Aurora Boreal escrita por Mr Ferazza


Capítulo 22
XIX. EXPLICAÇÕES




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XiX. EXPLICAÇÕES

— Isso eu deduzi sozinho, Bella. Obrigado — Disse-me Charlie, depois que eu lhe explicara que ninguém devia saber da existência dos vampiros. Agora ele sabia; eu lhe estava contando a verdade.

                O que ele ainda não sabia era porque ninguém devia tomar conhecimento de nossa existência; eu ainda não chegara à parte dos Volturi. Na verdade, eu estava protelando, evitando ao máximo chegar nesse ponto inevitável do mundo dos vampiros.

                Charlie franziu as sobrancelhas e engoliu em seco.

                — O que eu quero saber é; Por que ninguém deve saber da existência de vampiros? O que vocês perderiam com isso? Já que, como você diz, são indestrutíveis, abrigados também sob sua imortalidade condicional? — Charlie ficara surpreso quando eu contei a ele sobre a indestrutibilidade e sobre os mitos que eram falsos, como dormir em caixões e ser queimado em resposta da exposição à luz solar.

                Eu tinha a impressão de que ele estava olhando mais atentamente para os meus dentes, tentando enxergar o que não vira antes; eu sabia que ele estava procurando ver se meus dentes caninos haviam crescido considerável e desordenadamente, agora como presas. Não encontrou nada.

                Eu flagrei seu olhar sobre meus dentes algumas vezes, mas tentei me fazer de idiota, não querendo responder para não assustá-lo, mas não deu certo.

                — Não funciona assim, pai. Os vampiros não têm presas enormes, com dizem as histórias. Não precisamos ter dentes mais favorecidos em tamanho do que outros. Todos são igualmente fortes e poderosos.

                A confusão atravessou o rosto dele. Eu conseguia ver que ele não entendia o que eu estava falando.

                — Ah, deixe para lá, pai. — eu disse, sabendo que ele se assustaria se eu demonstrasse o quanto meus dentes eram poderosos.

                — Tudo bem, garota. — ele assentiu e ficou pensativo de novo. — Bella, estou esperando uma resposta.

                Ah, droga.

                — Hã... Sobre o quê? — Me fingi de desentendida; eu não queria tocar no assunto dos Volturi com Charlie. Isso só serviria para me deixar furiosa.

                — Não finja Bells. Sabe exatamente sobre o que estou falando. A minha pergunta. Você não respondeu. — Eu queria que ele tivesse esquecido isso, mas Charlie insistia nesse ponto.

                — Certo pai. Primeiro você precisa entender que o mundo dos vampiros têm leis.

                — Leis? — perguntou confuso — Que tipo de leis? Como uma constituição? Igual a um país?

                — Não. Não é assim. Na verdade, só uma. Guardar o segredo. Mas isso se fragmenta em vários aspectos, e você não iria querer ouvir. — eu disse.

                Charlie devia estar deduzindo sozinho, porque sua expressão ficou, de um segundo para outro, deliberativa.

                — Então, se existe uma lei, existe também... — ele não terminou.

                — Sim. Existem aqueles que a fazem valer, que também punem os que a desrespeitam ou não cumprem algum ponto de uma das suas “fragmentações”. — eu terminei por ele.

                Charlie arfou. A conclusão que ele chegara não devia ser muito animadora. De forma alguma.

                — Mas há algo que eu ainda não entendi. — ele disse, ainda confuso. — Porque um ser indestrutível, como vocês me disseram — seus olhos dispararam pela sala, olhando todos nos olhos por um momento. —, teria de obedecer a alguém assim? E, se há uma lei, quem são os... “Policiais?”... Dos vampiros? E em que eles são diferentes de vocês.

                Eu soltei o ar pesadamente. Mas foi Edward quem respondeu as perguntas de Charlie.

                E eu agradeci por isso.

                — Charlie, não é somente uma questão de obedecer a alguém. Manter nossa existência oculta dos humanos é mais conveniente. Tudo bem, não tanto para nós, mas para os vampiros comuns. Mais conveniente àqueles que existem de forma diferente de nós.

                — Não, não, não. Para tudo. Espere um pouco. — Charlie interrompeu Edward ruidosamente. ­— O que quer dizer com vampiros comuns?

                — O que quero dizer é que a maioria de nós costuma satisfazer sua sede com o sangue humano. Nós só bebemos animais. Essa é a diferença.

                Charlie assentiu, certamente se lembrava da história que havia lido, xeretando nas coisas de Sue.

                — Sim. Por que é mais conveniente? — Perguntou Charlie.

                — Se os humanos soubessem da existência de vampiros, iriam querer destruí-los. Tudo bem, não é uma tarefa muito fácil, mas é possível. — Respondeu Edward. — É por isso que se deve guardar o segredo. E também para manter a facilidade de encontrar alimento.

