O Garoto Da Camisa 9 escrita por Gi Carlesso


Capítulo 4
Capítulo 3


Notas iniciais do capítulo

Nem chega num internato em Londres e já tem o famoso "garoto misterioso" sedução ¬¬ sorte, você ainda gosta de mim? Precisamos conversar....



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Senti-me como uma completa psicopata mediante aquela cena – o garoto sorrindo diretamente na minha direção e eu, sem nenhuma chance de escapar daquele sorriso arrebatador. Tentei desviar o olhar para qualquer outra coisa, mas como imãs, seus olhos me puxavam de volta para os seus de forma fixa. Não poderia ser algo normal, como alguém que nunca me vira na vida, simplesmente não consegue desviar um olhar? Nosso contato visual demorou longos segundos, até que um jogador quebrou o contato chamando o garoto para longe.

Uma sensação estranha tomou conta de mim, como se eu já o tivesse visto antes, seus olhos eram conhecidos e provavelmente, fora por isso que fiquei tão assustada com nosso contato visual. Uma lembrança confusa e escura passou em minha mente – alguém me dizia algo, era um garoto pequeno, com cabelos negros e olhos escuros. Ele sorriu levemente antes de desviar o olhar e a lembrança se apagar em um borrão escuro. Um leve arrepio tomou conta de mim e assim eu soube.

Eu já o vira antes.

- Mel, você está bem? Ficou um tempão quieta. – Carly estava parada ao meu lado, seus braços estavam cruzados sobre o peito e ela tinha um olhar preocupado sobre mim. – Parece até que vocês dois estavam se comunicando pelo olhar, tipo os X-man. Sinistro!

- Quem é ele?

- Sam Bower. – ela sorriu mordendo o lábio inferior. – Lindo, inteligente, aluno com mérito e muito sinistro. – Carly viu minha expressão confusa e riu. – Ele é estranho, não conversa com muitas pessoas e nem tem muitos amigos, só com o colega de quarto dele, o Jonah.  Não sei se é verdade, mas criaram alguns rumores de que ele matou uma pessoa no ano passado e por isso foi mandado para o North England. Essa história me dá arrepios. Já me disseram que o homem que ele matou estava com o pescoço esfaqueado e um corte horrendo na barriga.

Senti um calafrio intenso em meu corpo. Como há um segundo atrás eu estava encarando um possível assassino? E pior, achando que o conhecia?!

Rapidamente desviei meu olhar na direção de Sam, onde ele estivera antes, porém ele já não estava mais me encarando, agora ele voltava a prestar atenção ao jogo antes que o treinador apitasse avisando o término da partida. Respirei fundo lentamente tentando não entrar em desespero por aquele mísero detalhe. Sam não parecia um assassino, sua mente parecia tranquila demais para alguém que já tivesse matado alguém. Se o fosse, estaria, provavelmente, se sentindo culpado e quase morrendo de tanto remorso.

Bom, pelo menos essa seria a minha reação.

Jesse decidiu que me mostraria o internato inteiro, para que eu não me perdesse caso precisasse procurar por alguém ou por alguma sala. De acordo com ela, o lugar era gigante e por isso, demoraríamos um pouco. Saímos do campo, deixando Carly e Roman para trás, quem decidiram ficar para ver o término do jogo.

Respirei fundo e olhei lentamente na direção do campo, encontrando seu olhar penetrante mais uma vez na minha direção.

 E mais uma vez, sorrindo.



- Muito bem, aqui é o refeitório. Não tem lugar mais nojento do que esse, eu acho que só limparam algumas vezes nos quase quarenta anos de internato Ah, e a cozinheira vai te envenenar se disser que a comida dela é ruim. – arqueei as sobrancelhas me perguntando que aquilo era verdade e pelo olhar de Jes, era. – Ela tenta inovar a cada almoço e janta, porém é praticamente sempre a mesma coisa grudenta e asquerosa, mas comestível.

- Já estou acostumada com isso, quero dizer, menos a parte de ser envenenado. – Jes riu enquanto me levava até o outro lado do internato, onde estavam as outras salas de aula.

