–Lion?- Chamei por ele.

–É Lian. - Disse ele aparecendo na porta.

–Desculpa, aonde você se meteu? Estou te chamando a um tempão.

–Eu estava resolvendo alguns assuntos. Quer continuar a conversa?

–Claro.

–Jéssica? - Foi então que minha mãe apareceu na porta. Olhei para Lian ao seu lado, que me parecia tão real que desconfiei se ela o estava vendo ou não.

–O que foi mãe?

–Eu tenho que te perguntar isso. Por que esta acordada e falando sozinha?

–Falando sozinha?

–É, eu vim aqui por isso, achei que estava tendo pesadelos.

–Já vou dormir, eu só estava xingando meu travesseiro que caiu no chão.

Ela me olhou com desconfiança e saiu para a cozinha. Deitei e me virei para a parede. Senti o outro lado da cama afundar, olhei por cima do ombro e era Lian que estava deitado ao meu lado. Bem perto.

–A cama é de casal, tem bastante espaço. - Falei. Ele me olhou nos olhos.

–Qual é o problema? - Ele se cheirou. - Eu estou fedendo?

Eu ri.

–Não, nada não.

Eu me sentia cismada em deitar com um menino, mesmo que fosse um anjo e meu amigo. Eu era a única pessoa da minha sala que tinha uma cama de casal. Ganhei ela porque minha mãe não suportava dormir em uma cama que era para ter alguém ao seu lado. Alguém que ela amava muito. Depois que meu pai morreu, fizemos uma troca de camas, assim as duas ficariam felizes. Ela passou de volta ao seu quarto e eu me virei para Lian. Meus olhos se encontraram com os dele. Eu estranhava a inocência que eles passavam, a tranquilidade e a falta de expressão, pareciam mortos. Foi então que eu o vi sorrir e seu olhar era alegre e cheio de vida.

–Estou humano, sua mãe não vai mais acordar.

–Mesmo assim vou fechar a porta.

Já estava sentada quando a porta se fechou lentamente. Olhei para ele, mesmo estando escuro notei que estava mexendo em meu bicho de pelúcia.

–Posso te perguntar uma coisa? - Perguntou ele.

–Você já perguntou.

Ele ficou em silencio por um momento.

–Posso te fazer outra pergunta?

–Pode.

–Por acaso você vê pessoas usando calças pretas, sem camisa e com uma cicatriz no peito?

–Sim já vi! Os anjos caídos. Você estava lutando com um e às vezes vejo eles me olhando. -Um arrepio me subiu quando falei isso. Ele soltou o ar. - O que foi?

–Estou me sentindo estranho, parece que meu peito esta queimando e eu estou com vontade de fazer uma loucura. - Disse ele entre os dentes.

–Isso se chama raiva e por que você esta assim?

–Nada não.

–Fala!

–Não.

–Você já me fez ficar curiosa, agora fala!- Disse em voz alta, já não estava mais nem ligando para minha mãe. Ele ficou em um breve silencio.

–Não.

Cruzei os braços com uma violência tão grande que chegaram a doer, mas não ia reclamar e nem perder a pose. Depois comecei a balançar o pé, ele olhou para mim mas evitei seu olhar.A porta não estava totalmente fechada deixando com que uma brecha de luz entrasse no quarto. Minha mãe sempre deixava a luz do corredor acesa. Bufei e rapidamente lancei meu olhar para a porta do guarda roupas onde vi alguma coisa. Olhei novamente e vi uma coisa preta parada em forma de homem. Lian se atiçou ao meu lado se sentando na cama. Lentamente a porta se abriu deixando mais luz entrar e revelando um homem sem camisa, com calças pretas e uma cicatriz feia no peito.

–Saia daqui. - Disse Lian em tom ameaçador.

–Calma eu só quero conversar com ela. - Disse o homem não em tom defesa, mas quase como uma gozação. Quando percebi, Lian já havia se levantado e empunhado uma espada de fogo, me assustei e me escolhi.

–Saia daqui.

–Eu não vou sair, só quero conver...- Antes que o homem terminasse de falar, Lian o havia partido e então desapareceu queimando com um grito de dor. Fiquei parada na cama, imóvel. Lian saiu de sua posição de guarda e a espada desapareceu em sua mão.

–Eu tenho que ir. - Disse ele e então desapareceu. Naquele momento me senti tão vulnerável quanto uma rosa delicada no meio de uma ventania. Eu estava sozinha, sem meu anjo da guarda, com um demônio tentando falar comigo e ainda não podia contar nem com minha mãe que não iria acordar. Me encolhi na cama e passei a noite em estado de alerta, com medo de alguma coisa que eu não sabia o que era. Chamava por Lian mas o silencio sempre me respondia que estava sozinha.