Saint Seiya: A Rosa Infernal escrita por Nyahnah


Capítulo 9
Vienna e Megaera


Notas iniciais do capítulo

Aviso: existem alguns spoilers do mangá de SS: The Lost Canvas.



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“Tudo o que passei foi graças à outra pessoa. Aquela que, diferente de mim, sentiu o verdadeiro amor, a tristeza e carregou o fardo do patético destino humano.”


Quando abriu os olhos, percebeu que estava de volta ao seu corpo original e vestia sua armadura negra. Ela observou o céu que lembrava um manto machado de sangue e sentiu o fedor de enxofre no ar. As almas vagavam sem rumo pelo Tártaro e, à medida que ela caminhava, sentia-se deslocada, com se não pertencesse àquele lugar. Enfim chegou ao templo do escriba que se levantou numa reverência assustada.




— Vejo que vossa malevolência retornou ao Submundo. – Disse Lune, ajoelhado. Ele parecia suar frio com a presença assustadora dela.




Ela não disse nada, puxou uma espada japonesa que estava presa às suas costas e observou seu rosto pelo reflexo da lâmina prateada. Seus olhos arregalaram e ela pareceu não se reconhecer. Ela fitava atentamente cada detalhe de seu rosto pálido como o mármore; os olhos verdes como esmeraldas e, o que mais a assustou, as madeixas castanhas. O espectro, incomodado com aquela situação, levantou-se e perguntou:


— Algo errado?

Ela enfim proferiu suas primeiras palavras.

— Vienna. – Disse ela guardando a espada.

— Como?

— Ela acabou de morrer. Eu quero os registros de Vienna. – Ordenou, mal-humorada.

Lune a observou com dúvidas e então se dirigiu à sua mesa onde havia um livro com páginas em branco e um pergaminho. Seus olhos percorreram toda a extensão do pergaminho.

— Então? – Perguntou impaciente.

— Não existem registros de nenhum humano com o nome Vienna. – Disse ele calmamente.

— Não é possível! – Exclamou e arrancou, incrédula, o pergaminho das mãos dele e leu os nomes. Era verdade, não havia ninguém com o nome Vienna. Ela se dirigiu para fora do templo do escriba e voou solitária pelo Submundo até que chegou à cachoeira de sangue. Sentou-se em uma rocha e observou o rio de sangue que corria violentamente.

Perdida em pensamentos, ela sentiu uma presença, mas a ignorou. Ela tinha consciência de que esse ser não a faria mal e talvez estivesse ali apenas por curiosidade.

“Curiosidade”. Essa palavra ecoou por sua mente e ela passou a se perguntar se as atitudes que tinha tomado eram realmente certas. Ela fechou os olhos e se deparou, em sua mente, com uma solitária garota de cabelos negros, sentada ao lado de um grilhão. Então os abriu instintivamente ao sentir uma dor terrível abaixo da costela.

— Não pode me culpar. – Ela sussurrou. Em sua mente as palavras surgiam de outra forma.

“Egoísta! Roubou meu último suspiro!” As palavras soavam como acusação, mas eram proferidas por uma voz doce como mel.

Ela contemplou a cachoeira de sangue no ponto onde sentira a presença misteriosa e então, puxando uma espada de corte duplo e lâmina negra, saltou com um sorriso selvagem nos lábios. Várias almas ficaram vermelhas apenas por se aproximarem dela.

Megaera finalmente retornara à sua função como deusa erínia da Vingança e estava sedenta pelo sangue dos pecadores. Várias vezes, a voz doce da garota que residia em seu coração ecoava por sua mente, acusando-a de crimes que ela acreditava jamais ter cometido. E, para afugentar a garota, Megaera torturava os criminosos do Submundo com o maior deleite.

Fugir era a melhor opção.


Um bom tempo se passou e Megaera teve de encarar os seus demônios no momento em que a alma de uma pessoa conhecida cruzou o seu caminho. Ela hesitou involuntariamente e sentiu seu rosto arder. Seu coração acelerou e a tristeza tomou conta de seu ser.




