Gostosuras Ou Travessuras? escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 7
Gostosuras ou travessuras?




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Por um instante, Cebola achou que aquilo era mil vezes pior do que ser atacado por uma multidão de zumbis e começou a se arrepender amargamente por ter aceitado as condições de D. Morte.

Tudo o que DC queria era sair dali o mais rápido possível. Toni e Felipe já nem sabiam mais onde enfiar a cara de tanta vergonha e idéias suicidas passavam pela cabeça do Cascão. Eles estavam bem no meio do salão de festas, cercados pela turma toda e mais vários outros alunos do colégio, amigos e conhecidos. Denise filmava tudo com um grande sorriso no rosto, Carmen não sabia se gritava ou desmaiava, Quim tentava tapar os olhos da Magali e a zoação era geral. Eles não sabiam se deviam sair correndo dali ou se matar de vez.

– DC, o que você pensa que tá fazendo? - Nimbus repreendeu dando sua capa de mágico para cobrir o corpo do irmão. Mônica fez o mesmo ao dar sua capa de vampira para que Cebola pudesse cobrir toda aquela vergonha e Cascuda procurava desesperadamente por algo para cobrir o Cascão. Ver seu namorado usando aquelas roupas ínfimas era algo que ela nunca mais ia esquecer em sua vida.

– Eu não acredito! O que aconteceu com vocês?
– Eu é que pergunto! Mônica, você tinha sido atacada pelos zumbis!
– Zumbis?
– É! Aquela garota que apareceu morta no jardim, todo mundo ficou falando que fui eu mas não fui. Aí ela se levantou e começou a perseguir o DC e... – ela o interrompeu.
– Cebola, pára! Do que você tá falando?
– Da garota que apareceu morta no jardim, pindalolas!
– Ninguém apareceu morto no jardim!
– Não? Todo mundo viu e o Franja garantiu que ela tava morta!

Ao ouvir seu nome sendo mencionado, Franja protestou.

– Andou bebendo por acaso? Eu nem faço idéia do que você tá falando!

Mônica também completou.

– A gente ficou aqui na festa o tempo inteiro e ninguém foi pro jardim! Vocês é que foram se esconder lá no banheiro masculino e saíram desse jeito!
– Peraí! Então nada disso aconteceu? Mas a D. Morte...
– Volta logo pro banheiro, anda! Suas roupas devem estar lá dentro. Depois a gente conversa.

Ele foi para o banheiro junto com os outros e para sua sorte, as roupas deles ainda estavam lá dentro. Menos mal, pelo menos não iam ter que ir embora usando calcinha e sutiã.

Quando voltaram para a festa, todos ainda olhavam e apontavam para eles. Os amigos os cercaram, crivando os cinco de perguntas que eles não pareciam dispostos a responder.

Aos poucos, o evento foi perdendo a graça e a festa voltou ao ritmo normal, embora Cebola e os outros não tivessem mais nenhuma vontade de continuarem ali. Ao perceber seu desconforto, Mônica o chamou.

– Ei, vamos pro jardim pra conversar melhor! Você tá tão bolado...

Ele acabou aceitando e os dois foram para fora do salão em direção ao jardim. Quando encontraram o caramanchão, Cebola sentiu arrepios desagradáveis ao lembrar-se do cadáver degolado que tinha visto ali, ou que pensou ter visto, ele já não sabia mais. Teria sido apenas uma ilusão da D. Morte? Era bem provável.

– Cê, por que não me conta o que aconteceu?

Ele respirou fundo, pensou um pouco e por fim decidiu.

– Eu não quero falar disso agora, Mô. Vamos só ficar aqui numa boa, tá bom?
– Mas...

O olhar suplicante dele fez com que ela desistisse de fazê-lo falar e os dois ficaram ali abraçados e olhando para o vazio. Cebola relembrou os fatos daquele dia, concluindo que aquele foi o halloween mais assustador da sua vida, até mais que o do ano passado.

Mônica pousou a cabeça no seu ombro e ele ficou afagando seus cabelos. Ele estava tão distraído sentindo o perfume dos cabelos dela que não percebeu que estava sendo observado de longe por um par de olhos claros se destacavam sob a escuridão. Ela apenas deu um sorriso meia boca e saiu dali caminhando tranquilamente. Sim, sim... aquele rapaz tinha mesmo aprendido sua lição, talvez até mais do que ela esperava. Não havia mais necessidade de se preocupar com ele.

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Ao sair da propriedade dos Frufrus, D. Morte encontrou-se com seus amigos que a esperavam do lado de fora, ainda rindo e comentando sobre aquela noite.

