Screaming escrita por caiquedelbuono


Capítulo 6
Todos juntos.




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A mente de Logan estava agitada, mas ele não sabia se era devido aos estranhos acontecimentos das últimas horas, ou por ter passado a manhã inteira ao lado de Mel.

Não exatamente a manhã inteira, mas o suficiente para estabelecer uma conversa que durasse mais do que apenas cinco minutos. Tomara café da manhã com ela e aquilo significara ficar longe de Sophia e dos outros amigos. Não sabia se estava fazendo a coisa certa, deveria querer conversar com a namorada e pelo menos tentar expelir todas aquelas dúvidas que estavam corroendo seu cérebro, porém não conseguiria nada se tudo não acontecesse por acaso. Planejar as coisas nunca dava certo.

O primeiro tempo daquela manhã incluía uma aula dupla de biologia. A única pessoa conhecida em sua classe era Mel. Logan já começara a achar que ela estava criando mania de perseguição. Aliás, por que todo mundo parecia persegui-lo? Se por um lado ele se sentia desconfortável e incomodado com Ian em seu encalço, ele não podia dizer o mesmo a respeito de Mel. Como o próprio nome indicava, ela era doce e agradável. Logan a conhecia há tão pouco tempo, mas sentia-se extremamente à vontade quando estava ao lado dela. Era quase como se Mel fosse uma amiga de infância. Tanto era verdade que ele prometeu ajudá-la com suas dúvidas a respeito dos grupos taxonômicos.

O segundo tempo era de educação física e Logan resolveu fugir um pouco. As aulas de educação física eram misturadas e todos os alunos se reuniam na quadra de esportes e participavam ao mesmo tempo. O garoto, porém, preferiu se afastar. Não estava com vontade de ficar correndo atrás de uma bola, sendo que a mente estava em outro lugar. Mais precisamente em outra pessoa.

Era fácil escapar da aula de educação física. O professor estava sempre ocupado demais escrevendo os times em sua prancheta e a quantidade de alunos favorecia Logan a se misturar entre eles sem ser notado com tanta facilidade. Já alcançara a porta da quadra, indo em direção aos corredores enigmáticos e ninguém chamou pelo seu nome. Nem mesmo Helena que era sempre tão escandalosa.

Não sabia para onde deveria ir. Nem mesmo sabia se queria ir para algum lugar. Estava inquieto, querendo apenas um lugar onde pudesse ficar sozinho e se acalmar. Queria esquecer por um momento todo aquele sangue e toda aquela pressão. Queria ser uma pessoa normal. Será que era pedir demais?

Um cheiro doce invadiu suas narinas e quando ele olhou para frente, percebeu que estava dentro da sala de estar. Havia uma menina loira sentada no sofá, com as pernas cruzadas em cima do móvel. Ela parecia estar bastante concentrada na leitura, pois não esboçou nenhum sinal de percepção quando o garoto sentou ao seu lado.

— Sophia? — ele chamou, com um tom de voz que não era o que gostaria de usar quando estivesse falando com a namorada.

Ela levantou os olhos verdes e eles se arregalaram quando encontraram Logan. Por um instante, pensou que ela fosse simplesmente olhá-lo e retornar à leitura. Mas ela fechou o livro, repousou-o no braço do sofá e simplesmente encarou Logan como se estivesse fazendo uma pergunta oculta. A boca dela tremeu. Ele sabia o que ela estava querendo dizer.

— Eu sei que estamos... distantes. — disse Logan. Fez menção em pegar na mão dela, mas ela parecia rija demais para isso.

Sophia balançou a cabeça.

— Eu não sei se eu fiz alguma coisa de errado, mas simplesmente não estou entendendo. Você mal conversa comigo. Parece que somos colegas de classe. E por que você tomou café da manhã com aquela menina estranha? Por que você não tomou café da manhã comigo?

