Corro pela floresta transformado em urso. Sigo a trilha do cheiro do sangue que me leva até o Centro de Treinamento de Devdan. Volto a minha forma normal, vejo tudo destruído.

– Devdan. – grito.

Escuto um barulho atrás dos arbustos atrás de mim e me preparo para o combate. Vejo uma silhueta saindo atrás de uma arvore e fico atento.

– Olá jovem aprendiz. – diz Devdan saindo detrás a arvore.

– Devdan o que aconteceu? Você está bem?

– Estou, obrigado por se preocupar comigo.

– Por que aqui está tudo destruído?

– Foi um ataque de urso.

– Não minta pra mim Devdan. O que eu escutei não foi um simples urso.

Devdan sorri calmamente.

– O que você está escondendo de mim? Você vive falando sobre confiança e você não confia em mim para dizer a verdade?

– Claro que confio em você. É você que não confia em você mesmo. Por isso desconfia de tudo e todos.

– Você não sabe o que eu já passei para dizer isso.

Devdan se senta no chão e diz:

– Nove deuses reencarnaram na Terra para nos proteger dos demônios que querem trazer o apocalipse ao mundo. Eles reencarnaram a mais ou menos onze anos e ainda seus corpos são jovens para enfrentar os demônios. Infelizmente os demônios encontraram e mataram três, mas ainda restam seis deuses para salvar a Terra. E acredito que você Naveen seja um desses deuses. Melhor ainda acredito que você seja o mais forte deles o Supremo e Poderoso Vishnu.

Tenho vontade de rir, mas estou perplexo com o que Devdan me disse.

– Como você sabe de tudo isso?

– Isso é uma profecia.

– Profecia? Como assim?

– Há muitos anos atrás, meu mestre, que me ensinou tudo que sei hoje, ele me contou sobre essa profecia. E disse que eu estaria destinado a encontrar e treinar um desses deuses. Que acredito que é você Naveen, você é o nosso salvador. O nosso Vishnu.

– Como eu posso ser Vishnu?

– Ele possui dez avatares e tenho certeza que você pode se transformar nos dez.

– Como assim me transformar?

– Eu sou velho, mas não sou burro coelhinho preto. – disse Devdan piscando um dos olhos.

Dou uma risada e parece que toda essa historia de profecia e Vishnu parece me motivar e decido aprender mais sobre isso com Devdan.

– Mestre Devdan quero que o senhor me ensine tudo o sabe.

Ele abre um sorriso e sai andando e pede para que eu o siga. Caminhamos pouco até um lago com aguas cristalinas e nas arvores ao redor do lago vejo dez cartazes com fotos e no meio delas vejo uma estatua. Eu já havia visto aquela estatua antes, era Vishnu. O lugar é bem calmo e tem cheiro de flores.

– Aqueles são os dez avatares de Vishnu. Aquele é Matsya o primeiro avatar. – disse Devdan apontando para uma foto de um peixe e da boca dele saia Vishnu.

– Aquele é Kurma o segundo avatar. – disse apontando para outro cartaz, mas dessa vez tinha a forma de criatura metade homem metade tartaruga.

– Este é Varaha. – este se parece a um javali – Aquele é Narasimha. – Vejo uma criatura metade homem e metade leão.

– Este é Vanama o quinto avatar de Vishnu. – disse apontando para a foto que havia um anão. – e aqueles são Parashurama (Homem com um machado), Rama (um arqueiro), Krishna (segundo a lenda é a reencarnação real de Vishnu), Buda (O Iluminado) e Kalki (o espadachim montado a cavalo que ainda está por vir). Vishnu pode alterar sua forma física assim como você meu jovem. – disse Devdan que passou o dia todo me falando sobre o hinduísmo e sobre Vishnu.

