Perigo na Floresta escrita por Crica


Capítulo 10
Capítulo 10


Notas iniciais do capítulo

Perdão pela demora, mas estive lutando com um bloqueio criativo.
O capítulo não ficou com o ritmo que eu queria, mas acho que deu pra colocar os pingos nos 'is'.



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CAPÍTULO FINAL:

“ Da próxima vez em que o meu instinto aranha apitar, eu juro que vou te arrancar pra longe do perigo, nem que tenha que te amarrar e carregar nos ombros, Sam” - Dean observava o sobe-e-desce da luzinha vermelha no aparelho logo acima da cabeça de seu irmão.
Bobby estava cochilando na cadeira estofada, entre os dois leitos hospitalares. Ele parecia muito abatido. O velho caçador tinha dado tudo de si nessa caçada e no resgate de Sam e, por mais que desejasse permanecer vigilante, o cansaço o derrubara sem dó nem piedade.
“ Estou ficando de saco cheio dessa cena.” - O mais velho dos Winchester procurou ajeitar o corpo moído no colchão e acabou por esbarrar no braço do amigo que estava sobre sua cama, despertando-o.

_ Você está com uma cara péssima, Bobby.

_ E você não está muito melhor – puxou o corpo para cima, sentando-se _ Já deu uma olhada no espelho?

_ Eu não me atreveria – um leve sorriso desenhou-se no canto dos lábios _ Deveria ter ido pra casa da Kat descansar. Você está péssimo.

_ Eu vou sobreviver, assim como vocês dois. Somos vasos ruins.

_ Ele está muito pálido e quieto – apontou com o olhar, o irmão mais moço, na outra cama.

_ Tire essa expressão da sua cara, garoto – Bobby vestiu sua armadura _ Não estou a fim de nenhum bebê chorão grudado no meu pé. Seu irmão é forte e já recebeu todos os cuidados necessários. O que ele menos precisa agora é de ficar ouvindo essa sua choradeira.

Bobby conhecia seus garotos melhor do que ninguém. Ele sabia que não poderia dar espaço para os receios de Dean, sabia que precisava afastá-lo dos pensamentos que envolviam a saúde de seu irmão para mantê-lo são. E o que viu dentro dos olhos daquele rapaz era uma mistura perigosa de dor, culpa, raiva e medo.

_ O médico já veio ver vocês? – perguntou, mudando de assunto.

_ Não sei. Acabei de acordar – apertou os olhos quando encontrou a luz que entrava pelo vidro da janela.

_ Vou ver isso – Singer levantou-se, esticando as costas castigadas _ Você vai ficar bem aí?

_ Como um anjinho – sorriu _ Não vou me mexer, eu prometo.

_ Ótimo. Estou muito cansado pra correr atrás de qualquer um – saiu pela porta, deixando os jovens caçadores sozinhos no quarto.

“O que fizeram com você, maninho?” Os olhos do mais velho não saíram de cima de seu irmão “Você bem podia acordar e acabar com essa agonia, cara. Eu estou preocupado aqui.” A falta de resposta do mais moço atravessava seu coração como uma faca afiada. “Vamos lá, Sammy...Por favor... Sai dessa e volta pra mim.”

_ Olá, meu rapaz! – a velha enfermeira gorduchinha voltou _ Como se sente hoje?

_ Maravilhoso – Dean acompanhava os movimentos da mulher, com o olhar.

_ Tome – ela ofereceu um copo com suco _ Vamos começar a alimentá-lo novamente.

_ Oh... Isso parece delicioso... – o líquido amarelo-pálido não era, nem de longe, o que Dean consideraria um alimento.

_ Se você for bonzinho, amanhã passaremos a algo mais sólido.

_ Muito animador – bebeu o restante do suco e devolveu o copo descartável, acomodando a cabeça no travesseiro novamente _ Como está o meu irmão? Por que ele ainda não acordou?

_ O médico virá conversar com você – a senhora robusta passou sua mão sobre o braço do jovem, num carinho _ Tenha um pouco de paciência e descanse, está bem?