(Muminho) – Esse foi um dos melhores halloweens que a gente teve!
(Penadinho) – Eu nunca ri tanto!
(Zé Vampir) – Eu até consegui morder uns pescoços deliciosos. – o vampiro bateu em sua barriga e deu um sonoro arroto.

D. Morte também deu umas risadas e disse.

– É isso aí, pessoal! Vamos voltar pro cemitério que eu vou preparar uns salgadinhos pra nós!
– Ueba!

No meio do caminho, eles foram conversando alegremente e Penadinho quis saber.

– D. Morte, como você conseguiu criar toda aquela ilusão? Eu nunca te vi fazendo isso.

Ela fez um ar de mistério.

– Existem muitas coisas que você nunca me viu fazer, amiguinho.
(Lobi) – Caramba! Tudo isso só porque eles mexeram nas suas coisas?
– Mais ou menos. Acho que a gente precisava de um pouco de diversão, certo?
– Isso é verdade! – os outros concordaram e eles continuaram o trajeto rindo e fazendo piadinhas.

D. Morte os seguia em silêncio, pensando na loucura que tinha sido aquele dia. Não, ela não fez tudo aquilo apenas porque aqueles rapazes tinham mexido em suas coisas. Grande parte foi por sadismo, pelo prazer de ver aqueles rapazes apavorados e implorando pela sua ajuda.

Seus amigos pensaram que ela tinha feito aquilo por pura e simples traquinagem e não questionaram suas ações em momento algum já que ela não tinha machucado ninguém. Ela os olhou mais uma vez, contemplando seus rostos ingênuos e pensou consigo mesma.

“Realmente, existem muitas coisas que eles nunca me viram fazer.”

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Ele andava pela rua chutando latas, pedras, bolas de papel e qualquer coisa que seus tênis conseguissem alcançar. Sua cabeça estava baixa e ele estava perdido em seus pensamentos. Duas semanas se passaram desde o grande fiasco da festa e todos ainda comentavam sobre “as bibas do halloween”, como eles eram chamados. As fotos deles usando calcinha e sutiã se espalharam pela web de maneira viral e nem os melhores esforços do Franja foram suficientes para deletar todas as fotos publicadas.

Sempre havia algum engraçadinho que insistia em continuar publicando aquelas fotos para todo mundo ver. E para piorar, ainda fizeram montagens com as fotos deles usando vários ambientes como praias, selvas e outros lugares totalmente inóspitos. Até perucas alguém tinha colocado em suas cabeças, outros fizeram maquiagem com o Photoshop e tudo sempre vinha acompanhado com piadas e comentários maldosos.

Seus pais bem que tentaram fazer alguma coisa, mas embora o anonimato da internet não fosse absoluto, ainda trazia muitas dificuldades e eles decidiram deixar que o tempo se encarregasse de apagar tudo.

“Droga, esse foi o pior halloween da minha vida, que merda!”. Se fosse só aquele incidente, DC ainda poderia conviver com aquilo. Só que tudo aquilo acabou acarretando um efeito colateral que nem ele nem ninguém da turma esperava.

Um dia, Cebola e Mônica apareceram de mãos dadas na escola e ela exibia para todos uma aliança de prata para namoro. As garotas deram gritinhos histéricos, os rapazes parabenizaram o Cebola e todos pareciam felizes. Todos menos ele, que sentiu ganas de torcer o pescoço daquele careca miserável.

– Peraí, quando foi que você derrotou a Mônica? – ele perguntou surpreso ao ver os dois namorando.
– Eu não derrotei. Na boa, aquele aperto que a gente passou me fez ver as coisas de um jeito diferente, é isso.
– Que jeito? – ele perguntou tentando controlar a raiva.
– Outro jeito...

Diante da insistência de todos, Cebola acabou falando a verdade, já que todo mundo já tinha sido colocado a par da vingança de D. Morte. Quando soube, Mônica até pensou em ir tirar satisfações com ela, mas Cebola pediu desesperadamente que o assunto fosse encerrado ali mesmo. Não havia mais porque remexer em algo que já passou e ele tinha medo de que a morte fizesse algo com ela.

– Quando a Mônica foi levada pelos zumbis, eu pensei que ela tivesse sido morta ou zumbificada. Eu sei que foi só uma ilusão, mas caramba! E se não fosse? Aí eu nunca mais ia ver ela na vida!
– Tá, e daí?
– Daí que eu pensei muito e vi que não valia mais a pena ficar perdendo tempo com essas bobagens, é isso. Eu ainda vou trabalhar muito pra merecer a Mônica, mas não vou ficar adiando nosso namoro por bobagens que ficaram no passado.

