A água quente do chuveiro escorria pelo meu rosto e o resto do meu corpo. Dizem que uma das melhores horas para se pensar é no banho.Pensei em tudo que estava acontecendo comigo durante esses 4 dias em que estou em Fairchild, devo dizer que a cidade é bem pior do que eu me lembrava. Tudo tão parado,todos tão silenciosos. Eu estou acostumada com o caos de Nova York, sinto falta de ter que atravessar a ponte até o Brooklyn para comer escondido na lanchonete de Marcy . Eu sempre amei o sanduíche dela mas no Upper East Side se você não come em um restaurante chique ou algo do tipo você era automaticamente levado para o hanking de pobre ferrado na vida, um alguém sem nada e eu não posso perder meu posto de rainha e queridinha de todos.O povo só ia para o Brooklyn se fosse pra comer no bistro da mãe da Lucy .Lucy Sparrow é minha melhor amiga desde a infância a única que me conhece de verdade, eu sinto muita falta dela. A minha perda deixou um espaço dentro de mim que só ela iria conseguir diminuir.

Sinto-me como se estivesse faltando algo para me completar,sinto um vazio dentro de mim crescer a cada dia. Um vazio proporcional pela perda repentina. Ouvi James gritar lá de baixo: Hermione se vista para nós irmos jantar.

Ótimo! A única coisa que eu queria fazer hoje era praguejar contra o Ryan e ler um bom livro para me distrair de toda essa loucura.Ai vem o James e arruma isso. Eu não quero me comunicar com o James não agora que a dor da perda aumentou. 

Eu nunca gostei do James, ele nunca foi um pai. Não esteve presente em nada na minha vida. Dia dos pais ele nunca me atendia, Aniversário nunca estava presente, Natal ele nem ligava pra mim. Lembro-me que toda vez que ele tentava pedir desculpas eu fugia de casa e acabava bebendo todas, ia pra festas e depois aparecia em tabloides ou no site de fofocas da escola. Infelizmente durante 3 anos fui obrigada a passar todas as férias de verão na a casa do James, mesmo assim eu nunca consegui chama-lo de pai e duvido muito que consiga agora que estou com 16 anos.

Sai do banho e fui me trocar. Vesti-me com uma calça jeans justa e uma camiseta de banda cinza do Tyler botei minha camisa xadrez vermelha de manga longa e calcei meu ténis, olhei-me no espelho e me deparei com um reflexo irreconhecível meu. Um reflexo que nem eu mesma conhecia. Possuía um rosto triste e roupas que eu nunca usaria em Manhattan.Eu estava diferente. Não sou mais eu mesma.  fui até o quarto e peguei meu kit de maquiagem, não estava no humor pra me maquiar mas meus olhos estão muito fundos mostrando que choro mais do que durmo. Passei só um corretivo e um pouco de rímel, o que melhorou e muito minha aparência. Peguei minha bolsa e peguei o livro que estava lendo e botei na bolsa, também não poderia esquecer do meu querido iphone e meus fones de ouvido. Aposto que o James vai pra algum lugar insuportável. 

-Hermione se apressa !- James deu um grito que fez meus ouvidos doerem e eu automaticamente me encolhi.

-Estou pronto.- disse o mais baixo possível .

-Desculpe, vamos logo que eu estou com fome e não quero deixar a Martha esperando.

-Martha?

-No caminho eu explico. 

Pegamos o caminho da praia , aquele que o Tom pegou só pra me irritar. Olhei para a casa no auto da montanha ela estava toda acesa, era mais linda ainda a noite. O James desceu a rua da praia e bem no final entrou numa bifurcação. A rua era bem bonita com casas altas e pequenas,todas de madeira. Acho que essa cidade deve ter um código determinando que todas as casas por rua devem ser iguais. A rua era grande e no meio dela havia um casal se agarrando. O James fez um som estranho enquanto passávamos por eles, eu fiquei em silêncio porque notei que não era um casal qualquer, era o Ryan e a Jessica. Parece que eles voltaram, ou nunca terminaram. Talvez eu esteja maluca. James continuou descendo a rua e parecia que ela era sem saída, acho que o James esqueceu o caminho. Mas não, ele estacionou o carro num estacionamento imenso que ele já sabia que existia, era bem escondido o estacionamento e sua entrada parecia um portão normal de uma casa normal.Porem era apenas um terreno com grama baixa cheio de carros. Saímos do carro e seguimos em direção a rua sem saída, notei que havia uma saída para o lado esquerdo. Não era uma saída , era uma rua no estilo Parisiense, cheia de restaurantes e lojas de antiguidades. Dentre vários restaurantes lindos e aconchegantes ,James escolheu o mais simples de todos.Era vermelho com toldos amarelos, já vi um desses em NY. Entramos e ele sentou perto da janela, uma mulher baixinha e de aparência cansada veio nos atender.