                — Tudo bem — falou meu pai —, mas, e se alguém desobedecesse à lei...?

                — Há quem pune esse comportamento “inadequado”. Os Volturi são como os “policiais” dos vampiros. Existem e moram na Itália, mas isso não é tão relevante, não é? A razão para que obedeçamos às leis, assim, cegamente é que eles existem desde antes do nascimento do Filho de Deus. Então, muitos dos vampiros que hoje existem, foram doutrinados com essas leis, sem que nunca a tivessem questionado.

                Charlie assentiu de novo.

                — Mas os que existiam antes deles? Por que obedecem a essas leis? —perguntou Charlie com curiosidade. — Isto, se é que existia algum antes deles.

                ­— Entenda Charlie: Só existem quatro vampiros no planeta que são anteriores ao surgimento dos Volturi. O clã que vive no Egito cumpre essas leis, porque os poderes dos Volturi são absolutamente inigualáveis, de modo que você não consegue se esconder deles. Eles encontram o que quer que seja. E isso não demora muito. — Disse Edward.

                Eu não podia argumentar contra isso. Para todo e qualquer efeito, Demetri ainda estava vivo.

                — Entendi — disse Charlie, meio sufocado com a própria voz e pela respiração, que agora estava acelerada. Mas não havia medo em sua voz, só espanto. Talvez um pouco de incredulidade. — Mas... Poderes? Que tipo de poderes? Como assim? Como o Superman e o Homem-Aranha?

                Todos na sala riram um pouco, mas depois recuperaram a expressão séria e estressada com a descoberta de Charlie.

                — É, mais ou menos, Charlie — respondeu Edward, ainda com alguma sugestão de humor em seus olhos dourados. — Alguns vampiros, depois de transformados, têm como se fosse... Um... Poder especial. Você chamaria de superpoder.

                — Rá, rá, rá — Riu Charlie, incrédulo agora. — Como o quê? Visões de raios-X? Tele cinética? Atravessar paredes sólidas? Tele transporte? Eu não entendo.

                — Sim Charlie. É basicamente isso, só que um pouco menos fantasioso. Ninguém pode se tele transportar, ou atravessar paredes. É mais como uma intensificação das habilidades que alguns tinham, enquanto ainda eram humanos. Isso é pouco comum, mas existe.

                — Habilidades que humanos tinham antes? Vocês estão me deixando mais confuso do que esclarecendo, de fato, alguma coisa.

                — As habilidades humanas seriam uma fácil percepção de sentimentos, intuições, instinto de sobrevivência, etc. E então, quando um humano muda, essas habilidades se intensificam em um nível quase vertiginoso. Tornam-se verdadeiros poderes.

                — Ah, tá. Certo. E algum de vocês tem algum poder assim? — Falou ele, com um pouco de desdém.

                Nós nos entreolhamos por um longo tempo. Será que isso assustaria Charlie demais?

                Só havia uma forma de saber.

                Agora foi a minha vez de falar.

                — Sim, Charlie. Alguns de nós têm poderes.

                — Do tipo... — encorajou Charlie, que não parecia assustado, sua voz era curiosa agora. Isso era bom.

                — Ler pensamentos, ver o futuro, controlar as emoções e ser imune a alguns poderes que existem por aí. — eu pisquei para Edward, mas Charlie não viu.

                — Então... Você quer dizer que... Que alguém nessa sala, nesse momento, sabe exatamente o que eu estou pensando?

                Eu assenti.

                — Sim.

                — Não, Charlie. Eu não sou uma aberração. Pelo menos não tão grande quanto você está pensando. Eu posso dizer isso com segurança. Sei o que se passa em sua cabeça. — Respondeu Edward a um pensamento indiscreto de Charlie. E depois sorriu um pouco, piscou para Charlie e tocou de leve sua têmpora com o indicador.

                — Edward, atenda ao telefone. — Disse Alice — É Nessie. Vai tocar daqui a dois segundos. É sobre seu carro; o pneu furou, mas eles já estão no aeroporto.

                Os dois segundos se passaram e o telefone tocou.

                Edward atendeu, já indo para a garagem, levando Esme com ele, para que voltasse dirigindo o outro.

                — Estou a caminho, Nessie. Não se preocupe. Fique tranquila e aproveite sua viagem.

                Charlie fitou Alice, perplexo.

                — Ah, então você pode... — ele engoliu em seco e não continuou.

                ­— Ver o futuro? ­ — Perguntou Alice, terminado sua frase. — posso sim.          

Charlie só assentiu, calado. Era muita coisa para que sua mente humana e fraca absorvesse com tanta rapidez; ele precisava de um tempo.