O corredor largo se estendia por um longo caminho, em que em uma das paredes haviam um grande número de janelas e no outro, várias portas de salas de aula. Ninguém circulava por aquele local, provavelmente tentando evitar as salas enquanto podiam, coisa que todo aluno faz.

- Alguém já conseguiu fugir daqui? – perguntei quando passamos por uma janela alta cobrindo quase toda a parede. Do lado de fora, pude ver o portão alto e as grades com fins pontudos ameaçadores. Engoli um seco ao imaginar alguém tentando pular, com certeza seu fim não seria o melhor.

- Uma vez, um garoto do último ano conseguiu achar uma maneira de fugir. Ninguém sabe exatamente como, mas disseram que ele se feriu bastante antes de realmente conseguir. – Jes limpou a garganta. – Não sei se é verdade, mas parece que ele foi pego por um dos fiscais quando tentou voltar e... morreu algumas semanas depois.

Era óbvio que Jes conhecia o tal garoto, pois seus olhos molhados indicavam que lágrimas poderiam escapar a qualquer momento. Por um instante, senti pena dela, a pessoa deveria ser especial e a morte é algo que deve ser respeitada. Eu sofri muito com a de meu pai, tanto que conversar sobre esse assunto fazia com que lágrimas enchessem meus olhos.

- Jes... – olhei bem nos olhos dela. – Quem era o garoto que conseguiu fugir?

- Meu irmão. – não consegui conter a surpresa, eu não esperava que a pessoa fosse irmão dela. –Todos os dias eu tento descobrir o que aconteceu com ele. Chegaram a me dizer que ele encontrou algo sobre o passado do North England e... bom, acham que a diretora tem algo a ver com a morte dele.

- Sinto muito. – murmurei dando um rápido abraço nela. Porém, suas palavras se repassaram mais uma vez em minha mente, focando sobre a parte em que ela procurava pelo motivo de sua morte. – Espera, você disse que acham que a diretora tem algo a ver com a morte de seu irmão?

- Sim. – ela limpou o rosto com as mangas de sua jaqueta. – Por que?

- Não é estranho acharem que Lilian tem alguma conexão com a morte de seu irmão? Quero dizer, isso não tem sentido, por que uma diretora participaria da morte de um aluno?

Jesse deu de ombros.

- Não sei se é verdade, Mel. As pessoas do North England costumam inventar muitos rumores sobre alunos, professores e até mesmo Lilian. Deve ser porque ela dá medo, você mesmo disse que se sentiu ameaçada pelo olhar dela. – assenti, porém ainda achava que havia algo muito estranho naquela história. – De qualquer jeito, vamos esquecer isso, vou leva-la para entender os labirintos dos dormitórios.

Ela riu, parecendo esquecer o incidente por um momento. A frase de Jesse ainda insistia em voltar a minha mente, eu tentava encontrar uma razão para que tivessem criado o rumor de que Lilian participara do assassinato do irmão de Jes. Havia algo muito estranho naquela história.

Voltamos a caminhar pelo mutirão de corredores do internato, até finalmente encontrar as portas para cada dormitório. Em cada uma delas, havia uma pequena placa prateada indicando se era o feminino ou o masculino. Quando estávamos prestes a entrar no feminino, a porta do outro abriu sonoramente e se fechou num baque alto, chamando nossa atenção

De lá, saiam dois garotos rindo alto e conversando sobre um assunto que não pude ouvir muito bem. Um deles era loiro, muito mais alto que eu e possuía olhos castanhos sorridentes. Já o outro, fez-me parar bruscamente ao lado de Jes e puxá-la para dentro do dormitório feminino o mais rápido possível. Porém, esse meu movimento acabou por chamar a atenção dos dois, quem vieram até nós.

- Olá, meninas. – disse o loiro com um sorriso de lado, com aquela típica voz de garoto “pega todo mundo”. – O que fazem aqui, estão atrás de alguém?

- Não, Jonah.  – disse Jes revirando os olhos. – Estou mostrando o colégio para a aluna nova. Essa é Melanie. Melanie, esse é o tarado estúpido, Jonah.

