Break Of Dead escrita por Write Style


Capítulo 8
(V 2) | Capítulo 1 - Chased Mind, Broken Heart


Notas iniciais do capítulo

Volume 2 --Death Always Wins-- "You can hide yourself, you can get a group and you can also feel safe.
But never forget one thing: Even if you go to fight, in the end, dead always win."
Imagem do volume 2 para os curiosos:
http://img405.imageshack.us/img405/4707/dgfddhfgh.jpg
Podem deixar a vossa opinião sobre a abertura deste volume ^^



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Nunca me senti melhor. Estava quente e parecia que todo o frio teria desaparecido da fase da Terra; Não pensava em mais nada que aproveitar o momento e esquecer tudo o que se passara… Mas o que se tinha passado mesmo?

Depois vem a sensação de satisfação completa e com todas as letras, quando no horizonte, aquela figura aparece, esguia e como sempre a conheci, que mesmo ofuscada por uma estranha luz brilhante demais, eu conseguia distinguir, não é mais que isso, eu consigo ouvir, sentir e reconhecer. A menos de cinco metros de mim, vejo finalmente a pessoa que me conhecia melhor que ninguém, com os longos cabelos arruivados e aquele sorriso parvo que lhe fica tão bem. Emily usava aquele vestido de seda longo do dia do baile de finalistas, pois sabia perfeitamente como eu o adorava.

Sorri-lhe a abracei-a e sabia apenas que não a via á muito e que aquilo sabia tão bem. O calor das suas mãos e o bom que era a sua presença. Estivemos abraçados por muito tempo a meu ver, até que os seus olhos cor de mel se cruzaram com os meus e os seus lábios se aproximaram. Mas eu não senti nada, aquela adrenalina do sabor da sua boca desaparecera. Afastei-me e voltei a olhar para ela e ali estava.

Foi então que finalmente a consciência pareceu voltar, por muito que agora doesse saber novamente. Emily não estava mais ali, era impossível estar tão longe de casa. Do nada ao seu lado apareceu Jack e depois Tanya, ambos feridos e com sangue a escorrer nos locais onde foram mortalmente atacados e por fim a ultima sombra revelou-se como Claire e aqueles olhos brilhantes sem lágrimas, com um tiro no centro da testa ainda em carne viva. Todos encolheram os ombros e impotência e depois Emily desapareceu como pó.

Zombies, milhares deles, todos juntos, como um exército de carne a apodrecer, famintos e de braços esticados. Foi nesse momento que percebi que vinham todos na minha direcção.

Acordei com um grito abafado ainda durante a noite. Estava completamente suado e mesmo que o tempo estivesse a aquecer, sabia que se devia ao sonho, àquele que tinha noite sim noite não á bastante tempo e desde que tivera a árdua tarefa de por fim à miséria em que a Filmore estava. Começava a ficar farto daquilo. Mas ao mesmo tempo era uma sensação estranha, pois gostava de rever a minha noiva, nem que numa miragem, mas depois sentia isso na pele e desesperava, pois dava ainda mais vontade de a voltar a ter e isso partia-me o coração e sentia-me logo a seguir miserável e até me admiro de ter conseguido adormecer hoje.

Tive de me levantar e percorrer em boxers apenas para a mesa que fazia de apoio a comida e coisas assim. Tinha lá uma garrafa de água que tinha trazido do refeitório e foi nela que peguei para beber. Já estava a meio e naquela altura despejei-a por completo.

Perdi mais uma hora naquilo, sem conseguir dormir mas também sem conseguir tirar os pensamentos da cabeça. Estamos neste local quase tanto tempo como aquele que demoramos desde a saída do parque de campismo até encontrarmos Chris e Elizabeth e mesmo assim nunca me sentia completamente em casa. Claro que nos adaptamos, tivemos várias aulas de prática com armas e até Marie aprendeu grandes coisas. Muitos de nós arranjaram coisas para fazer com as instruções de Gage: Marcus conseguiu um pequeno trabalho como patrulheiro por turno, assim como Dennis; Chris, como estudante de polícia, pode ajudar nos treinos com armas e Elizabeth teimosa como era, “ofereceu-se” para permanecer ao lado do “namorado”; Brian e Marie ficaram encarregues de arranjar as coisas do interior sempre que fosse necessário, fosse buscar lençóis, como ir conferir os stocks da comida disponível. Já eu, como instrutor de condução, teria no dia seguinte a primeira aula prática de condução para ensinar aos adolescentes do asilo, claro que sem sinais de trânsito para respeitar, apenas a própria condução.