                Depois, seu comportamento parecia agitado e confuso; certamente ele absorvera as informações e concluíra que deveria estar sonhando. Seu fluxo sanguíneo aumentou com o nervosismo.

                — Fique calmo, Charlie — Disse Jasper. E foi o que meu pai fez; imediatamente seu fluxo sanguíneo diminuiu e sua respiração ficava mais estável, à medida que os segundo se passavam.

                Vi a expressão de Charlie e compreendi que ele sabia quem estava controlando suas emoções dessa forma tão eficaz e real.

                — O.K., Então, quem é a pessoa imune “certos poderes que existem por aí” — ele perguntou, usando as palavras que eu utilizara antes.

                Ele me fitou, esperando uma resposta.

                — Está olhando para ela. — Eu disse a ele, e abri um sorriso.

                Dessa vez ele arfou.

                — Mas como isso é possível? O que quer dizer com “imune”?

                — Quero dizer que Edward não pode ler minha mente. E os poderes de muitos outros vampiros não funcionam co... — Eu ia dizer contra mim, mas me esqueci de que Charlie não sabia que tínhamos inimigos — migo. — A pausa foi tão rápida que Charlie sequer a percebeu.

                — Outros poderes. Outros vampiros poderosos. É por isso que ninguém desobedece a esses tais de Volturi? Por causa de seus poderes? — Perguntou ele; eu não estava exatamente surpresa que ele tivesse chagado a essa conclusão sozinho.

                Fiz que sim. Minha cara agora, eu podia ver, mesmo sem um espelho em minha frente, estava um pouco hesitante.

                Eu não queria chegar tão rápido a esse assunto desagradável, mas não se podia evitar.

                Então, antes que eu pudesse abrir a boca, meu pai estava falando.

                — Então, já que ninguém pode saber a existência de vampiros e permanecer vivo — eu não havia dito isso a ele; mas parecia ser óbvio demais, até para um humano. —, como foi que você sobreviveu, garota? Já que, segundo Jake, você sabia disso desde que veio para Forks? Eles a transformaram a força? Para também saírem vivos? — A voz de Charlie era zangada, e ele fuzilava os outros com os olhos, neles havia raiva.

                Charlie acreditava que eu havia sido transformada contra minha vontade.

                Eu o interrompi.

                — Pai. Escute. Ninguém me transformou sem meu consentimento; eu queria ser transformada. Mas sim. Eu iria morrer se não fosse, mas isso nunca foi verdadeiramente um problema, porque eu pedia a Edward que me mudasse desde o começo.

                — Tudo bem. — disse Charlie, e depois engoliu em seco; dava pra ver que a realidade não estava tão longe de sua percepção. Sua percepção do futuro.

                Agora ele podia perceber o rumo que essa conversa tomava. O rumo que, talvez, sua vida tomaria.

                Mas eu não queria tocar nesse assunto, que estava em suas mãos.

                Ele arfou.

                Respirei fundo e tomei coragem para começar.

                — Pai, agora todos nós estamos diante de um dilema; agora que você sabe sobre nós, isso implica todo mundo. E há algo que você deve decidir. — Eu não gostava da forma como as palavras fluíam para fora de meus lábios, elas tinham um tom de ultimato, e não me agradou pronunciá-las. — Compreenda: Nós faremos de tudo para que os Volturi não saibam sobre você, para que não saibam que você conhece o segredo. Mas eu não posso prometer nada. Aro tem...

                Então, repentinamente, Charlie me interrompeu, explodindo numa onda de gargalhadas.

                — Como é? ­— ele parecia estar engasgado. — Rá, rá, rá. — ele não conseguiu terminar.

                — Qual é a graça, pai?

                — Como... Qual foi o último nome que você disse? — perguntou ele, ainda entre gargalhadas.

                — O que há de engraçado nesse nome? — eu não achava. Nunca achei esse nome engraçado. Feio, sim. Doía na alma ver ouvir a aquele nome, mas numa era quase pré-histórica, não havia muitas opções por aí.

                — Ah, desculpe... Continue, mas é que eu achei um pouco estranho. — ele disse, se recuperando do pequeno surto de humor.

                — Como eu ia dizendo... Aro tem muitos meios de saber a verdade. Sua guarda é extremamente poderosa, e, se descobrirem e o quiserem morto, pai, você morrerá — Doía-me dizer aquilo, mas era a mais pura verdade. Cada célula drenada que eu tinha em meu corpo protestava ao dizer aquelas palavra, mas não passava da realidade.

                Da realidade cruel, obscura e mórbida.

Mas ainda assim era a verdade.