O nome dessa garota estranha é Mel, ele queria dizer, mas não faria a menor diferença. Não era o nome de Mel que estava em jogo naquele momento, e sim o seu relacionamento. Não sabia quais deveriam ser as suas próximas palavras.

Ainda em silêncio, Logan tentou encontrar algo de diferente no tom de voz de Sophia. Talvez alguma hesitação, um leve sinal de gaguez. Mas não havia nada de errado. Era simplesmente a mesma Sophia de sempre. Sua namorada.

De repente, ela pegou na mão dele. Logan sentiu o calor instantâneo quando a pele de ambos entraram em contato. Havia algo naquele toque que fazia com que esquecesse todas as suposições que tivera a respeito de Sophia. Era uma coincidência, tinha que ser. Não fazia o menor sentido.

— Fale comigo. — ela quase suplicou — Sou sua namorada.

Logan suspirou.

— É tão complicado. Você se lembra de como as coisas viraram de cabeça para baixo quando eu cheguei a esse colégio? Você se lembra de todo aquele pânico e terror? Aquela angústia de não saber o que vai acontecer em seguida, de não saber se nossas vidas estão seguras? Eu receio de que isso vai voltar a acontecer em breve.

Sophia já era pálida, mas depois de ouvir aquilo, sua pele ficou ainda mais translúcida. Era quase possível enxergar além dela, como se ela fosse um fantasma.

— Do que é que você está falando?

Logan apertou a mão dela.

— Seja o que for que esteja acontecendo, quero que me diga uma coisa. Por favor, Sophia, seja sincera. Você tem alguma ideia do que isso que acabei de dizer possa significar? Você tem algo a ver com isso?

Logan percebeu naquele exato momento que ter dito aquilo fora um dos maiores erros de sua vida. Sophia parecia tão indignada que largou a mão de Logan como se ela fosse feita de um material corrosivo.

— Eu não sei o que está acontecendo. Nem ao menos sei o que você quer dizer quando diz que as coisas vão voltar a ser sinistras novamente e você vem me perguntar se eu tenho algo a ver com isso? Não sei nem o que pensar. Se você quer saber, não sou nenhum zumbi antropomórfico que sai por aí devorando corações de humanos como se fosse a coisa mais normal do mundo.

Sophia estava se preparando para levantar do sofá, mas Logan agarrou novamente em sua mão. Não podia deixá-la ir, não sem antes consertar a burrada que acabara de fazer.

— Espere. — ele disse. Ela virou a cabeça e encarou, erguendo uma das sobrancelhas — Desculpe. É só que eu estou nervoso. Muitas coisas estão se passando pela minha cabeça.

— E ao invés de dividi-las com a sua namorada, a pessoa que você deveria mais confiar aqui dentro, você vem e age como se eu fosse suspeita de alguma coisa.

— Eu sei. Sou um idiota, Sophia. — ele disse, puxando levemente o braço dela para que ela pudesse se sentar novamente. Quando o fez, Logan a sentiu tão distante que preferiu que ela se mantivesse de pé. — Vou contar tudo o que vi.

Logan começou a narrar os fatos rápido demais. Percebeu que sua voz ia detalhando os acontecimentos em uma sintonia desesperada, como se ele quisesse terminar de dizer tudo aquilo o quanto antes. Contou sobre a bagunça no corredor, sobre o sangue seco no chão, sobre a letra S estampada no quadro de avisos, sobre como toda a sujeira tinha sido limpa no dia seguinte e em como todo o ambiente parecia brilhar. Não se esqueceu de incluir também as estranhas crises de insônia de Kelsey e Mel.

Logan esperava qualquer reação de Sophia, menos que ela começasse a rir desesperadamente.

— Francamente! — ela exclamou, com as lágrimas banhando os olhos. Levou alguns segundos para que ela parasse de rir totalmente e suas frases carregassem um leve sinal de coerência — Não acredito que você pensou que eu fosse a responsável por essa confusão só porque tinha uma letra S estampada no quadro de avisos. Sério, você merece o troféu de idiota do ano.

