assim será digno da confiança dos deuses.

— Está brincando? — Os olhos de Antony flamejaram enquanto ele fitara Julian.

— Não. — Julian franziu o cenho dando à mínima. — Comecem pelo Ar, em seguida Água, Terra e depois Fogo.

— Por que terei que dar o último beijo? — Antony estava cada vez mais confuso.

— São quatro partes. Cada parte para um dos elementos. Começamos com o fogo, então, você será o último a ser avaliado pelo seu elemento.

Antony assentiu mesmo preocupado.

E então Matt saiu da sua posição e fora até Oliver com passos lentos. Eles já haviam feito aquilo antes, mas não na frente de outras pessoas. Os dois eram amigos há anos, não teriam problemas nenhum com aquilo, porém dessa vez era diferente. Aquele beijo podia significar a morte de um dos dois.

Matt passara a mão sobre os lábios de Oliver e o amigo colocara as mãos na sua nuca e eles selaram um beijo não muito demorado.

Assim que Matt se afastou a vela negra no centro do círculo apagou e sete segundos depois reacendeu.

Oliver entendera aquilo como um “é sua vez” e então olhara pros três amigos se questionando em quem ele mais confiaria. Algo lhe disse pra ir em direção a Matt, mas ele tinha dúvidas, tinha medo do ciúme de Alice, já havia se decepcionado muitas vezes com Antony e ele sentira que Matt às vezes escondia as coisas.

Sem saber o que ele faria ele olhou pra chama da vela azul aos seus pés e ela apontara para alguém.

O garoto franziu uma das sobrancelhas e caminhara até a direção dessa pessoa.

Era Alice. Sem muita enrolação ele deu um sorriso pra melhor amiga e lhe beijara e quando finalizaram ambos riram, mas logo pararam ao ver a vela apagar e reacender mais uma vez.

Na vez da Terra, Alice foi bem determinada na sua escolha. Ela gostava dos três garotos da mesma forma, mas Oliver era aquele com que ela poderia contar até no dia do nascimento do seu filho. Ela sabia que Oliver enfrentaria Mares e Montes para vela sorrir.

O beijo que ela dera não fora romântico igual os que ela dava em Ethan, era um beijo puro, sem malicias. Assim que ela se afastou do amigo ela bagunçara seu cabelo e caminhara até o norte, sua posição no círculo mágico e esperava a vela reacender.

Dessa vez a vela demorava mais do que sete segundos pra acender.

Os cinco já estavam ficando intrigados quando a vela voltara a acender. Eles sabiam que o acender daquela vela dependia da provação dos espíritos que estavam presentes naquele momento. Os quais iram decidir se os quatro teriam a bençoa de usar as The Wonders ou não.

Era a vez de Antony.

O garoto não havia sido beijado nenhuma vez. Ele não tinha se importado muito com isso. Ele sabia que há amigos em que confiamos mais do que outros e que mesmo assim não deixam de ser amigos.

Ele estava confuso. Ele conhecia Alice a pouco tempo, ela era a única garota de seu coven. Desde que ela mudara pra sua rua e pra mesma escola, eles construíram uma amizade engraçada, mas ele sabia que confiava mais em Matt a que nela.

Antony olhara pra Matt e percebera que ele não contava muitas coisas a ele e as poucas coisas que ele sabia a respeito, só contara na presença de outra pessoa, ou seja, não era um total sinal de confiança.

Restara um, Oliver.

O jovem rapaz estava confuso, realmente não sabia o que fazer.

Ele fechara os olhos e pensara em tudo em que ele e Oliver já haviam passados juntos. Em cada noite que passaram acordados, em todas as brincadeiras nas piscinas, em cada festas que estiveram juntos, em cada segredos e piadas internas que compartilharam e nas vezes em que Oliver salvara sua vida.

“Merda, vou beijar Alice e pronto. Ela é a única garota e mesmo que se eu não estiver fazendo o certo... Não tem como os espíritos do fogo saberem” pensou o garoto confuso.

Ele começara a andar em direção a Alice engolindo a seco suas dúvidas, mas alguma força maior desviara sua direção.

Matt colocou um sorriso um tanto quanto feliz demais na face, Alice olhara curiosa para a expressão na cara de Antony e assim que percebera pra onde o garoto caminhara ela ficou corada.

Antony envolvera Oliver pela cintura, olhou fixamente nos olhos do amigo, soltou um riso inseguro, fechou os olhos e puxara Oliver.

Ambos conseguiam sentir a respiração quente e nervosa um do outro, o beijo tinha um gosto de cereja e menta.