E não podíamos fugir dela. Inclusive Charlie, que insistira, repentinamente, em participar desse mundo do sobrenatural, de onde se podia entrar, mas, de forma alguma, se podia sair. Porque não dava para esquecer o que era saber que o mundo em que se acreditava viver, nunca fora nada do que você imaginara; eu já conhecera essa sensação. Mas aquilo não me espantara.

E tampouco parecia assustar Charlie, agora. Eu nunca pensara verdadeiramente em nossas semelhanças, porque a mais evidente parecia ser o gosto pelo silêncio e a antiga dificuldade em expressar qualquer tipo de sentimento em voz alta.

Agora eu podia ver que tínhamos mais em comum do que eu sequer sonhara. E sentia que o sobrenatural também não o incomodava tanto. Obviamente, ele não parecia muito à vontade ali, como certamente eu estivera há muito tempo, mas também não parecia prestes a sair correndo porta afora, gritando e arrancando os cabelos como se fosse um lunático.

A verdade não era totalmente repulsiva para ele, e eu não sabia se isso era uma coisa boa ou não.

— E como eu vou sobreviver a isso? Já que eu agora sei de tudo? — Ele perguntou de repente; eu não estava preparada para responder a essas perguntas.

Porque havia uma forma de Charlie sobreviver. E eu não queria pensar nela. Não quando minha madrasta era uma anciã da tribo quileute, que sabia do segredo e, como qualquer um, em La Push, que soubesse, não era muito fã de vampiros. Então, se ele escolhesse a imortalidade, aquela história estaria acabada.

Não. Deveria haver outro jeito de Charlie permanecer humano e, ao mesmo tempo, esconder a verdade dos Volturi. — Que, ao contrário, viriam mais como um pretexto para que eles nos atacassem com justificativas válidas.

Mas as chances não eram muito boas; Porque não se podia esconder a verdade de Aro por muito tempo. E porque aquela era a lei mais sagrada dos vampiros e, embora eu nunca tivesse simpatizado muito com os Volturi, eu sabia que eles teriam a razão. O segredo era importante demais. Mas Charlie não diria nada. Disso eu sabia. Ele ficaria quieto.

E, mesmo que não ficasse, quem iria acreditar nele? Certamente, não as pessoas sãs. Ou, nesse caso, as menos conscientes da realidade que as cerca.

Eu dei um pigarro, para desobstruir a garganta e mandar embora o nó que se formara nela. E para me obrigar a falar.

— Aí é que está, pai. — eu murmurei. — Eu não consigo ver como você pode sobreviver a isso. Agora você sabe o segredo, e só há duas opções. ­— murmurei de novo, repetindo o que dissera antes, ainda mais baixo; minha voz estava quase embargada e percebi que, se meu corpo fosse capaz disso, eu estaria chorando. E torrentes de lágrimas não seriam suficientes.

Ele assentiu.

— O.K, e quais são essas opções? — perguntou ele, mas havia receio em sua voz. Quase como se já imaginasse essas duas opções. E era isso mesmo; ele já podia saber delas. Só queria confirmar.

— Bem... — eu hesitei por um instante, para conter um fluxo repentino de suspiros. ­—, pai, você pode se tornar um de nós. Ou... — me obriguei a não terminar a frase. Com certeza ele já podia adivinhar a segunda.

Charlie passou a lateral do dedo indicador no pescoço, imitando uma faca cortando-lhe a jugular.

— Sim. É isso mesmo. — eu lhe disse. — Mas, por favor, Charlie, eu sei que é meio idiota pedir isso, e até irônico, mas não se sinta pressionado a tomar uma decisão rápida, sim? Podemos tentar esconder a verdade dos Volturi por algum tempo, e você deverá estar preparado para tomar uma decisão quando a informação “vazar”. Entendeu? Digo quando, porque isso é certo. Algum dia eles saberão que você sabe. E deveremos estar preparados para isso.

— Entendi Bells. Isso é ótimo para mim, porque eu preciso pensar com clareza em minhas opções. — disse ele. Charlie parecia um pouco mais aliviado com a última informação que recebera. — Mas eu ainda não faço ideia do que eu vou decidir, sabe?

Eu assenti — Era verdade; eu podia imaginar que ele não fazia ideia do que fazer, numa situação como essa.

E então, foi Alice quem falou.

— Ah, ela pode não fazer ideia nenhuma, Charlie. Mas eu sei que você não sabe o que fazer; seu futuro está muito instável agora. Se for continuar indeciso assim, então é melhor que eu esteja preparada para isso. A única coisa que vejo sobre você a respeito dessa decisão são imagens inanimadas e em preto e branco. Humpf! Que definição horrível. Isso acaba com a minha cabeça. — tagarelou Alice. Mal humorada.

A confusão atravessou a expressão de Charlie. Depois ele me fitou, com a mesma expressão, como se Alice estivesse falando outro idioma, e, como se não bastasse, rápido demais para que meu pai entendesse uma vírgula sequer.

