Panem Et Circenses escrita por Giullia Lepiane


Capítulo 9
Notas


Notas iniciais do capítulo

Ufa! Esse capítulo já estava pronto antes mesmo de eu postar o primeiro aqui no Nyah!, mas quando eu ia postar na quarta-feira e reli antes... Caramba, eu me perguntei: "O que é isso?". Rsrs, o reescrevi inteiro. Mas agora ele está pronto, melhorado, e totalmente dedicado à Glommy Haner, que me encanta com seus comentários e me deixou super emocionada com a recomendação. Obrigada!



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Me seguro para não dar um urro de vitória assim que saio do ginásio.

Eu consegui! Desarmei uma bomba-relógio em menos de cinco minutos! Os Idealizadores devem ter ficado impressionados. Ou, talvez, rido depois que eu saí e comentado algo do tipo: “Não podíamos esperar outra coisa de um tributo treinado por Mastt”.

Não importa o que eles achem. Não podem negar que eu fui bem. Ao menos que eu tenha ido mal, e esteja com o ego muito elevado neste exato momento para admitir isso.

Não. Não vou pensar assim. Essa talvez seja a última oportunidade que terei na vida de me vangloriar de algo. Mesmo que eu vá ficar sem saber de minha nota até a noite, quando todos os tributos já tiverem se apresentado e os Idealizadores dos Jogos discutido sobre as notas que cada um merece.

Entro no elevador para o terceiro andar. Esta é a primeira vez em que estou nele sozinha, não posso deixar de constar.

Bem. Acho que a esta altura do campeonato, cada nova experiência deve ser valorizada.

Saindo, vou direto para a sala de estar. Lá encontro Mastt, Chareen, Simary e Kallux fazendo um verdadeiro questionário para Pine sobre o desempenho dele na avaliação. Sei que isto já está durando, no mínimo, uns quinze minutos, desde que ele chegou. Pine não está parecendo exatamente feliz com o desempenho dele, mas claramente não triste. Provavelmente estava parecendo com algum dos dois, no começo, mas agora só aparenta estar meio atordoado com o excesso de perguntas.

Tanto que solta um suspiro de alívio quando eu entro na sala e o foco da atenção de todos vira para mim.

- E aí? – É a primeira pergunta, feita por Mastt.

- Fui bem. – Anuncio, com um sorriso no rosto.

- Só bem? – Esta foi por Simary.

- Talvez ótima. Vamos ter de esperar a noite para saber.

- Você pode ter ido mal. – Kallux diz. Se não o conhecesse, acharia que isso foi para me chatear.

- Tenho certeza de que ela não foi. – Chareen me defende.

- O que você mostrou para eles? – Pergunta Mastt. O único dizendo coisas realmente significativas por aqui.

- Eu desarmei uma bomba.

Todos se calam, e aplausos soam pela sala. O único a não aplaudir é, justamente, Mastt. Mas ele me olha de uma maneira que é melhor que a maior salva de palmas do mundo.

- Que tipo de bomba?

- Relógio.

- Quanto tempo?

- Mais ou menos quatro minutos e meio. – O natural seria eu arredondar isto para “cinco minutos”, mas quero deixá-lo orgulhoso. Nem que seja tirando míseros trinta segundos do número e sendo monotonamente exata.

Desde que fui sorteada na colheita, tive o prazer de ver Mastt sorrindo algumas vezes. Mas nenhum sorriso anterior dele se compara com o que ele dá agora.

- E o que você fez no resto do tempo? – Pergunta Simary.

É como se eu estivesse sobre uma nuvem que repentinamente se desfizesse, proporcionando-me uma dolorosa queda de milhares de metros de altura diretamente ao chão duro.

Como eu não respondo de primeira ela conclui que eu não entendi a pergunta e explica:

- Você ficou lá mais do que quatro minutos e meio. O que fez no resto do tempo?