Sem responder, Dean observou a enfermeira injetar algo no saco do soro e deixar o quarto em seguida, levando a bandeja com ela. Estava se sentindo muito sonolento. Seus olhos pesaram e tornaram-se nublados. As imagens perderam o foco e a escuridão do sono tomou conta.

***

Já estava escuro quando Dean despertou novamente, com o burburinho de vozes dentro do quarto.

Katyre aproximou-se da cama com o seu habitual sorriso encantador e, atrás dela, o xerife.

_ Como você está se sentindo, querido? – Kat passou a mão pelos fios de cabelo do rapaz.

_ Melhor, eu acho – imediatamente, o olhar do caçador pendeu para o lado, de encontro ao leito onde deveria estar seu irmão e seu coração disparou. Seu cérebro entrou em estado de alerta _ Onde está o Sam?!

_ Tenha calma, rapaz – Thompson impediu que o jovem levantasse _ Seu irmão foi levado para fazer uma tomografia e logo estará de volta. Relaxe.

_ Tomografia? Para que? – todas as marcas de expressão voltaram ao rosto de Dean _ O que há de errado com ele?

_ Se nós soubéssemos não precisaria de exame, gênio – Bobby sentou-se à beira da cama e levantou o boné surrado, exibindo a expressão de ironia.

_ Os médicos só querem saber o motivo pelo qual Sam ainda não acordou – Katyre achou melhor dar uma explicação convincente antes que tivessem que amarrar o rapaz na cama _ Sabendo o que está causando isso, poderão usar um tratamento mais eficaz.

Neste exato momento, os enfermeiros surgiram empurrando a maca na qual transportavam o Winchester mais novo, acomodando-o, em seguida, em seu leito.

_ E então, doutor? – Bobby aproximou-se do médico que entrou por último no quarto.

_ Está tudo certo. Não vimos nada que justificasse essa inconsciência prolongada na tomografia.

_ Então porque meu irmão não acorda?

_ Sinceramente, não sabemos – dirigindo-se ao rapaz deitado _ Não há qualquer sinal de problemas com o cérebro. Tirando a anemia, normal em casos de grandes perdas de sangue, fizemos as transfusões necessárias nos últimos dias e agora tudo funciona perfeitamente bem. Ele já deveria ter acordado.

_ O que podemos fazer para ajudar? – o xerife quis saber.

_ Só podemos esperar, Harry.

_ Se não há nenhuma complicação, doutor, nós poderíamos levar os rapazes para casa?

_ Enquanto Sam não acordar, teremos que mantê-lo monitorado, Katyre.

_Eu trabalho na clínica comunitária da reserva como voluntária e sei como fazê-lo. Posso trocar os frascos de soro e dar-lhe os cuidados necessários, se o senhor permitir.

_ Bem... – o medico inquiriu Bobby com um olhar _ Eu não arriscaria uma transferência, exceto se a família concordar em se responsabilizar pelo rapaz.

_ Nós estamos de acordo, não é Bobby? – Dean procurou apoio no amigo.

_ Claro, garoto. Se Kat diz que pode cuidar de vocês, eu confio. E vamos ajudá-la com isso.

_ Certo. Darei alta aos dois, mas você, rapaz, como parente mais próximo terá um monte de papéis para assinar e vai me prometer não se meter em mais encrencas, pelo menos até estarem completamente recuperados, okay?

_ Sim, senhor – o jovem respondeu com um sorriso sincero e aliviado.

_ Katyre, pode me acompanhar, por favor? – conduziu a pequena mulher morena para fora do quarto – Preciso passar-lhe algumas informações e prescrever umas receitas para esses dois.

Kat saiu, acompanhando o médico e seguiu-o pelo corredor até o balcão do posto de enfermagem, onde conversaram longamente.

***

Antes das sete da manhã, Bobby e Harry apareceram para conduzir os irmãos.

A cama de Dean estava vazia e sua mochila sobre a cama.

Bobby aproximou-se da porta do banheiro e, quando ia bater para verificar se o outro estava lá dentro, a mesma se abriu e um Dean Winchester sorridente e animado saiu, com o cabelo pingando e a mão engessada enfiada num saco plástico.

