Os dias foram se passando. Todos os engenheiros faziam suas partes do projeto e estavam ansiosos para terminarem e montar logo o protótipo. Richard estava sempre supervisionando, pois o trabalho era um dos maiores de sua vida. Tudo tinha de sair perfeito. Se o protótipo funcionasse como esperado, seria um grande passo para a Austin Security. A empresa ganharia, além de lucro, muito prestígio, e a marca Austin Security seria renomada. O futuro dos engenheiros seria brilhante com a construção daquele importante chip.

Era de noite. Um grande amigo de Hannah, David Summer, pianista famoso, telefonou para ela. Ele a amava muito, mas já perdera as esperanças, sendo apenas um bom amigo. Ele era louco por Caroline, gostaria de ser pai dela, mas já entendia que era algo impossível.

— Gostaria de sair comigo, Hannah? Eu queria te levar ao restaurante mais novo da cidade, que está fazendo muito sucesso. Lá tem música ao vivo e servem uma lagosta que é uma delícia. Irei acompanhado por um casal de amigos, e fica ruim não ter uma companhia. Se quiser pode levar Caroline. Estou com saudades dela.

— Ela já está dormindo, Davie. Se estivesse acordada já teria tomado o telefone de minha mão. Esse restaurante pede roupa informal ou elegante?

— Extremamente elegante. Por que acha que eu a chamei? Você é a mulher mais elegante que conheço.

— Pare de me elogiar, seu galanteador! A que horas devo estar pronta?

 — Às nove e meia. Vou pegar meus amigos na porta do Austin Latino Theater Alliance.

— Está certo. Até logo.

— Até.

Quando David entrou no apartamento de Hannah, quase perdeu o fôlego. Ela estava muito bonita e elegante. No corpo, um longo vestido de seda preta decotado no busto marcava suas curvas sexy e voluptuosas. Uma corrente com pingente de brilhantes e opalas e os brincos que faziam conjunto eram as únicas joias que ela usava. Os cabelos, como sempre, estavam presos num elegante coque.

— Você está divina, Hannah! Uma sereia com o rosto de um anjo...

— Lá vem você me galantear de novo... Hum, você está lindo! Nunca o vi tão charmoso e elegante, Davie.

David era muito alto, musculoso, mas com ossatura longa que o deixava, além de delicioso, elegante, e tinha sensuais traços que lembravam sua ascendência indígena, como pele cor de cobre, lábios carnudos, maçãs do rosto altas, testa larga, olhos amendoados e cabelos longos, lisos e negros.

— Eu tinha que ficar à sua altura, querida. Vamos logo, já estamos atrasados. Meus amigos devem estar nos esperando. Ah, tenho que dar um beijo em Caroline!

— Mas você não está atrasado?

— Estou, mas esse atraso é por um bom motivo.

Ele foi ao quarto da criança e, com cuidado para não acordá-la, beijou-lhe as faces.

Rodaram um pouco pelas avenidas agitadas do centro de Austin e pararam em frente ao Austin Latino Theater Alliance. O espetáculo, pela quantidade de pessoas que havia na entrada, tinha acabado havia pouco tempo. Enquanto Hannah olhava como estava sua maquiagem no espelho do carro, David saiu e foi se encontrar com seus amigos.

Os três entraram no carro e só então Hannah, com um sorriso, virou-se para cumprimentá-los. No mesmo instante o sorriso sumiu de seus lábios. Não! Essas coincidências só aconteciam com ela!

— Olá, Richard — cumprimentou Hannah friamente.

— Oi, Hannah — ele respondeu no mesmo tom.

— Ora, vocês já se conhecem? — perguntou David.

— Sim — eles responderam ao mesmo tempo.

— Mas acho que você não conhece a Karen Smith, Hannah.

— Não tive o prazer. Como vai, Karen?

— Vou bem, e você?

— Bem, também, obrigada.

Durante o percurso até o restaurante, conversaram amigavelmente. Foi quando David e Karen souberam que Hannah era engenheira da empresa de Richard e que eles já tinham sido namorados. E Hannah soube que Karen era uma grande cantora.

O restaurante era muito bonito e elegante. As mesas estavam cobertas por toalhas de linho e cetim e possuíam quatro trabalhadas cadeiras com detalhes dourados artisticamente esculpidos. As paredes eram revestidas com painéis de carvalho envernizado e, num pequeno tablado iluminado, um lindo piano de cauda jazia, com um bem vestido pianista tocando lindas músicas acompanhado por uma elegante cantora.

O dono do restaurante e chefe de cozinha, ao saber da presença deles lá, foi pessoalmente cumprimentá-los, com um sorriso cortês, e falou:

— Boa noite, Sr. Summer. Como vai?

— Bem, Sr. Gaston. Hoje eu trouxe três amigos.