— O que... Como... Quando... — ele estava perdido em suas perguntas e, claramente, não conseguia escolher qual fazer primeiro. Por fim, ele respirou fundo, controlando o fluxo de palavras. — Que foi que ela disse? — seu tom de voz também deixava que a confusão vazasse de dentro dele, quase como se fosse água; ele parecia um estudante preso numa difícil aula de matemática...

Eu entendi a pergunta dele e respondi:

— Alice disse que não consegue ver seu futuro, pai. Isso porque você ainda não tomou nenhuma decisão relevante sobre o assunto de sua mortalidade. — expliquei a ele; Por fora, quem ouvisse minhas palavras, acreditaria que eu pensava nelas como se fossem banais. Mas a verdade era que eu não conseguia encontrar formas melhores de expressar imparcialidade sobre o assunto, e, então, a única saída era dizê-las como se elas não tivessem efeito nenhum sobre mim.

— Mas isso não estava em meu destino? Quero dizer... Alice deveria saber o que aconteceria comigo antes mesmo que eu descobrisse sobre vocês, não é? — perguntou ele, ainda confuso.

Estranho. Eu nunca havia realmente conversado a fundo com Charlie sobre qualquer assunto. — em parte porque seus pensamentos ficavam evidentes em seu rosto assim que eles chegavam à sua mente — Muito menos sobre destino ou futuro — nenhum de nós dois acreditava nessa coisa mística —, mas Charlie sempre me pareceu ser um homem muito prático, porém, nunca me passara pela cabeça que meu pai acreditasse em destino.

Eu dei uma risada sem graça. Eu não achava. — daquelas que você ri somente por não saber o que dizer e fica com medo de falar algo muito idiota.

— Rá. — eu ri de novo. Só uma vez. — Pai, Alice pode ver seu futuro somente quando você toma firmemente alguma decisão; enquanto você não tiver nada decidido sobre o assunto, ela não poderá vê-lo. Nem de uma forma, nem de outra. Isso, é claro, se você quiser saber algo antecipadamente. Mas as consequências de sua escolha só poderão ser visualizadas depois de seu pronunciamento.

— Meu pronunciamento?

— Não literalmente. Você não tem realmente de se pronunciar. Só precisa pensar sobre a decisão.

Então Alice saiu rapidamente pela porta, carregando Jazz, puxando-o pela mão. — A saída dos dois foi rápida (nem tanto), mas eu sabia que Charlie tinha conseguido ver o “borrão” em que os dois decompuseram-se, em sua saída repentina.

Charlie deu um assovio longo e baixo, o tom do som agudo demonstrando surpresa.

Ele assistiu à saída dos dois por um segundo, depois se voltou para mim, apontando por sobre o ombro o local onde Alice e Jazz desmaterializaram-se — pelo menos para Charlie — repentinamente.

— O que houve com ela? — perguntou ele, ainda apontando por sobre o ombro.

— Ah, ela odeia tentar ver o futuro de gente indecisa, com ela mesma passou a chamar. Isso lhe dá dor de cabeça; é como tentar focalizar, na televisão, uma imagem numa tela que está cheia de chiados. E, pra falar a verdade, parece ser bem irritante. — eu expliquei a ele, agora que eu entendia as visões de Alice tão bem quanto Edward.

— Bem, tudo bem, então. — disse ele. E depois falou com sarcasmo. — Horrível mesmo não poder e ver o futuro o tempo todo.

E então Charlie se levantou de repente, espreguiçando-se, e eu sabia que ele estava pronto para ir para casa.

— Até mais, então Bella. — Disse ele, passando a mão ternamente em minha cabeça; parecia que não o incomodava saber que estava tocando uma vampira. E a minha temperatura — para ele, extremamente fria —, eu imaginei que, para ele, não era nada.

— Pai? — perguntei.

— Sim, Bells?

— Isso não o incomoda? Quer dizer... A temperatura de minha pele e... E o resto? — Perguntei vacilante.

Ele me fitou por alguns segundos enquanto decidia o que diria.

— Não. Nenhum pouco, na verdade; e não digo isso da boca pra fora. Realmente me sinto bem à vontade. O que me incomoda é não ter sabido disso antes. Na verdade, mocinha, eu fiquei muito chateado com isso, sabe? Parece que... Você e toda essa história vão desaparecer quando o Sol nascer amanhã. — Disse ele.

Então ele pensava igual a mim, no início de tudo. Era assim mesmo que eu me sentira um dia. Mas isso não era novidade, porque ele já me dissera isso um dia — Muito antes de saber a história toda.

— Não se preocupe pai. Tudo isso é a realidade, e acredito que não vamos embora tão rápido. — eu lhe assegurei.