— O que há? Todos morrem. – Murmurou sombriamente.




Tisífone e Alecto que se divertiam com o sofrimento de alguns cavaleiros de prata e bronze recém-mortos desviaram sua atenção para Megaera. Elas se entreolharam e Tisífone até pensou em perguntar se a irmã caçula estava bem, mas nenhuma das duas quis interferir.


— Você sabia que ele viria para cá. E que nós o torturaríamos. – Afirmou ela para si mesma. Seus olhos descansaram na chama azul-pálida do homem que estava a sua frente e então desferiu um corte certeiro na alma de Albafica que se tornou rubra como sangue.

Isso a fez chorar como uma criança.

“VOCÊ NÃO TINHA ESSE DIREITO!” Exclamou a voz na mente da deusa.

Megaera fechou os olhos e viu, a sua frente, a garota de pé, ao lado do grilhão. Ela vestia um vestido branco e seu rosto estava vermelho de raiva.

— Quem você pensa que é para dizer isso? – Perguntou a deusa, desdenhosa. Em sua mente ela trajava um vestido negro.

— Não fale palavras com tanto descaso. Você sabe muito bem quem sou eu! – Anunciou a jovem cerrando os punhos.

Agora estava tudo muito claro. Então era esse o motivo pelo qual não havia registros dela na biblioteca do escriba, afinal ela nasceu da falta de memória de Megaera. Todo o tempo que passou no Santuário, a alegria, a tristeza, o amor e tudo o que aprendeu no mundo dos humanos foi vivido por Vienna.

Assumindo sua postura superior, Megaera mediu a garota com o olhar.

— Não fale como se fosse algo tão importante para você, sombra. – Respondeu a deusa com escárnio.

— Não foi você quem viveu. Você arruinou a minha vida e não sabe de nada!

— Ora, preferia ser manipulada por Thanatos e morta por aqueles que você tanto amava? – A deusa sorriu em sinal de vitória.

— Você não entende mesmo... – Vienna soltou um suspiro amargurado.

Ela se sentou ao lado do grilhão que a impedia de caminhar e olhou para o nada. Megaera a observou sem entender.

— Lembra-se das dores que sentiu?

— E daí? – Indagou a deusa desinteressada.

Vienna sorriu e uma imagem do rosto de Regulus surgiu no ar. Ela tentou tocá-lo, mas seus braços eram muito curtos. Então o admirou com seus olhos marejados.

— Será possível que...

Megaera entendeu onde ela queria chegar com toda essa conversa de egoísmo e injustiça. Afinal, desde que recobrara as memórias, sentia que alguém em seu interior tentava derruba-la a todo custo. Então seriam as dores causadas pela própria Vienna?

— As dores? Era você!?

— O sonho. As lágrimas. Sua decisão. – Disse ela docemente. – E tudo o que você sentiu nas últimas horas.

— Não é possível!

— Eu estava tão triste porque você tinha me descartado que queria que alguém percebesse que aquela não era eu! – Lágrimas rolaram de seus olhos cansados. – Mas você me acorrentou aqui e tudo o que eu quis...

— Cala a boca! – Deu um passo para trás

— Tudo o que eu desejei... – Levantou-se.

— CHEGA! – Megaera tampou os ouvidos com as mãos.

— FOI QUE TODOS TE ODIASSEM! – As lágrimas de Vienna tocaram o chão.

O rosto de Regulus se dissolveu no ar e uma escuridão tomou conta da mente da deusa que ainda tampava os ouvidos. O choro de Vienna ecoou pelo ambiente silencioso onde estavam e Megaera agora tinha noção da dimensão que seus atos alcançaram. Ela jamais pensou que um novo ser nasceria de sua curiosidade e viveria por ela. E o pior: teria consciência própria. Ela abriu novamente os olhos e a imagem de Vienna e Regulus foi apagada de sua mente. Por alguns instantes a erínia fitou a alma de Albafica que se contorcia em dor.

“Não existe como você fugir Megaera.” Sussurrou a voz doce de Vienna em sua mente.

— Sinto dizer, mas se pensa que estou fugindo, você não passa de uma tola existência sem passado, presente ou futuro.