— Você conhece outra pessoa cujo nome se inicie com a letra S? — perguntou Logan, inocentemente.

— E ainda continua me acusando! — disse Sophia, olhando para Logan como se pudesse estrangulá-lo.

— Não! — Logan quase gritou — Não estou te acusando. Apenas estou tentando descobrir quem mais pode ser o culpado dessa desordem.

Sophia deu um longo suspiro.

— Isso não é o mais importante agora. Como você pode querer pensar no culpado, sendo que nem sabe o que está acontecendo? Sangue foi encontrado, Logan. Isso pode significar duas coisas: ou alguém está ferido ou alguém está morto.

As cenas da noite anterior novamente voltaram a invadir o cérebro de Logan. Ele sabia que aquilo não fora uma alucinação. Ele lembrava-se perfeitamente: havia apenas sangue no chão. Nada além disso. Não havia nenhum corpo, nenhuma pegada, nenhuma arma, nada. Apenas sangue e a maldita letra S.

— Mas não havia corpo. — disse Logan — E se não há corpo, não há assassinato.

— Então você acha que alguém foi ferido? — perguntou Sophia, passando a mão no queixo — Não faz sentido algum. É completamente sem nexo. Tinha que ser um ferimento muito grande e profundo para deixar a quantidade de sangue que você disse que encontrou no chão. E tem também a letra S que, com certeza, foi escrita com o sangue da vítima.

Logan não estava prestando muita atenção no que Sophia estava falando. Sua mente viajava ao dia em que provocara o incêndio na sala da direção. O incêndio que matara um zumbi antropomórfico, que foi responsável por causar dias de pânico e terror. Que assassinou quatro pessoas sem um pingo de dó, sem esboçar nenhum traço de humanidade. Ele morrera com a promessa de que voltaria e deixara bem claro a existência de um exército de zumbis. Nada tirava da cabeça de Logan que Kofuf não estava brincando.

— Estou com medo de que Kofuf estivesse falando a verdade quando disse que existiam mais zumbis de olho no colégio. Acho que isso é o começo de uma vingança.

Logan percebeu que Sophia estremeceu ao ouvir aquilo. Só ele sabia o que Kofuf tinha feito com ela. Sabia que a garota teve tanta vontade quanto ele de tê-lo matado pessoalmente, porém agora ele não sabia como agir, com a possibilidade de mais um ataque beirando o seu cérebro.

— Será que isso pode ser obra de mais um zumbi? Outro zumbi antropomórfico entre nós?

Logan não podia dizer nada. Ele estava totalmente no escuro.

— Eu não sei. Não há rastros de que um zumbi tenha passado por lá. Se ao menos pudéssemos encontrar o corpo...

— Não há corpo, Logan! — exclamou Sophia — Não acha que já teriam encontrado o corpo a essa altura? O cheiro de putrefação já teria tomado conta do colégio.

— Não é nem a ausência ou presença de corpo que está me intrigando. Aquela letra S... — disse Logan, olhando para os olhos verdes e aflitos de Sophia — Deve ser a assinatura do autor da bagunça. É tudo que temos. Precisamos nos guiar por ela.

Sophia assentiu com a cabeça. Logan percebeu que os olhos dela estavam começando a ficar cansados.

— Você disse que Kelsey e Mel tiveram uma crise de insônia durante a madrugada. Também disse que alguém limpou toda essa sujeira durante o mesmo período em que elas ficaram vagando pelo colégio. Você acha que uma delas pode ter sido responsável por isso e ter escrito aquela letra S apenas para que a culpa pudesse cair em outra pessoa? Outra pessoa assim como... — a voz dela vacilou por um momento — eu.

