A Beautiful Mess escrita por Danendy


Capítulo 2
Capítulo II – Uma caminhada


Notas iniciais do capítulo

Mais um capítulos. Confesso que não é dos melhores, mas é preciso desenvolver a história. Espero que gostem.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/321613/chapter/2

Eu poderia jurar que Johanna pegaria uma faca na cozinha e cortaria Haymitch em pedacinhos a qualquer momento, durante o processo de levá-lo para o banheiro arrastado e tirar suas roupas. Ela chegara pouco depois de eu lhe enviar uma mensagem, quando eu já havia arrastado o corpo inerte de seu pai até a porta, com toda a coragem que consegui reunir — ele era um homem grande e pesado, exatamente o oposto de mim.

Enquanto o colocávamos embaixo do chuveiro, Haymitch despertou desnorteado e olhou para nós duas, deixando a água cair por seu corpo. Ele se sentou no chão, resmungando algo, e nós o largamos devagar, temendo que ele cedesse ao peso do seu corpo e caísse de cara no piso.

Olhei para Johanna, e notei que sua fúria parecia enfraquecer enquanto ela assistia a água cair sobre um homem tão bêbado que nem se importava com a nudez a que estava exposto. Desligamos o chuveiro e o levantamos. Johanna o enrolou em uma toalha enquanto eu o mantinha apoiado na parede e em mim.

Subimos a escada com cuidado para não deixá-lo cair e ignorando todas as frases sem nexo que dizia, abrimos a porta de seu quarto e o deitamos sobre a cama. Johanna deu meia-volta e saiu do quarto. Eu a segui.

— Não dá mais pra mim, Katniss. — Ela me disse assim que fechei a porta atrás de mim. — Quando ele ficar um pouco sóbrio, eu não vou dar escolha a ele! Ou ele para, ou ele para, simples assim. Nem você, nem eu merecemos isso.

Johanna parecia determinada e a fúria tinha voltado a ela. Seus olhos estavam úmidos, o que me preocupou. Ela estava mesmo cansada daquilo, de ter dias bons em que chegávamos perto de ser uma família, e dias em que tínhamos que arrastá-lo pela casa, dar banho nele e limpar seu vômito na varanda.

— E o que acontece se ele não aceitar? — Eu perguntei.

— Eu o interno. — Respondeu Johanna, com muita convicção. — Eu andei lendo sobre clínicas de reabilitação. Não me importa quanto vai custar, ou quanto tempo ele vai ficar lá, se ele não quiser por bem, por mal não será uma opção. — Ela jogou a franja para trás e suspirou. — Bem, tome um banho. Eu vou preparar o jantar.

Não discuti com Johanna. Adentrei meu quarto e me joguei sobre a cama. Estava preocupada com o que iria acontecer. O mais provável era que Haymitch acabasse numa clínica de reabilitação e por mais que concordasse com sua filha, achava que ele não merecia ser trancafiado e forçado à abstinência. Nem todo mundo sabe lidar com a dor ou com os problemas, a bebida era a válvula de escape de Haymitch. Eu também tinha a minha, que era fingir que nada acontecera. Ignorar o passado e os pesadelos.

Cerrei os olhos e tentei não pensar em nada. Eu gostava do vazio, do nada na minha cabeça. Ignorar tudo, todos os problemas, todas as coisas difíceis, até mesmo as coisas fáceis. Tudo esquecido por alguns segundos antes que eu pensasse em algo e todo o alívio por não ter preocupações se esvaísse.

-X-

Após tomar banho e vestir alguma roupa, eu desci as escadas e segui para a cozinha, onde costumávamos jantar, e antes de adentrar, eu ouvi Johanna falando com alguém. Levei alguns segundos para perceber que estava ao telefone e imediatamente parei onde estava.

— Não, ele está bem… Nós estamos bem. — Ela afirmou para a pessoa na linha, e após uma longa pausa disse baixinho: — Eu sinto sua falta.

Então eu soube com quem ela falava, e resolvi adentrar o recinto antes que aquilo se estendesse. Johanna assim que me viu, se despediu, desligou o celular e pôs sobre a mesa.

— Haymitch ainda está no quarto? — Ela me perguntou sem jeito, como alguém que acabara de ser apanhado fazendo algo que não deveria.

— Aham. — Respondi. — Ele não vai levantar tão cedo, acho… O que fez para o jantar?

— Bolo de carne. — Disse enquanto colocava a luva e retirava uma travessa do forno colocando sobre a mesa.