— Como? Por quê? — disse ele. — quero dizer... Vocês são discretos, não é? Nunca chamariam atenção.

— Não intencionalmente, pai. Mas nós não envelhecemos, lembra? — perguntei — Carlisle diz que tem quarenta e cinco anos agora, quando, na verdade, fisicamente, ele tem apenas vinte e três; nós temos conseguido nos camuflar por causa de um tipo muito bom de maquiagem que Alice encontrou. E isso é bom, mas não poderemos usar essa desculpa para sempre.

Ele assentiu.

— Carlisle tem vinte a três anos fisicamente? — perguntou ele; ele tinha prestado mais atenção nisso, era óbvio. Porque o “Dr. Cullen” sempre parecera jovem demais para ter a idade que dizia ter.

— Tem. É meio estranho. Eu lembro, por experiência própria. — disse-lhe.

— E... E... — ele gaguejou; Charlie estava vacilante. Hesitou em falar o que o estava afligindo — Quantos... Quantos anos ele... Ele... Tem de verdade? — ele perguntou a abriu ainda mais seus olhos que continuavam arregalados pela surpresa; parecia que ficariam assim permanentemente. Charlie olhou em volta, a procura de Carlisle, mas ele não estava mais ali; havia subido discreta e silenciosamente para a biblioteca.

Agora eu entendia a hesitação de Charlie, a falta de delicadeza com uma pergunta dessas.

— Conte a ele; eu não me importo. — Ouvi Carlisle dizer baixinho, do segundo andar.

Charlie ainda esperava por uma resposta.

— Carlisle tem trezentos e setenta e cinco anos. — eu disse.

Charlie arfou.

— Meu Deus! — ele se espantara — Isso é... Muita coisa.

— Nem tanto — discordei. — há alguns de nós que são muito mais velhos.

— É claro. — ele concordou. — E Edward?

Eu sabia que ele não se referia à idade física.

— Edward tem quase cento e vinte.

— Você não deveria estar casada com alguém que tem idade para ser seu tetravô. — disse ele brincando.

Eu ri com ele.

— Muito bem, pai. Ainda estaremos aqui amanhã. Se quiser voltar, é claro. — eu disse; não podia estar alheia à realidade. A realidade de que quando o que ele havia ouvido hoje assentasse em sua mente, talvez ele quisesse manter distância daqui. Ele era humano. E, por mais que fosse corajoso, seus instintos deveriam estar gritando “Corra”, corra; fuja daí, seu idiota. Eles são vampiros.

— Certo. Prometo pensar sobre... A minha situação, Bells. Não a deixarei sem alguma resposta. — ele me disse.

— Por favor, pai. Eu já disse que não quero que se sinta pressionado a tomar qualquer decisão; nós conseguiremos retardar os Volturi pelo máximo de tempo possível, embora seja inevitável que eles um dia saibam. Isso pode demorar muito tempo.

— O.K, então. Nada de pressa. — Disse ele

E depois Charlie se retirou da sala, indo em direção à porta. Depois ligou o carro e foi embora.

— Tudo bem. Essa não foi tão difícil. — eu disse para mim mesma.

Enquanto eu falava, Alice passou pela porta dos fundos, já de volta.

— Então, Alice, conseguiu pegar alguma coisa? — perguntei, sabendo que, pela expressão dela, nada havia mudado muito.

Ela me fitou mal-humorada por um instante e depois balançou a cabeça.

— Pelo menos ele ainda está indeciso — eu disse, imaginando como seria se sua decisão já estivesse tomada. Em minha mente eu podia ver os dois lados dessa decisão. Eu uma, Charlie voltava correndo para cá, pedindo para ser transformado. E eu também sabia que ele não estava realmente pronto para isso. E tampouco eu. Mas havia outra possibilidade, Carlisle podia...

Argh. Não. Não. Não. E não podia pensar nisso. Não devia pensar nisso. Pelo menos por enquanto. E meu pai ainda nem havia decidido. Aquele não era meu assunto preferido. Mas esta noite seria de assuntos desagradáveis.

Alice me olhou sugestivamente, e eu sabia que o que ela estava pensando não era tão fácil quanto o que acabara de ser feito (contar a verdade a Charlie). — Não precisei ler sua mente para isso. Eu sabia que era bobagem ficar tão hesitante quanto a esse assunto, já que todos nós sabíamos que, em alguma hora, deveríamos ter notícias da Itália — Só não sabíamos que seria tão cedo. No entanto, mesmo assim, eu estava hesitante. Não era algo complicado de fazer, mas tampouco era fácil.

— Tudo bem, o que está acontecendo? — perguntou Jazz, já tendo sentido a aura de hesitação e temor que irradiava de Alice e de mim como um elemento químico venenoso, radioativo e letal.