_ Alta tecnologia – exibiu o aparato para não molhar o gesso e sorriu.

_ Está se divertindo com todo esse circo, não é, idiota?

_ Deixe o garoto, Bobby. Também odeio hospitais e estaria fazendo piada se fosse me livrar deste lugar.

_ O médico já assinou a papelada e arrumou uma ambulância para nos levar até a sua casa, xerife.

_ Está bem informado para esta hora da manhã, moço. A que horas acordou?

_ Sei lá – Dean colocou o restante de suas coisas dentro da mochila e vestiu a camisa por cima da camiseta escura que destacava o colar com o pingente dourado_ Bem cedo, eu acho.

***

“Sammy...”

“Dean, é mesmo você?”

“Sou eu, cara.”

“ Então acho que também estou morto.”

“Não, Sam, você não está morto. Eu não estou morto, mas se não largar o meu pescoço vou estar em breve.”

“Tem certeza? Eles disseram...Disseram que você tinha morrido na montanha.”

“Eu não morri e você também não. Só está dormindo, mas precisa acordar, Sammy. Precisa acordar.”

“Como eu vou saber se você não é mais uma alucinação?”

“Sou eu, mano. Acredite.”

“Eu vi você duas vezes, cara, e a cada vez, acabava sofrendo mais por saber que você não voltaria... e não voltaria...por minha culpa. Eu...”

“Presta atenção, Sam, eu não morri. Acho que estamos sonhando, sei lá. Katyre me mostrou como fazer para alcançá-lo, mas você precisa se esforçar para acordar porque eu não poderei ficar aqui com você para sempre.”

“Você poderia ficar, Dean. Eu não quero voltar.Este lugar é tão tranqüilo... Estou cansado. Você não está cansado de sofrer?”

“Não o bastante para querer morrer. Vamos lá, Sam. Me ajude e acorde. Faça uma forcinha e volte para nós.Kat disse que não poderia me manter muito tempo fora e eu definitivamente não estou pronto pra abrir mão da minha vida, por pior que ela esteja, mano.”

“Tem certeza de que vai estar lá, se eu acordar?”

“Eu juro. Não vou abandonar você, garoto.E você vai açodar, não vai, Sam, por mim? ”

_Dean? – Kat sacudiu o ombro do rapaz _ Dean, você precisa voltar. Não temos muito tempo.

“Eu preciso voltar, Sammy. Preciso ir agora e vou esperar por você.”

“Por favor, Dean, não vá. Não me deixe sozinho outra vez...”

“Eu não posso ficar, Sam, e você também não. Tem que voltar, tem que querer voltar... logo...”

_ Kat... – a voz saiu meio enrolada, um pouco mais que um sussurro _ Eu o vi – puxou o corpo para cima e apertou as têmporas para conter a dor de cabeça _ Acho que conseguimos.

_ Sim, meu querido, nós conseguimos – acariciou a face do rapaz _ Agora descanse. Você deve estar exausto.

_ Ele vai voltar? – puxou o corpo mais para cima na cama e retirou a fita de couro que atava seu pulso ao de Sam, na cama ao lado _ Quero dizer, não foi só um sonho, foi? Nós realmente conversamos...

_ Não foi um sonho, Dean – Katyre aproximou-se de Samuel e desatou o nó de seu pulso _ O feitiço que usamos é magia muito antiga, dos primeiros do meu povo, de quando o Búfalo Branco ainda corria pelas pradarias. Nós levamos o seu espírito até o de seu irmão.

_ Aquele lugar, Kat, era tão tranqüilo, tão bonito, tinha... tanta paz... Dá vontade de ficar, sabe?

_ Mas não cabe a nós decidir a hora em que devemos partir. Não chegou a hora do Sam nem a sua. Vocês dois têm ainda muita história a escrever.

_ Estou cansado.