Oliver passara a mão pelos ombros do amigo e depois de alguns segundos se beijando eles perceberam o que estava acontecendo e então se afastaram.

Todos começaram a encarar as chamas das cinco velas que estavam descontroladas.

Eles temiam que o fogo que Julian conjurara também perdesse o controle.

— Vocês conseguiram passar pela primeira parte. — Julian não parecia tão contente. — Os espíritos viram que vocês sabem em quem confiar.

— E que sabemos beijar bem. — disse Matt dando um beijinho no ombro esquerdo.

Alice deu uma risada abafada, ela sempre achava tudo engraçado.

Julian pegara o livro das sombras e continuara a ler em silencio até que conseguira entender o que o livro queria dizer e disse pros adolescentes inquietos.

Com nosso sangue, selamos nossos corpos. Mais do que nunca, somos um só. — Julian lera e relera o livro pra ter certeza que sua tradução daquela língua antiga estava certa.

Os quatro deram um passo pra trás.

Oliver pensara no que havia acabado de falar “Com nosso sangue, selamos nossos corpos”. E então se abaixou para pegar a agulha que Julian trouxera e olhou para o primo para ter certeza que estava fazendo a coisa certa.

Ele estendeu a mão e todos fizeram o mesmo.

O garoto dera um suspiro olhando para Matt, depois para Antony e assim que olhou para Alice ele voltara o olhar para seu indicador direito e o espetara com a agulha.

Quando a primeira gota de sangue saiu, ele caminhara até a garota e entregara a agulha. Ela fez o mesmo enquanto Oliver voltara pro seu lugar ao sul do círculo.

Na vez de Matt furar o dedo ele ficara meio pensativo, não tinha certeza que queria fazer aquilo.

— Não estamos vendendo a alma pro tinhoso, estamos? — Matt estremeceu. — Não sei se estou de acordo com isso.

— Faça. — Os outros três disseram ao mesmo tempo.

E então o garoto furara seu dedo e entregara a agulha para Antony, quando ele furou, os quatro sentiram um calor que logo cessou.

— E agora? — perguntou Antony.

Julian lia o livro das sombras com o cenho franzido. Ele estivera tendo problemas com a interpretação.

— Misturem o sangue de vocês.

— Como? — Disse Alice confusa.

Matt vira o Cálice no chão e o pegava com a mão que não estava sangrando.

Ele ergue a taça e pingou duas ou três gotas dentro do cálice e passara o objeto para Antony que fizera o mesmo e passara em diante o cálice até chegar a Alice.

Assim que a terceira gota do sangue da menina caíra sobre o recipiente Julian o ordenou que a menina jogasse aquele liquido nas chamas da vela negra.

A menina ficara um pouco assustada, mas não queria parecer medrosa. Colocou um sorriso na face e seguira até a vela e despejara o líquido nas chamas.

Assim que fizera isso às chamas do círculo que Julian invocara ficaram altas, quase da altura das copas das árvores.

Antes que os bruxos pudessem se assustar com a altura das chamas, eles foram jogados para alguns metros atrás de onde estavam caindo deitados e imobilizados no chão.

Julian correra até o círculo pra ver o que acontecera.

Ele tentara domar as chamas, mas não tinha mais controle daquilo.

O garoto tentara pular através das chamas, mas elas o empurrou para fora o fazendo rolar alguns centímetros até perceber o que estava acontecendo.

Os quatro jovens bruxos estavam flutuando na direção oposta dos seus guardiões. Alice e Matt gritavam tanto que Oliver ficara preocupado se eles estavam sentindo dor ou algo do tipo.

Julian se recompôs e então se deu conta do que estava acontecendo.

— Os deuses estão avaliando vocês mais uma vez — riu Julian contente.

— E o que temos que fazer? — Antony disse desconfiado, mas não obtiveram resposta.

— Apenas esperem a aprovação deles. — Julian aumentou a voz. As chamas estavam tão altas que ele não conseguia ver mais dentro do círculo, torcia pra que eles pudessem ouvi-lo.

Julian parara de encarar as chamas e começou a ler a velha página de seu livro na esperança que houvesse algo dizendo que aquilo era completamente normal, mas ele não conseguia entender muita coisa que estava escrito. Além de ser um idioma antigo, a letra era confusa de compreender.

Em desespero e sem saber o que fazer ele pensara em uma forma sábia de tentar ajudar.

Minus ignis! — gritara Julian.

Nada acontecera. Então ele estendera as duas mãos no chão deixando o livro cair e gritara mais uma vez com a voz ampla e clara.