***

O tempo passou. Eu não era mais aquele garotinho magrelo, com certeza estava mais alto, meu cabelo agora chegava quase nos ombros, e meus braços ficaram grossos e musculosos.  Todos os dias mergulhava no lago perto da cabana, corria quilômetros em questão de segundos, fazia abdominais e flexões. Até já briguei com ursos e alguns outros animais do Himalaia. Também treinava todos os dias com Devdan que conquistou minha confiança de tal maneira que revelei meus legados para ele, mas sem contar minha historia verdadeira. Ele realmente acreditava que eu era Vishnu reencarnado. Sempre que ele me encontrava, se curvava para mim, eu odiava isso. Não queria brincar com a fé de alguém dessa maneira, por isso disse a Devdan que não fizesse mais isso. Com meu legado de transformação fui capaz de me transformar em todos os avatares de Vishnu e não era só isso, podia me transformar em que eu quisesse. Desde uma pequena formiga a um dragão voador com oito cabeças. Nunca tentei ser um dragão, mas podia me transformar nele se quisesse. Meu legado de teletransporte também melhorou já podia alcançar distancias maiores, com telecinese já podia levantar quase tudo com só um pouco de concentração. Devdan me ensinou artes marciais milenares da antiga Índia. Ele me ensinou derrubar meu oponente devolvendo sua força para ele, assim como me conectar com meu espirito que me ajudou a entender melhor meus sonhos e visões. De alguma forma Devdan me ensinou mais do que eu jamais imaginei ser possível. Talvez até mais do que Reynolds. Ele me ensinou que ser um coelho é uma coisa, mas ser algo poderoso, algo que possa derrotar os mogadorianos, exige muito mais que medo ou raiva. Exige força. Exige conhecimento, concentração e confiança. Acima de tudo, exige fé.

***

Numa manhã acordei cedo e fiz toda minha rotina, nadar no lago, correr e me exercitar. Fui até o lago me encontrar com Devdan e para minha surpresa ele não estava lá. Espero durante uma hora e começo a achar estranho. Devdan nunca se atrasa. Me transformo em uma mariposa americana que segundo Devdan é o animal que tem o olfato mais aguçado do mundo, sinto cheiros a quilômetros de distancia, mas nenhum cheiro que possa detectar Devdan. Volto a minha forma normal e me teleporto até o Centro de Treinamento e nenhum sinal de Devdan.  Me transformo em uma águia e voo sobre as montanhas do Himalaia e além da linda visão, não vejo nenhum sinal de Devdan. Volto até o lago e volto a minha forma normal e com meu treinamento se sobrevivência busco sinais luta, rastro de algum animal ou algum outro sinal, mas não encontro absolutamente nada. Isso me faz sentir algo que não sentia há muito tempo. Solidão. Só de pensar em ficar sozinho de novo me faz tremer e isso só me faz ter mais vontade de procurar Devdan. Já está quase anoitecendo e é a hora que as naves Mogadorianas aparecem com mais frequência e decido encerrar as buscas e voltar para a cabana.

No dia seguinte acordo cedo e nem sigo minha rotina diária, só consigo pensar em encontrar Devdan. E é isso que faço me transformo nos mais variados animais para tentar encontrar uma pista de Devdan, cachorro, rato, formiga, águia e nenhum sinal dele ou alguma pista que me possa levar até ele. Devdan havia desaparecido e eu mais uma vez estava sozinho nas montanhas. Sinto o mesmo vazio de quando perdi Reynolds e a mesma pergunta vem a minha cabeça. O que vou fazer agora? As vezes queria jogar tudo pro alto e me render, pensar que pessoas haviam morrido em Lorien para que eu pudesse me salvar, isso era torturante. Nunca pedi pra ser um salvador, queria ser normal, ter amigos, ir a escola, ter uma família e até uma namorada. Mas não sou normal, sou um alienígena vivendo em um planeta ameaçado e estava completamente sozinho. Sei que ainda restam mais cinco adolescentes como eu espalhados pelo mundo. Sem Reynolds, no entanto, não faço ideia de como encontrá-los. Não sei qual é a aparência deles; não sei como se chamam. A única coisa que sei é que Reynolds sempre dizia que tínhamos que treinar para nos reunir com os outros Gardes e derrotar os Mogadorianos. Tenho tanta fé nisso quanto em Lorien. Então minha esperança é que um dos outros tenha um plano. Que eles saibam mais que eu sobre os demais. Que o restante da Garde se encontre, e então me encontre, antes que os Mogadorianos me encontrem novamente.