Vienna se calou.

— Alecto, deixo esse para você! – Anunciou Megaera, lançando seu olhar autoritário para a irmã mais velha e voou para longe dali, onde pudesse reorganizar seus pensamentos e, talvez, conhecer melhor Vienna.


Algum tempo depois...




— Talvez você tenha razão. – Admitiu.




Megaera, com um vestido roxo, estava sentada sobre uma rocha e a sua frente estava um vasto oceano. Ao longe, no horizonte, o sol estava a se pôr, formando um espetáculo de cores quentes e frias que se fundiam com os anjos da pintura da Tela Perdida de Hades.


— Você viveu a vida que eu tanto desejei e graças a isso, tenho inestimáveis memórias. – Ela sorriu, mas fez uma breve careta quando sentiu o aroma ferroso de sangue no ar. Uma forte rajada de vento fez com que suas vestes e cabelo esvoaçassem violentamente, mas ela sequer se importou.

Do que a deusa estava falando? Um doce discurso não faria com que Vienna se sentisse melhor.

— Vai tornar isso um monólogo? – Comentou teatralmente. Megaera fechou os olhos e, em sua mente se aproximou de Vienna sentada ao lado do grilhão.

— Estou surpresa. – Disse ela, infeliz.

— Não me diga! – Megaera riu da careta que Vienna fez e então se sentou ao lado dela e do grilhão.

Vienna encarou a deusa nos olhos.

— Você não entende porque estou sorrindo não é? Nem porque me sentei ao seu lado, certo?

Vienna negou com a cabeça. Aquela situação estava ficando cada vez mais estranha.

— Bom, eu quero te agradecer. – Megaera observou a reação cética de Vienna. – E te dar um presente.

— Presente?

— Acredite você vai gostar. – Ela tocou na corrente que prendia a perna de Vienna ao grilhão e a destruiu.

— O que significa isso!? – Vienna se exaltou.

— Você sabe que eu sou uma “casca vazia”. – Ela riu. – Tem algo que quero que você viva por mim, mais uma vez. – Megaera se deitou e observou o nada.

— E o que é? – Indagou curiosa.

— Apenas abra os olhos. – Ela gesticulou com as mãos, abrindo-as a frente de seu rosto.

Vienna abriu os olhos e levou as mãos até a boca em resposta à cena que viu.

Regulus, sem a armadura de Leão, estava com o punho cravado no peito de um espectro cuja armadura lembrava um Wyvern. A diferença de tamanho entre eles era notável e ela percebeu que ele continuava o mesmo de quando o conhecera. Uma luz emanou do peito do espectro e o leonino foi repelido.

Ela observou cada ação de Regulus em silêncio, ouviu o que ele dizia sobre suas aventuras e sentiu um terrível aperto no coração.

“O que está esperando? Vá até ele!”

— Mas... – Sussurrou enquanto via o cavaleiro caminhar e conversar com a armadura de ouro. Então planou, etérea, até o leonino, fazendo com que seu olhar astuto se voltasse para ela.

— Vienna?

— Regulus!

— Você ainda está viva? – Perguntou com um sorriso incrédulo. Seus olhos analisavam cada detalhe do corpo dela, em como seu vestido branco tremulava, seus cabelos se despenteavam com o vento e seus olhos verdes brilhavam.

— É você mesmo! – Exclamou e no segundo seguinte fora envolvida pelos braços do jovem cavaleiro. As lágrimas escorreram por seu rosto pálido e ela o abraçou como se não houvesse amanhã.

— Estou tão feliz que você esteja bem. – Sussurrou ele com um sorriso nos lábios. Ele beijou o topo da cabeça de Vienna e aspirou o perfume adocicado de seus cabelos negros.

Vienna não conseguia falar nada, ainda estava muito encabulada com toda a situação. Ela descansou a cabeça no ombro nu de Regulus, mas em seguida se afastou dele, assustada com o que estava acontecendo.

— O que...? – Ela observava horrorizada.

— Opa! – Exclamou olhando para o próprio corpo que agora se desfazia em luz. – Parece que o meu tempo está acabando...