Alice e eu nos entreolhamos mais uma vez; a segunda naquele minuto. E eu sabia, tanto quanto ela a meu respeito, que ela estava decidindo o melhor modo de como fazer aquilo, embora não houvesse muitos.

— Tudo bem, Jazz. Mas eu tenho certeza de que, não só você, mas todos os outros já sabem do que se trata.

Jasper assentiu.

— A decisão foi tomada — disse ele, com um toque de resignação na voz. — Quando? — continuou. — Pelo menos temos algum tempo para nos prepararmos psicologicamente? — ele disse com sarcasmo.

— Não — disse Carlisle, que estava sentado no outro sofá, na extremidade norte da sala. — Eu não quero que haja luta. Mesmo que, agora, já tenhamos uma maior probabilidade de vencer. A ideia... Simplesmente... Não me agrada. Aro foi o meu primeiro amigo nessa vida. Não quero ter de lutar.

— Nenhum de nós quer isso — disse Alice, e um rosnado fraco veio do segundo andar, contradizendo-a; Emmett. — E eu não acredito que tenhamos de lutar; essa possibilidade ainda está muito nebulosa.

— Que bom. — disse Carlisle; Do segundo andar, Emmett bufou. A expressão de Carlisle não se tranquilizou tanto quanto seu tom de voz, porque ele sabia que decisões diferentes ainda estavam em tempo de ser tomadas.

— Por favor, gente. Mantenhamos o foco, sim? — pediu Jazz. — Alice, você ainda não nos disse quando vai acontecer. E as esposas, virão de novo? Os anciãos? — perguntava Jazz freneticamente.

—Calma, calma. Não criemos pânico! — disse Alice. — Eles não estão vindo.

Jasper suspirou pesadamente.

— Então porque todo esse alarde? — perguntou ele, cético. — Não entendo.

Passaram-se alguns segundo, e ninguém se atreveu a falar. Jasper pensava nos significado do que Alice lhe dissera

— Ainda estou boiando, querida. — ele falou a Alice. — Pode me dizer o que isso significa? — pediu ele gentilmente.

Mas foi Carlisle quem respondeu a pergunta de Jazz.

— Se Maomé não vai até a montanha... — ele não acabou, sabendo que Jasper entenderia onde ele queria chegar.

                — Mas... Não faz sentido. Porque Aro pensaria que justo nós os atacaríamos? E Justo em Volterra? Parai... Mas há alguma lógica... Agora que Demetri está fora da equação.

                Santo Deus! Como é que ele ficara sabendo?

                — O que? — eu perguntei, com um tom de voz um pouco mais estridente do que o normal. — Como você soube? Quero dizer... Eu não contei a ninguém, mas... — eu começara a tagarelar mais do que o necessário.

                — Estava apenas me referindo à incapacidade de Demetri de nos rastrear, caso você protegesse nossas mentes. — explicou ele rapidamente. — o que você pensou que fosse?

                Se eu pudesse suar, estaria suando. Suando frio. No que eu havia me metido? Pelo amor de Deus. Como eu era idiota!

                Eu queria esmurrar minha cara idiota eu mesma, até que virasse pó e eu estivesse perdida no vento.

                Tentei disfarçar.

                — Nada. Não era nada. — eu disse, mas pude sentir que não havia convencido ninguém.

                — Bella! — falou Alice, num tom severo. — Conte tudo. O que você presenciou na Itália, posso saber? — ela perguntou retoricamente. Alice não perguntava se podia saber. Ela arrancava a informação a qualquer custo. — Tudo tem de ser lavado em conta aqui.

                Desisti e resolvi contar parte da verdade, antes que alguém me pressionasse; Sabia que se alguém o fizesse, eu acabaria contando tudo.

                — Certo. Eu não contei a vocês antes porque não achei que fosse o momento apropriado, e, porque, antes dessa notícia, isso não era exatamente relevante. — eu expliquei, minha pequena introdução me pouparia de responder futuras perguntas.

                Três pares de olhos dourados me fitaram, esperando pela notícia principal.

                — Demetri... Demetri foi morto. Quando estive em Volterra, ouvi os boatos e vi Jane voltando com suas cinzas. — eu disse, e senti muito bem que eu podia estar passando óleo de peroba em minha cara-de-pau. Eu só podia pedir que eles tivessem acreditado em mim. Não que eu merecesse pedir algo, é claro; eu havia matado um semelhante. Mas era um motivo de força maior.

                — Verdade? — Alice perguntou, sorrindo agora com a boa notícia.

                Eu assenti.

                — Tudo bem — disse Alice, voltando à conversa original. — Sobre o que você estava falando, Jazz?