_ Eu imagino – levantando-se da beirada da cama, Katyre afastou-se em direção à porta _ Descanse um pouco. Vou descer e ajudar Bobby e Hanry a proteger a casa. Trarei o jantar para você mais tarde, está bem?
Dean concordou com um aceno da cabeça e fechou os olhos, assim que a mulher deixou o quarto. Não dormiu. Não conseguia parar de pensar em tudo o que tinham passado e no quão perto da morte Sam esteve. Apenas deixou as pálpebras caírem, cobrindo sua visão e permitiu que seu corpo relaxasse.

***

_ Eles estão bem? – Harry inquiriu sua esposa que descia os degraus.

_ Sim, estão bem.

_ Você parece muito cansada – Bobby observou enquanto preparava os aparatos para a proteção da casa dos Thompsom.

_ É, estou mesmo cansada – sentou-se no sofá, ao lado do marido e recebeu deste um carinho _ O caminho que trilhamos lá em cima é muito cansativo e perigoso.

_ E você acha que funcionou? – Harry serviu uma xícara de chá à esposa.
_ Tenho certeza que sim – recebeu a gentileza do marido, agradecendo com um sorriso _ Dean se lembra de tudo, da conversa que teve com o irmão. Só podemos torcer para que Sam tenha entendido e lute para voltar. O seu despertar depende apenas dele agora.

_ Você deveria subir e dormir um pouco também, querida.

_ Estou bem, Harry. Quando estivermos seguros, terei muito tempo para descansar e dormir.

_ Não creio que o tal do vampiro do qual você falou vá se arriscar a vir até aqui depois de tudo – Bobby aproximou-se e aceitou o café servido pelo policial _ Ele não tem mais aquelas aberrações e deve saber que estaremos preparados.

_ Ele sabe, Bobby, mas nós não sabemos o que o move agora. Ele se manteve oculto por séculos, fiel a um pacto com o meu povo, com o objetivo de proteger sua família, mas agora ele não tem mais nada. Não tem mais nada o que perder.

_ Pelo que sei dessas criaturas, ele conhece o nosso cheiro, principalmente o dos garotos e, se decidir caçá-los, vamos ter trabalho – Bobby verificava as trancas repetidas vezes _ E depois de John ter matado a mulher e a filha dele, provavelmente há de querer vingança.

_ Por isso nos preparamos, Singer - Harry até parecia um caçador experiente com tanta determinação _ Vamos acabar com essa coisa.

_ Não fico nem um pouco à vontade em usar os rapazes como iscas. Eles não estão em condições de lutar.

_ Nós cuidaremos deles, Katyre.

_ Acho que vou preparar algo para comermos – Kat precisava manter sua mente ocupada com algo que não envolvesse sangue e morte _ Se os deuses ajudarem, teremos mais uma boca para alimentar ainda hoje.
O velho caçador viu a pequena mulher morena enrolar a trança comprida num nó atrás da cabeça e seguir em direção à cozinha, seguida de perto pelo marido.

Era líquido e certo que alguma força superior estava olhando por eles porque, só o fato de terem saído vivos da montanha já era um milagre.

***

_ Sammy... – Dean acomodou-se no chão junto à cama de seu irmão e segurou sua mão entre as suas _ Cara, quanto tempo você ainda vai demorar para acordar? Será que não ouviu uma palavra do que eu disse ou é tão estúpido e teimoso que prefere morrer?- limpou o nó que tinha na garganta _ Se não acordar, não vai viver para me ouvir admitir que você tinha razão. Você estava certo, Sam. Estava certo sobre o Pé-Grande e tudo mais. A coisa realmente existe. Eu vi. É enorme, exatamente como na descrição dos mitos – torceu o nariz _ e fede... como fede! – respirou profundamente e segurou o ar por um momento _ E esse papo não está nos ajudando muito, não é? – lutava para manter a barreira invisível que segurava as lágrimas nos olhos _ O que mais eu posso fazer? Eu não vou conseguir continuar sem você, Sammy... Eu... não posso, Sammy... Não sei como...

_ Dá pra parar de molhar a minha mão com essa choradeira, por favor – a voz sussurrada de Sam ecoou como música aos ouvidos de Dean.

_ Graças a Deus...- o mais velho ergueu-se e puxou o corpo do irmão para um abraço _ Merda, Sam, você quase me mata do coração... – um abraço para trazê-lo de volta à vida e mantê-lo assim, a salvo.

