As Histórias De Thalia escrita por GiGihh


Capítulo 13
Escolhas de um funturo nem tão distante




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LUKE



Fugimos do hotel o mais rápido possível. Correndo, passamos por viaturas de policiais e de ambulâncias. Não pude deixar de pensar naquele pobre garoto ruivo. Havíamos explorado da gentileza dele e nem ao menos havia me certificado que Campe não o tinha machucado e a raiva, ou melhor, dizendo o ciúme, que eu sentia dele por ter encostado-se a Thalia não justificava o meu erro.

Eu, com esses pensamentos, me sentia acabado. Mas Apolo havia falado da minha mãe e isso, fora ver Thalia com outro, foi a pior sensação que eu tinha experimentado hoje.

Depois de estarmos longe o bastante do hotel, especificamente fora da cidade, começamos a caminhar mais devagar de modo que pude observar o lindo por do sol.

Paramos em uma colina próxima a autoestrada. Thalia respirou fundo, devolvendo á seus pulmões todo o ar que lhes fora roubado durante nossa longa corrida. Ela apreciava o ar fresco do começo de primavera e o lindo por do sol.

Durante um tempo eu deixei de pensar. Nada passava na minha cabeça. Apenas a paisagem, o ar fresco e aquela menina ao meu lado me traziam uma paz que eu nunca tinha experimentado em toda a minha vida. A sensação era incrível.

Mas lembrei das ultimas palavras de Apolo. De como ele dissera que minha mãe sentia a minha falta. Pensar nisso me lembrava do porque de Apolo nos resgatar. Campe. E Campe me lembrava de um jovem ruivo. E tudo isso acabou com toda a minha paz.

Thalia percebeu o que se passava em minha mente. Era incrível a facilidade com que conseguíamos nos entender mesmo sem dizer absolutamente nada.

Ela passou suas mãos delicadas em volta do meu pescoço em um gesto carinhoso, remexendo nos cabelos da minha nuca. Com apenas isso, a paz estava voltando ao meu ser.

– Eu sei o que esta sentindo. Mas você não deve se culpar pelo o que aconteceu no hotel. – eu estava incrédulo. Como ela sabia o que eu estava pensando? Eu ia começar a protestar, dizer que não era isso, mas nos conhecíamos muito bem. – Nem tente negar! Sei que se sente culpado por nem ao menos ter verificado se Pablo estava bem. E... Também sei que Apolo mexeu com a sua cabeça em relação... Em relação a sua mãe.

Pude ver que ela tomava cuidado com as palavras como se não quisesse me ver triste ou com raiva. Por essa razão sorri.

– E eu sei que você se decepcionou com Apolo e com... Com Zeus... Mais uma vez. – Eu respondi, assim como ela, tomando cuidado com as palavras.

Eu a abracei forte. Thalia correspondeu ao abraço da mesma maneira. Ambos tínhamos lagrimas nos olhos. Afinal família e decepções era um assunto muito delicado para nós dois.

– Não se preocupe com isso. Nem com Apolo, nem com Zeus, nem com Pablo ou com a minha mãe! – falei após o abraço com a voz doce.

Thalia esboçou um sorriso e voltou a olhar o horizonte.

Ficamos assim. Alguns segundos fitando o horizonte.

– Podíamos pedir uma carona La embaixo. – Comentei sem pensar muito no assunto.

Ela deu um sorrisinho muito travesso como se eu acabasse de dizer algo terrivelmente perigoso e divertido.

–Vem! – Thalia me chamou enquanto corria colina abaixo.

Eu sorri e corri em sua direção. Thalia era muito rápida. Eu nunca a teria alcançado, mas ela permitia que eu me aproximasse. Ela não previu o que eu faria a seguir. Agarrei a sua cintura e joguei meu corpo por cima do dela de modo que ambos caímos e rolamos na grama.

Quando parei, eu estava em cima de Thalia como tantas vezes antes. A diferença é que agora nenhum de nós dois conseguia parar de rir. Não era algo romântico. Era apenas diversão para dois adolescentes.

– Vamos logo antes que escureça. – Thalia estava se levantando, mas ainda sorria.

