Ao entrar em casa, Hermione notou que havia quebrado o salto do sapato. Sua bolsa estava pingando. As roupas estavam encharcadas e o cabelo colado no rosto. O tempo mudou depressa.

Draco desceu as escadas e pareceu nem notar Hermione.

– Oi? Draco, cheguei.

– Algum problema? – disse ele, em tom de despreocupação.

– Acho que estou encharcada, você poderia trazer uma toalha pra mim.

– Tenho cara de empregada?

– É o mínimo que pode fazer!

– O mínimo que posso fazer é ter que te aturar. Por que tão insuportável? Parece impossível ir até o varal e pegar uma toalha!

– Só acho que você está sendo insensível demais! Eu faço tudo, e você não pode nem me trazer uma toalha...

– Para de ser fresca, garota. Não enche meu saco, vai logo pegar uma toalha antes que suje todo o piso.

– Não estou sendo fresca, mas é típico casais se ajudarem. E não digo apenas por trazer toalhas, também falo de companheirismo. Quando foi a última vez que me levou a um restaurante? Ou para um passeio no parque? Ou então quando foi que preparou chá para mim, pediu sobre meu dia ou elogiou o que faço?

– O que você faz não é motivo de elogio! Você foi comprar doces e voltou com mais problemas. Ah, e, falando nisso, onde estão os doces?

– Eu... Eu comi.

– Pensei que estávamos falando de companheirismo! Companheirismo ou sei lá do quê também é dividir.

– Eu tenho que dividir? Quando é que você divide sua alegria comigo? Quando é que me trata com respeito, com carinho? Quando demonstrou que me amava pela última vez?

– Não preciso te dar satisfação disso!

– Ah, acho que precisa! Parecemos mais inimigos de luta do que um casal!

– Quer saber? Você está com toda a razão! Então, acho melhor terminar e você viver sua vida com... Ah, esqueci que talvez toda a sua família esteja morta!

– Não fale assim, Draco! Tudo... Tudo o que eu faço por você! – Hermione agora chorava ao se lembrar do pai. – Você poderia me respeitar só por um dia, só um dia demonstrar gratidão por tudo o que faço por você!

Draco ficou quieto e subiu as escadas novamente.

– E hoje eu não durmo no sofá.

Hermione, em meio a lágrimas, foi até o closet e pegou uma toalha. Tomou um banho rápido e colocou o pijama. Logo em seguida, pegou seu celular na bolsa: estava cheio d’água. O que pôde fazer foi atirá-lo no lixo.

Foi até a lavanderia e pegou o vestido que havia usado no dia anterior. Tirou do seu bolso o bilhete com as informações de Rony.

Com o telefone fixo, discou o número do ruivo. Nem se preocupou com o horário de meia noite e meia.

– Alô? – atendeu uma voz bem acordada do outro lado da linha.

– Oi, é a Hermione... Meu celular estragou. Eu queria saber se posso dormir aí essa noite, só hoje... Por favor.

– Claro que pode... O que houve aí? Está tudo bem? Ah, e meus pêsames pelo celular.

– Longa história. O.K., obrigada, estou indo.

– Vem nessa chuva? Quer que eu passe aí pra te buscar?

– Não, eu vou de carro, mesmo, mas obrigada. Falo com você depois.

* POV Hermione *

Desliguei o telefone e peguei um casaco. Saí com as chaves do meu carro, roupas, um cobertor e escova de dente apenas deixando um bilhete: “Fui dormir em uma amiga.”

Não sei por que, mas estava feliz.

Cheguei à casa de Rony em longos dez minutos. Os sinais vermelhos e o rádio com sinal fraco não quiseram ajudar.

Me recolhi na aba do telhado da casa e toquei a campainha.

Ding Dong.

Logo que a toquei, Rony abriu a porta. Estava me esperando.

– Pode entrar, fique á vontade.

Entrei e tirei o casaco. Agradeci a gentileza e fui aconchegando o cobertor no sofá, que já fora preparado para mim.

– Não, espera. Aqui no sofá eu vou dormir, você vai dormir na minha cama... É convidada.

– Imagine... Me sentiria mal ocupando o seu lugar.

– Não, Hermione, sério. Você vai dormir na minha cama, não precisa se preocupar. Já ajeitei pra você. Eu gosto de dormir no sofá, aqui tem TV.

– Tudo bem, então.

Recolhi meu cobertor e segui Rony até o seu quarto.

Não tem como descrever aquilo. Era... Ronástico. Ronyzástico. Ronylândia. Como preferir.