DC ainda se lembrava daquela conversa, remoendo sua contrariedade. Se soubesse que as coisas iam acabar daquele jeito, ele jamais teria proposto aquele desafio ao Cebola. Ou pelo menos teria pensado em qualquer outra coisa que não envolvesse aquela criatura psicopata e demoníaca.

Agora ele era obrigado a ver aqueles dois andando para baixo e para cima trocando beijos como dois pombinhos apaixonados. Se antes já estava difícil ter alguma chance com a Mônica, depois do namoro tudo ficou impossível.

“Tudo culpa daquela monstra! Porcaria, por que ela não se vingou apenas cortando a cabeça do Cebola? Teria sido muito melhor!”

De tanto andar por aí sem rumo, ele percebeu que acabou parando no caminho para o cemitério, faltando apenas alguns quarteirões. Seu primeiro impulso foi o de dar meia volta e ir embora, mas a curiosidade falou mais alto e ele acabou seguindo em frente. Chegando ao cemitério, ele foi até a casa da morte. Pelo horário, ela ainda devia estar trabalhando e a casa parecia vazia.

“Caramba, eu não devia estar fazendo isso! Bah, quem vai ficar sabendo? Não tem ninguém aqui pra dedurar!”

Ele foi até a porta e mesmo pensando que daquela vez ela estaria trancada, ainda tentou abri-la. Surpresa. A porta estava destrancada indicando que ou D. Morte estava muito segura de que ninguém mais ia invadir sua casa ou então ela não era capaz de aprender com os erros do passado. Aquilo não interessava por enquanto e ele entrou sem a menor cerimônia, andando bem devagar para não fazer barulho.

Cebola tinha tirado fotos da casa da morte e apagou todas sem que ele tivesse a chance de vê-las. Aquele careca tinha ficado com tanto medo que nem quis guardar foto nenhuma.

“Rapaz, que casa maneira! Até que a maluca tem bom gosto!” ele percorreu os cômodos do andar de baixo e logo subiu as escadas ansioso por conhecer o tal quarto de instrumentos de tortura de que Cascão tanto falava. A casa estava relativamente escura e tinha uma atmosfera bem estranha, algo bem sobrenatural que ele não soube definir. Só sabia que o ar ali era bem diferente daquele do lado de fora.

Não foi preciso procurar muito para encontrar o quarto porque a porta estava bem aberta. Ele arregalou os olhos e entrou rapidamente se esforçando para conter a empolgação. Havia tantas coisas legais ali que ele nem sabia por onde começar!

Enquanto olhava uma grande gaiola de ferro, ele sentiu uma espécie de tonteira, uma vertigem que foi tomando conta do seu corpo e se tornando cada vez mais forte. Ao tentar virar-se, a única coisa que ele viu antes de perder os sentidos foi um sorriso cheio de maldade e péssimas intenções. E tudo ficou escuro.

O tempo que passou, ele não soube dizer. Podiam ter sido minutos, horas ou mesmo dias. Ao acordar, DC sentiu o corpo doendo como se tivesse levado uma surra da Mônica. Ele olhou em volta e viu que estava preso em uma espécie de placa de madeira que tinha buracos para as mãos e para o pescoço. Ele tinha visto a imagem daquele instrumento em vários livros de história e sabia que era usado para punir escravos fujões.

– Ah, vejo que meu convidado de honra já acordou. Está bem confortável, querido?
– O-o que...

D. Morte estava sentada em uma cadeira logo a sua frente, de pernas cruzadas e contemplando a lâmina da sua foice distraidamente, alisando o metal como que procurando por algum defeito. Ainda sem olhar para o rapaz, ela falou com a voz doce e ao mesmo tempo ameaçadora.

– Mas que menino desobediente você é! Qual foi a parte do “fiquem longe da minha casa” que você ainda não entendeu? Hum... esqueci! Você é o Do Contra, sempre faz tudo ao contrário não é mesmo?
– Você é doente! Me tira daqui agora mesmo!
– Já? Nós nem começamos a brincar ainda! Ora, relaxe! Eu prometo que não vou deixar marcas (profundas).
– Como é?

Ele olhou melhor e viu que no chão estava um pequeno fogareiro com alguns atiçadores sobre as brasas. Em cima de uma mesa, vários alicates, boticões e outros instrumentos que pareciam feitos para perfurar, dilacerar, cortar, mutilar e quebrar. Também havia alguns chicotes e algemas.

