Ela disse isso mesmo? Carla Ferrer, a Carlinha, minha amiga que nesse mundo era uma estranha disse que acreditava em mim? Olhei para Tomás, que apenas sorriu. Encarei Carla e então sem esperar mais nada me joguei nela para abraça-la.

– Eu sei que é estranho pra você. Sei que é estranho pra vocês dois... – completei me virando pra Tomás.

– Mas você precisa de nós – me interrompeu Tomás, completando meus pensamentos. Carla apenas sorriu.

– É melhor você ir tomar um banho e se trocar para a aula, Alice! – disse Carla.

– Vem comigo? – perguntei indefesa.

Carla sorriu e assentiu. Nos despedimos de Tomás e fomos até o dormitório feminino. Depois do meu banho, Carla fez uma trança de raiz nos meus cabelos e me ajudou a escolher um dos uniformes personalizados. Era bom ter minha amiga de volta. Bom, ela estava um pouco mais calada, porém, estava lá.

Fomos juntas andando até a aula de Marcelo e por onde passávamos pessoas cochichavam, provavelmente falando de mim. Talvez pelo fato de Carla, a nerd que “eu sempre menosprezo” estar andando comigo. Talvez pela cena de hoje de manhã. Quando chegamos na sala nos juntamos a uma rodinha que observava atentamente a discursão de Roberta e Diego.

– Falando na sua namoradinha, olha quem chegou! – desdenhou Roberta.

– Selvagem, me poupe – falou Diego impaciente.

– Do que me chamou?

– Eu te chamei de...

– Mas que bagunça é essa? – nosso professor de história interrompeu a briga quando chegou na sala – Todos sentados!

Todos obedeceram e sentaram. Nunca vi uma aula demorar tanto para acabar. Muitos mal prestavam atenção e foi aí que algo me interessou: Roberta encarava Diego. Não com amor, óbvio, mas estava olhando pra ele. Minha tese se confirmou: Ainda existe amor em DiRo! Será que eu terei a mesma sorte com o Pedro?

Todas as aulas da manhã acabaram e esperei Tomás e Carla para irmos almoçar. Caminhamos e almoçamos em silencio. Era estranho ver eles dois assim, tão calados. Fomos para o jardim e nos sentamos encostados em uma árvore, em baixo da sobra.

– Eu sei que está sendo difícil pra vocês – disse quebrando o silêncio. – Vocês não se falavam até pouco tempo e estão convivendo agora. Obrigada.

– É que, Alice... No nosso mundo todos nós tomamos rumos diferentes.

– E que rumos vocês tomaram? Já que estou nesse mundo, quero saber de tudo. Conte sobre o Tomás, Carla.

– Porque eu? – ela perguntou enquanto as maçãs do seu rosto ficavam vermelhas.

– Porque se o Tomás for responder ele não vai falar nada de ruim que ele tem aqui – respondi.

– Ei! Eu sou perfeito! – brincou Tomás.

– Bom... – começou Carla, pensativa. – Tomás é o típico garoto popular que já passou o rodo em todas as meninas do colégio. Geralmente é o palhaço as aulas. E é só isso. Ele anda com você, Diego e Vitória. Ou andava...

– Eu não “passei o rodo” em todas as meninas do colégio. Nunca fiquei nem com você, nem com a Alice. Tá vendo você errada? – falou Tomás indignado.

– Então ok... Deixa eu reformular: Tomás já passou o rodo em todas as vadias do colégio. Melhorou?

– Talvez – ele respondeu sorrindo.

– E a Carla, Tomás? – perguntei.

– A Carla é menina meiga e nerd que anda com a Marcia e o Téo. Não falam muito dela no colégio, só é comentada quando... – Tomás parou constrangido olhando pro chão.

– Quando eu desmaio por causa da bulimia – ela completou abaixando a cabeça.

– Você ainda tem bulimia? Quer dizer, nesse mundo você não parou?

– No outro eu parei? – ela perguntou com os olhos brilhando.

– Sim, parou, Carlinha. Você conseguiu! – respondi sorrindo. – E eu? Qual a minha reputação?

Carla e Tomás se entreolharam, talvez escolhendo as palavras. Eu já sabia que a resposta não ia ser boa, mas eu preciso saber para agir como tal.

– Bom, você é patricinha e ama rosa.

– Sempre fui patricinha e sempre amarei rosa. Eu quero saber como eu ajo. Por favor! – pedi.

– Você é cruel – respondeu Tomás, sombriamente.

– Tomás! – repreendeu-o Carla com uma cotovelada – Bom, é que aqui você faz parte do grupinho popular. Você e a Vitória vivem colocando pra baixo as meninas. Você é mimada e vivia grudada com Diego, fazendo com que ele faça tudo que você quer.

– Vamos fazer um jogo! – Tomás disse tentando aliviar a tensão. – Eu falo o nome de alguém. Carla diz sua personalidade aqui e Alice sua personalidade no seu mundo. Pode ser? – ele perguntou e assentimos. – Lucy.

– Lucy é grudada com Miguel, o irmão dela. Ela gosta do Pedro e é legal com todo mundo – respondeu Carla.

– Lucy é louca. Botou fogo na minha casa, é grudada com o Miguel e é uma psicopata pelo meu namorado. Ou ex-namorado... Enfim, o Pedro.

– Pilar.

– Mimada e não te suporta, Alice. Nem suporta a Roberta. Na verdade ela só suporta o Miguel e a Lucy. E ela gosta do Miguel.

– Pilar é duas caras. Ora é do bem, ora do mal. Já tentou nos prejudicar, mas antes de vim pra cá ela estava legal e namorando o Binho.

As horas se passaram e Tomás já tinha falado o nome de quase todos. Quando ele me perguntou como ele era no meu mundo ele ficou feliz e constrangido, pois disse que ele namorava a Carla. Essa brincadeira estava ficando divertida. É bom ter os dois aqui comigo.

– Roberta – Tomás falou enquanto nos levantávamos.

– Não suporta o grupinho popular. Melhor amiga do Pedro e gosta do Miguel. Selvagem e grossa com todo mundo.

– Minha melhor amiga. Selvagem, sempre. Mas quando a gente precisa ela está lá, para ajudar. Não conheço ninguém mais justa que ela. Nossos pais são casados. E ela era namorada do Diego – falei então me lembrei da cena de hoje na aula. – Ah, vocês não vão acreditar! Hoje eu vi a Roberta olhando pro Diego!

– Será que eles se amam aqui também? – Carla perguntou, curiosa.

– Eu tenho um plano pra juntar os dois. Só não sei se vai dar certo – falei.

– Senhorita Albuquerque – Jonas chegou no jardim com a mesma cara de sempre – Por onde andou? Isso é hora de ficar aqui fora?

– Desculpe, doutor Jonas, estamos indo para as aulas da tarde! – Carla falou.

– Vocês dois vão logo. Alice fica – ele disse e quando os dois caminharam virou para mim: - Sua mãe está na minha sala.