Capítulo 3

 – E então, Sr. Cullen, vai me dizer o porquê de um comportamento vergonhoso como aquele? – o diretor Phillip me fitava com ar reprovador, mas no fundo nós dois sabíamos que ele não acreditava que a culpa pelo incidente fosse minha. – Você é um aluno exemplar, tira apenas nota A+, não vejo motivos para esse comportamento inadimplente. Aconteceu algo, mas se o Sr. não me contar, terei de puni-lo. Não posso admitir fanfarras assim no primeiro dia de aula.
– Não tenho nada a dizer sobre isso, diretor. – Sinto muito, mas eu não iria dizer que foi o Black, por mais que o próprio diretor soubesse que havia sido ele.

Claro que uma punição seria ruim, mas nada se comparava a enfrentar Jacob Black irritado. Nós já brigamos algumas vezes, quando eu ainda não havia aprendido que não devia delatá-lo. Ele nunca admitiria, mas eu até conseguiria lidar com ele, caso não estivesse sempre acompanhado de Paul e Embry. Nossas brigas foram todas injustas e eu, obviamente, sempre saia machucado. Após perceber que não tinha jeito de mudar isso, passei a aceitar as punições de bom grado. Melhor umas horas a mais na escola do que um olho roxo durante dias. Quando entendeu que, mais uma vez, eu não diria nada, o diretor se empertigou na cadeira e disse, em voz séria:

– Tudo bem, Edward. Uma hora na detenção deve bastar, mas já lhe aviso, caso mais alguma coisa se repita eu lhe suspenderei. Pode sair agora. Encaminhei-me para fora da sala com os pensamentos revoltados. Uma suspensão ficaria registrada no meu histórico escolar, uma mancha que eu não poderia permitir. Meu sonho era Harvard, eles não ficariam felizes com isso. Quando abri a porta dei de cara com a Swan, lancei-lhe um olhar raivoso que foi respondido com um rolar de olhos desinteressado. Essa era a última vez que eu aceitava, tinha de ser ou então eu poderia dar adeus a Harvard.

Dirigi-me de volta a sala de aula a passos largos. Nesse período eu tinha literatura, com Black. Entrei na sala, pedi desculpas à professora e me encaminhei para minha classe. Evitei olhar para o fundo da sala, onde Black se encontrava. Uns cinco minutos após minha chegada uma bolinha de papel me acertou.

"Muita bronca, Cullen? É só a primeira do ano, otário"

Não demonstrei nenhuma reação, apenas amassei o papel e o larguei no canto da mesa. Não iria dar esse gostinho para ele, não iria mais me dar mal por causa dele. A aula passou tranquila depois disso e eu aproveitei para absorver o máximo que eu podia, como de costume.
O sinal tocou e todos foram embora. Todos menos eu, é claro. Chegando à sala de detenção a professora me olhou  surpresa.

– Esse ano começou cedo hein, Edward.

Carmen era uma boa mulher. Professora de espanhol, ficava responsável pelos alunos da detenção, pois sua matéria era opcional, o que causava poucas turmas a ela. Tinha cabelos longos e negros, feições latinas, algum sotaque ainda podia ser percebido em sua fala. Ela me conhecia bem, nós conversamos muito durante minhas detenções. Nunca lhe disse nada, mas ela simplesmente sabia que a culpa não era minha.
Eu costumava usar esse tempo para resolver minhas tarefas escolares e quando não tinha mais nada, ela me dava aula de espanhol. Esses encontros amistosos, porém, só ocorriam quando eu era o único na detenção, caso contrário, nós mal trocávamos um “bom dia”. Não tínhamos nada a esconder, mas os outros alunos que iam parar lá realmente mereciam, e eu já tinha problemas suficientes com apenas Jacob Black me perseguindo. Uma hora depois me encaminhei para minha casa, como Emmet já tinha ido embora, eu teria que ir a pé.. seria uma longa caminhada até minha casa. Tentei imaginar o que dizer a Esme desta vez. Já eram duas horas da tarde e eu não tinha nem almoçado ainda.. Até fazer a comida e limpar tudo eu já não teria mais tempo para aparar a grama. Esme nunca sabia das minhas detenções, ou pelo menos quase nunca. Raramente o diretor se incomodava em comunicá-la.
Chegando em casa, deparei-me com o gramado completamente aparado. Estranho, logo pensei, Esme não contratou ninguém para fazer isso. Fui entrando e descobri que a porta estava aberta, estranhei ainda mais. Quando cheguei a sala vi Emmet atirado em um sofá e Jazz e Rose em outro.

