A sorveteria não era exatamente o que se espera de uma sorveteria; apertada, simples ou suja... Nem era exatamente uma sorveteria. Era um cybercafé com sorvetes artesanais excelentes.

Esta era bem organizada com umas mesas de madeira bem afastadas, algumas poucas lâmpadas que iluminavam o bastante para criar certo clima. E em uma destas mesas estava Len, um garoto bastante pequeno para seus quatorze anos, mas com lindos globos oculares de um azul intenso e um cabelo loiro sedoso que o fazia deveras bonito.

Sentado do outro lado da pequena mesa de superfície esbranquiçada, estava Kaito. Alto e com as mechas estranhamente azuladas, criava uma visão de um menino engraçado e descontraído. Distraído, comendo sua parte da banana split com sorvete napolitano, puxava algum tipo de conversa com o loiro.

– Então, se não se importar em responder, em que lugar da cidade você mora?

Len, que até então estava focado na banana split que dividia com seu par - deixando-o todo lambuzado - levantou a cabeça e ficou por alguns segundos olhando o rosto de Kaito até responder:

– Para ser sincero eu moro no subúrbio, em King's Farm perto da estação Shady Grove de metro da linha vermelha.

O menino mais velho se esforçava para colocar um pouco da parte do sorvete que era de morango dentro de sua colher, já que a mesma já estava ocupada com um pedaço da banana. Prendendo a língua entre os lábios em concentração, acabou se decidindo em colocar a banana na boca e rapidamente colocar também o sorvete, em outra colherada. Sorriu satisfeito e voltou seus olhos de um azul quase roxo ao menino mais novo.

Abriu um sorriso torto:

– Eu moro em Rockville. É muito longe? Eu não sei. Não presto muita atenção a essas coisas.

O loiro ficou um tanto quanto surpreso em saber onde morava seu parceiro, se é que assim poderia chamá-lo.

–Rockville?! Mas é apenas uma estação de diferença! Significa que dá pra gente se encontrar sempre! YEY - Indagou Len eufórico e tremendo de alegria.

Kaito abriu um sorriso forçado e nervoso. Às vezes, se sentia desconfortável com a animação do garoto. Não sabia ao certo o porquê, mas ao mesmo tempo em que o loiro o dava certos sustos, existia um medo estranho de decepcioná-lo.

– Sim... Sempre. Yay

Len não podia acreditar na possibilidade de poder encontrar com Kaito sempre que quisesse. Pensar em ter aquele ser maravilhoso sempre ao seu lado, com seus lindos cabelos longos e olhos de um azul tão intenso que simplesmente não conseguia desviar o olhar, ou falar qualquer coisa, perdidamente emerso nos olhos de Kaito. E sem nem perceber não pode evitar sua cabeça cair um pouco para o lado e soltar um leve suspiro.

O menino de mechas azuis comia silenciosamente, as colheradas de sorvete lhe congelando o cérebro pouco a pouco. Encheu a boca de comida depois de falar, pois de repente estava constrangido. Eram sentimentos de vergonha e derivados que o menino avoado quase nunca sentia. Ele agia muito e pensava de menos. Sentir-se obrigado a batucar os dedos na mesa e desviar o olhar dos olhos azuis de quem estava na sua frente era um sentimento diferenciado, para ele. Costumava ser desinibido, na maior parte do tempo. Muitas vezes com professores, o que o colocava em situações constrangedoras simplesmente por esquecer-se de pensar em suas palavras.

Ouviu um baixo suspiro, e levantou a cabeça. Deparou-se com o rosto sonhador e tão delicado do mais novo e engasgou brevemente no pedaço de banana que comia.

O mais novo se assustou com o som emitido por Kaito, fazendo com que seu braço que apoiava a cabeça escorregasse para o lado e ele próprio caiu depois de uma leve pancada na borda da mesa, só dizendo:

– CHIIIIIIIIIIIIIII!!! –

Kaito de arrepiou de susto com o que o garoto caiu da cadeira. De repente, todos da sorveteria o encaravam, com os olhos arregalados e expressões bravas. O mais velho se levantou com pressa, pagou a comida rapidamente e puxou o loiro pela mão arrastando-o pelo chão. Traiza também suas mochilas. Quando quase saía do estabelecimento, parou e olhou para trás, a sua banana split mal terminada sobre a mesa. Soltou Len, foi correndo pegar o pote de comida com um braço levando a acidentalmente chutar a cabeça do pobre coitado desacordado, e correu de volta para a saída com o mais novo em seus calcanhares cambaleando.

Ao chegar do lado de fora, colocou o pote de sobremesa e as mochilas no chão ao lado de seus pés e sentou Len, o encostando à parede. Ajoelhado na frente do loiro, lhe dava leves tapas no ombro e na bochecha, repetindo o seu nome com uma voz preocupada:

– Len, por favor, acorda. Len, hey. Len, loiro, acorda. Desculpa Len, me perdoe. Hey Len, acorde.

Ainda de olhos fechados e inconsciente, Len cantava em um desafinado som:

– Hey I just met you... and this is crazy... but here's my number....so call me maybe... –

O som randômico que saiu dos lábios do pequeno fez o veterano rir. Pousando a mão no ombro do loiro pelo que podia ser a décima vez no dia, ele o sacudiu de leve.

– Você precisa me dar o seu número, primeiro –

Lentamente o loiro abriu as pálpebras, emitindo um som bem fácil de confundir com um ronronar. Ainda deitado, só pode ver o rosto de Kaito a alguns centímetros de seu, e terminou de acordar com um susto.

– Onde eu estou? O que aconteceu? Kaito conta o que aconteceu detalhes, por favor! –

O mais velho riu-se, passando os dedos pelas mechas claras e macias que estranhamente tanto o encantavam.

– Espere – disse, pegando sua mochila do chão e tirando um caderno vermelho de lá de dentro. Rasgou uma folha e puxou uma caneta do bolso menor da bolsa, escrevendo rapidamente antes de devolver o papel ao mais novo.

– O meu número. Ligue-me quando achar conveniente – disse, se levantando e abrindo um meio sorriso antes de pegar a mochila e se afastar.