_ Dean... Você está me sufocando...

_ Me desculpe – apartou-se do mais moço e sorriu, sem jeito, limpando o rosto molhado _ Me desculpe, cara – permitiu que o caçula descansasse o corpo no colchão novamente _ Como você se sente?

_ Com o corpo moído - ajeitou-se com uma expressão muito cansada _ Quanto tempo... como você me encontrou?

_ Essa é uma história muito comprida, maninho e teremos tempo para conversar mais tarde sobre tudo – Dean puxou os travesseiros para cima, acomodando seu irmão sobre eles, com cuidado _ Você esteve inconsciente por muito tempo, mas agora está acordado e vai ficar tudo bem.

_ Aonde você vai? – Samuel sobressaltou-se ao perceber o afastamento do mais velho.

_ Vou avisar o Bobby que você voltou e buscar-lhe um copo de leite – um sorriso iluminado decorou o rosto de Dean _ Posso apostar que está faminto, acertei?

_ Meu estômago dói.

_ Eu sabia. Fique quietinho aí que volto num segundo.

Dean saiu e fechou a porta atrás de si, deixando um jovem Winchester bastante confuso sobre a cama junto à janela.

Os olhos de Samuel percorreram o quarto na penumbra. Ele não reconhecia aquele lugar. Definitivamente, aquela não era a casa de Bobby. As paredes claras, as cortinas na janela, o perfume de flores e a organização dos móveis só vinham a confirmar o que seus olhos percebiam. Também não sabia explicar o motivo pelo qual se sentia tão seguro naquele lugar.

***

Três dias se passaram desde o despertar do filho mais novo de John Winchester.

Três dias repletos de novidades, de longas e assustadoras histórias e de um final feliz, só para variar.

Três dias que bastaram para que Sam se sentisse, como Dean e Bobby, parte da família de Harry e Katyre.

Dean passou todas as horas daqueles últimos três dias ao lado do irmão e ocupado com os cuidados com ele, orientado pela amiga. Sorria satisfeito ao ver a cor voltar ao rosto de Sam e o riso solto acender-lhe o rosto, substituindo a escuridão das olheiras.

***

_ Para onde vamos afinal? – Sam saiu do pequeno banheiro enxugando o cabelo.

_ Até a aldeia Sioux – Dean respondeu, amarrando os cadarços das botas, ainda sentado na beirada da cama _ Katyre quer que a gente assista a cerimônia do Billy.

_ O garoto Yankton que te ajudou a me encontrar?

_ O próprio – vestiu o agasalho mais pesado e jogou outro para o irmão _ Hoje o garoto vai receber seu nome. Sem falar que vai rolar uma festa depois e, sabe como é, comida de graça... – estalou os lábios, sorrindo de lado.

_ Você é incorrigível, sabia? – Sam não conteve o riso.

_ Pois é – ajeitou o casaco _ sou mesmo. Vamos nessa?

***

À noite, na reserva, a aldeia estava iluminada por lamparinas e os nativos vestindo seus trajes cerimoniais. A sensação era de que estavam entrando num daqueles filmes do velho oeste, com todo aquele couro e penachos coloridos e grandes cocares de penas e contas.

Havia uma roda, ao centro da qual, crepitava uma enorme fogueira de troncos empilhados. Num local mais afastado, homens tocavam tambores enquanto o resto do povo entoava cânticos em sua língua nativa. Mulheres jovens, com vestidos compridos, dançavam em círculos, ao redor do fogo, exibindo a beleza de seus rostos pintados.

Os quatro homens brancos foram encaminhados para seus lugares na cerimônia e sentaram-se sobre o tronco deitado na neve branca.

Quando Katyre surgiu de dentro de uma tenda, gritos ecoaram pela floresta e por toda a vila, numa saudação eufórica à mulher santa, à Wanca, vestida de branco, cabelo trançado e enfeitado com penas e contas multicoloridas e o manto do búfalo sobre os ombros. Parecia mesmo uma rainha ou uma deusa. Em nada lembrava a mulher miúda que desposara o xerife Thompsom.