Após as apresentações, foram encaminhados para uma mesa muito bonita num lugar privilegiado, onde a acústica era muito boa. Pouco tempo depois um máitre apareceu com uma carta de excelentes vinhos. Acabaram optando por Opus One como aperitivo, Brunello de Montalcino com o prato de entrada e Château D’Yquem acompanhando o prato principal.

O jantar, apesar de estar acompanhado por um pouco de tensão para Hannah, estava maravilhoso. A comida e a bebida eram excelentes, para não dizer a música e o serviço eficiente, fora a ótima companhia. Todos eram pessoas gentis e cultas, e a conversa era muito boa.

Num dado momento, Richard convidou Karen para dançar. Hannah e David ficaram sozinhos na mesa. Corroendo-se de ciúmes, ela quase quebrou uma taça de tanto que apertou a haste. David percebeu. Olhou para o casal que dançava e depois para ela.

— Ele não sabe que Caroline é filha dele, não é, Hannah?

Hannah empalideceu.

— Como... como você soube?

— Basta olhar para os dois, Hannah. Caroline é a cópia fiel de Richard.

— Não conte a ele, Davie! Por favor!

— Fique despreocupada.  Não é de minha conta. Só acho que eles dois deveriam saber. Imagine como Caroline gostaria de ter um pai.

— Mas quando namorávamos, Richard não queria filhos. Ele disse que, se alguma mulher engravidasse dele, ele insistiria em que ela fizesse um aborto. E isso eu não fiz e não farei nunca!

— Agora sei que Richard é meu rival — ele comentou sorrindo de maneira triste. — Você o ama, Hannah.

— Sim, eu o amo — ela confirmou, suspirando profundamente. — Tanto que chega a doer. Mas... agora já é tarde. Caroline já tem quatro anos.

— Nunca é tarde para a felicidade e o amor, Hannah. Pense nisso. Mas tome um conselho. Se não quiser mesmo que Richard saiba que tem uma filha, não o deixe ver Caroline. Tirando a cor dos olhos, ela é a cópia do pai. E se lembre, sempre tem a mim. Estarei sempre pronto para você, caso me queira algum dia.

Com carinho, David segurou a mão de Hannah. Nesse momento Richard e Karen voltavam à mesa. Mal se sentaram e Gaston apareceu.

— Sr. Summer e Srta. Smith, poderiam nos dar o prazer de uma “canja”? — ele perguntou com um sorriso, usando a gíria. — Seria um grande prazer que vocês tocassem e cantassem em meu estabelecimento.

— É claro, Sr. Gaston! — responderam alegres.

David foi ao piano, Karen, ao microfone, e passaram a cantar uma linda música. Richard e Hannah ficaram, então, a sós, numa situação muito tensa.

— David pegou sua mão, Hannah! O que vocês têm? Se ele voltar a tocá-la na minha frente, eu não respondo por meus atos, está ouvindo?!

— Você não tem nada a ver com a minha vida. Não tenho que responder a nada.

— Deixe ele te tocar, para você ver!

— Richard, pare de agir como uma criança! Já faz cinco anos que não temos nada em comum. Quero viver a minha vida, e que você viva a sua.

Ficaram calados até a música acabar, e, sob aplausos, David e Karen voltaram à mesa.

— Vocês são divinos — disse Hannah.

— Obrigado.

Continuaram a jantar e beberam, no final, café. A conta foi dividida entre os homens, e todos saíram do restaurante. No estacionamento, David perguntou:

— Querem passar em minha casa para tomar um licor e estender a conversa?

Todos concordaram.

Entraram no carro e foram à casa de David, que era bonita e exótica. Hannah já a conhecia muito bem, pois era grande amiga de David. Ela e ele tinham paixão por animais e plantas, e muitas das plantas que enfeitavam a casa eram presentes dela.

Na sala de visitas, todos se acomodaram e beberam licor de damasco enquanto conversavam.

— Davie, você mudou o padrão das plantas dessa sala, não foi? — Hannah perguntou.

— Sim. Acho que já estava há muito tempo sem mudanças.

— Acho que você devia mudar as plantas da sala de estar, também.

— Você já conhecia essa casa antes, Hannah? — perguntou Karen.

— Sim. Eu venho muito aqui. Davie é meu melhor amigo e ambos temos paixão por plantas.

O telefone de David, de repente, começou a tocar.

— Com licença — ele falou, e foi atender em outra sala. Quando voltou, estava nervoso.

— Meu pai foi internado. Talvez precise fazer uma operação de apêndice. Tenho que ir ficar com meus parentes. Richard, você pode me levar ao hospital, depois levar as garotas para casa e ficar com meu carro até amanhã?

— É claro, David.

— Davie, vou ficar com você no hospital — disse Hannah. — o Sr. Summer está muito mal?

— Não sei. Mas é melhor você ir para sua casa. Você sabe do que estou falando. Claire, minha irmã, estará lá, não se preocupe.

Ela entendeu que ele queria que ela ficasse com Caroline.

— Está certo.