-O de sempre James?

-Sim, Martha.

Então essa é a Martha que devia estar esperando.Ela olhou para mim e arregalou os olhos como se eu fosse algo sobrenatural .

-Essa é a pequena Hermione?- disse a mulher com um sotaque estranho.

-Pequena que cresceu.- disse James ao perceber minha cara de duvida- Hermione essa é a Martha, ela sempre cuidava de você quando eu tinha que fazer uma cirurgia de emergência.

-Oi Martha- disse dando um sorriso, mesmo não me lembrando dela .

-Ah querida, eu estava esperando para te ver, você cresceu muito desde a ultima vez que a vi, também você tinha uns 10 anos. Quantos tem agora criança?- definitivamente não conheço nenhuma lugar que tenha esse sotaque engraçado. 

- Estou com 16 .- disse olhando para o chão, odeio que me chamem de criança. 

-Santa Maria, como passou rápido o tempo.Então o que deseja comer? 

Olhei para o cardápio e não havia nada que abrisse meu apetite. Como não queria deixar o James chateado pedi um waffle e um suco de laranja. Comemos e conversamos com a tal Martha, ela me contou que veio do Brasil e que eu deveria conhecer lá. Contou como o James ia comer lá todo dia, pois não sabia cozinhar e sempre comia a mesma coisa. Pâtisseries com mel e geleia e sempre bebia chocolate quente. Martha era uma moça gentil e prometeu que me ajudaria no que fosse preciso. 

-Santa Maria como o tempo passa rápido, esta na hora de fechar o restaurante! Por favor me dêem licença. - disse Martha com um olhar assustado. Olhei no telefone era 23:50, realmente o tempo passou rápido. 

-Vamos Her, amanhã você tem aula. 

-Para de me chamar de Her, é Mione, M-I-O-N-E !

-Okay, me desculpe. 

-Tudo bem. 

Entramos no carro e assim que viramos na bifurcação vimos o Ryan andando. Já era tarde , será que ele passou todo esse tempo na casa da Jessica? Se sim, significa que eles voltaram ou nem terminaram. Era uma duvida que vai ficar por um bom tempo. Além do mais ele já me viu de sutiã ,imagina se eu pergunto  sobre a Jessica e ele acha que eu estou afim dele. Melhor deixar quieto e esperar. 

Meu pai parou o carro e abaixou o vidro para perguntar se o Ryan queria uma carona.Obviamente ele aceito, antes que ele atravessasse a rua eu botei meu fone de ouvido para não ter que falar com ele. Quando fui ligar a música notei 2 mensagens . Uma da Lucy e a outra de um numero desconhecido. Fui ler a da Lucy. 

         Mione! Você não vai acreditar na novidade que eu tenho. Minha mãe vai abrir um bistro em Fairchild e  eu vou tomar conta.*PULOS DE ALEGRIA* Ela pediu pra perguntar se eu posso ficar na sua casa,se seu pai quiser cobrar o aluguel é só me avisar. Amanhã eu te ligo pra combinarmos tudo. Te amo ruivinha !

Ai meu deus, essa é a melhor noticia de todas, eu tenho que falar com o James agora mesmo: A Lucy quer saber se pode morar com a gente,a mãe dela vai abrir um bistro aqui e  ela vai tomar conta. A mãe dela falou que se quiser cobrar aluguel não tem problema. Ela vai ligar amanhã. 

-Lucy! Sparrow? Aquela sua amiga de infancia?

-Ela mesma. - disse fazendo sinal positivo com a cabeça.

-Claro que pode, mas não precisa de aluguel não, a Lucy é da família. 

-Oi Hermione - o Ryan disse tentando chamar minha atenção.

-Oi Ryan. 

Peguei meu celular e fui ler a outra mensagem, era de um numero restrito. Ótimo! Deve ser um tarado. 

Hermione, Hermione. Sabia que seu namoradinha anda se agarrando embaixo da escada do lado oeste da escola? Pois é queridinha, seu amado Nate não consegue viver sem uma mulher.

No fim da mensagem tinha uma foto do Nate com uma menina loira oxigenada,diga-se de passagem. Maravilhoso, isso era tudo que eu queria. Como eu já não estava muito afim do Nate, terminei com ele por uma mensagem. Tirei os fones de ouvido e fiquei em silêncio olhando pela janela. 

-Ryan, você estava onde essa hora da noite?- James perguntou como se fosse parente do Ryan. 