Atrás de Kat, vieram Lobo Veloz, também adornado à caráter, seguido por seus dois filhos mais velhos.

Os tambores silenciaram ao levantar das mãos da sacerdotisa, abrindo caminho para o pequeno Billy, guiado pela mãe, que o deixou no centro da grande roda junto à Katyre e se retirou, anunciando a seu povo que seu filho menor deixava os braços de sua mãe, se tornando um homem.
O velho pai de katyre juntou-se à filha para ungir o corpo tronco nu do menino com as cinzas da borda da fogueira.

Billy, apesar da friagem, mantinha-se imóvel. Nem um músculo em seu corpo denunciava qualquer desconforto com a temperatura.

Das mãos de Lobo veloz, o jovenzinho recebeu sua túnica, bordada por sua mãe, com a história dos seus ancestrais e, em seguida, seus irmãos mais velhos, trançaram seu cabelo, prendendo neles, uma pena de águia.

Katyre aproximou-se de Billy, retirou o manto do búfalo de seus ombros e vestiu-o no mais novo guerreiro de sua tribo.

Neste momento, Lobo Veloz gritou o nome pelo qual seu filho mais moço seria reconhecido dali para adiante e para sempre, diante dos antigos.

O povo todo respondeu ao grito do guerreiro, aceitando o jovem em seu seio.

Pela primeira vez, desde que chegaram, Dean sentiu seu coração se encher de orgulho, quando Billy dirigiu a ele um olhar e um sorriso. Naquele sorriso estava a recompensa e a cumplicidade.

Ao final da cerimônia, as mulheres mais velhas apareceram com vários pratos feitos com milho e assados.

_ Ei, Grande Urso! – Dean apertou a mão do rapazinho e abraçou-o _ Belo nome, cara!

_ Você gostou mesmo? – Billy riu, animado.

_ Nome de macho, moleque! – o mais velho bateu atrás da cabeça do garoto _ Ah! Você ainda não conhece, Sam, mas este é Billy Grande Urso, o cara que salvou os nossos traseiros.

_ É um prazer, Billy, e muito obrigado por tudo – Sam apertou a mão do menino _ Dean tem falado muito de você. Foi muito corajoso o que fez, obrigado mesmo.

_ Não tem de que – sorriu, encabulado _ Você vão ficar para a festa?- voltou-se para Dean com um brilho no olhar _ Vai ter muita comida e minha avó preparou um assado especial.

_ E você ainda pergunta?! – Bobby riu, batendo nas costas do Winchester mais velho _ Esse sujeito não recusa comida, principalmente de graça, garoto!

Todos seguiram Billy ao local reservado para eles na festa e passaram boa parte da noite entre conversas animadas e risadas, principalmente quando o assunto pendia para o apetite do irmão de Samuel.

_ Querem saber? – Dean levantou-se e acarinhou a barriga, sorrindo satisfeito _ essa bebida de milho que você fazem é muito boa, mas deixa a gente doido pra tirar a água do joelho.

_ Dean!

_ Qual é, Sammy. Estamos entre amigos aqui. Deixa de frescura. Vai dizer que a sua bexiga não tem fundo?

_ Vá por ali, Dean – Billy apontou a direção _ Não tem como errar.

_ Perdoem o meu irmão – Samuel estava roxo de vergonha _ Ele perde a noção quando bebe um pouco.

***

“Porcaria de banheiro... Cara, não dava pra fazer a ‘casinha’ mais perto de um lugar iluminado?” O caçador resmungava, aproximando-se da pequena construção de madeira que servia como aposento sanitário. Entrou e não demorou muito para sair “ Que maravilha... Pronto pra segunda rodada.”

Um par de mãos fortes e frias imobilizaram o jovem caçador ainda junto à parede do banheiro e o forçaram a chocar seu corpo contra a construção.

O coração de Dean falhou uma batida quando encontrou os olhos gelados de Anton e disparou, em seguida, descompassado quando sentiu os dentes afiados afundando em sua carne e atravessando sua jugular. Suas pernas bambearam e seus olhos perderam o foco por um breve momento. Tempo suficiente para que o morto-vivo o arrastasse para a parte de trás do cômodo, onde não correria o risco de ser visto por algum passante.

