Eragon

Quando o elfo Blödhgarm me disse que Nasuada estava chamando no espelho, eu e Saphira saímos correndo, quase que como apostando uma corrida, cada um querendo chegar logo.

O grande castelo que eu havia conseguido construir em tão pouco tempo, era, me orgulho de dizer, lindo. Ele despencava em uma montanha, como que se encostando nela, desde o topo, até o chão. Sim, sim, ele era realmente gigante. Mas, com magia e cavaleiros e seus dragões ajudando, dava para se construir um desse em no máximo, um ano. E ele precisava, realmente, ser enorme assim, porque tínhamos cavaleiros e dragões que precisavam caber com simetria e sem apertos desconfortáveis, cada um em seu quarto. No entanto, mesmo sendo gigante assim, eu havia percebido há algum tempo que não ia ser o suficiente, então, já começara a preparar a construção de outro castelo.

A janela dos meus aposentos era no topo do castelo, uma torre enorme, com o teto aberto. Ele podia ser fechado, claro, mas eu gostava de mantê-lo aberto. Era um ótimo jeito para Saphira entrar e sair quando quisesse.

Eu estava correndo ao seu lado, quase empatados, e sincronicamente, eu pulei em suas costa exatamente no segundo que suas costas ficaram alcançáveis. Ela alçou o voo, e eu senti aquela imensa satisfação que ela sempre sentia quando voava.

Em um segundo, já estávamos no topo do castelo. Ninguém havia nos visto, porque, como eu disse, era meu dia de descanso, e os elfos estavam no lago, começando a trabalhar no projeto que entreguei a eles, para o castelo novo.

Entramos desabalados nos aposentos. Blödhgarm havia ficado no chão, ultrapassado pelo voo de Saphira, é claro.

É óbvio que eu estava maluco para saber o porque de Nasuada estar me chamando do grande espelho Dourado. Ele era apenas para emergências. O que poderia ter acontecido agora?, eu pensava.

Tentei me acalmar enquanto abria a porta secreta onde estava o espelho dourado. Talvez ela só quisesse dizer um oi.

Mas eu sabia que não era isso. Eu havia dito a Nasuada que só me convocasse para emergências, e ela não desrespeitaria esse pedido.

– Calma, pequenino. Ficar nesse frenesi não adianta de nada. Abra logo essa porta, e encararemos juntos o que quer que seja. - Saphira me disse.

– Vou tentar. - eu respondi.

Peguei o espelho, que estava coberto por uma manta, e o coloquei em frente a enorme cama, na qual eu quase nunca dormia, preferindo me aninhar junto de Saphira na realmente imensa almofada dela.

Quando já ia descobrindo o espelho, percebi que provavelmente o conselho de guerra estaria reunido, e isso incluía...

– Arya. - completou Saphira na minha cabeça. - Você acha que... sabe, está pronto para vê-la?

Arya... era como um tabu, do qual eu só falava com Saphira, do mesmo jeito que ela falava comigo sobre a saudade que tinha de Fírnen. Mas nós tentávamos evitar esse assunto. Doía demais. Desde que eu havia chegado ali, e começado a construir toda a minha 'vida', se eu posso chamar assim, nunca, nunca mesmo, houve um minuto no qual em não pensasse em Arya. A dor dos outros era absolutamente dilacerante, mas a de Arya... Era como se, além da sensação de vazio, houvesse uma necessidade. Sim, a palavra era essa. Necessidade. De estar com ela, falar com ela, vê-la. Mas eu sabia que, mesmo que pudesse, isso não seria o suficiente. Havia passado o tempo em que eu podia ignorar meu amor por ela.

– Eu não sei, mas tenho que estar, não é? Nasuada está chamando, e isso significa que tem algo errado.

– Não significa só isso, Pequenino. Significa Arya, Murtagh, Roran, Katrina, sua sobrinha, Orik, Islanzadí e a própria Nasuada, como pessoa, e não como rainha. Você sabe disso.

– Eu sei, mas isso não significa que posso dar as costas a eles, quando eles precisam de mim, só para me poupar da dor de vê-los e depois ter que dar adeus.