Eu não tinha a mínima vontade de sair daquele local tranquilo que me trazia tanta paz. Mas Thalia tinha razão. Não é seguro para semideuses ficar durante muito tempo em um só lugar. Principalmente para Thalia. Ela tinha um cheiro muito mais forte do que de outros semideuses. E durante a noite, no escuro, Hades tinha mais força.

Thalia estendeu a mão para que eu a pegasse. Não recusei sua ajuda.

Terminamos de descer a colina e chegamos ao acostamento da avenida. Estendemos a mão e um carro parou.

O motorista desceu do carro e se aproximou.

Ele usava uma calça jeans, uma camiseta branca e um casaco xadrez. Era um homem de aproximadamente 40 anos. Tinha cabelos e olhos castanhos gentis. Seu rosto expressava claramente preocupação. Afinal não é todo o dia que crianças param para pedir carona.

Esse era o meu pensamento: Quando se é um meio-sangue você aprende a desconfiar de tudo e de todos, principalmente dos bonzinhos.

Thalia sabia perfeitamente bem o que se passava na minha cabeça, de novo, pois se aproximou e sussurrou no meu ouvido.

– Você não pode viver com medo para o resto da sua vida. Faz parte de quem nós somos correr riscos.

Ela pronunciou cada palavra com calma e ternura, mas mesmo assim o motorista não ouviu ou não quis prestar atenção.

– Então, o que crianças fazem no meio da estrada há essa hora? - o homem perguntou com muito interesse.

Eu sabia o que aconteceria a seguir: Thalia teria que contar toda uma história comovente acompanhada de uma interpretação impecável. Eu não era tão bom quanto ela com mentiras ou com atuações, então apenas mexia a cabeça concordando com tudo o que ela dizia.

– Estamos fugindo de casa. – Thalia disse com a voz fraca, como quando falava de sua família.

De todas as coisas que eu esperava ouvir da boca dela, ela escolhe a única alternativa que eu desconsiderava, descartava como imprópria para a situação. Thalia estava contando toda a verdade.

Olhei para ela incrédulo. Como ela tinha a coragem de fazer isso?

– Ora, mas por que estão fugindo de casa? – a cada instante ele parecia mais preocupado e cheio de compaixão.

– Nossos pais nos maltratam muito. Trancam-nos no sótão por dias sem ver a luz do sol, nos batem por diversão, nós mal comemos... Nós não podemos mais viver assim!- Thalia estava com lagrimas nos olhos.

De novo olhei incrédulo para ela. Como ela conseguia mentir tão bem? Eu não tinha resposta.

– Mas por que não foram falar com um policial? – Pronto! Agora eu queria ver como Thalia sairia dessa.

–- Já falamos com um policial... E ele foi encontrado morto no outro dia!- agora as lagrimas rolavam pelo rosto dela.

Impressionante! Ela sempre consegue!

Senti que deveria fazer alguma coisa, ou toda a encenação perfeita estaria estragada por minha causa.

Abracei Thalia, não como um namorado abraçaria, mas como um irmão. Aquilo foi tudo o que precisei fazer. O homem estava se segurando para não chorar.

Thalia virou o rosto como para que ele não visse as lagrimas e sussurrou as palavras que eu teria que dizer para deixar tudo ainda mais realista.

– É por isso que precisamos de alguém que nos leve para o mais longe possível. Eu e minha irmã precisamos chegar a um orfanato distante daqui. Por favor, me ajude a manter minha irmãzinha á salvo! – Eu tinha uma expressão triste em meu rosto – Ela é tudo o que me sobrou! – improvisei com a voz fraca.

Ao olhar para Thalia percebi, apenas com um olhar, que ela havia aprovado minha atuação e principalmente a parte improvisada.

– É claro que vou ajudar! Mas que história comovente! Eu nunca acreditaria... Nunca poderia imaginar... – Ele quase não conseguia formar uma frase.

Ele enxugou uma lagrima e abriu a porta de traz para Thalia. Depois que ela entrou me virei para o homem e dei um sorriso tímido, mas muito agradecido. Entrei no carro e me virei para Thalia.

–Como você consegue? - perguntei totalmente incrédulo.