Mas com tantas coisas a normalizar, como o arranjar de empregos, tudo parecia menos real. Seria isso bom? Devia ser, mas não me consigo sentir confortável ao pensar que estamos a desligar-nos do que realmente se passa lá fora e com aquilo que nos temos de preocupar. Por peso de consciência sabia que teria de arranjar tempo para voltar a falar em privado com alguns deles e perceber se seria só eu.

***

Não consegui pegar olho muito mais e por isso de manhã, senti-me grato por poder vestir a minha roupa, comer um pouco de enlatados, que se tornaram a nova dieta e sair do quarto para o baixo movimento do asilo. Percorri os corredores de uma forma mais directa pois com o tempo, começamos a acostumar-nos ao local por onde temos de seguir até chegar a um certo destino, mesmo que seja tudo bastante idêntico ali. Por isso foi com facilidade que cheguei à parte de fora depois do rés-do-chão e das grandes portas que se abriram de forma lenta, de forma igual à primeira vez que de lá saíram as duas mulheres que se assustaram connosco e com as quais já falo de vez e quando. Claro, pois como sempre, existem pessoas com que nos damos melhor e mais vezes que outras.

Desci a longa escadaria e olhei em frente. Não foi necessário ir mais de cinco degraus para ver que uma fileira de três carros estava disposta em linha recta e várias pessoas as rodeavam. Podiam ser os alunos, ou simplesmente aqueles que se dispuseram para os procurar lá fora. Toda aquela agitação no exterior estavam a chamar alguns zombies na rua lateral, que se juntavam às grades a gemer, mas nada podiam fazer para penetrar as barras de ferro.

– São estes? – Perguntei à pessoa que estava mais perto e que pelos vistos era Kevin, o homem que conhecemos a patrulhar no primeiro dia.

– São sim. Tem gasolina suficiente para várias voltas. Estavam a poucos metros daqui. Eu e os meus colegas conseguimos dar conta de os trazer. – Disse, orgulhoso apontando para os outros dois homens.

– Parecem-me bem para começar as aulas, obrigado.

– Ora essa. Aulas de condução vão ser bastante importantes para os jovens daqui. Assim ao menos podemos dispor de mais umas mãos que saibam ligar uma ignição.

– Bem verdade. – Comentei, ao dar uma volta a um Nissan vermelho. – Conseguiste verificar aquilo que pedi?

– Tivemos tempo para passar por lá, o monovolume está onde tu disseste. – Tinha pedido a Kevin para quando fosse à procura dos “automóveis de instrução”, deve uma vista de olhos ao monovolume que fora de Claire. Estava ali a minha confirmação de que ele se mantinha intacto e isso era bom. Tive bastante tempo para pensar no que poderia fazer para me manter alerta e preparado para sair do asilo assim que necessário, algo que não tínhamos à saída do parque de campismo. Mais um ponto do plano de possível fuga feito.

Acenei e agradeci mais uma vez. Pelos vistos os três não ficariam para assistir e foram para as escadas a lamuriar-se de como saberia bem uma cerveja naquela altura. Posso dizer que também possuía um certo desejo por isso. O álcool servia para ajudar a esquecer as coisas e tanto Emily como Claire eram algo que eu queria atenuar nos pensamentos.