– Sim, sei que precisamos ver o que quer que seja. Só quero lhe preparar. Sabe que não será fácil.

– Sei.

– Então, descubra logo isso.

E eu descobri. Lentamente, peguei a manta de veludo e fui a arrastando para o chão. Quando o espelho estava totalmente descoberto, eu me posicionei em frente a ele, e pronunciei as 'palavras-chave'.

– Eragon, o Cavaleiro, o Matador de Espectros, está aqui.

Alguns segundos foram necessários para o processamento da magia.

Então, o espelho tremulou, como se fosse um lago que havia sido perturbado.

E em um segundo, antes que eu pudesse preparar a mancha negra que agora era minha alma, por estar distante deles, antes que eu pudesse sequer dramatizar o momento, lá estavam eles.

–

Estavam em um semi-círculo em volta do espelho, e Nasuada estava em frente a ele. A cor da sua pele, extremamente escura, bonita como sempre, vestida em um longo vestido amarelo-torrado. Ela parecia pasma, com os olhos cheios de lágrimas, e sem conseguir falar nada.

Meus olhos não percorreram o semi círculo como eu planejava, ou seja, olhando para cada um.

Meus olhos procuraram automaticamente, desesperadamente, necessitadamente, por ela.

E lá estava ela. Em seu charme élfico, de mulher guerreira, com calças de couro preto bem justas, e uma blusa de botões branca, que a deixavam muito bonita, muito mais linda do que a Arya de minhas memórias, que não lhe faziam justiça.

O rosto dela, com os olhos verdes, e o cabelo extremamente preto caindo ao redor, estava duro, como sempre o que me fez sentir uma pontada no coração. Será que ela não sentia nem um pouco de falta de mim? Então, meus olhos desceram até suas mãos, que, percebi, tremiam. Quando voltei a seu rosto, ela sorria, ainda que ainda parecesse estar muito controlada, pensei ter visto seus olhos cintilarem com uma lágrima por um segundo, antes de que Orik gritasse:

– Eragon, meu irmão!

E aí, todos explodiram em saudações. Roran não estava ali, mas estavam Orik, Murtagh, Angela, Arya é claro, a menina-bruxa Elva, Islanzadí (essa me olhava estranho. Não entendi o porque), e Nasuada, claro.

– Ah, seu Cavaleiro de meia tigela, o que você estava pensando quando foi embora? Isso aqui é uma chatice sem você! E Nasuada vem com reuniões, e Murtagh com viagens, e Arya com problemas, aliás todo mundo com problemas!

– Angela! - gritaram todos ao mesmo tempo.

– Ora, não é mentira.

– Angela, ... Ah, quer saber? Deixa para lá! É tão bom ver você, Eragon!

– Sim, é um prazer vê-lo de novo, Cavaleiro. - o tom de Islanzadí era frio.

– Ah, irmão, que saudades de nossos duelos de espada! -Murtagh tinha um sorriso brincalhão no rosto.

Todos disseram tudo isso muito rápido, e eu mal tive tempo de responder.

– Argh... - pigarreei, pois percebi que o nó na minha garganta havia chegado aos olhos. - É... eu nem consigo descrever... o quanto é bom ver vocês de novo. Eu estive arrasado, sem precedentes, desde que fui embora... - baixei a cabeça.

Então, levantei de novo. Eu e Arya não havíamos nos falado, exceto pela troca de olhares. Enquanto todos haviam chegado mais perto do espelho, ela continuava em seu lugar.

Meu coração era uma pedra.

– Princesa Arya. - eu disse, ao resolver tratá-la formalmente.

Por um momento, achei que ela iria sorrir, e se derreter como os outros. /mas, não foi bem assim. A expressão dela voltou a ficar dura.

– Cavaleiro Eragon.

Todos olhavam, como se soubessem que havia algo de estranho ali.

– Detesto interromper o clima, mas Eragon, temos de falar do que fez Nasuada convocar você. - disse a menina bruxa, Elva.

– Ah, claro... Olá, Elva.

– Olá, Cavaleiro.

A menina estava bem maior, como se já tivesse uns dez anos.