— Parece bom. — Suspirei sentindo o aroma. — Deveria me ensinar a cozinhar tão bem assim.

— É um dom, não dá pra ensinar. — Johanna piscou e sorriu. — Mas o fim de semana está chegando, pode aprimorar seus dotes culinários e domésticos enquanto eu me esparramo no sofá.

Quando Johanna concluiu o ensino médio dois anos atrás, nós fizemos um trato. Ela cozinhava e cuidava das atividades domésticas durante a semana, para que eu pudesse me focar no estudo, mas durante os fins de semana em que eu não tivesse trabalhos escolares ou coisas do tipo, o papel de gata borralheira era meu.

Não falamos enquanto comíamos, porém assim que acabamos e retiramos a louça, eu não resisti em perguntar:

 — Era Finnick ao telefone, não era?

O prato que Johanna começava a lavar quase se quebrou quando ela o deixou escapar e cair na pia. Sua tez ficou pálida e fez-se um silêncio que só confirmou minhas dúvidas.

— Eu liguei para ele hoje de manhã. — Começou, numa voz baixa. — Estava preocupada com Haymitch, pedi a ele que ficasse atento a qualquer coisa.

— Foi só por isso que ligou, Johanna?

— Você deveria parar de escutar as conversas alheias. — Ela disse ríspida.

Então eu fiquei quieta e voltamos a nos concentrar em lavar a louça e limpar a cozinha.

— Desculpe. — Ela murmurou ao se sentar a mesa quando terminamos. — É só que já basta aquelas senhoras idiotas praticamente me apedrejarem na rua, não quero que você me julgue também, Kat. — E os cantos da sua boca se moveram num sorriso tímido.

Eu sorri para ela, para que soubesse que estava tudo bem. Eu só me preocupava com Johanna. Ela era o mais perto de uma família que eu tinha tido nos últimos anos. Era como ter uma irmã mais velha, que cuidava de mim. Mas, às vezes, eu também tinha que cuidar dela. Finnick Odair era a maior razão para isso.

Finnick era cinco anos mais velho que Johanna e também era casado. Quando concluiu o ensino médio, teve de desposar a namorada, Annie, porque ela estava grávida, então, em vez de ir para a faculdade, como a maioria de seus colegas, ele ficou aqui, foi para a academia de polícia e se tornou membro da guarda de Panem. Infelizmente, o bebê que Annie esperava não nasceu com vida. Ainda assim, eles não se separaram, na verdade, segundo Johanna, o rapaz não teve coragem de fazer isso com a esposa abalada. E então, eis que os dois, Johanna e Finnick, se aproximaram com os desaparecimentos de Haymitch e começaram um caso.

Talvez seja o fato de que Johanna não teve muitos bons exemplos de homens na vida, ou não teve o amor de pai que deveria ter tido, mas alguma coisa a levava a gostar de cretinos. Na época da escola, ela costumava sair com uns imbecis que me faziam torcer o nariz, embora nenhum deles fosse pior do que o atual. Até, porque, nenhum deles a fizera ficar difamada em toda a cidade. Porque é, claro, não demorou muito tempo para que o caso se tornasse público. O mais incrível, é que Annie não pareceu se importar. Era como se não visse Johanna como uma ameaça, o que deixava a mesma prestes a um ataque de nervos.

Sinceramente, eu não entendia esse triângulo amoroso deles. Aliás, eu não entendia pessoas apaixonadas. Elas pareciam funcionar de uma forma totalmente diferente das pessoas normais. Aguentavam cada coisa por um único momento juntos.

— Bem… — Eu disse. — Vou dar uma caminhada, levarei o celular, mas não se preocupe, só vou até o parque. Ainda são sete e meia. Tente não matar o Haymitch, ok?

Johanna prometeu tentar. Então, eu peguei meu celular e saí. Precisava espairecer, depois do dia que tive. Além disso, as imagens do meu sonho começavam a voltar a minha cabeça, e eu já não sabia o que fazer. Parecia que a qualquer momento, as vozes encheriam meus ouvidos. Meus olhos começavam a ficar marejados. Eu detestava esses dias em que a depressão era o imã e eu o metal.

Cheguei ao parque do outro lado do nosso bairro em poucos minutos. Gostava de dar voltas ali à noite. Não tinha muita gente, e mesmo que fosse considerado perigoso por isso, nunca me parecera. Era acolhedor, com sua pouca iluminação, suas árvores altas e seu silêncio.