– Tá, isso foi longe demais! Eu já entendi, juro! Desculpa aí, vai!
– Agora você me pede desculpas? Engraçado... achei que você não gostasse de desculpas fingidas.

Sob os protestos e súplicas do rapaz, ela levantou-se da sua cadeira e foi até a mesa e contemplou demoradamente os instrumentos sem a menor pressa. Não havia porque correr. Por fim, ela pegou algo que parecia um grande alicate e DC sentiu um pavor tão grande, um desespero sem fim, algo que mesmo depois de muitos anos ele jamais seria capaz de descrever, ou esquecer.

D. Morte olhava para ele com seu olhar demoníaco e aquele sorriso perverso.

– Agora, meu querido, vamos começar a brincadeira!

DC gritou a plenos pulmões, como nunca tinha gritado em sua vida. Ele fechou os olhos e se debateu loucamente, tentando se libertar e fugir para bem longe e nunca mais voltar. Aos poucos, ele foi ouvindo uma voz que parecia ser do outro mundo chamando seu nome com insistência.

– DC? Ei, acorda mano! Vamos, acorda! – alguém sacudia seu corpo e ele levantou-se num pulo só, com os olhos esbugalhados e o corpo banhado em suor. Seus pais estavam na porta do seu quarto olhando aquela cena com um misto de medo e preocupação.

Ele respirava fortemente, como se tivesse corrido por uma maratona e seu corpo tremia como se ele tivesse enfrentando um frio de -20ºC. Aos poucos ele foi se acalmando e se dando conta de que estava no seu quarto, com sua família ao redor.

– Cara, eu nunca ouvi você gritar tanto! Esse pesadelo foi dos bravos, heim!
– Filhinho, você está bem? Quer alguma coisa? – sua mãe perguntou também preocupada com o filho.
– Eu só preciso de um banho mãe, valeu...
– Humpt! Eu acho que você devia parar de ouvir essas musicas pesadas! – Seu Nimbão falou. – Agora você fica aí tendo pesadelo com essas coisas.

O rapaz não respondeu nada e foi direto para o banheiro, aliviado por tudo aquilo ter sido apenas um sonho. Ou talvez mais uma daquelas ilusões da D. Morte, ele não sabia. Menos mal. Foi assustador, tenebroso e horrível, mas sem grandes conseqüências. E daquela vez, ele tinha aprendido mesmo a lição. Rodear a casa da D. Morte, nunca mais!

Quando entrou no banheiro, ele sentou-se no vaso como que para colocar os pensamentos no lugar. O que tinha mesmo acontecido? As lembranças estavam confusas e embaçadas. Várias imagens iam e vinham em sua memória, se misturando uma com a outra e depois desaparecendo como fumaça. E nenhuma dessas imagens e lembranças eram agradáveis e ele pensou que o melhor era não lembrar de nada e resolveu não pensar mais naquilo.

Ao tirar a roupa, ele sentiu uma ardência desagradável nas nádegas e passou os dedos tentando ver do que se tratava. Uma dor aguda atingiu o local e ele sentiu que havia alguma coisa ali que parecia estar em alto relevo. DC pegou um espelho que estava em cima da pia para olhar o local e seu rosto mostrou puro pavor quando viu que ali estava algo que parecia ter sido marcado com ferro quente.

A marca parecia o contorno de uma caveira com a letra “m” bem elaborada em seu interior e uma espécie de tribal dos lados. Ele sabia muito bem o que significava aquele “m”. A voz sumiu em sua garganta, sua mão perdeu a força e deixou o espelho cair no chão, quebrando em vários pedaços. Ele pressionou as costas contra a parede fria e foi escorregando até o chão. Alguém batia na porta, chamando-o várias vezes. Certamente devem ter ouvido o som do espelho se quebrando. Mas ele não ouvia os chamados, ouvia apenas o som de uma risada que de início soava apenas como um sussurro e aos poucos foi aumentando até terminar em uma gargalhada histérica.

De repente, DC começou a rir também, sem saber se era por achar graça ou se porque acabou perdendo a sanidade. Ele apenas ria e foi se acalmando gradualmente.

– Sua pervertida! – ele falou antes de abrir a porta do banheiro para avisar que tudo estava bem.


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Notas finais do capítulo

É isso aí, pessoal! Espero que tenham gostado. Confesso que eu tinha pensado em terminar a história no momento em que D. Morte estava para dar uma... bem... lição no DC, mas resolvi dar uma colher de chá para ele e colocar tudo como se tivesse sido um sonho ou uma ilusão. Afinal, essa história não é totalmente terror, é parte comédia também. Espero que tenham gostado!