– E então quem são os sortudos? – Tirei as ideias angustiadas da cabeça ao olhar em redor para ver quem ia ensinar. Estavam lá como eu esperava Brian e Marie, de forma a acabar aquilo que à meses tinham começado comigo; Lucy e Jordan de mãos dadas; Alice uma rapariga de cabelos dourados e um aspecto de maria rapaz e a sua amiga Julia, que eu vira… naquele dia com Brian. Pelos vistos eram os únicos menores que necessitavam de aprender. – Sendo assim vamos começar assim: Como o Brian e a Marie já sabem minimamente algumas coisas, vão naquele ali, no Corsa preto e mostrem-me à vez o que sabem. – Apontei para a frente, paralelamente à escadaria e por onde estava a grade principal. – Vão até ali, fazem marcha atrás e voltam aqui. Sem pressões nem rapidez. Depois deixo-vos a treinar mais um pouco, enquanto explico algumas coisas aos restantes e vejo o que eles já podem saber, ok? – Ninguém recusou a proposta, mas ao caminharem para o carro reparei que a ruiva não estava lá muito confiante. Brian pegou-lhe no ombro e disse-lhe alguma coisa que a fez continuar. Sorri.

Vi que eles estavam a seguir bem, devagar como eu pedi, mas entretanto perdi a noção do que estava a fazer ou se estava a ver mesmo tudo. Como seria possível que ainda pensasse em como voltar a Richmond para tentar procurar Emily? Seria impossível, não existia combustível disponível, não poderia deixar ali os meus ex-alunos o caminho era perigoso e demorava bastante tempo. Mesmo assim eu continuava com uma réstia de esperança de conseguir arranjar forma de descobrir onde o amor da minha vida se tinha metido.

– Então, o que achou? – Dei por mim a divagar tanto que ao fim de contas, Brian tinha acabado e Marie estava a acabar o caminho de volta. O rapaz estava ao meu lado a perguntar-me e eu tive de fingir estar completamente atento.

– Há sempre coisas a melhorar, mas já conseguem fazer bastante.

– Alguém foi um bom instrutor, não acha?

– Claro que acho, os loros são para mim na mesma, não é? – Ri-me e dei o mesmo elogio à rapariga. Estava na altura de perguntar aos outros se estiveram atentos e começar um a um a tentar conduzir.

Ao fim da manhã já todos tinham tido o seu momento no volante, uns melhores outros ainda a necessitar de algum treino. Percorri com eles a parte da frente do asilo três vezes, com as grades repletas de zombies. Esperava que aquilo não afectasse a nossa segurança. Pelo sim pelo não depois daquela aula deixaria de fazer barulho com os carros até que alguém começasse a matar alguns para os afastar. Estávamos a dias dos treinos de tiros ao alvo novamente e quanto menos barulho, melhor.

– Bruce! – Olhei para trás e reparei que o casal me perseguia, parei para me apanharem ao subir da longa escadaria. – Obrigado pela aula de hoje. Acho que já lhe apanhamos algum jeito. – Disse Jordan, o rapaz da idade de Brian mas de cabelos mais claros.

– Não têm de quê. Ajuda sempre se necessitarmos da vossa ajuda para mexer em alguns carros.

– Bem, nos queríamos agradecer de uma outra maneira. O pai do Jordan tem um dos maiores quartos do asilo e vai hoje fazer um jantar. Se quiser, está convidado, assim como o resto do seu grupo. – Afirmou amavelmente Lucy, metendo uma madeixa para trás da orelha.

– Sim, não pode recusar, vá lá!

Não tive de pensar muito, talvez até algum convívio me tirasse os pesadelos à noite e me ajudasse a dormir melhor. Ia tentar levar Elizabeth e os restantes, mas esta primeira tinha pouca a certeza de se ia ou não aceitar.

– Ok, ok, se insistem assim tanto… Vou tentar que eles vão todos.

– Esperamos por vocês. – Comentou Lucy, quando de mãos dadas, se afastaram.

Estão tão felizes junto, Pensei. Se a Emily aqui estivesse… isto seria tudo diferente. Cabeis baixo, passeei um pouco pelo campo de areia do lado esquerdo do edifício. A neve estava a derreter e o espaço a abrir. O frio estava a cessar e eu estava a ficar farto de paredes. Tive de arranjar algo para fazer, o mais depressa possível e a melhor forma de o fazer ali era perguntar a Gage.