– O que vocês fazem aqui a essa hora? E quem cortou a grama? – perguntei, não me dirigindo a nenhum deles em especial. Foi Rose quem respondeu.
– Fomos nós, Edward. Não tínhamos nada para fazer, então resolvemos dar uma força para o nerd favorito de Jacob Black.

Rose disse isso sorrindo, mas eu via a tensão em seu rosto. Ela odiava o Black, sentia-se frustrada por, em suas palavras, "viver em uma sociedade cheia de adolescentes anencéfalos e tristemente manipuláveis que aceitavam esses comportamentos ridiculamente abusivos", e o fato de eu nunca delatá-lo apenas deixava-a ainda mais frustrada.

– Não adianta Rosalie, ele não vai fazer nada a respeito disso, outra vez - disse Jasper sem tirar os olhos da televisão.

Uma repórter local falava sobre o “Cine Clássico”, que iria começar na semana seguinte, em Port Angeles, cidade vizinha a Forks e relativamente mais avançada. Oras, ao menos os moradores de lá dispunham de um cinema! Havia um velho prédio abandonado na Rua Fern Hiil, próximo ao Motel Dew Droop In, onde se situava o cinema de Forks, porém ele logo foi à falência. Hoje em dia aquele lugar era usado por moradores de rua das redondezas. Isso era realmente uma pena, a construção era digna dos filmes clássico, com tapete de veludo vermelho na entrada, iluminação suave, retroprojetor a moda antiga. Completamente decorado no estilo retro, o que na época de funcionamento era apenas moda. Talvez um dia ele voltasse a funcionar, com sorte, esforço e uma boa grana aquele lugar ficaria novinho em folha. Quem dera pudesse eu fazer isso, mas dinheiro era algo de que eu não dispunha. Não havia lá muitas outras opções de lazer por aqui. Nós podíamos aproveitar o Sunset Lanes, um ginásio poliesportivo que continha também um boliche, o Forks Park, um camping para os mais aventureiros e a Taqueria Forks, um restaurante de comida mexicana simplesmente incrível. Para mim, o melhor lugar de todos era a Livraria memorial de Forks, onde passei vários momentos de minha vida. Me sentia bem lá, as pessoas não me olhavam como uma aberração nerd, era apenas um cara que gosta de ler, como todos os outros que se encontravam lá.

– Edward, acorda! – fui arrancado de meus pensamentos por um Emmet impaciente – tá afim ou não?
Franzi o cenho: – Afim de que, Em?
– Volta pra terra, cara. Perguntei se tá afim de ir nesse Cine Clássicos, talvez seja legal. – e rindo ele mesmo se corrigiu – O que eu acabei de dizer? Clássicos são sempre legais.
– Claro. Vai ser bacana, agora me deixa subir e tomar um banho, depois eu volto aqui gente.

Tomei um banho bem demorado e em meio a isso me pus a pensar. Esse era o meu último ano na Forks High School e eu ainda não tinha me aproximado de Alice. Eu precisava fazer isso, não aguentava mais sonhar com ela e não poder tê-la. Hoje eu fiquei a observando durante a aula, tão linda quanto sempre, seus cabelos escuros e repicados exibiam algumas mexas rosas. Pude notar, durante os anos de amor platônico por Alice, que sempre que ela dizia algo, os outros concordavam, mesmo que não a conhecessem pareciam simplesmente ser tocados pelo carisma dela e pronto (!) ninguém discordava. Outra coisa que notei foi que isso sempre deixava Isabella Swan extremamente irritada. Não parecia certo, eu tinha a impressão de já ter visto as duas juntas, mas era impossível, Isabella jamais estava a menos de 10 metros de Alice.
Sai do banho ainda pensando nisso, mas logo esqueci, pois meus amigos gritavam meu nome lá embaixo. Me vesti rapidamente e fui ver o que eles queriam. Sai do quarto quase correndo e tropecei no tapete, caindo de cara no corredor.
Foi assim, estatelado no chão da minha própria casa que percebi, com um misto de confusão e surpresa, a garota parada a soleira de minha porta.