“Não se esqueça: um dia todos morrem.”

— Mas tinha de ser agora? – Sussurrou Vienna para si mesma.

— O que foi? – Perguntou Regulus que se aproximou novamente e agora segurava as pequenas mãos de Vienna entre as suas.

— É só que... – Começou, os olhos marejados. E então aconteceu: o corpo de Vienna também começou a se desfazer, assustando-a mais ainda. Desta vez, Regulus a puxou para perto, encostando o seu nariz no dela.

— Eu sempre soube que era você. – Murmurou com o sorriso nos lábios. – A partir de agora, estaremos em todo lugar. – Disse sonhador.

Vienna fechou os olhos com pesar e logo os abriu. Então sorriu e apertou as mãos dele.

— Eu te amo tanto.

Regulus riu baixinho, satisfeito com as palavras de Vienna. Ele desejou que tivessem mais tempo para poder conversar, afagar os seus cabelos e persegui-la como caça mais uma vez. Então sussurrou doces palavras de amor ao ouvido dela, que a fez soltar um riso divertido.

Eles se admiraram até que seus corpos etéreos se dissiparam no ar como folhas ao vento.


Megaera se levantou da rocha, satisfeita com o que acabara de presenciar. As quatro asas escarlates se projetaram de suas costas e ela planou sob o céu, em passeio.




— Seja feliz minha tola consciência humana. – Riu a deusa.




— Então você estava aqui! – Alegou a voz firme de Alecto.


— Você disse que não participaria da Guerra Santa, o que faz num lugar desses? – Perguntou a doce e angelical voz de Tsisífone.

Megaera parou e se voltou para as duas irmãs que acabaram de aparecer às suas costas. Elas também não trajavam suas armaduras apenas vestidos e o de Alecto em particular era muito sensual.

— E quem disse a vocês que estou participando dessa guerra? – Perguntou Megaera, cínica. – Vim observar a paisagem.

— Não seria por causa do humano? – Perguntou Alecto cortante.

— Também... – Ela olhou para o horizonte. O sol finalmente se punha e agora o céu era iluminado apenas pelas estrelas distantes.

— Mas parece que o seu problema também se foi. – Riu Tisífone. Ela planou ao lado da irmã caçula.

— Conte-nos como fez? – Indagou Alecto num misto de curiosidade e excitação. – Afinal, ela era uma parte sua!

Megaera riu e, com uma expressão óbvia, disse:

— Se um mágico revelasse todos os seus truques, ele perderia a graça.

As duas deusas se entreolharam.

— Eu sou uma deusa, nada é impossível para mim! – E soltou uma gargalhada deleitosa.

Megaera voou para longe das irmãs, de volta para o Elíseos. Ela pensava em tudo o que aconteceu com ela desde que se questionou sobre os pecados cometidos por humanos aos quais ela torturava. Recordou-se dos momentos que Vienna vivera por ela em sua jornada, dos treinos, do amor, das batalhas, das dores e da própria morte. Ela riu, achava aquilo tudo muito interessante. Talvez, no futuro, se arrependesse de ter concedido a liberdade para sua consciência humana. Agora ela não sentiria mais tristeza, ansiedade, medo ou qualquer outro sentimento humano. Mas... O que era aquilo? Em sua mente ela via como Vienna estava feliz ao lado de Regulus no mundo dos espíritos.

Megaera sorriu. Sentiu seu coração bater mais forte.

— Então isso é alegria.

Sim, o que ela sentia era tão intenso quanto o que sentira em sua vida na Terra. Finalmente Megaera entendeu um pouco sobre como era ser humana.

FIM


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Notas finais do capítulo

Hey pessoal! Finalmente chegamos ao final e é com muita alegria que digo isso! Essa é a primeira estória que concluí em toda a minha jornada de escritora de fanfic.
Agradeço muito a todos os que leram, espero que tenham gostado da história de Megaera e que eu tenha conseguido fazê-los sentir quaisquer tipos de emoções.
Críticas e sugestões, são bem aceitas. n_n!



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