Bati à porta da secretaria no primeiro andar e esperei para ouvir a sua voz. Como sempre quando entrei, a luz quase me ofuscou e o homem estava lá ao fundo, depois de um bom par de secretárias. Passava ali muito tempo, pelo menos desde a nossa chegada só o tinha visto umas cinco vezes e já considerava bastante. Talvez fosse uma pessoa solitária, talvez o mundo lhe tivesse retirado alguém, como a mim.

– Posso?

– Faça favor Bruce. – Depois disso disponibilizou-me uma cadeira para me sentar. Senti-me completamente observado. – O que o traz até aqui?

– Pensei que podia ter alguma coisa para ser feita. Já dei algumas aulas de condução aos menores à pouco e por hoje não farei mais barulho com os carros.

– Muito bem, desde já agradeço o que tem feito e o que se propõe em fazer. Instruir os que não sabem conduzir pode sempre ser uma mais valia. – Ele falava com uma calma que me deixava de pé atrás e aqueles olhos semi-cerrados não ajudavam nada mesmo.

– Ora essa, acho que temos de fazer uns pelos outros.

– Certamente. – Olhou para o lado, mas não me demorou muito tempo a responder. – Bem, desde a última sessão de tiro e agora com a condução as cercas exteriores devem estar repletas de criaturas. Mandei alguns para o sul no portão principal tomar conta de alguns, ainda tem o seu facalhão?

– Claro. – Não quis dizer-lhe que estava sempre ali, para onde quer que me deslocasse. Achava que não necessitava dessa informação e já à algum tempo que aprendera a conter algumas coisas, não sendo tão aberto como gostava, mas tinha de assim ser.

– Nesse caso acha que consegue dar conta de eliminar alguns deles atrás do edifício, para norte, através das grades?

– Com certeza. Considere feito. – Ao menos aquilo deixar-me-ia com algum ar exterior, assim como algo para me entreter nas horas vagas, que agora dentro do asilo, pareciam passar lentamente demais. Levantei-me e com um sorriso entre olhares levou-me para fora dali. Gage era uma pessoa reservada e de pouco mais falas que as necessárias. Cá para mim ele deixa para si mais daquilo que devia, mas desde que não interferisse na minha segurança ou dos que estavam mais chegados a mim, estou-me quase completamente a cagar.

Já novamente lá fora, fiz-me acompanhar pela minha pistola, num coldre que me foi dado e o facalhão enfiado no cinto, como sempre. Contornei a parede este do asilo e era sempre um longo caminho contorná-lo todo para chegar às traseiras. Com umas contas assim muito de cabeça e as minhas observações sucessivas desse mesmo caso, talvez o edifício em si tenha mais de 4500 metros de largura por 3500 metros de altura, logo foi isso, 3500 metros depois, estava na parte traseira.

Ali atrás ficava um longo estacionamento, oculto da luz devido ao tamanho do asilo por trás de mim. À esquerda, a continuação do parque de areia e o resto de vegetação como um jardim normal, à esquerda apenas campos de terra, que podia muito bem acabar tanto a este como a norte, nas grades claro, a mais de 2 quilómetros. Iria patrulha-las e matar alguns zombies, mas antes queria fazer algo e por isso é que primeiro, caminhei até uma árvore desprovida de folhas do Inverno que estava a passar, à minha direita. Estava ali como no dia anterior, claro. Os dois pedaços de madeira suja entrelaçados com uma corda em forma de cruz, onde tinham tentando escrever “Claire” com algo rígido e que ajudava a esculpir. Estava bastante parecido à sepultura fictícia que Marcus quis deixar em Dale City para Tanya e Jack, mas aquela tinha o corpo da mulher e isso parecia deixar tudo diferente na minha cabeça, sei lá… mais real…

– Fui eu que a matei… – Pensei para com a minha consciência, sentindo-me culpado por tudo aquilo. – Ela desistiu, mas nós não fizemos nada para perceber a fundo a sua dor e ela escolheu não viver mais. Teria eu conseguido fazer alguma coisa para o impedir? Se quando ela saiu do quarto do Marcus, se eu a tivesse ido acalmar, estaria ela aqui? – Suspirei para com os meus pensamentos. Cada vez mais me sentia impotente e estúpido por não ter agido melhor. E era por isso que quase todas as noites, Claire e os outros acompanhavam Emily até perto de mim. – Se Claire não conseguiu viver sem a filha, serei eu capaz de viver sem a mulher da minha vida? – Era uma das retóricas mais difíceis de dizer para mim mesmo.