A ideia parecia tão absurda na mente de Logan. Não precisava nem comentar em como Mel parecia inocente perante aquilo. Não havia a menor possibilidade de ele sequer imaginar que ela tinha algo a ver com isso. Já Kelsey... ela era uma garota estressada, rebelde e que estava sempre de mau-humor, mas daí a matar alguém e escrever uma letra S no quadro de avisos para incriminar outra pessoa? Não. Era demais até mesmo para ela. O peixe que eles estavam caçando era muito maior que Kelsey ou Mel.

— Não. Que motivos elas teriam para fazer isso? Estamos procurando algo maior, muito maior.

Sophia estreitou os olhos.

— Algo sobrenatural...

Logan novamente agarrou a mão de Sophia. Precisava sentir o sangue correndo nas veias dela. Precisa de algo para se apoiar naquele momento em que ele achava que tudo desmoronaria.

— Eu estou com medo. Não quero que a vida das pessoas que eu amo corra riscos novamente.

— Você se lembra de como derrotamos Kofuf? — Sophia olhou para Logan, apertando a mão dele e a transportando para o conforto de seu colo — Não foi por causa dos galões de querosene. Não foi por causa do fogo. Foi a nossa união. Estávamos todos juntos e continuaremos todos juntos. Para todo o sempre. Vamos enfrentar juntos o que quer que esteja nos ameaçando.



Já era a terceira bola que Helena defendia com o ombro no jogo de futebol. Não se lembrava de que esportes eram uma boa maneira de se esquecer dos problemas pelo menos por alguns minutos. Não pensava em nada que não fosse sua obrigação em impedir que a bola tocasse a rede e marcasse pontos para o time adversário.

No final das contas, o saldo de Helena foi relativamente bom: quinze bolas defendidas com seu ombro que já doía levemente, oito bolas defendidas com a cabeça, cinco bolas defendidas com o pé e apenas uma bola que atravessara sua defesa e adentrara pelo gol. Apesar do erro, o time dela vencera e não podia estar mais contente. Como era bom sair do campo olhando com cara de vitoriosa para o time adversário.

Com suor pingando da testa e a roupa grudando no corpo, Helena ouviu o apito do professor indicando que a aula tinha acabado. Tentou localizar algum rosto conhecido naquela quadra, mas não encontrou nem Sophia nem Logan e nem ninguém. Dando de ombros, a garota ruiva começou a andar em direção à entrada da quadra. Passou a mão pelos braços e percebeu que tinha esquecido o casaco largado em cima da trave do gol. Já estava voltando para buscá-lo, quando sentiu uma mão tocando-lhe o ombro.

Ela virou para trás e o encontrou. Tommy estava usando uma camiseta regata e uma bermuda que chegava exatamente na altura de seus joelhos. Ele estava com o cabelo encharcado de suor, as gotas escapando pelos fios e molhando seu rosto corado. Mesmo assim, ele continuava lindo. Os braços estavam pulsando enquanto leves e finas gotas de suor passavam pela pele, indo em direção ao casaco que ele segurava nas mãos.

— Você esqueceu isso. — Tommy esticou o braço e entregou o casaco a Helena, que tentou não tocar em nenhuma parte da pele de Tommy.

Os lábios de Helena traçaram um sorriso, mas ela não mostrou os dentes.

— Obrigada. Eu já estava indo buscar.

Tommy mexeu as sobrancelhas de uma maneira engraçada.

— Bem, não foi necessário.

Passaram-se longos minutos enquanto eles ficaram parados em frente à quadra, cada um olhando para o rosto do outro como se fossem idiotas. Ora exibiam alguns leves sorrisos, ora enxugavam as mãos cobertas de suor na roupa. Helena sabia exatamente tudo o que queria fazer naquele momento. Queria se jogar no corpo de Tommy e pedir desculpas por todas as vezes em que agiu como uma menina mimada e revoltada. Queria poder ter coragem de fazer isso, mas toda vez em que pensava na possibilidade, seu maldito orgulho estraçalhava toda e qualquer chance daquilo se tornar realidade.

