Eu nunca tive nada na vida. Não tenho nada. Absolutamente nada.

Não tenho pais. Não tenho família. Não tenho casa própria. Não tenho roupas compradas por mim. Não tenho um quarto só meu. Tudo foi-me tirado quando era pequena.

Já há muito tempo, pelo menos parece que foi há muito tempo. Parece que passaram séculos mas só passaram sete anos. Sete longos e dolorosos anos.

Tudo começou, ou seja, tudo acabou quando eu tinha dez anos. Há sete anos atrás eu perdi tudo. A minha mãe era tudo para mim e quando ela foi-se embora, eu perdi tudo. Não sei como a perdi. Foi tudo tão rápido. Numa noite, igual a todas as outras, ela saiu para trabalhar e nunca mais voltou.

Por volta da meia-noite, quase uma da madrugada, dois polícias bateram á minha porta, disseram que ela foi apanhada no meio de um tiroteio e não conseguiu sobreviver. A verdade é que vivia num bairro social, num dos bairros mais perigosos da grande cidade de Nova Iorque. A minha mãe sempre quis sair daqui. Estava fazer isso quando era apenas uma bebé. Eu tinha apenas dois meses e o meu pai abandonou-nos. E todos os planos mudaram. Ou melhor, todos os planos foram por água abaixo.

Depois da morte da minha mãe, passei por vários orfanatos e casas de acolhimento, até que enfim uma amiga da minha mãe acolheu-me. Amanda é uma mulher bem conservada de quarenta anos. Os seus cabelos encaracolados estão normalmente presos num rabo-de-cavalo. Ela é doce e carinhosa. Trabalha como empregada na casa de uma das famílias mais ricas dos Estados Unidos da América. Todos os dias sai ás seis da manhã para estar ás sete e meia em Manhattan.

Não sou filha dela, não sou nada para ela mas a Amanda fez tudo e mais alguma coisa por mim, sem pedir nada em troca. Há um ano e meio eu vivo com ela, habituada a tomar conta de mim própria, a ser independente, consigo pô-la de cabelos em pé. 

Eu nasci e cresci numa zona não muito segura mas eu gosto de onde vivo. Todos os momentos que passei com a minha mãe, bons e maus, estão nessas ruas. E isso torna esse lugar mágico para mim. Foi aqui que ela me mostrou a coisa que mais amo na vida. Arte.

No chão, nas paredes, em todo o lado, as marcas dos habitantes desse sítio estão marcados por todos os lados que passamos. Dizem que graffiti é um vandalismo, só serve para estragar. Não é verdade. Para alguns é esse o verdadeiro significado. Para outros são obras de arte.

Nessas ruas perigosas, arte verdadeira vive. Eu sou uma amante de pintura. O meu sonho é tirar um curso de artes. Enquanto não posso, vou-me desenrascando pelas ruas. O graffiti permite-me dizer o que eu não consigo dizer por palavras, ajuda-me a ser quem realmente sou.

Toda a minha vida, lutei contra tudo e todos para conseguir o que eu quero e não vou parar agora. Não vou fugir nem correr, vou enfrentar todos os obstáculos que me aparecerem pela frente. Não vou desistir dos meus sonhos, pelo contrário vou concretizá-los.

Vou conseguir um futuro melhor que a minha mãe quis para mim.

E essa, sou eu. Angie Colt.