– Consigo o que? – ela perguntou recuperada da crise de choro.

– Mentir, atuar tão bem! – eu me segurava para não gritar.

– Sinceramente eu não sei. – Thalia teve a coragem de sorrir- E “ela é tudo o que me sobrou”? De onde você tirou isso? Foi Brilhante!

– Eu não sei! – nós dois estávamos nos segurando ao máximo para não rir.

Nós não nos importávamos com as expressões faciais já que os vidros do carro eram todos escuros. Mas nossa conversa não durou muito. O motorista havia retornado ao carro.

– Então crianças estão prontas para ir? – ele perguntou sorrindo

– Estamos sim. – Thalia respondeu com a voz novamente fraca.

Eu não tive muito tempo para me recuperar, e de novo Thalia age com perfeição.

– Não se preocupem crianças. Vou tirar vocês daqui o mais rápido possível.

Ele voltou sua atenção para a estrada e em questão de segundos a paisagem já mudava. Durante horas Thalia e eu ficamos apenas observando a paisagem o quanto era possível.

A noite estrelada estava linda. Quando a lua chegou a seu ponto mais alto, Thalia não conseguiu resistir ao sono e adormeceu em meus braços, com a cabeça apoiada em meu colo. Acariciei seu rosto e brinquei com seus cabelos espalhados por meu colo. Eu levei mais uma boa meia hora para seguir seu exemplo... E me arrepender por isso.

Arrependo-me praticamente todas as noites por ser um semideus. Todos nós temos sonhos terríveis. A questão é que o “sonho” nunca é apenas um “sonho”. São como visões do nosso passado, presente e futuro. Podemos ver nossos amigos e inimigos, deuses e deusas. Nós podemos ir para literalmente qualquer lugar do mundo. E isso às vezes é muito perigoso.

Eu por exemplo, estava em uma espécie de caverna. Um lugar escuro e sombrio, próximo à beira de um abismo profundo sem um fim aparente.

Eu não apenas via, mas também sentia como se fantasmas estivessem ao meu redor sussurrando palavras como “fuja”, “não de ouvidos a ele”, “acorde”. Suas vozes pareciam ecos muito fracos e distantes. Além de todas as palavras eles tentavam me empurrar para o lado oposto do abismo.

Algo naquelas profundezas me puxava para cada vez mais perto.

Algo me chamava.

Eu não sabia o que fazer. Permaneci imóvel sem saber se ia com os fantasmas ou se seguia em frente e via o que tanto me chamava e me queria por perto.

– Luke Castellan, finalmente. Estava esperando por você!- Aquela voz era muito antiga e fria como se nunca tivesse conhecido o calor.

Eu não sabia o que fazer, o que dizer e nem ao menos sabia onde estava. Por essas e outras razões, fiquei surpreso ao perceber que ainda conseguia respirar. Aquele abismo parecia se alimentar dos meus medos, das minhas duvidas, dos meus mais secretos pensamentos. Ele estava sugando todo o ar dos meus pulmões.

– Como assim, estava me esperando? – perguntei com a voz fraca pela falta de ar.

– Ah, você me ajudará em muitas coisas, filhote de deus. É seu destino estar ao meu lado... Posso sentir que é essa a escolha que você fará. - aquela voz parecia cada vez mais fria e sem piedade nenhuma.

Eu estava completamente sem ar. Sentia-me fraco. Cai de joelhos naquele chão pedregoso e pude sentir as pedras cortando minha pele na altura do joelho. Sentia meu sangue quente correndo pela minha pele fria até o chão...

Inesperadamente o ar voltou aos meus pulmões com força. Meus cortes estavam cicatrizando e a força não apenas física, mas moral voltava ao meu ser. Senti-me revigorado como quando... Quando estava com Thalia.

– Argh, a filha de Zeus esta mantendo você conectado a sua preciosa vidinha... Então a garota te protege mesmo sem saber. Ela é a única que pode impedir meus planos... Mas isso não importa. Em breve não haverá mais uma filha de Zeus.

Com esse comentário feliz ele solta uma gargalhada maléfica.