— Queria que as coisas voltassem a ser como eram antes. — foi Tommy quem quebrou o silêncio, a voz grave agredindo os ouvidos de Helena.

— Antes de termos começado a namorar? — perguntou Helena. Obviamente Helena sabia que ele não estava querendo dizer isso, mas sua boca tinha a chata mania de ultrapassar os comandos de seu cérebro.

Ele suspirou.

— Está vendo? Por que você age assim? É claro que eu não quis dizer nesse sentido. Eu só queria a minha Helena de volta. A Helena pela qual eu me apaixonei não é assim.

Helena fechou os olhos por alguns instantes e massageou as têmporas que começavam a doer. Ela tinha que ser verdadeira com Tommy. Ele deveria estar ciente de que quando optou tê-la como namorada, não estava escolhendo uma princesa de contos de fada.

— A Helena pela qual você se apaixonou está bem aqui na sua frente. Você apenas está enxergando-a do jeito que você quer. Você precisa entender que eu não sou como Sophia. Não sou romântica, Tommy. Não sou tradicional. Às vezes penso que eu não sou uma menina que deva entrar em algum tipo de relacionamento. Eu não sei o que devo fazer.

Helena percebeu quando Tommy começou a se aproximar. Sem entender muito bem, ela continuou parada onde estava, apenas observando-o. Ele mexeu em uma de suas mechas ruivas, colocando-a atrás da orelha. Passou o dedo indicador por todo o contorno de seu rosto, permitindo que ela sentisse a nuca eriçando-se. Queria que Tommy chegasse mais perto, queria que ele tocasse mais nela.

— É isso que você deve fazer. — ele sussurrou em seus ouvidos.

Helena sucumbiu ao desejo. Lançou-se aos braços de Tommy, fechando os olhos e deixando se levar pelo momento. Estava sendo aninhada pelo seu namorado. O que mais poderia importar? Danem-se os conceitos éticos de romantismo. Dane-se tudo. Ela não podia esconder de si mesma que a coisa que mais desejava no mundo era simplesmente estar ao lado dele.

Porém, o beijo que ela esperava que fosse acontecer em seguida não aconteceu. Ao invés disso, ela se sentiu caindo. Com o susto, lançou o casaco que estava praticamente amarrado em seu braço para trás. Se não tivesse derrapado o sapato no chão, ela teria caído de boca. Tommy não teve a mesma sorte. Ele estava sentado no chão, com os olhos cerrados e a boca contorcida numa expressão de dor.

Helena estava começando a se perguntar que diabos tinha acontecido, quando viu Paul segurando na gola da camiseta de Tommy e forçando-o a se levantar.

— Seu cretino! — o garoto loiro estava gritando — Fique longe dela! Ela é minha!

Helena, incrédula, correu na direção de Paul. Ele estava cerrando os punhos para dar um soco na cara de Tommy. Entretanto, Helena era esperta. Ela segurou os braços de Paul rapidamente e apenas o encarou. Aquele olhar que ela sempre enviava para alguém quando estava sentindo a pior das raivas.

— Qual é o seu problema? — ela gritou, empurrando Paul para longe de Tommy e ficando entre eles.

Tommy observava a tudo atônito. Ele parecia não ter palavras para descrever o quão indignado estava com a atitude maluca de Paul.

— Ele estava tocando em você. — disse Paul — Ele ia beijar você!

— É claro que ele ia! — Helena percebeu tarde demais que estava berrando. Uma menina que ainda estava na quadra, observava a cena à distância. — Ele é meu namorado, seu imbecil!

Paul lançou a cabeça para trás e começou a gargalhar. Ele poderia começar a rolar no chão de tanto rir a qualquer instante.

— Espere um pouco. — ele disse, ofegante — Está me dizendo que essa coisa mixuruca é o seu namorado? E ele ainda disse que ia te beijar? Melhor ensiná-lo como se faz.

