A chuva tocava o chão com uma voracidade incomum, a terra ficava marcada pelas gotas e várias poças se formavam. De dentro do quarto de Nichole ouviam-se somente os gritos abafados pelo som da tempestade.

Todos os seus ossos se deslocavam ao mesmo tempo. Gritava. Sua pele se esticava e seus músculos se repuxavam por baixo dela e ficavam cada vez mais extensos. A dor era praticamente insuportável, mas algo não a deixava morrer, embora ela muito desejasse isso. Viu um sorriso conhecido e reconfortou-se nele.

“Quando sair desse pesadelo seremos só nós dois.” Pensou, erroneamente.

O belo sorriso se desfigurou para um sorriso sádico e malicioso.

– F-faz p-parar! – Gritou quando sentiu seus pensamentos aos poucos serem arrancados de sua mente, dando lugar ao nada. O vazio. Em questão de minutos ela recobrou a consciência, mas só ouvia uma risada. Sentia-se pequena, em um local quente e úmido. Algum lugar dentro da mente dele, do ser que tanto amara. Gritou, e teve como resposta o grito de dezenas, ou talvez centenas de pessoas, clamando por misericórdia.

– Revigorante. – Uma voz grossa e falha ecoou por todo o local, calando a todos.

~~”~~

Em algum lugar, naquela mesma cidade, dormia uma criança. Seu sono infantil e sereno foi perturbado por um clarão no céu. Um estrondo invade o quarto e, por instinto, ele se cobre completamente enquanto a luz de seu abajur noturno falha. Vários relâmpagos cortam o céu, dando ao garoto a visão da silhueta de um homem sobre seu cobertor de tema espacial. O medo o invade e tudo o que consegue fazer é cantarolar uma canção de ninar que sua avó lhe ensinara. Fechou os olhos e rezou para que tudo parasse, rezou com todas as suas forças e acabou pegando no sono.

O menino se levanta, caminha devagar até o banheiro onde faz sua higiene e retorna ao quarto. Aos pés de sua cama se encontrava um urso de pelúcia sujo de lama, com um olho faltando e fiapos de seu interior aparecendo. Ao lado do urso está um bilhete com a seguinte frase: “Always watches, no eyes”.

“A vaidade é com certeza o meu pecado favorito. Amor-próprio. O narcótico 100% natural.”