Demorei muito para perceber o significado dessas palavras. Quando finalmente entendi, aquela coisa no abismo me puxava para mais, mais e mais perto... Até que eu caio abismo abaixo.

Acordei sobressaltado e suando frio.

A primeira coisa que reparei ao abrir os olhos foi que Thalia estava em meu colo e dormia tranquilamente, embora estivesse levemente pálida. Uma das minhas mãos repousava no local exato de onde pulsava o coração da minha garota. E uma das mãos de Thalia estava em cima da minha... Ela prendia minha mão ao seu peito como se soubesse que eu precisava de apoio.

Foi então que a ficha caiu.

Thalia havia me resgatado daquele pesadelo apenas com o seu toque delicado e carinhoso. O contraste da sua pele com a minha fez com que meu mundo ficasse mais nítido. Ela havia me deixado mais forte pelo simples fato de seu coração bater.

Acaricie seu rosto suavemente lembrando o medo que sentira há poucos minutos, quando aquela voz havia dito que eu perderia a minha preciosa Thalia. Deixei escaparem algumas lagrimas.

–Não se preocupe rapaz. Vou manter sua irmã e você a salvo. – ouvir a voz gentil e bondosa do motorista me assustou, mas também conseguiu me acalmar um pouquinho.

Um pouco envergonhado enxuguei minhas lagrimas, embora eu soubesse que ele não podia vê-las.

– Muito obrigado, por tudo! – minha voz soou falha, mas um sorriso fraco e verdadeiro se passou pelo meu rosto.

Faltava uma hora para o sol nascer e aos poucos as estrelas já sumiam no céu.

Durante muito tempo fiquei apenas observando Thalia dormir. Afinal ela parecia ter bons sonhos.





THALIA




Eu estava em uma casa bem espaçosa onde três crianças brincavam com vários brinquedos espalhados pelo chão: dois menininhos pequenos e uma menina mais velha com trancinhas douradas nos cabelos.

Reconheci a menina de cara: Era aquela menininha loira de outro sonho.

A garotinha brincava afastada das outras duas crianças e parecia bem infeliz. Reparei que o brinquedo em suas mãos era a estatueta de um deus grego. Ou melhor, dizendo, uma deusa. Eu não a reconheci de cara até...

Desculpe estou fugindo do assunto!

Um dos meninos se aproximou da garotinha para pegar um brinquedo e a mãe o agarrou e o colocou o mais longe possível da menina, lançando um olhar terrível a ela em seguida. O olhar foi percebido pela garota que abaixou a cabeça e deixou escapar uma lagrima triste e solitária.

A mulher se aproximou da garotinha e a ergueu do chão, colocando-a de pé a sua frente. Uma expressão nada amistosa e cheia de fúria claramente visível em seu rosto.

– Fique longe dos meus filhos, aberração! – ela rosnou para a menina e seguiu na direção dos próprios filhos.

Ao contrario do que se possa imaginar, a menina não ficou triste pelo comportamento da madrasta, e sim com uma raiva mais que evidente.

... Então tudo mudou.

Eu estava na rua, de frente para um pequeno sobrado. Não e pergunte como, mas eu sabia que de alguma forma estava na frente da casa da garota loira.

Pela rua eu via carros, motos e pessoas passeando pela noite calma e fresca de primavera. Nenhum deles prestava a menor atenção em mim. Nenhum deles percebia a minha presença. Eu era invisível para todos eles.

Com um calafrio na espinha, percebi que alguém me observava com um grande interesse: uma mulher de longos cabelos negros, como as asas de um corvo, e olhos cinzentos determinados. Ela usava um vestido branco simples e uma rasteirinha cinza nos pés. Pude sentir uma aura forte e poderosa ao seu redor.

– A semelhança é assombrosa! Principalmente os olhos – ela falava mais para si do que para mim.

Eu não tive nenhuma reação. Não queria pensar nas palavras dela. Fiquei imóvel olhando para aquele rosto levemente conhecido.

–Você falou comigo em outro sonho. Pediu que eu protegesse aquela menininha... Mas por que você mesma não protege sua filha? - perguntei ignorando o antigo comentário da deusa.