Helena estava olhando para Tommy. O garoto estava pulsando de raiva, os lábios e os músculos do braço tremendo. Foi então que tudo aconteceu. Helena sentiu um puxão forte a arrastando para longe dele. Quando se deu conta, estava nos braços de Paul. Ele a segurava com força, com tanta força que ela temia que sua pele pudesse ficar roxa. Quando encarou os olhos dele, havia algo ali. Algo que a assustou. Era quase como uma sede predatória. Como se ele fosse uma ave de rapina prestes a atacar um coelhinho que passeava pelo bosque.

Os lábios de Paul eram rígidos e vorazes. Ele estava desesperado, louco demais para pensar em tratar Helena do jeito que ele dizia que ela merecia. Sem pensar, Helena mordeu os lábios de Paul. Ele gritou e largou a garota, que aproveitou a deixa para pisar no pé dele.

— Nunca mais toque em mim, seu nojento! — ela gritou ao mesmo tempo em que cuspiu na cara dele.

Sem pensar duas vezes, correu até Tommy, que já não estava mais lá. Olhando para trás uma última vez, percebeu que Paul estava limpando a saliva de Helena com a manga da camiseta. Ficou com medo que ele pudesse ir atrás dela, mas rapidamente encontrou Tommy no final do corredor seguinte. Ele andava com pressa, aparentemente pisando no chão mais forte que o normal.

Helena avançou o passo até que pudesse tocar no braço dele. Quando ele virou o rosto, a garota percebeu que uma lágrima tinha acabado de descer. Ela se sentiu a última pessoa do mundo. Sentiu-se suja e indiscutivelmente culpada.

— Nunca mais olhe na minha cara. — disse Tommy, com uma voz que se assemelhava a ódio.

Helena sentiu o coração ficar murcho.

— Tommy, por favor, você não está entendendo... Paul... Ele é louco...

Tommy parou de andar. Virou o corpo e encarou Helena. Olhou no fundo dos olhos dela e foi exatamente naquele momento em que ela percebeu o quão magoado ele ficara. Não era para menos. Paul tinha a beijado, na frente dele, logo depois de interromper um beijo que ele estava prestes a dar!

— Não estou entendendo? Você acha que eu sou burro? Você acha mesmo que eu vou continuar me arrastando por você? Acha que eu vou continuar me humilhando, me sujando, me deixando cada vez mais para baixo? Eu pensei que você fosse a garota certa para mim, Helena. Toda vez em que eu olhava para você, me imaginava ao seu lado e me sentia feliz só de pensar que um dia eu poderia beijar você, abraçar, olhar nos seus olhos e dizer que eu sempre ansiei por esse momento. Mas você não é nada disso. Você não é nem de longe a pessoa que eu mereço. O que eu acabei de ver... Não quero nunca mais saber de você. Você morreu para mim.

Helena sentiu as lágrimas banhando seus olhos, que ardiam como se estivessem salpicados de pimenta. Aquela seria a primeira vez em que ela chorava na frente de outra pessoa. A primeira vez em que sentia a dor realmente como ela era.

— Foi ele quem me beijou! — ela gritou e soluçou ao mesmo tempo — Não percebe o quão transtornado ele estava? Não percebe que uma pessoa normal não agiria daquele jeito?

— Não interessa! — ele gritou e sua voz ecoou pelos corredores do colégio — Você me traiu na minha frente. Jamais lhe perdoarei. Nunca mais quero me lembrar de que um dia fui seu namorado.

Tommy olhou para Helena pela última vez e saiu correndo, indo em direção a mais um dos corredores confusos.

A garota não estava controlando as lágrimas e os soluços que escapavam. Ela chorava e tremia desesperadamente. Encostou as costas na parede e permitiu que seu corpo escorregasse até que ela atingisse o chão. Quando abraçou os joelhos, o único pensamento que lhe ocorreu foi de que nada poderia estar pior. Ela estragara tudo.


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