Tive de sair dali, não dava mais. Estava a comer-me vivo, algo dentro de mim ardia em sofrimento. Longe dos olhos longe do coração. Pelo menos um pouco mais distante, era tudo o que pedia.

As botas foram soltando um leve “clack” ao embater no solo de pedra e areia, enquanto o caminho até à grade se ia encurtando. Olhei novamente para cima, deixando o solo onde sempre estava. Estavam três criaturas pegadas aos ferros, a gemer para mim.

Olhando bem, parece que depois deste tempo todo, comecei-me a habituar a ver a cara deles todos os dias, a todas as horas, como quem vê um estrangeiro ou merdas como essa. São diferentes, mas já vi tantos neste pouco tempo que já nem vómitos me dão, não, agora é diferente. Sinto pena deles, sinto fúria deles e ao mesmo tempo sinto uma qualquer outra mistela de sentimentos que nem ao menos sei explicar, uma junção de bons e maus pensamentos.

Fui-me aproximando e os seus gemidos ficaram mais intensificados. Não podia ser de outra forma, eles só pensavam a comer. Posso não ser nenhum cientista, mas dá para ver. Se não encontram humanos, vagueiam por ai sem rumo e caso algo vivo lhe chame à atenção, vão logo atrás, como se a vida deles dependesse disso. Restará humanidade naquilo? Olhos desfeitos, ou brancos como se fossem cegos, cabelos esfarrapados e cabeças esfoladas como feridos mortalmente e mesmo assim continuam a caminhar para nos comer. Um faltava-lhe uma mão e outro até rastejava sem pés, todos eles em decomposição. E aquele cheiro, ninguém se consegue mentalizar que aquele odor estará sempre ali com eles, morte, velharia e coisas podres do pior tipo. Que miserável forma de continuar a viver se é isso que se pode chamar àquilo.

O facalhão de lâmina negra saltou do cinto e o seu punho enterrou-se na minha mão. Enterrou-se tão fundo do crânio do homem sem lábios que quase lhe rachei a nuca em dois. Estava farto, estava cansado de ter de fugir deles e mesmo ali, mesmo que os outros se sentissem seguros, eu não estava nem um bocadinho preparado para assentar. Vou-me vingar, não pelo que eram, pois não lhes dava a culpa, mas pelo que aquela nova espécie fizera aos meus.

E a lâmina foi subindo e descendo a cada um que se aproximava, com uma violência e rapidez que eu não sabia ser possível. Tinham-me tirado os amigos, tinham-me tirando os colegas de trabalho, tinham-me tirado os pais; “Cra” ”Cra” “Flip” ”Cra”; tinham-me tirado os alunos, Jack, Tanya e agora Claire! E possivelmente levaram também Emily!

A grade estava a impedir-me de aplicar toda a força que eu sentia poder aplicar neles e isso enervava-me. Queria aliviar aquela tensão, aquele medo. O facalhão voltou para o meu lado ensanguentado e a pingar em sangue e cérebro e mesmo assim sentia que tudo ainda estava demasiado fresco na minha cabeça. A minha mente pedia mais sacrifício, para que eu pudesse dormir descansado naquela porra daquela noite! O impulso levou-me mais perto da grade e olhei para cima, onde terminava. Eu podia saltar, eu tinha de saltar e matar toda a merda de zombies asquerosos e filhos da puta que por ali estavam! Com isso até podia ser que eu eliminasse a porcaria daqueles monstros e as mortes acabassem. EU VOU DAR CABO DESTA MERDA TODA!

– Bruce? – A voz veio de trás, quando eu tinha já agarrado a grade com uma das mãos e o pé esquerdo estava também flectido. Olhei. Chris não parecia tão animado como sempre.

– Chris… - Baixei o facalhão e claro afastei o corpo da grade. – Que há?