Ele veio até mim olhando-me de cima a baixo sem nem sequer disfarçar. Claro, senti que meu rosto esquento e provavelmente minhas bochechas estavam num tom muito vermelho.

- Melanie... gostei do nome. – ele piscou. – Seu nome faz jus a sua aparência: ambos muito bonitos.

- Ah, Jonah, poupe a garota com essas suas cantadas ridículas! – Jes deu um tapa nele de uma forma um pouco... hum, violenta. Os dois começaram uma longa discussão, a qual estava deixando eu e Sam, completamente inertes do que estavam falando.

Algo me dizia que os dois já se conheciam a um bom tempo e estavam aproveitando agora para terminarem alguma briga do passado.

Sam estava parado a poucos metros de mim, as mãos descansando nos bolsos da calça jeans e o olhar sobre a discussão de Jesse e Jonah. De perto, pude vê-lo de uma forma mais detalhada – os olhos continuavam o mesmo, com o brilho que me deixava confusa. Suas feições eram marcantes, com traços muito diferentes dos que já vi antes. Os lábios eram carnudos, poderiam deixar qualquer garota com inveja e implorando por lábios iguais. Os ombros largos eram cobertor por uma blusa cinza de gola V, a qual definia bem os músculos nada exagerados de baixo da blusa.

Percebendo meu olhar sobre ele, Sam andou calmamente em minha direção e assim, pude experimentar o desespero do medo. Porém, todo esse sentimento fora por água baixo quando ele sorriu abertamente.

- Oi, você deve ser a Melanie. – disse ele calmamente. Sua voz tinha o poder de prender minha atenção completamente, quase que um efeito paralisante.. – Sou Sam.

- Oi. – murmurei baixo demais. – Jesse já me apresentou você a distância. – brinquei.

- Imaginei. – Sam sorriu. – Ahn... que tal deixarmos esses dois terminarem a briga e... dar uma volta lá fora?



Nos sentamos em um dos últimos bancos do lado de fora do North England, na entrada em que cheguei com minha mãe hoje de manhã. A temperatura havia caído muito, por isso, tive que me encolher com a jaqueta preta que usava para me esconder do vento forte.

Típico clima de Londres.

- E então, o que trouxe você aqui? – perguntou ele depois de alguns  segundos em silêncio olhando em volta. Mesmo percebendo que eu e Sam havíamos saído, Jonah e Jes haviam ficado no mesmo lugar, discutindo sobre as cantadas dele e como eram bobas

Eu tinha que admitir, Sam era diferente do que imaginei – era divertido às vezes e gostava muito de falar, diferente do que Carly havia falado sobre ele ser muito quieto e não falar com ninguém. No geral, ele era muito diferente do que as pessoas diziam, possuía um jeito único e talvez seu silêncio algumas vezes e o olhar um pouco penetrante, deixavam as pessoas se sentindo ameaçadas. E por esse motivo, comecei a duvidar ainda mais de que os rumores sobre ele assassinar alguém, fossem mentira.

- Meu pai morreu há alguns anos e acho que isso me afetou muito. Ele era uma pessoa importante demais na minha vida, me ajudava mais que minha mãe – engoli um seco. – Fiquei sem alguém para contar o que estava acontecendo em minha vida e comecei a me sentir sozinha. Minha mãe encara isso como uma revolta, mas... só tento esquecer o que aconteceu, por mais difícil que seja.

Eu me sentia a vontade para contar minha história para Sam, ele parecia ouvir e não fingir como minha mãe costumava a fazer. Talvez eu estivesse precisando mesmo disso, ter alguém que apenas me ouvisse e deixasse com que eu desabafe sobre tudo que estava acontecendo. E algo me dizia que Sam, o que colocava medo em todos, era a melhor pessoa para isso.

- Você não parece revoltada, Melanie. Acho que é isso mesmo, você só age dessa forma para se defender, para não sofrer de novo. É como uma defesa. – não contive o sorriso ao ouvi-lo. Pelo menos uma vez em minha vida, alguém havia me entendido. – E a propósito... sinto muito pelo seu pai.