-Ah, eu estava na casa da Jessica - disse Ryan com a voz um tanto baixa, talvez ele não quisesse que eu ouvisse. 

-Desculpe-me, quem? 

-Jessica Stone , senhor. Ela é minha namorada. 

Eu sabia, eu sabia que eles não tinham terminado. Era obvio que eles não iriam terminar assim do nada. Não sei o porque mais um bolo subiu pela minha garganta, meus olhos começaram a arder. O que esta acontecendo comigo? Eu queria gritar e chorar, mas por quê? Eu não tenho nada com ele, nem conheço ele direito. Isso não faz o menor sentido. O bolo na minha garganta apertou , eu preciso sair desse carro. Meus olhos encheram de água e eu os fechei com força para evitar que as lágrimas caíssem . Eu pareço uma criança. 

James estacionou o carro e eu sai em direção a casa, mas o Ryan me chamou fazendo com que eu me virasse sem pensar duas vezes. James passou por mim e disse pra eu não demorar. Eu fiquei parada onde estava e o Ryan veio na minha direção. 

-O que você quer comigo?- disse numa voz embarganhada e tremula. 

-Por que esta triste? 

-Você não entenderia.- disse olhando para o chão, as lágrimas já começaram a rolar pelo meu rosto.

Ele botou a mão no meu queixo e levantou minha cabeça na altura da dele.-Não chore.- disse secando minhas lágrimas- Qual o motivo dessa lágrimas? 

-Você não entenderia.- tentei abaixar meu rosto mas ele não deixou.

-Tente me contar.

-Não estou afim.- tirei a mão dele do meu rosto e recuei- o que você quer comigo?Se for só isso pode ir embora!

-Não é só isso.

-Então diga logo.

-Eu queria pedir desculpas por ter mandado em você no outro dia, eu estava errado. E também pedir desculpas por ter te visto de…- ele cortou a frase e olhou pra mim- você sabe, de roupa intima.. 

-Tá bem, pedido feito agora se me der licença eu vou entrar. 

-Antes, pode por favor me dizer o motivo do seu choro? Foi por minha causa?

-Obvio que não, foi por causa da minha vida e de todos os acontecimentos que se passam nela. 

-Sua perda?

-Sim.- me virei e fui em direção a porta. 

-Boa noite Mione e não se preocupe , eles foram para um lugar melhor.

Entrei e fui tomar outro banho, pelo menos no banho eu podia chorar sem ser vista nem ouvida. Chorei pelo Tyler, pela minha mãe e pelo Nate também. Chore por ter que estar aqui. Chorei igual uma criança, chorei até soluçar e até meus olhos arderem. Sai do quarto e fui dormir, tive um sonho ruim. Um sonho não, um Flashback. 

 * Flash back on *

Eram as férias de verão e nós íamos para o Havaí, mas estava chovendo muito e minha mãe não queria sair de casa.Mas eu precisava ir a essa viagem se não perderia o meu posto de popular. Eu tinha que voltar com marca de sol e um namorado surfista. 

-Vai mãe, eu preciso ir pro Havaí.- implorei de joelhos.

-Para com isso Hermione, você é muito egoísta- disse Tyler

-Cala a boca Tyler você não sabe de nada.- me virei pra minha mãe novamente.- Vai mãe essa viajem vai ser ótima para nós, pode deixar o Tyler se quiser, ele nunca vai a paia mesmo.

-Ta bem Hermione, mas só porque você está me enchendo o saco.

-Obrigada, obrigada e obrigada.- disse beijando a bochecha dela. - Você é a melhor.

Tyler levou nossas malas para o carro e resmungou o tempo todo. Mamãe pegou a ponte para o Brooklyn e a chuva havia aumentado. O Tyler e eu estávamos brigando pela estação do rádio e minha virou para brigar com a gente, foi nessa hora que ela perdeu o controle do carro e não começamos a capotar eu vi sangue pra tudo quanto é lado e nós não parávamos de capotar. 1,2,3,4,5 e 6 capotadas. O  sangue vermelho e gelado começou a escorrer pelo meu rosto e eu só ouvi minha mãe gritar  depois  de ver a lanterna de um caminhão vir em nossa direção. Era o fim! 

-HERMIONE!HERMIONE!HERMIONE! ACORDA! - James gritava enquanto me sacudia. 

-PARA! Eu já acordei.

-O que aconteceu? 

Eu não consegui falar, comecei a chorar de novo e soluçar . Me engasguei durante um soluço e outro e abracei o James.

-Foi só um pesadelo meu amor, só um pesadelo.

-Não pai, ela se foi, ele se foi.- disse entre soluços.Eles se foram para sempre e a culpa é minha !