- Ah, eu encenei uma luta com lanças com um boneco de treino. – Não me sinto disposta para as perguntas. Somente as de Mastt, talvez, mas tenho certa relutância às outras. Nunca gostei muito de ser interrogada. Então me volto para Pine, para mudar de assunto. - E você fez o que?

- Fiz alguns nós. Mas eles mal estavam olhando para mim. Então, fui para a seção de facas e terminei fazendo a apresentação por lá. Os Idealizadores pareceram um pouco mais interessados nesta segunda parte, mas não sei dizer se ficaram interessados de verdade ou só em comparação aos nós.

- No treino você foi bom em ambas as coisas. Vai tirar uma boa nota. – Concluo.

- Bom, já deu para entender que nenhum de vocês foi mal. – Mastt, para nossa sorte, encerra o assunto. – Agora, o que vocês vão fazer na tarde livre de vocês?

Ele falou “tarde livre”? Teremos uma? Depois de tantos dias de correria e com uma emoção após a outra, uma tarde livre me parece algo tão improvável quanto um Sol azul.

Mas até que faz sentido. Cada apresentação dura, em média, quinze minutos, e os tributos não têm permissão de sair de seus respectivos andares enquanto ainda há outros se apresentando. Para os tributos dos últimos distritos isso não quer dizer muita coisa, mas para os dos primeiros, como eu, equivale a um tempo bem significativo.

- Você podia começar a nos dar dicas para os Jogos. – Sugere Pine.

- Podíamos assistir a uma edição anterior dos Jogos. – Falo, mas logo franzo a testa. – Esqueçam. Péssima ideia – Não, não é uma péssima ideia. Podemos absorver alguma coisa assistindo a isso, mas ver vinte e três pessoas sofrendo e morrendo de novo... Sem dúvidas é mais agradável ouvir sobre os Jogos na teoria, com dicas de Mastt, do que na prática, com um vídeo de outra edição.

- Oh! Oh! Se vocês forem assistir, sugiro a 28ª Edição. Foi de longe minha favorita! – Simary se intromete, empolgada. Discretamente arqueio minhas sobrancelhas de uma forma reprovadora, mas a ignoro junto com Pine e Mastt.

Uma pessoa com bom-senso teria reparado que falou algo errado, que para nós vindos de um distrito os Jogos não são a mesma coisa que para eles da Capital, e se desculpado, ou no mínimo teria calado a boca. Mas a pessoa mais próxima de um bom senso que eu conheci desde que cheguei à Capital foi Chareen. Tirando por ela, absolutamente todos se provaram lunáticos. Simary fica vermelha de raiva - ou pelo menos eu imagino que ela tenha ficado vermelha, mas é difícil de saber com toda a maquiagem que ela usa – e sai da sala, irritada por a termos ignorado.

Duvido que os outros distritos tenham uma representante tão temperamental e instável quanto Simary.

- Então, vocês vão querer as dicas? – Mastt pergunta como se nada tivesse acontecido.

- Por favor. – Eu e Pine pedimos em uníssono.

- Ah! Mas vocês nem falaram direito das avaliações. – Chareen lamenta.

- Chareen. – Mastt fala o nome dela e a encara com seriedade. Um segundo de contato visual, e ela entende que as dicas são bem mais importantes.

- Perdoem-me. Prossigam.

- Obrigado. – E ele se volta para nós. – O que querem saber?

Solto um longo e profundo suspiro e me sento confortavelmente numa poltrona bem macia. Estive de pé até agora, mas vou me cansar se ouvir tudo o que ele tem a dizer desse jeito. Tenho certeza de que a sessão de dicas será muito longa. Dicas para se manter vivo em uma arena aleatória são coisas bem complexas.

Passamos a tarde inteira – todas nossas horas livres – ouvindo Mastt. Ele passa algumas informações tão valiosas que lamento não ter em mãos um pedaço de papel e uma caneta para anotar. Registro tudo mentalmente:

“Na Cornucópia, pegar uma mochila com suprimentos é mais importante do que pegar uma arma. Se conseguir pegar ambas as coisas, excelente, mas vocês não podem se demorar muito por lá.”