Pôsteres de jogadores de futebol nas paredes, um armário cheio de adesivos colados, cama com cobertores azuis xadrez, cadernos de anotação pousados sobre uma escrivaninha de madeira...

Mas, acima de tudo, o que mais me chamou atenção foi uma estante de livros recheada de cultura: Livros sobre tudo estavam arrumados cuidadosamente sobre ela. Havia fileiras de livros de Auto-Ajuda, livros informativos, livros de história adolescente, livros de ficção, livros de aventura, livros com poesias, e, a fileira mais comprida, livros de romance.

Todos os livros pareciam surrados e de segunda mão, exceto alguns da fileira de romance.

– Quarto legal. – comentei, sentindo o cheiro de Rony invadir minhas narinas.

– Obrigada... Ah, não repare na bagunça, ajeitei tudo de última hora. Quer comer alguma coisa? Merece, depois do dia que teve. Quer dizer...

– Se não for ser muito folgada, eu poderia comer uma torrada ou um sanduíche?

– Faço mil torradas se quiser. Quer comum? Queijo e presunto?

– Sim... Pode colocar dois presuntos?

– Claro. Mais alguma coisa? Um leite com achocolatado?

– Por favor.

– O.K. Pode ajeitar o cafofo da sua forma, sinta-se em casa.

Eu sorri e ele se afastou, encostando a porta.

Dei mais uma olhada no quarto: era tudo muito fantástico. Tinham fios de cabelo ruivo sobre os cobertores.

O jeito como Rony organizava o cantinho era engraçado. Não sei se é o meu ponto de vista ou porque o acho engraçado. Talvez seja os dois. Talvez não seja nenhum.

Atirei meu cobertor sobre a cama e, junto dele, a escova de dente, as roupas de inverno e o casaco.

A porta se abriu.

– Hermione, suas torradas estão prontas.

O segui até a cozinha.

Era inacreditável: Rony fizera cinco torradas.

– Vai comer comigo? – pedi inocentemente.

– Não... Se quiser mais é só pedir.

– Obrigada, mas não sou a Magali!

Ele deu um sorrisinho envergonhado e se sentou na minha frente.

– Onde estão seus pais? – perguntei, dando a primeira mordida na torrada. Mesmo tendo sido cozinhada por um homem desastrado, estavam mais do que maravilhosas.

– Já estão dormindo, acordarão seis da manhã para trabalhar. A casa entrará em movimento nesse horário.

– Ah... Posso tentar acordar essa hora.

– Não precisa. Olha, eu saio de casa sete e quarenta para a cafeteria, mas vou deixar as chaves sobre a mesa e você as deixa debaixo do tapete depois de sair.

– Mas e se alguém pegar as chaves?

– Não vai acontecer. Se preferir pode atirar a chave pela janela da cozinha, mas tenho medo que caia atrás da geladeira ou algo assim, então...

– Prefiro acordar seis horas e sair junto com todos.

– Pode ser, mas acho que seria mal pra você.

– Imagine... – falei, comendo o último pedaço da minha segunda torrada. – Acabei. Desculpe sobrar, mas eu estou cheia, realmente.

– Não se preocupe, eu como as outras três no café da manhã. Gosto de torrada no microondas, de verdade.

– Então parece que temos mais em comum do que penso! Será que o guia turístico da residência Weasley pode me orientar até o banheiro?

– Claro, venha comigo. – disse Rony, rindo e me conduzindo ao banheiro.

Escovei os dentes e, ao ir me dirigindo ao quarto dele, ele me pede com a maior inocência do mundo:

– Quer jogar banco imobiliário?

Considerando que era uma hora da manhã, eu aceitei. Fazia tempo que não jogava banco imobiliário, muito tempo mesmo.

O ruivo abriu seu armário e mais cheiro de Rony grudou em mim. Fiquei um pouco corada, mas acho que ele nem percebeu, por sorte.

Ficamos até umas três horas da manhã jogando banco imobiliário, sem falar na meia hora que se precisa pra separar dinheiro. No final, ele ganhou com três casas e cinco shoppings. Eu tinha apenas uma mísera casinha boba nos Jardins.

Dei boa noite e me deitei na cama de Rony. Era, de fato, muito confortável, principalmente pelo cheiro do seu cabelo nos lençóis.

Não tive muita dificuldade em dormir, depois do dia que se passou. Na verdade, eu queria passar a manhã toda admirando o quarto.

Ah, você vai me deixar louca, Ronald Weasley.

**

"Mas você é tão hipnotizante

Você me faz rir enquanto eu canto

Você me faz sorrir enquanto durmo"

Demi Lovato - Catch Me