Anton levantou Dean pela gola do casaco e bateu em seu rosto para despertá-lo.

_ Seu pai e você destruíram a minha família, rapaz – o sangue ainda pingava das presas do vampiro _ Agora, você vai substituir meus filhos.

_ Me mate... Acabe com isso de uma vez...

_ Não, eu me alimentei do seu irmão e sangrei nele.

_ Não!

_ Eu deveria ter percebido, mas me deixei levar pela possibilidade de transformá-lo e ter alguém civilizado para acompanhar minha solidão.

_ Você não vai ter o Sammy, seu monstro! Nem a mim! Eu prefiro a morte!

_ Você tem razão. Não terei seu irmão. De alguma forma, ele é imune. Há algo naquele rapaz, em seu sangue que o torna especial. Ele não será um vampiro, mas você, meu caro, você é muito comum...

_ Vai pro inferno!

_ Não vai demorar. Logo você será como eu e terei uma família novamente.

O mero pensamento de ser transmutado em um vampiro fazia o estômago de Dean dar cambalhotas. Todo o seu corpo gritava por uma reação, mas algo o impedia. Seus membros estavam imóveis, ao contrário de seus sentidos.

Anton aproximou-se mais do rosto do Winchester e inspirou o ar perfumado pelo sangue de sua vítima que escorria pelo pescoço e provou dele mais uma vez.

Dean fechou os olhos e apertou-os como se, com isso, pudesse escapar do destino que o aguardava.

Um som metálico e a brisa provocada pelo deslocamento do ar, liberaram os respingos do líquido viscoso manchou o rosto do rapaz.
Algo tinha acontecido porque Dean poderia jurar que era a voz de Sam que falava com ele, perguntando se estava bem e pedindo que abrisse os olhos.

E era. Era Sam quem estava ali. Mal podia crer na imagem diante de si. Seu irmãozinho segurando-o pelos ombros e sacudindo em busca de uma resposta. Suas pernas falharam completamente e seu corpo escorregou para baixo, até que encontrou o chão gelado. Estava tonto e a última coisa que viu foram os vultos de outras pessoas chegando apressadas, falando todas ao mesmo tempo.

***

Já estava mais do que na hora de partirem.

Bobby e Sam tinham colocado a bagagem na mala do Impala e Katyre terminava de trocar o curativo no pescoço de Dean.

Billy apareceu acompanhado de seus irmãos e trouxe presentes para os Winchester: dois colares de pequenas contas em tons de azul, tendo ao centro, um pequeno urso entalhado em madeira. O menino explicou que o urso é o portador da fortaleza do amor, na crença de seu povo e que, assim sendo, ambos estariam protegidos pelo sentimento que os unia.

Os mais jovens seguiram para fora da casa acompanhados do xerife, deixando Bobby e Katyre para trás.

_ Não tenho como agradecer por tudo o que vocês fizeram por nós, Katyre.

_ Nós estaremos aqui, se precisarem, Bobby. Sabe disso, não é?

_ Eu sei, Kat e, mais uma vez agradeço – Singer beijou o rosto da mulher e se afastou.

_ Bobby... – o caçador voltou-se para Katyre _ Fique de olhos nesses meninos. Eles precisam de você mais do que pode imaginar e creia-me, eu gostaria de estar errada, mas ainda há muito mais por vir.

_ Eu vou ficar – Singer saiu e dirigiu-se ao automóvel, cumprimentando o xerife e os rapazes Yankton no caminho _ Chega pra lá, idiota _ ordenou que Dean fosse para o banco do carona _ Hoje quem dirige sou eu e nada de reclamações! – enviou um olhar ameaçador ao jovem amigo _ Ainda estou te devendo uma surra.

O motor ronronou, acelerando pela estrada de terra, elevando uma nuvem de poeira em seu rastro.

FIM


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado da história.
Obrigada pela audiência e pela paciência.
Beijos no coração de cada um que acompanhou.