- Obrigada. – murmurei. Ficamos em silêncio por mais alguns instantes, tudo que eu podia ouvir eram os sons de pessoas conversando não muito longe de nós, o som do vento contra as árvores e pequenas plantas em torno do prédio do internato e minha respiração. Até que decidi quebrar o silêncio. – E você, por que está aqui?

Em silêncio, o lancei uma espécie de desafio. Agora, eu poderia saber a verdade e deixar todos os rumores que inventaram de lado e criar uma imagem nova e certa do Sam que eu tinha a meu lado. Só por alguns minutos de conversa, já percebi algumas falhas nos rumores, coisa que poderia apenas mudar ainda mais.


Sam endureceu a expressão, voltando ao seu olhar sombrio que eu conhecia muito bem. Engoli um seco, talvez aquela era a falha de minha ideia e eu, não estava preparada para ouvir o contrário e saber que todos os rumores sobre Sam eram verdadeiros.

- Eu... – ele suspirou. – Não me julgue, ok? Briguei com um professor há dois anos atrás. Eu não o feri tanto como as pessoas insistem em dizer, a única coisa de nova no rosto dele era um pequeno hematoma no olho direito. Mas as pessoas são más, tanto que aumentaram o que aconteceu e fui obrigado a fazer serviço comunitário. Quando terminei, meu pai nem pensou duas vezes em me jogar nesse internato. – Sam mordeu o lábio inferior. – Eu nunca quis fazer aquilo, me arrependo todos os dias.

Havia algo naquela história que mudou completamente minha imagem de quem era Sam Bower. A forma com que me contou aquilo fora íntima, ele descarregou o que estava preso em sua garganta por tanto tempo e nem se importou em qual seria minha impressão.

Porém, ainda movida pelos rumores, uma impressão também errada me rondava. Era como se aquela história do porquê que ele viera para o internato não fosse verdade, quase que contada de uma forma ensaiada.

Levantei-me de uma forma um pouco brusca demais, chamando a atenção dele, o qual antes parecia entretido demais relembrando o passado e revivendo as cenas mentalmente. Olhei em volta, principalmente para o céu e pude ter a visão de nuvens negras se aproximando daquela região, indicando que poderia chover a qualquer momento.

Salva pela chuva de Londres, quem diria.

- Ahn... Sam, eu preciso ir. – falei. Ele continuava sentado no banco descansando os cotovelos nos joelhos, sua expressão mostrou um misto de confusão de curiosidade. – Tenho que arrumar minhas coisas, acabei de chegar aqui e nem tirei minhas roupas da mala. Acho que... poderíamos acabar essa conversa outra hora.

Ele nem piscou.

- Entendi. – murmurou levantando-se também do banco, ficando a poucos centímetros de mim. – Eu até perguntaria se não quer ajuda, mas garotos são proibidos de entrar no dormitório feminino, então...

- Claro, entendi. – falei sorrindo educadamente para ele. – Obrigada mesmo assim.

Eu me preparava para seguir meu caminho até o internato, até que ouvi sua voz grave atrás de mim.

- Melanie! – chamou. Quando se aproximou mais de mim, continuou. – O que acha de conversarmos amanhã depois das aulas? Eu entendo se tiver alguma coisa para fazer, é que gostei de falar com você. Foi a primeira que não me julgou pelo o que fiz ou saiu correndo por ai inventando que matei pessoas.

Ele parecia sincero, tanto suas palavras quanto o sentido delas. Com um meio sorriso no rosto, mostrei a ele que não recusaria.

- Pode ser. – falei. O sorriso dele aumentou, mostrando o quão havia ficado feliz por eu não recusar. – Nos vemos amanhã então, Sam.

- Mal posso esperar. – ele sorriu de uma forma diferente, colocando-me numa posição sem vantagens. Tentei sorrir mais uma vez, porém desisti e fui para o internato, virando apenas uma vez para trás encontrando seus olhos fixos em minhas costas.





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Notas finais do capítulo

"Mal posso esperar" UI UI UI



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