– …Disseram-me que estavas cá fora e como precisava de te dizer uma coisa resolvi vir… Estás bem meu? Não pareces lá muito, saudável sei lá. – Foi só ai que notei que estava ligeiramente a transpirar.

– Não te preocupes… Estou bem. – Observei os movimentos lá fora desviando o olhar dele. Tenho de me recompor. – Acho que foi o calor do momento sabes, à muito que não matava um. Estava a retirar aqueles que estavam mais próximos, como o Gage pediu. – Isso pareceu bastar para ele abanar a cabeça em confirmação, mesmo que eu ainda visse muita desconfiança no olhar. – E o que querias de mim?

– Ah, pois. Foi a Elizabeth que me mandou cá. Ela podia ter vindo pessoalmente, mas sabes como ela é, tipo super-espiã, disse-me que podia levantar suspeitas estar sempre a falar discretamente contigo e por isso é que vim eu.

– Não deve vir boa coisa, mas conta lá. – Afastei a arma das minhas roupas para não mancharem. Teria de tentar limpa-la até antes de entrar no edifício. Limpei o pouco suor que escorria na testa. Seria do esforço mental ou físico?

– Ela diz que tem visto com mais pormenor maneiras de tentar descobrir a porra do quarto andar. Umas escadas suplentes ou uma outra merda qualquer e já sabes que pelo menos tanto eu como tu estamos incluídos nesta rusga.

– E quando pensa ela fazer isso?

– Hoje à noite, pela hora do jantar, mais coisa menos coisa.

– Pois, mas o James filho e o James pai, juntamente com a Lucy estão a planear convidar-nos para um jantar hoje, nós sabes, eu, a Marie, o Brian, o Marcus, o Dennis e vocês dois. Seriamos mal-agradecidos recusar, por mais que eu também queira descobrir se sempre é seguro ou não permanecer mais do que aquilo que já estivemos aqui.

– Tens razão, entendo. Vou ter de lhe dizer, mas já sabes, se metade do asilo explodir, sabes o que aconteceu com ela. – Sorriu e pareceu ganhar novamente aquele sorriso brincalhão. Até que me estava a ajudar a melhorar um pouco daquilo que me tinha acontecido à minutos. Ri-me.

– Estarei preparado para evacuar.

– Ok… E então, queres ajuda com isso? – Ele observou o último zombie que também eu conseguia distinguir dali, naquela zona.

– Obrigado, mas deixa estar eu dou conta. Deves ter alguma coisa para fazer, não?

– Por acaso sim. O Gage quer que eu limpe os canos das armas todas. Foda-se, só o trabalho. Mas é melhor que passar o dia sem fazer nada.

– Ou a pensar em coisas…– Pensei, ao acenar-lhe.

– Nesse caso vou andando. Se a senhora quiser falar depois contigo, encontra-te no teu quarto?

– Hei-de lá estar mais cedo ou mais tarde. – Confirmei-me e ele afastou-se. Esperei que ele estivesse fora do alcance, para lá do estacionamento de maneira a que pudesse mandar sem remorsos o facalhão ao chão. Suspirei e tentei não pensar mais no assunto.

***

Mesmo com a pouca roupa que tinha para escolher, coloquei o blêizer preto que me tinham dado, de forma a estar um pouco mais apresentável no jantar. Levantei ligeiramente o cabelo no espelho e com ele observei a minha cara. Para além das olheiras gigantes, podia notar que tinha deixado crescer um pouco demais a barba, tinha talvez uns cinco dias, estando bonita, mas espessa, que me deixava o rosto mais carregado, como se o mundo me tivesse envelhecido.

Encontrei Brian e Marie á minha espera do outro lado da porta e os três juntos seguimos pelos corredores iluminados, enquanto muitos dos sobreviventes estavam a seguir para os seus espaços para terem os seus momentos finais antes de irem deitar. Acho que aqui ninguém é muito de ficar acordado até tarde, mas isso pode dever-se também a nunca saber-mos às quantas andamos.

– Marie, chegaste a fazer aquilo que o Kevin te pediu? – Os adolescentes estavam a ter uma conversa banal e mesmo eu não estando completamente concentrado nela, podia ouvir como comunicavam muito melhor um com o outro agora.