Durante meio segundo ela pareceu surpresa. Mas tratou de corrigir sua expressão tão rapidamente quanto havia formado. Ela sorriu docemente como se eu tivesse acabado de descobrir que desejos se realizam.

– Foram os olhos, não foi? – ela perguntou ainda sorrindo e eu assenti – Bom Thalia, a essa altura você já deve saber que somos parentes...

– Você é minha irmã, certo? – interrompi a deusa sem me preocupar – mas não sei ao certo que deusa! – confessei

– Sou Atena, Thalia. Mas como soube que sou sua meia- irmã sem saber ao certo quem sou? – a deusa sabia a resposta, mas parecia querer ouvir ela de mim.

– O seu cabelo. É cacheado como as minhas pontas e é igualzinho ao da menininha. – não pude deixa de sorrir

– Muito bom! – Atena sorriu de volta – Você se parece muito com...

– Esta mudando de assunto! – a acusei – Por que você mesma não protege sua filha?

Atena suspirou derrotada.

– Criança, os deuses não podem ter nenhum tipo de contato físico com os sues filhos mortais. Não podemos interferir em suas vidas, mesmo sendo questão de vida ou morte. Podemos apenas ajudar por intermédio de outras pessoas. Isso e nada mais.

Atena pronunciou cada palavra com calma e eu não pude notar nenhuma nota de tristeza em sua voz.

Pensei nas duas ocasiões em que havia encontrado meu meio-irmão Apolo. Será que Zeus havia mandado seu filho por não poder estar comigo ou foi Apolo que veio por livre e espontânea vontade?

No fim das contas, Zeus não podia estar comigo mesmo se quisesse.

Isso me confundia muito!

A deusa da sabedoria olhou tristemente para o pequeno sobrado ao nosso lado e por um instante, apenas um instante, essa tristeza se transformou em ódio.

– Minha filha não vai aguentar isso por muito mais tempo. - ela voltou a cravar aqueles olhos cinzentos em mim - Quero que você a proteja.

– Por que eu faria isso? – desafiei a deusa.

Sei o que você deve estar pensando: “Puxa Thalia, desafiar a deusa da sabedoria e estratégia em batalha é muito arriscado. Qual é o seu problema?”. Meu problema são os deuses. Todos egoístas... Mas eu não conseguia acreditar no pedido de Atena!

– Não quer protegê-la? Atena perguntou com a voz tão desafiadora quanto a minha.

Se ela achava que eu ia me intimidar tão fácil assim estava muito enganada.

– Você sabe que não é esse o ponto. – minha voz soou forte e inflexível.

Só de olhar pude ver que Atena conhecia muito bem aquele tom de voz... Mas a surpresa em seu rosto ficou mais que evidente. Ela não esperava isso de mim.

Com a voz um pouco mais doce continuei:

– Porque esta pedindo isso justo a mim? O que eu tenho de tão especial que possa fazer uma deusa me pedir isso?

– Sei que você não gosta dos deuses e não posso culpa-la por isso – Atena pronunciou cada palavra com ternura– Acho que você é esperta o suficiente para saber que vocês se parecem muito em um aspecto: seus parentes mortais não se importam com nenhuma de vocês. As duas são órfãs de pais vivos... Vai cuidar dela?

Eu não tinha que pensar no assunto. Eu sabia antes mesmo de Atena explicar, que ela se parecia muito comigo. Eu não podia deixa-la.

– É claro que eu vou! – minha voz saiu doce, calma e levemente baixa - Eu nunca poderia deixa-la!

Atena estava radiante. Um sorriso extremamente grato estampado em seus lábios.

– Esta me fazendo um grande favor, meio-sangue. Como presente lhe darei o dom de sempre fazer a escolha certa. Quando chegar a hora de escolher o seu destino, você fará a escolha que melhor lhe convém ao seu doce coração puro, e acertará.

Dizendo isso Atena se foi em uma explosão de luzes e eu acordei assustada.

Luke estava acordado e pelo visto tinha tido sonhos horríveis. Mais horríveis que os meus. Mais sombrios que os meus.

– Esta tudo bem? – ele me perguntou preocupado. Ele estava pálido e com olheiras.