– Bom, Eragon. Eu gostaria de chamá-lo para a sala de reunião, mas acho que é impossível. Eu vou direto ao ponto, depois falamos de Roran, tenho certeza que você quer sabe onde ele está, e tudo mais. Mas, a questão que temos que falar aqui, são os Galbatorix's.

– Os... o que? - eu nunca tinha ouvido falar daqueles "Galbatorix's", mas, pelo nome, soube que boa coisa não era.

– A Bruxa Angela vai explicar.

E ela explicou. Falou da sociedade secreta dos servos de Galbatorix. Falou de como roubaram os ovos de dragão. E dos ataques a Arya e Murtagh.

– Como é? Eles atacaram vocês? - aquilo me deixou com muita raiva.

Por fim, Angela terminou.

Eu fiquei em silêncio. Nunca imaginei que ao sair da Alagaësia, deixaria tal perigo para trás.

– Muito bem... vou mandar vários Cavaleiros. Os melhores. E eles vão...

Angela me interrompeu.

– Se eu estivesse aí, lhe transformaria em um sapo. Queremos que você volte. Entenda, o perigo em questão não é brincadeira. Magos muito fortes. Seus iniciados nunca dariam conta.

– Mas... Angela... sua profecia...

– Pode parar aí mesmo, garoto. - e então, ela me explicou de sua pesquisa com os dois elfos, e a verdade sobre profecias.

– Então... eu posso voltar? Mesmo, mesmo?

– Mesmo, Eragon. Precisamos de você - Nasuada disse.

– Eu... não sei... quem ficaria com os iniciados?

– Tenho certeza que os elfos são capazes, Cavaleiro. - disse Islanzadí.

– Volte para nós, Eragon. o Dûrgrimst Ingeitum precisa de você, - disse Orik.

– Mas... é que...

– Sem mas, Eragon. Venha. - foi Arya que disse isso, e todos os meus contras caíram.

Respirei fundo.

– Eu irei.

Todos começaram a gritar, comemorar.

– Bem, Eragon, arrume suas coisas. Parta ainda hoje. Queremos vê-lo em até cinco dias.

– Eu partirei.

– Até mais, Eragon!

– Até mais, Cavaleiro!

Todos se despediram.

Arya chegou perto, por fim.

– Estamos esperando, Cavaleiro.

E cortamos a ligação.

– Precisamos correr, Saphira.

– Eu sei, pequenino. - Ela ficara a maior parte do tempo, em silêncio, o que não era típico.

Saímos do castelo. Soprei um apito, bem alto.

Num instantes, cores para todos os lados estavam me rodeando.

– O que houve Eragon-elda?

– Em que podemos ajudar, mestres?

Todos ao mesmo tempo, meus cavaleiros falaram.

– Eu irei voltar a Alagaësia. Sérios problemas estão ocorrendo lá. Eu preciso ir.

Todos concordaram. Eu j´´a havia os ensinado a fazer o que eu mandava.

– Os elfo ficarão no controle. Eles e... - não precisei pensar muito na escolha do Cavaleiro, nesse caso, Amazona, que comandaria também.

– Katherine... É você.

Ela era uma menina muito bonita. Devia ter uns dezoito, dezenove anos. Os cabelos lisos e castanhos caíam ao redor do rosto, que tinha belos olhos da mesma cor. Ela era calma, preocupada, e uma líder bem legal. Uma das Amazonas e Cavaleiros também, mais aplicada.

Ela levantou os olhos para mim.

–Sim, mestre. Devo auxiliar os elfos?

– Sim. - eu respondi, sério.

Ela sorriu.

– Qualquer coisa, contato o senhor.

– Faça isso. O resto, se comportem! Sim, Bryan, eu estou falando com você!

Eles sorriram e se espalharam. Eu sorri também.

Juntei tudo o que precisaria para a viagem, e Saphira também.

– Quero partir mesmo ainda hoje.

– É claro, Saphira. Antes do anoitecer, estaremos na estrada, por assim dizer.

– Você... está bem em voltar? Sabe que terá que retornar para cá, não sabe?

– Sei sim, Saphira. E, acredite em mim, vai doer muito.

– Então, porque essa expressão alegre e tranquila, satisfeita?

– Por que o Cavaleiro Sempre Voltará a Seu Lar.