Chace's POV

A cena pareceu congelar. A espada de Nathan a meio caminho do meu coração.

Eu já não aguentava mais. Era muita dor para pensar direito. Minha visão estava meio bloqueada pelo sangue que saía do corte que o soco de Nathan abrira. Eu não me mexia pela dor no estômago. Os efeitos do choque que ele me dera ainda percorriam meu corpo.

Palavras ecoavam na minha mente. Palavras que pareciam soltas, sem sentido.

“Sente falta da sua namoradinha?”, Nathan dizendo debochadamente.

Um rosto começou a aparecer em minha memória. Borrado, mas então entrando em foco, ficando mais e mais nítido. Uma garota de quinze anos mais ou menos, linda, com olhos multicoloridos brilhantes, cabelos castanhos ondulados.

Qual era o nome dela mesmo? Eu não podia ter me esquecido tão facilmente.

“Eu te amo tanto”.

Diana.

Diana Owen. Esse era o nome dela. O nome da garota que eu deixara morrer.

Vença, disse a voz de minha mãe, aquele dia depois da colheita. Custe o que custar, você vai vencer, tem que vencer. Preciso do meu filho de volta. Entendeu?

Entendi, mãe, é claro que entendi. Eu só não tenho mais como fazer isso.

Ganhe.

A voz de Diana voltou. Mais forte do que antes. E se juntou à de minha mãe. As duas pessoas que eu mais amava no mundo me dizendo para eu ganhar. E uma delas me obrigando. Eu não podia rejeitar aquilo. Mas eu não tinha mais forças.

Ganhe.

Vou ganhar, pensei.

Poseidon, por favor. Eu nunca te pedi nada.

A cena descongelou. Uma força que não era minha tomou o controle. Quando a espada de Nathan estava a centímetros de me acertar, eu me mexi o máximo que consegui, o que não era muito. E ainda foi devagar.

Senti uma dor explodir em meu ombro esquerdo e ouvi um grito de dor. Que talvez fosse meu.

Ganhe.

Nathan ficou parado pelo susto e surpresa de eu ter me mexido. Puxou a espada de volta, voltando com a expressão de raiva que já era sua antiga companheira. Eu quase não sentia mais as dores por causa da adrenalina. Dei um soco em Nathan, e ele tropeçou e recuou. Chutei-o nas costelas e a espada caiu de sua mão pela força com que inclinou.

Me apoiei nas mãos para me levantar. Cambaleei pela dor no abdome e levei uma das mãos até lá.

Ganhe.

Nathan me encarou com ódio nos olhos cinzas.

- Não, Nathan – eu disse, tentando controlar o tremor. Não deu certo; a frase saiu mais como o som que um animal moribundo faria. - Você não ganhou.

Eu ergui os braços ao mesmo tempo que ele. Senti vontade de berrar com a dor borbulhante no estômago quando usei tudo o que restava das minhas forças para chamar o mar. Poseidon com certeza ajudou, pois eu não teria conseguido sozinho.

O mundo pareceu explodir em raios, clarões e rugidos. O mar inteiro se ergueu sobre a ilha e foi de encontro aos relâmpagos que Nathan produzira. O estrondo me deixou surdo. Quando tudo acabou, Nathan e eu estávamos um de frente para o outro, os dois arfando com o esforço. Eu, quase morto.

Ganhe.

Mas eu tinha um tridente em mãos. Um tridente de verdade. Não o que eu conseguira na Cornucópia, um diferente. Verde-água reluzente, brilhando.

Nathan pegou de volta a espada e veio correndo até mim.

Ganhe.

Eu joguei o tridente com a melhor mira que pude. Foi mais forte do que eu pensei. Nathan não teve tempo de desviar. O tridente acertou-o no pescoço. A cabeça foi separada do corpo. Rolou até bater numa árvore, os olhos ainda estavam abertos. Meu tridente fincado no resto do corpo de Nathan.

O canhão atirou uma última vez.

Eu ganhei.

Caí de joelhos, exausto. Mais do que nunca a vontade insuportável de berrar de dor me atingiu. Eu devo ter feito isso, mas o som do aerodeslizador vindo me buscar abafou o grito.

Eles me deram alguma anestesia, e eu fui me afundando na inconsciência.

Agradeci silenciosamente à Poseidon. E à Diana. Ela usara o charme no último momento para ter certeza de que eu ganharia.

Eu iria rever minha mãe. Meus amigos. Estaria de volta em casa, no Distrito 4. Mas as coisas nunca seriam iguais. Diana não voltaria. Haveria mais Jogos Vorazes.

E eu havia “trapaceado”. Usara meus poderes mais de uma vez naquela Arena. E eu não subestimava a Capital. Haveria as consequências. Mas eu não ligava muito. Não mais, não ainda, nesse estado.

Eu só seria amado no meu distrito, e nem por todos. Porque eu estava vivo, outras quarenta e sete crianças estavam mortas. Algumas eu mesmo matara. E Zeus não devia estar feliz. Devia me odiar.

Eu não queria nada daquilo. Não queria ter sido escolhido. Não queria ter ido para a Capital. Não queria ter visto tanta gente morrer, nem ter matado. Não queria ser rico e famoso. Eu só queria minha vida normal.

Mas ela nunca voltaria. E eu teria que viver com isso pelo resto dela. Sentindo falta de Diana e sabendo que eu havia mudado de uma forma que ninguém nunca iria entender.