Minus ignis! — Sua voz saíra tremula.

E então, mais rápido que o adormecer, as chamas cessaram e ficaram rentes ao chão.

Os quatro estavam sentados com os joelhos na grama e com as mãos estendidas para a vela negra.

De longe Julian conseguia ver as pupilas dos seus amigos completamente dilatadas. Ele chamara por eles, mas nenhum deles respondera.

Oliver soltara um suspiro, Julian o chamou, mas ele não respondeu. O garoto soltara mais um suspiro, mas dessa vez fora seguido por um grito.

— NÃO! ISSO É MENTIRA. NÃO É POSSÍVEL! — disse Oliver ofegante, como se estivesse fugindo de algo.

Sem saber o que fazer, ele voltara a ler seu livro na falsa esperança de entender o que era aquilo.

— ME DEIXE — Alice gritou com uma voz fina e chorosa. — NÃO! DEIXE-ME EM PAZ. VOCÊS DEVERIAM ME AMAR! — Os gritos estavam cada vez mais assustadores.

Passaram-se minutos e ele não sabia o que estava acontecendo e nenhum dos quatros havia voltado à lucidez.

Antony e Matt também começaram a gritar.

Julian ficou preocupado, algum policial ou segurança poderia aparecer pra verificar os motivos dos gritos.

Alice dera um grito cansado, como se estivesse sem ar.

Julian concentrou mais uma vez no livro e tentou ignorar os gritos que estavam cada vez mais frequentes.

As folhas das árvores começaram a balançar para todas as direções. Algo parecia estar dando errado.

Julian olhara rapidamente para o círculo e voltara para o livro.

Uma luz forte brilhou no círculo. Era Oliver, ele conseguiu sair do transe. Ele estava suando frio e tremia como nunca. Ele deitara sobre a grama pra retomar o folego e então uma capsula da cor do mar o envolvera. Duas aegishjalmur prateadas giravam em sintonia na órbita da capsula fazendo seu papel de proteção.

O garoto estava sonolento. Ele desejara que aquilo acabasse logo.

Não demorara muito e Alice rastejara para trás conseguindo sair do transe. Uma capsula verde te envolveu com as mesmas runas de proteção em sua órbita. Ela começara a chorar quando percebera que voltara a realidade. Suas bochechas queimavam na medida que ela chorava.

— O que você viu Azeitona? — A menina disse pro amigo.

— Eu — ele pausou lembrando-se da cena horrível que vira. — Eu estava sendo humilhado na frente de todos meus amigos. Foi horrível.

— Eu vi meus pais — a menina soluçou — eles me diziam coisas horríveis, que eu era o peso da vida deles e até que eu era o maior erro que já cometeram.

Antes que pudessem continuar a conversa, Matt se libertou da alucinação.

— Puta merda. — ele disse enquanto a capsula amarela o envolvera. — Todos me acusavam por ter matado o Marcos, não foi minha culpa dele ter suicidado. Não foi! Eu, eu sinto muito por ele. Vocês também viram algo?

Os dois amigos concordaram com a cabeça e não disseram nada.

Alguns minutos já haviam se passado. Oliver, Matt, Julian e Alice não haviam trocado nenhuma palavra. Eles olhavam apreensivos Antony a gritar cada vez mais. Eles temiam que ele não conseguisse se libertar da alucinação criada pelos espíritos e ficasse preso eternamente em seu pior tormento.

Alice se lembrara da última vez que pedira a Terra pra dar forças ao amigo e funcionou. Esperançosa, ela torcera pra que aquilo desse certo agora.

Ela fizera sua prece a deusa e ao seu elemento e então colocara a mão na grama aonde estava sentada. Se sentia conectada ao solo daquele bosque. A garota sentia se forte como nunca, mas fora inútil, Antony ainda não havia se libertado.

— O que vamos fazer Julian? E se ele não conseguir sair sozinho? — disse Alice quase chorando, novamente.

— Se ele não conseguir se libertar em mais alguns minutos, seu corpo incendiará e os espíritos ficarão torturando sua alma para sempre.

— Como você teve a terrível ideia de fazer isso conosco? — gritou Matt irritado.

— Era isso ou continuar sendo reprimidos e delegados pelo Tommy — Oliver parecia conformado.

— E a gente já tem nossos novos poderes então?

— Ainda não. — cuspiu Julian. — Ainda falta um teste.

Matt já iria reclamar, queria abrir mão dos novos dons, quando uma luz fraca deixou suas visões embaçadas.