“Não tenham matar como foco nos Jogos. Deixem a matança para os outros tributos. Foquem principalmente em sobreviver, e só se preocupem em matar quando os Jogos estiverem chegando ao final.”

“Nunca fiquem muito tempo em um mesmo lugar. Mantenham-se sempre em movimento.”

E tantas outras.

Em algum momento durante a tarde, Kallux e Chareen saíram da sala, mas sem chamar a atenção, tanto que eu sequer percebi de primeira a ausência deles. Porém, eles podiam até ter saído gritando e dançando que eu não teria percebido, de tão concentrada. Só noto isto quando Mastt encerra, dizendo:

- Isso é tudo. – Ele boceja. – Se seguirem tudo que eu disse à risca, tudo o mais que vão precisar para vencer é a sorte.

Ele está sendo otimista. Não é a toa que a grande maioria dos vitoriosos são provenientes dos distritos Um, Dois e Quatro. Eles vencem porque treinam desde sempre, não só porque têm ótimos mentores e sorte.

Agora, quanto aos vitoriosos provenientes dos outros distritos... Com eles sim pode ter sido sorte. Ou uma inteligência acima da média.

De uma forma ou de outra, eu aceitaria de bom grado uma dose de sorte.

- Vamos jantar? – Chama Mastt, se levantando.

Olho para o relógio de parede.

- Ainda faltam quinze minutos para o horário do jantar.

- Eu sei. Mas você sabe o quanto Simary é pontual, não é? Se chegarmos quinze minutos adiantados ela vai ficar comovida por termos chegado cedo e ela não ter precisado ir chamar a gente, e a irritação vai se desintegrar. Não fazem ideia do quanto uma Simary irritada é chata. – Pelo tom de cansaço dele, sei que ele já teve de lidar com essa situação dezenas de vezes.

- Ou ela pode ficar ainda mais irritada por termos chegado antes dela. – Pine pondera.

- Não, ela não pensaria assim. – Mastt parece tão certo disso que Pine não discute. – Pode não parecer, mas Simary é extremamente previsível. A imprevisibilidade, quando você se acostuma, acaba sendo previsível.

- Isso não faz muito sentido. – Falo.

- Porque esta é a primeira vez que você vem para a Capital.

Primeira? Como se fossem vir muitas outras vezes. Se eu vencer, é claro que vou ter de voltar à Capital com frequência, mas quais são as probabilidades? 1%? Talvez dois? O lógico seria por volta de 4%, mas estou contando os Carreiristas, que monopolizam mais da metade dos números da porcentagem.

Lembro de quando acordei no dia da colheita – parece que isso foi há uma eternidade, mas na verdade foi só cinco dias atrás – e tentei me acalmar com o pensamento de que minhas probabilidades de ser sorteada não chegavam à 0,1%. E eu fui.

Conclusão: Eu não gosto de estatísticas. E elas tampouco gostam de mim.

Vamos para a sala de jantar. E chegamos quase dez minutos antes de Simary – que quase cai para trás, incrédula, ao entrar no aposento e nos ver. E como Mastt previa, recupera o bom humor. É melhor assim.

O jantar do dia é sopa. Várias grandes panelas de aço estão espalhadas por sobre a mesa de jantar, cada uma cheia até a boca com um sabor de sopa diferente. Todas têm um cheiro e uma aparência ótimos, e fico com água na boca instantaneamente.

Como até me fartar, mas não consigo me concentrar no gosto. Com a proximidade da hora em que as notas irão passar na televisão, é mais difícil para mim me concentrar em qualquer outra coisa.

Voltamos para a sala de estar após a refeição. Nos acomodamos nos confortáveis sofás e poltronas, e Simary liga a TV. As notas ainda não começaram a passar – não perdemos alguma coisa.