– Eu acho que sim. – respondi meio em duvida sobre tudo o que havia acontecido – Onde estamos? – perguntei olhando a minha volta.

O sol estava nascendo, de modo que o céu tinha um toque cor de rosa. No horizonte eu conseguia ver apenas campinas muito verdes. Aves alçavam voo a todo o instante. Resumindo era uma vista muito linda.

– Em um posto na autoestrada. – Luke respondeu com a voz baixa.

Ainda estávamos na estrada, mas não estávamos em movimento. Aos poucos fui notando que estávamos parados em um posto de gasolina. O motorista não estava a bordo.

Estávamos sozinhos. Isso significava que poderíamos conversar sobre o porquê de estarmos tão aflitos com nossos sonhos antes que o motorista voltasse.

– Aonde ele foi? – perguntei a Luke apontando para o banco da frente.

– Foi pagar a conta, eu acho. Teve bons sonhos? – ele perguntou interessado

– Tive sonhos. Mas não sei se eles foram bons. - respondi pensando na ultima fala de Atena. – Mas e você? Com certeza teve sonhos e pelo jeito estão muito longe de serem bons.

Luke baixou a cabeça sem saber se deveria ou não contar para mim. Algo havia o assustado e muito.

– Apenas esqueça ok? – Luke tentou forçar um sorriso, mas não teve sucesso.

– Você sabe que eu não vou esquecer. Não sabe?

Dessa vez ele conseguiu sorrir.

– Sei. Mas, por enquanto, saiba que você me salvou.

– Como assim? – eu estava realmente confusa.

– Thalia... – ele já estava começando a bagunçar o cabelo, o que era um sinal claro de que ele não estava muito confortado com aquela situação.

– Por favor! Você não pode deixar escapar uma coisa dessas e depois calar a boca.

– Você sabe que sempre ganha, não é?- ele perguntou rindo.

Ele se aproximou de mim o colou seus lábios nos meus em um selinho simples, mas apaixonado.

Separei-me dele, e não pude evitar um riso.

–Só de você. Agora chega de me distrair e explica essa história direito.

Ele me lançou um olhar de “um dia eu ainda venço você“ e contou sobre como estivera próximo de um abismo escuro e sombrio. Explicou-me que, de alguma forma, eu havia devolvido o ar aos seus pulmões e devolvido a paz de que ele precisava, apenas com o meu toque. E que só assim ele não perdera a vida.

–Bom, pelo visto eu salvei a sua vida então você me deve algo. – eu disse mordendo o lábio inferior em uma clara provocação.

Ele aceitou a provocação e me puxou para mais perto e aproximou seus lábios dos meus.

– Por que você sempre ganha? – ele sussurrou com um sorriso no rosto.

Eu sorri de volta e para ele essa resposta foi o suficiente. Ele avançou delicadamente em meus lábios em um beijo doce, calmo e rápido.

– Divida paga, eu suponho. – Ele brincou.

–É, mas se houver uma próxima vez vai ter juros. – entrei na brincadeira e nós dois rimos.

Luke me abraçava e eu apoiava minha cabeça em seu ombro. Ficamos assim durante alguns segundos até Luke quebrar o silencio:

– Você não me contou o seu sonho! – ele me acusou com um sorriso muito travesso.

Afastei suas mãos do abraço e olhei em seus olhos.

– Apenas esqueça ok?

Assim que eu disse essas palavras Luke fechou a cara para mim. Confesso que não consegui conter o riso. Assim que a minha crise de riso passou, com uma expressão séria, voltei a encara-lo.

– Você se lembra de que eu te contei sobre uma menininha loira, de outro sonho?- perguntei meio em duvida se ele lembraria.

– Lembro. Aquela semideusa que sofre maus tratos do pai, certo?- ele perguntou interessado querendo saber até onde essa conversa iria dar.

– Bom, a mãe dela queria falar comigo...

– Como assim? – Luke não estava acreditando

Expliquei a ele a minha visão da menina brincando e sendo ameaçada pela madrasta e como a deusa Atena me pedira para proteger aquela criança. Uma sensação estranha percorria todo o meu sangue, como se me dissessem, ou melhor, me advertissem há não contar sobre a recompensa que Atena me dera.