Depois de alguns segundos eles conseguiram avistar uma capsula vermelha com um garoto desmaiado dentro.

Oliver soltara um suspiro aliviado e então se pusera de pé. Ele encostara a mão na capsula e ela desfizera em água se espalhando pelo chão. O garoto correra em direção a Antony, ficara com medo de encostar-se à capsula e então hesitou. Alice e Matt fizeram o mesmo que o amigo e suas capsulas viraram folhas e uma corrente de ar quente. Eles deram as mãos e juntos fizeram a capsula de proteção de seu amigo se incendiar até sumir.

O garoto soltara a mão dos dois amigos e ajoelhara perto de Antony e tentara o acordar com alguns tapas na face, mas fora inútil.

Ele se pusera de pé novamente sem saber o que estava acontecendo e então olhou pra Julian que estava um pouco longe dos quatros.

Ele começara a falar algo, mas então escutara a tosse seca do seu amigo acordando e recuperando o folego.

Antony estava tremulo e não disse nada.

Oliver o ajudou a levantar e então Alice lhe deu um abraço e em seguida voltou pra seu lugar no círculo.

E então um brilho lilás prateado surgiu das chamas da vela negra. Os guardiões soltaram as mãos, pararam de dançar e foram desesperados para perto de seus senhores. Uma sensação de paz preencheu todos, até Julian que não estava no círculo invocado.

— Não pode ser. — Julian ajoelhou cerrando o punho sobre o coração.

Sem saber o que fazer, os quatros fizeram o mesmo.

E então daquela forma luminescente três mulheres com aparência humanoide surgiram.

A do meio deu um sorriso e então os cinco começaram a ouvir uma voz serena e ríspida a falar.

— Meus filhos amados, vocês, bruxos, veem fazendo esses rituais profanos para despertar seus dons há tanto tempo... — a voz da mulher parecia estar triste — quantos filhos eu já perdi ao tentarem realizar esse ritual perigoso?

As três mulheres começaram a caminhar do leste com sentido horário analisado os rostos dos quatro jovens bruxos que olhavam admirados a beleza das três senhoras.

— Isso é uma tremenda mentira! Os espíritos inventaram esse ritual para se divertirem com as energias de vocês.

— Então — Disse Matt com a voz tremula — fizemos tudo isso atoa? O ritual não funciona?

A moça da direita o encarou, fechou os olhos e então sua voz surgira na mente dos garotos.

— Só servem pra te deixar mais unidos e aumentar a confiança um nos outros, mas não te dão nenhum poder mágico.

A primeira voz surgira novamente.

— Houve uma época que muitos bruxos e bruxas vivam pela terra. Todos sabiam de todas as formas de magia e feitiçaria. Era algo compartilhado pelas gerações dos bruxos, mas em uma determinada era, seus antepassados começaram a serem perseguidos por várias ordens até que vossa cultura fora quase extinta. Os poucos bruxos e bruxas que conseguiram fugir, não foram capazes de passar a diante todos os mistérios desse dom perigoso que vós possuístes.

Todos escutavam apreensivos, eles não conseguiam crer que a soberana deusa Tríplice aparecera pra eles.

A voz da direita passou a mão pelo cabelo e uma voz séria entrou na mente dos bruxos.

— Vós não entendeis ainda? Vós sois bruxos, nascestes com os dons que esse ritual prometera vos dar. Só não sobestes como usardes ainda, pois acreditares que a magia elemental sedes seu único dom.

— Então, o dom que desejamos está dentro de nós? — Alice estava indignada.

— Sim minha querida, basta se dedicar. — A voz da esquerda disse.

— Os bruxos mais poderosos da humanidade só se tornaram o que eram, porque tiveram dedicação a cima de tudo. — As três vozes disseram e então pararam de andar ao completar a sexta volta sobre o círculo.

— Quais os nossos dons? — Disse Antony saudando a deusa.

Um cheiro de erva cidreira possuíra o ar. A deusa tríplice deu as mãos as suas faces e então com um sorriso gentil disse para os garotos.

— Eu não os carreguei no colo, não os impedirei, nem os privarei de ter as mesmas oportunidades que são dadas aos meus outros filhos. Vocês são livres e não devem ser carregados no colo como um bebê. Se vocês estiverem dentro de sua devoção e desejos verdadeiros, todos os obstáculos, serão então, superados! Seu coração lhe mostrará seus dons.

E então as três mulheres correram mais uma vez pelo círculo e quando chegaram ao norte desapareceram e os cincos caíram desacordados.

O círculo se desfizera.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Imperfeitos" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.