– O quê? Contar o abastecimento de comida ao Gage? Sim.

– Uau, estou impressionado. Parece que a pequena menina está a ficar mais confiante de si de tal forma que já consegue falar com os outros. – Gracejou ele. Marie bateu-lhe amigavelmente no ombro e ele fez soar um “au” brincalhão.

– Parvo…

Como era fácil para eles esquecerem o mundo? Estariam eles ainda lembrados de que os zombies ainda nos rodeavam e que as suas famílias estavam… sabe lá deus como? Talvez seja esta a adaptação humana, tentar esquecer para não nos passarmos da cabeça. No fundo sabia que eles ainda pensavam nos entes, pois durante este tempo que estivemos no asilo, ouvi-os muitas vezes e também falei com eles muitas vezes e sabia os seus desgostos. Mas mantinham-se fortes, até a tímida ruiva… Eu sinceramente sinto-me a ceder, ao ponto da conversa entre eles se ter tornado facilmente de frases completas em apenas uma palavras repetida vezes sem conta: Emily, Emily, Emily…

– Bruce, está a ouvir? – Dei por mim no meio do corredor a andar, mas sem percepção de que Brian estava a tentar dizer-me algo.

– Ahn, oh, desculpa. Estava a pensar numa coisa. – Disse.

– Estava a perguntar se o Marcus já resolveu ficar ou ir embora? – Ele fazia-me aquela pergunta pois já á muito que considerávamos o bombeiro como um líder, quase como Gage já era para os que tinham procurado refúgio no APA.

– Sinceramente não tenho falado com ele á já algum tempo. Podemos saber isso amanhã, tentarmos juntarmo-nos novamente e discutir mais umas coisas. – Isso já não acontecia desde que Claire saíra do quarto de Marcus ofendida e este desgostoso. Mas estava na hora de voltar à rotina.

A seguir já ninguém disse mais nada, estávamos à porta do quarto no segundo andar, tão longe dos nossos que o caminho parecia sem fim. Fomos encontrar Dennis, Chris e Elizabeth já ali.

– Finalmente chegaram… Estava a pensar que nos tinhas dito mal as horas. - Comentou o bombeiro de cabelo rapado, que depois de tanto tempo começava a crescer.

– Se aqui estou não me enganei, não te parece. – Respondi-lhe sarcasticamente. Foi então que a porta se abrir e apareceu de lá Jordan, o namorado da Lucy, penteado e melhor arranjado, da melhor forma que nós podíamos fazer claro, roupas mais gastas, mas ao menos limpas.

– Ei, olá. Entrem. – Alguns começaram a entrar e eu deixei aqueles que o fizeram ir primeiro. Restou para o fim eu e o Chris.

– E o Marcus? – Perguntei-lhe, mesmo que soubesse que quem poderia saber melhor era Dennis.

– Ah, ele disse que vinha num instante. Não se sentia muito tentado a vir, mas que ia fazer um esforço.

– Tal como eu…– Pensei, acenando-lhe.

Cumprimentei o pai de Jordan, um homem de cabelo grisalho e um bigode grande, mas não velho demais. Para além dele, estava naquela sala apenas mais o filho dele e a namorada. Já à algum tempo que sabia que eles estavam sozinhos, ou pelo menos por agora. A Lucy contou-me que os três fugiram de New York e encontraram pouco tempo depois Kelly, a mulher que me tentou seduzir à algum tempo atrás e de vez em quando ainda me lançava olhares. Pelos vistos também se tentou fazer a Jordan e acabou por correr mal. Não são assim tão chegados desde que chegaram ao asilo, por isso nem se chatearam em convida-la. Marcus chegou pouco depois e foi ai que começamos a comer, não que houvesse muita comida, ou que comer enlatados tornasse aquilo um jantar chique, mas agora tudo era diferente, fazíamos aquilo não para ser formal, mas apenas para nos juntarmos um pouco. Aquela família foi o nosso maior apoio desde a morte de Claire.

– E então, como se safa o meu rapaz a conduzir? – Perguntou-me Stan, quando eu tinha acabado de voltar do meu mundo de pensamentos.