Luke ouviu tudo de boca aberta como se não acreditasse no que ouvia.

– Então sua irmã aparece e sem mais nem menos pede que você cuide de uma menina. - Ele estava despejando as palavras como que para entender melhor o que eu dizia – Você concordou em proteger a garota, não é?

– É claro que eu concordei! – francamente eu não acreditei naquela pergunta.

– Mas por que você concordou? – Luke perguntou como se essa fosse a principal questão a qual eu devia responder.

– Como assim, por quê? Luke aquela menina é como eu. Seu pai e sua madrasta a desprezam, não tanto quanto os meus pais, mas mesmo assim... Ela precisa de uma família; alguém que lhe de apoio... Eu não posso negar isso a ela! – eu tinha lagrimas nos olhos.

– Eu sei disso... Mas a minha preocupação é como vamos acha-la. – Luke acariciou meu rosto como se entendesse todos os meus motivos. – Não podemos chegar e invadir uma casa e simplesmente dizer “ei a deusa grega Atena mandou nós levarmos a garotinha embora para viver nas ruas”.

– Não. Nós não podemos. Atena disse que a garota não aguentaria mais. E também disse que ela se parecia comigo.

–Então você esta deduzindo que ela vai fugir, como você.

–É... E tenho a sensação de que Atena vai guia-la até nós.

– Se é assim... – Luke disse em um tom claramente inflexível, como se não quisesse voltar a falar sobre esse assunto. Ele encostou o rosto na janela e passou a fitar o horizonte.

Com a voz baixa, mas sem chegar a ser um sussurro perguntei:

–Por que você se importou tanto quando disse que Atena precisava da minha ajuda?

– Porque eu achei que ela havia forçado você a fazer algo que não queria. Detesto os deuses... E os detestaria ainda mais se eles estivessem obrigando você a fazer algo contra a sua vontade.

Como ele conseguia ser tão perfeito? Eu não tinha resposta para essa pergunta, mas tão pouco me importava à resposta.

Eu me sentei em seu colo e Luke me olhou um pouco surpreso pela minha inesperada aproximação. Deixei meus dedos se perderem no meio de lindos cabelos dourados. Luke fechou os olhos aproveitando cada uma das minhas carícias. Antes que ele pudesse abrir os olhos novamente, rocei meus lábios nos seus delicadamente, apenas encostando-se a eles sem nem chegar a ser um selinho. Era impressionante o quanto um simples toque nos fazia ansiar por mais. Luke me pediu passagem para sua língua e eu cedi.

Por poucos segundos o beijo permaneceu firme. Era como se o mundo estivesse fugindo de mim aos poucos, mas em uma velocidade impressionante.

Antes que nós dois perdêssemos o controle e bem na hora, eu, usando toda a força que ainda me restava, quebrei o beijo e sai do seu colo. Voltei para o lado de Luke e fiz com que ele passasse o braço em volta dos meus ombros.

Antes que ele pudesse perguntar qualquer coisa o motorista do carro havia retornado.

– Como vocês estão crianças? – ele perguntou sorridente.

–Muito bem, obrigada. – respondi com um sorriso tão sincero quanto o dele

Olhei para Luke e reparei que seu rosto expressava ao mesmo tempo tristeza por eu ter quebrado o beijo, e surpresa por eu ter previsto que o motorista estava chegando.

Como sempre, a minha atuação salva o dia!

–Não precisa se preocupar! Você sabe que foi apenas um sonho. Você não vai me perder tão fácil assim!- Eu pronunciei cada palavra com carinho, como se Luke e eu tivéssemos retornado ao antigo assunto sobre aquela voz sombria que dizia que eu não viveria muito.

Graças aos deuses, Luke entendeu e com uma expressão triste apenas assentiu.

– Bem crianças, vamos parar em uma lanchonete que fica a uns cinco quilômetros daqui. Vamos chegar rapidinho.

Dizendo isso, com a voz falhando, ele começa a dirigir e durante alguns minutos chegamos a uma lanchonete pequena.


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Notas finais do capítulo

Gente por favor, comentem, deem sugestões!!!!!
por favor :)