Penso nas pessoas que clamavam o meu nome com tanta determinação no dia do desfile. Na minha esperança de algumas delas se tornarem minhas patrocinadoras nos Jogos Vorazes. Se a minha nota for baixa, pode esquecer. Como essas pessoas que me conhecem tão pouco podem ser fãs tão leais a ponto de me patrocinarem mesmo com uma nota desagradável?

Saio desta linha de pensamento. Sem drama. Se eu tirar uma nota baixa, ainda vou poder conquistar o público na entrevista que haverá depois de amanhã, na véspera do início dos Jogos. E eu não devo ter tirado uma nota baixa. Eu desarmei uma bomba.

Se bem que eles ainda podem tirar pontos meus por ter feito algo que tem tanto a ver com o meu mentor, e nada comigo.

 Mas então, e quanto ao momento em que eu joguei minha lança com tanta força no chão para chamar a atenção deles? Isso deve ter mostrado que eu tenho personalidade. Até que ponto será que eles consideraram a minha avaliação?

Só consigo parar esses pensamentos quando as notas começam a passar.

Primeiro, aparece na tela a foto do garoto do Distrito 1, com seu nome – Adlex - escrito embaixo, assim como sua nota.  Ele tirou nove. Esta é uma nota alta, mas não surpreendente para um garoto do Um. Carreiristas sempre conseguem as notas oito, nove ou dez. É normal. Acredito que um dia, até, algum deles irá tirar onze ou doze. Mas por enquanto, essas duas notas nunca foram alcançadas por tributo algum. O máximo é dez.

A garota do distrito dele tira a mesma nota. O garoto e a garota do Distrito 2 tiram, respectivamente, dez e oito.

A foto de Junie, do Dois, é substituída pela de Pine depois de algum tempo. Embaixo a nota – Seis. Ele foi bem mesmo. A média dos tributos não-Carreiristas é cinco. Todos nós lhe sorrimos e parabenizamos pela nota rapidamente, até a imagem dele dar lugar a uma outra. A minha.

Estou sorrindo na foto que está aparecendo na tela. Sorrindo daquela maneira que encantou tantas pessoas no desfile de abertura dos Jogos Vorazes, pura e brilhantemente. Deixo meus pensamentos vaguearem de volta para elas, para a esperança de ter algum patrocínio por parte delas.

Afinal, por que eu não teria? Eu tirei um oito.

Pela segunda vez no dia, recebo aplausos.

- Que tal? – Pergunto para Mastt, com um sorriso.

- Poderia ter sido um nove. – Ele ri ao ver a pequena careta que eu faço depois disso. – Ei, é brincadeira. Um oito é muito bom.

Concordo, e dou uma risadinha. Ele tem razão que poderia ter sido um nove. Mas também tem razão que um oito é muito bom. É bem acima da média do tributo normal.

Assistimos aos outros dezoito tributos recebendo suas notas. Aquela garota do Distrito 4 que está louca para me matar tira nota dez. Mais alta que a minha, mas se considerarmos que ela treinou a vida inteira para os Jogos e eu só tive três dias de treino, nem tanto. O garoto do distrito dela tira a mesma nota que eu.

Também presto atenção às notas dos tributos do Cinco. A garota tira sete, e o garoto, cinco. Ela foi bem, e ele não foi mal. Está bom.

As fotos e as notas dos outros tributos brilham na tela como as de todos os primeiros, mas não estou mais atenta. Não falei e nem interagi de nenhum modo com mais tributo algum, então não me é interessante.          

Quando o programa acaba, Simary desliga a televisão.

- Agora, Edelweiss e Pine, vão dormir. O treinamento pode até ter acabado, mas ainda há chão pela frente. Amanhã, quero ver os dois bem descansados para o ensaio da entrevista!

Amanhã será o penúltimo dia antes da arena. Ainda há chão pela frente.

Mas não muito.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado.
Até o décimo :3



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