                — Certo, então, já que não é relevante a existência de Demetri... Eu estava me perguntando por que Aro iria supor que nós os atacaríamos. — disse ele.

                Alice me fitou e, em seguida, falou, tanto para Jasper quanto para Carlisle, que estava escutando tudo, em uma cautela silenciosa.

                — Aro não está supondo nada. — esclareceu Carlisle — eu o conheço muito bem e sei que ele não é dado a fazer ou a apostar em algo no qual não tenha certeza.

                — É verdade; essa é questão. — disse Alice.

                — E, então, Aro tem certeza de que nós os iremos “atacar”. — supôs Jasper corretamente. — Mas como ele pode ter tanta certeza? Nada pode lhe dar as garantias de um ataque imediato.

                Eu balancei a cabeça, discordando.

                — Jazz, eu acho que há um modo, sim. Um modo muito seguro, na verdade. — eu disse.

                — O que quer dizer com isso? — Perguntou ele, confuso.

                — Aro pretende realmente jogar sujo. Ele vai colocar o amor e a generosidade de Carlisle a seu favor. — Aro quer fazer com que Carlisle se sinta pessoalmente culpado pelo que aconteceu há pouco mais de uma década. — Eu expliquei a Jasper.

                — Ainda não entendi. — ele disse.

                Alice revirou os olhou para seu verdadeiro amor e começou a explicar ela mesma.

                — Jazz, o que estamos querendo dizer é que todos os nossos aliados, os que testemunharam a nosso favor no último dia daquele ano, estão na mira dos Volturi agora. Aro não vai ser nada sutil quanto a isso; quer que nós saibamos para que decidamos agir o mais rápido possível. O que aconteceu com o Clã de Amun era só uma amostra do que ele pretendia. — Caius, na verdade, que queimar todos com quem nós tivemos contato naquela época. — Alice terminou sua explicação, e Jasper assentiu e todos ouvimos rosnados vindos do segundo andar e também do lado de fora. Não era novidade, eu sabia que Seth estava ouvindo. E também Leah e Victor — O enorme lobo completamente branco por quem Leah sofrera imprinting, e que também, agora, era parte da matilha de Jake. —, mas estes ficaram calados, sem emitir ruído algum; de Leah eu só podia ouvir o som abafada das patas, correndo, pela noite fria e molhada, em algum lugar para o Norte. E Victor com ela, mas ele era mais silencioso. Não dava para ouvir suas patas batendo no chão molhado.

                — Emm, Rose, acalmem-se. Não vemos tomar nenhuma decisão sem que seja baseada inteiramente em uma avaliação racional. — Carlisle, que também havia ouvido os rosnados lhes acalmou. — Tudo bem, Seth? — ele disse, sabendo que Seth estava ouvindo.

                Seth latiu e Carlisle, de alguma forma, soube que aquilo era um “sim”.

                — E agora? Quem poderá nos ajudar? — perguntou Jasper.

                E então, dada a familiaridade da frase, eu me espantei que Emmett não tivesse aparecido de dentro da chaminé, ou em qualquer outro lugar estranho, vestido de vermelho, e dito: “Eu, o Chapolin Colorado; Não contavam com minha astúcia”. Então ouvi sua risada ecoar do segundo andar, e eu soube que ele havia pensado em algo parecido.

                — Não sei. — Alice falou. — Mas sei de uma coisa.

                Todos a olhamos, ansiosos; será que ela tivera outra visão? Que ótimo. Boas notícias. Os Volturi haviam mudado de ideia de novo? Não. Não era provável. Demetri estava morto.

                — O que é? — perguntei a ela, desistindo de tentar adivinhar.

                — É que lá fora está uma bagunça. Ainda. Ficamos tão absortos em nossa conversa que nos esquecemos de que aquilo está parecendo uma festa de dia das bruxas que foi arruinada. Há muito sangue pelo chão. — Charlie e sua ideia brilhante — Então, mãos a obra, pessoal.

                E todos saímos pela porta dos fundos, a fim da mergulharmos em coisas que mais produtivas e que faziam mais sentidos.

                O sangue de Charlie, derramado no chão da extremidade da pista de dança, me relembrou do assunto que, fazia pouquíssimo tempo eu havia esquecido.

                E então o assunto sobre-a-mortalidade-de-Charlie fez com que minha mente, já preocupada tivesse algo a mais com que se importar.

                Qual seria a decisão dele? Acho que eu não queria saber; sacudi a cabeça para me livrar desse pensamento e continuei a arrumar a bagunça da fasta de casamento.


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Notas finais do capítulo

Obrigado por estarem acompanhando. O próximo capitulo será postado no Domingo -- Estou estendendo um pouco mais o prazo para que eu tenha tempo de adiantar os capítulos, a fim de, também, conseguir revisá-los.
Grato por sua compreensão.