– À primeira vista bem. Mais umas aulas e estão todos prontos pata conduzir minimamente.

– Isso é sempre bom. Não que eu não saiba que ele nas minhas costas usava o meu carro de vez em quando, mesmo sem carta.

– Pai… - Embirrou Jordan, infeliz. – Eu já te disse que isso nunca chegou a acontecer.

– Pois, conta-me histórias. – Comentou o pai, deixando-o sem mais palavras.

– Já decidiram se vão aqui continuar? – A pergunta de Lucy soou-me alto e ao olhar para os meus colegas, percebi uma certa inquietação geral. Ninguém respondeu logo.

– Este local parece bom. Ao tempo que aqui estamos sinto que pode ser muito bem um bom refúgio para agarrar. – Pronunciava-se Stan, opinando.

– Ninguém nos diz que o é completamente seguro. – Claro que Elizabeth tinha de intervir. – Acho que são um pouco mais de confiança que muitos que vivem agora aqui refugiados, não me parecem ser más pessoas… - Era estranho ouvi-la a elogiar alguém, mas também sabia que ela estava sempre de olho aberto, podia-a imaginar escondida atrás de uma parede a espiar e avaliar as pessoas como fez connosco. – O que acham do quarto andar?

– O quarto andar? – Stan não mostrou surpresa, mas também não me pareceu que tivesse muito a esconder sobre isso. – Pessoalmente já me interroguei, tal como vocês, na altura em que a minha chegada ainda era fresca. Cheguei a perguntar ao Gage, mas ele só me respondeu que estava bloqueado desde o começo da epidemia.

– E acha que isso é mesmo assim? – Questionou Marcus da outra ponta da mesa.

– Em tempos preocupei-me e pensei em partir, mas entretanto os dias foram passando e nada aconteceu. Resolvi ficar por cá, mas nunca deixei de ter curiosidade pelo que possivelmente o andar está bloqueado. Será um local de quarentena, daqueles que hospedam os primeiros infectados? Quem sabe. – O velho encolheu os ombros.

– Não é nada muito relevante… – Começou Jordan. – Mas se repararem, visto de fora o quarto andar não tem janela nenhuma, como se nem existisse. E do lado de dentro, da perspectiva de quem está num dos pátios, existem janelas quase em grade, pequenas demais para se ver o interior.

– Isso e montes de arrepiante. – Pronunciou Marie, tremendo ligeiramente.

– Nada supera os mordedores, rapariga. Se enfrentas aquelas porras, não tens de ter medo de mais merda alguma. – Respondeu-lhe Dennis, logo de seguida. Ela nem um olhar lhe fez.

– Podemos sempre arranjar maneira de lá subir. Mais cedo ou mais tarde terei de encontrar uma janela mais alcançável, uma porta mais solta. – Disse confiante Elizabeth, não se querendo pronunciar mais do que aquilo que estava a dizer, mas eu sabia tudo.

– Desde que este local nos acolha por mais algum tempo, poderemos arranjar tempo para descobrir essas coisas todas. – Comentou Marcus. Dava para ver que não recuperara completamente, sentia-se culpado pela morte da Filmore. – Se afinal esse quarto andar não passar de mais um local selado e sem nenhum interesse, prefiro continuar por cá, com a electricidade, os geradores e o bem-estar…

Não foi necessário o bombeiro dizer mais nada, pois logo a seguir, as luzes apagaram-se uma a uma e foi como se o asilo fosse mergulhado em negro. Os meus olhos já estavam habituados à luz e por isso quando tudo ficou escuro, não conseguia perceber se estava mais alguém ali comigo, mas mantive a calma.

– Tu e a tua grande boca. – Ouvi Dennis comentar.

– Terá sido um problema nos geradores? – Comentou Chris e logo a seguir ouvi uma cadeira a ser puxada para trás.

– Esperemos que seja um problema simples. Nunca me agrada passear num asilo às escuras… - Dizia eu, esperançoso que a luz voltasse logo a seguir, como por magia das minhas palavras.

Isso não aconteceu.


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Notas finais do capítulo

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