Little Firefly escrita por Isabella


Capítulo 2
Pesadelos


Notas iniciais do capítulo

"O destino é uma criança travessa, meu caro. Adora pregar peças nos mais vulneráveis" - Isabella Viana



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Eu estava deitada na minha cama de segunda mão do meu pequeno quarto, observando o teto. As paredes eram de um lavanda desbotado, e as cortinas azul pastel dançavam com o vento. Eu estava ouvindo A Tempestade da banda Legião Urbana e pensando. Pensando em tudo e em nada ao mesmo tempo. Pensando em Ed, na escola, no meu futuro... Os pensamentos corriam pela minha cabeça como pequenos grãos de poeira, daqueles que você pode observar ao sol. Eu me sentia feliz por ter conhecido alguém no bairro, e sinceramente, estava começando a gostar do jeito de Ed. Ele era aquele tipo de pessoa que possuía luz própria, que de alguma forma você consegue acreditar que nunca lhe faria mal; tão jovem e ao mesmo tempo tão sincero, tão desprovido de futilidade. Devo confessar que aquilo me encantou.

Minha cama ficava em baixo da janela, e a brisa batia em mim. Eu amava senti-la e costumava pensar que a suavidade da brisa outonal era uma forma de Deus nos acariciar. Ajoelhei-me na cama e me debrucei sobre o parapeito de madeira gasta da minha pequena janela. Olhei para o céu escuro, nem de noite era tão azul como os olhos de Ed. Sorri involuntariamente, o céu teria inveja de um tom de azul como aquele. Observei a praça cheia de árvores e bancos de madeira que ficava em frente ao meu prédio. Eu havia passado a tarde sentada em um daqueles bancos com Ed, jogando conversa fora. Escolhera um banco de madeira gasta e torto para me sentar com ele. Um banco meio incerto, sem lá nem cá; assim como minha vida.

Contei para ele um pouco sobre mim, mas omitindo meu passado. Não queria que ele virasse meu amigo por pena ou pensasse coisas como: “Ah, coitadinha!” queria que me entendesse, apenas. Mas não nos conhecíamos tão bem para isso. Ele me dissera que era músico e já lançara um EP chamado The Orange Room, que também estudava na escola do bairro, a mesma na qual eu iria começar. Combinamos um horário para nos encontrarmos na mesma praça no outro dia e irmos para a escola juntos.

Já eram oito da noite, e estava escuro. A iluminação da praça vinha dos postes, mas meu quarto não estava iluminado por nada, apenas pela luz da lua cheia que coloria a mobília de prateado. Soltei um suspiro, os raios lunares deixavam tudo ainda mais solitário a meu ver. Eu não gostava de me sentir sozinha, mas já me acostumara. Talvez dali algum tempo eu adotasse um gato de estimação que me fizesse companhia. Adotar, não comprar. Eu queria um pequeno filhote abandonado, de rua mesmo, sem raça ou família; um gato como eu.

Levantei-me e acendi a luz, me olhei no espelho que ficava atrás da porta e uma garota de olhos castanhos e cabelos do mesmo tom me encarou de volta. Eu estava com o rosto cansado, precisava de banho e sono. Do contrário, não me sentiria disposta a ir à aula no outro dia. Apanhei meu pijama na gaveta do guarda-roupa e caminhei lentamente até o banheiro pequeno.

Os azulejos eram amarelos e desbotados, com pequeninas flores cor-de-rosa. Eu achava que tinha certo charme. Despi-me e liguei o chuveiro, deixando a água quente molhar meus cabelos e relaxar meus músculos. Era uma boa sensação sentir a água morna, assim como carinho de mãe. Desliguei o chuveiro, me sequei com a toalha rosa pastel que minha mãe bordara meu nome alguns anos atrás e vesti o pijama. Logo após, escovei os dentes e caminhei para o meu quarto. Joguei-me na cama e o cansaço me venceu sem ao menos eu tentar lutar: Dormi quase que instantaneamente.

Sonhei que estava começando meu primeiro dia de aula, e Ed apontava para mim e ria como uma criança vendo um programa qualquer de comédia na T.V. A princípio, não consegui entender o motivo, eu havia feito algo? Caminhei para as aulas, decidindo ignorar. O corredor era imenso e mal iluminado, as portas eram de madeira gasta e ensanguentada, como se alguém as tivesse arranhado até perder as unhas; o chão não possuía piso e era de um vermelho que lembrava horrivelmente sangue.

Senti um arrepio na espinha, as gargalhadas dos alunos e de Ed se transformaram em algo mais maligno, parecia que todos naquela escola tentavam me machucar. Corri desesperada pelo corredor e me joguei contra a porta de saída, mas ela se recusava a abrir. Eu estava presa dentro daquela terrível escola como um passarinho em uma gaiola, ou até mesmo um rato. Sendo observada, sendo zombada. Eu lutava com todas as minhas forças para abrir a porta, chutava, batia, arranhava. Nada produzia efeito, a porta sequer balançava. Minhas unhas começavam a sangrar também, meu corpo estava fraco, minhas pernas tremiam e eu não conseguia mais aguentar meu próprio peso. Encostei-me na porta procurando apoio, mas não adiantou... Fui escorregando lentamente, até cair no chão.

Acordei assustada, suando frio e chorando descontroladamente. Apalpei em baixo do travesseiro e encontrei meu celular: o visor luminoso indicava que eram 5:00am. Passei a mão pelos meus cabelos, já grudentos de suor.  Respirei fundo, tentando me acalmar. Meu peito subia e descia rapidamente, por conta da minha respiração acelerada. Minhas mãos tremiam e eu não conseguia parar de chorar, meu corpo todo se sacudia com o choro descontrolado.

Respirei fundo e lembrei de uma música que meus pais cantavam para mim quando eu era criança, sempre que eu chorava. Poderia parecer tosco, mas aquela música ainda me acalmava. Era como se eu fosse envolta por uma onda de paz e tranquilidade quase que instantaneamente quando cantarolava a melodia. Comecei a cantar baixinho, assustada e com a voz trêmula. O que será que o dia de hoje reservava para mim?


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