Eu caminhei ao redor, tentando encontrar o lugar mais isolado e olhando para os meus próprios pés, para que ninguém notasse que eu estava prestes a ruir em lágrimas. E então finalmente me sentei em um banco. Só aí eu percebi que tinha alguém ali também. Olhei para a pessoa ao meu lado e notei que me encarava curioso também. Sorri sem jeito quando vi seus olhos azuis familiares.

— Então, primeiro me manda desenhos e poesia e depois me segue? — Eu brinquei.

Peeta franziu o cenho e se voltou para o caderno de desenhos que segurava com uma das mãos. Com a outra ele segurava um lápis. Então esse era um refúgio para ele também? Notei ainda, que ele usava fones de ouvido.

— Posso? — Perguntei apontando para uma de suas orelhas.

Ele assentiu, e eu puxei o fone para mim. Gostei da música que tocava, demorei um tempo para perceber que a conhecia. Peeta voltou a desenhar, eu fiquei observando como sua mão trabalhava para formar os traços, que com o tempo tomavam a forma de um prédio alto e iluminado que se via sobre as árvores. Ele desenhava com perfeição. Involuntariamente, eu comecei a cantarolar a canção em nossos ouvidos. Sua atenção se voltou para mim.

— And in my dreams we’re still screaming…

Ele sorriu fascinado, como se fosse eu que nunca dissesse nada. Eu o encarei de cenho franzido, curiosa.

— Tem uma voz bonita. — Ele falou, e eu gostei de sua voz. Não era como se não a tivesse ouvido nunca. Mas ela sempre era baixa, para algumas perguntas ao professor. Ele nunca tinha falado diretamente comigo. Muito menos, me elogiado.

— Você também. — Eu disse para provocar. — Deveria falar mais.

E ele se centrou novamente no desenho, acho que ficou desconcertado com o que eu disse.

— Eu gostei do desenho. — Falei, e tive de volta sua atenção. — Não só desse. Do outro também. O poema também é legal, um dos meus favoritos. — Ele quase sorriu. — Mas por que os deu pra mim?

Ele ficou quieto por um minuto e fechou o caderno de desenho. Recolheu seus fones. Eu imaginei que ele fosse se levantar e me deixar ali, mas ele suspirou e se voltou para mim.

— Eu não consigo agir sem parecer um idiota na sua frente, já percebeu? — Ele encarava o gramado do parque, ao invés dos meus olhos. — Eu dei para você, por que… por que… — Ele parecia que ia perder o fôlego a qualquer momento. — Eu não consigo falar com você, sem meio que surtar, entende? — Ele levantou.

— Eu gostei… Sério, foi gentil da sua parte. — Eu segurei seu braço para que ele não fosse. — Obrigada.

— Por nada. — Ele respondeu desviando o olhar.

— Sabe, talvez possamos ser amigos. O que acha? — Eu sugeri e sorri para ele.

— Acho que seria bom. — Disse inspirando.

— Então, seremos amigos. — Eu me levantei também. — Talvez consiga não surtar falando comigo.

— É, talvez — Disse enquanto caminhávamos.

Eu me despedi dele, quando chegamos ao ponto em que eu descia a rua até a minha casa. Olhei o relógio no visor do celular, já passava das nove. Caminhei sem pressa, foi quando notei que ao conversar com Peeta, eu deixara toda aquela angustia de lado.

-X-

Eu corria assustada por entre os cômodos de casa. Ele vinha me pegar. Ele me alcançaria logo. O que eu faria? Onde me esconderia? O cheiro de gás era forte e nauseante. Eu mal conseguia respirar. Ouvi seus passos descendo os degraus da escada. Tinha que ser rápida, ele me pegaria. A janela! Tentei abrir, mas estava emperrada. Algo para quebrar o vidro. A luminária. Com o barulho ele me acharia fácil. Rápido. Algo puxou meu pé enquanto eu tentava escapar. Ele havia me pegado.

— Aonde vai, querida? — Meu pai perguntou.

E então eu gritei e esperneei, mas ele me agarrou e me levou para cima. E de repente toda a casa estava em chamas. E tudo o que podia ser ouvido era a sua risada. A risada ensandecida do meu pai.

-X-


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E aí, o que acharam? Quero saber o que pensam.
Se alguém estiver curioso, a música que a Katniss cantou é The Suburbs do grupo Arcade Fire. Ouçam, é linda. ♥



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Beautiful Mess" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.