Querido diário

São 00:30 e não consigo dormir. Sei que já deveria estar na cama, porque amanhã começam as aulas e vou ter que levantar cedo... (para minha desgraça... odeio acordar cedo) mas eu não consigo. Milhares de pensamentos rodam em minha cabeça; mas o que eu não paro de pensar é: “Como me sairei no colégio novo?”. Amanhã será meu primeiro dia de aula neste colégio, neste país e estou com receio, pois não sei se me darei bem.... Para começar, não sei nem porque estou aqui. Meus pais, meu irmão e eu morávamos em Atenas. Um dia, quando meu maninho e eu estávamos no colégio, a diretora nos chamou até a sua sala. Eu pensei: Fudeu. Digamos que não sou um bom exemplo de aluna a ser seguido. Bem... entrei na sala já me preparando para o sermão, quando a diretora nos deu uma notícia que me deixou.... abismada. Em resumo, ela falou: “- Vocês dois acabam de ganhar uma bolsa de estudos nos Estados Unidos.” Silencio mortal na sala. Momento WTF. Nunca esperaria isso, porque eu não... Bem, digamos que não sou nenhum Albert Einstein. Bem longe disso. Tirar notas altas é um suplício para mim. Sou boa em esportes. Uma arqueira de mão cheia. Peça para que eu atire com o arco em um ponto de meio centímetro em um alvo á 20 metros de distancia. É moleza. Acerto bem no centro. Agora peça para que eu resolva  o produto da soma pela diferença de dois termos, ou que calcule o comprimento de uma circunferência de diâmetro igual 8,2 centímetros... levo no mínimo uma hora e ainda resolvo errado! Bem diferente do meu irmão... As vezes acho que ele recebeu toda a inteligência destinada á nós e não deixou nada para mim! Nem fiquei surpresa por saber que ele tinha ganhado a bolsa, pois ele é ma enciclopédia humana! Por falar em Nikhos ( Nikholas é o nome de meu irmão, eu o chamo de Nikhos) quando a diretora nos deu a notícia, ele se levantou da cadeira em que estava sentado e começou a dar pulinhos e bater palmas. Desculpa maninho, mas estou começando a duvidar da sua masculinidade. Mas é obvio que não falaria isso para ele. Não se eu quisesse continuar com meus dentes intactos. Mas deixando de lado essa reação purpurinada dele, tudo aquilo estava muito estranho. Para começar, aquela mulher era bonita demais para ser a diretora. Ouvi um boato de que tínhamos uma nova diretora, mas essa aí parecia mais uma modelo. Alta, magra cabelos castanhos claros e cacheados que iam até a cintura, pele de pêssego branca e imaculada, rosto de fada, lábios bem vermelhos e olhos verdes como esmeraldas.Olhei para Nickos e tive que levantar seu queixo, porque estava quase formando uma poça no chão com sua baba. Homens são tão previsíveis. Não pedem ver uma mulher bonita que... não pude terminar o raciocínio comigo mesma. Entrou na sala um homem...estupendo. Alto, magro mas com músculos, cabelos extremamente pretos e lisos amarrados na nuca. Olhos azuis como o céu em um dia de verão, mas com um brilho... maquiavélico. Um rosto tão lindo e bronzeado que chegava ser maldoso. Por favor, alguém poderia vir aqui e fechar minha boca?Ah sim, traga uma bóia também para não se afogar na nossa baba. Obrigado. O novo habitante dos meus sonhos mais eróticos entrou e foi se sentar ao lado da diretora. Ele viu que meu irmão a olhava como que hipnotizado com sua beleza e.... sinceramente acho que bati com a cabeça porque pensei ter visto os olhos deles se incendiarem parecendo chamas, de ódio, ao olhar Nickos. Mas então, a diretora pegou em suas mãos e os dois se olharam profundamente, e o brilho de ódio deu lugar a um de... amor. Sério, esses dos estão me tirando pra castiçal? Devo perecer uma vela mesmo, só pode ser isso. Até que enfim eles perceberam que não estavam sozinhos e acabaram com a cena gay. Estava achando que tinha ficado invisível. Bem, a diretora apresentou-nos e disse que ele era o responsável pela bolsa. Parece que meu irmão começou a sentir um pouco menos de antipatia por ele.  Terá que se acostumar maninho, porque ele é seu futuro cunhado. Depois de uma longa conversa em que fui praticamente ignorada, resolvi abrir minha santa e abençoada boca e dizer:

"- Senhores, nos sentimos muito honrados, mas não podemos deixar a Grécia e ir para os Estados Unidos assim, sem mais nem menos. Primeiro, porque nossos pais, nem nós, conhecemos ninguém lá. Então não teremos onde morar, nem emprego, no começo. E segundo, eles NUNCA desistiriam de sua vida inteira aqui, para começar do zero em outro país, por causa de uma simples bolsa de estudos."

Os três olharam para mim. Nickos olhava para mim como se eu tivesse três cabeças e seu olhar parecia dizer "cala boca, porra". Ela, com seus olhos doces, parecia dizer "Não se preocupe". Ele, com seus azuis e frios me examinou dos pés á cabeça. Seu olhar sombrio e perigoso me dizia "Sua tola". Naquela hora, estava me sentindo o ser mais insignificante do universo. Então ela falou:

"- Leda, não se preocupe, está tudo resolvido. Arranjamos um apartamento para vocês morarem. Também temos um emprego para seus pais. Amigos vocês farão outros. E já falei com os pais de vocês. Eles estão de acordo e muito ansiosos."

Silencio mortal na sala. Segundo momento WTF. Além de eles darem duas bolsas de estudos nos Estados Unidos, ainda arranjaram apartamento e emprego para nossos pais. Isso ficava cada vez mais estranho. O que mais me estranhou foi o que a diretora nos disse antes de sairmos da sala. Depois de outra longa conversa, em que novamente fui ignorada, (Já falei como amo ser ignorada? Você fala e fica no vácuo. É uma delícia.) estava abrindo a porta, quando ela disse:

"- Eu quero que vocês saibam que esta mudança não será apenas de país e de colégio, mas sim uma mudança interna. Esta mudança será o primeiro passo para uma estrada com muitas escolhas e muitos caminhos em que a decisão final será de vocês. Tomem cuidado.”

Estaquei no lugar e a olhei interrogativamente. Ela apenas devolveu meu olhar e disse: “Vá”. Então saí da sala sem insistir em uma explicação, primeiro, porque eu precisava falar com Nickos e segundo, porque o homem dos meus sonhos que mais parecia um guerreiro do mal já estava me olhando com certa irritação. Mas antes de sair, olhei meu guerreiro moreno e pisquei para ele. Torci para que tenha parecido sensual e não um tique nervoso de uma retardada.

Quando estávamos no corredor, me virei para Nickos e perguntei:

- O que você acha?

- Acho que temos sorte por conseguirmos uma oportunidade como essa, e se nossos pais concordaram em ir, beleza. Não precisaremos ficar perdendo tempo para convence-los.

- E todos nossos amigos?

- A diretora mesmo disse: Lá nós faremos novos.

Chegando em casa, fomos conversar com nossos pais. Eles confirmaram tudo o que a diretora nos disse. Não sei por que, mas, sinto que meus pais estavam diferentes. Estavam meio frios. Mas mesmo assim eles pareciam estar contentes. Seus lindos olhos azuis me emocionavam. Aliás... azuis? Seus olhos sempre foram verdes. De ambos. Para não queimar os poucos neurônios que eu tinha nisso, resolvi deixar de lada essa questão.

Ocorreu tudo como a diretora predisse. E ainda pagaram a passagem de avião para nós quatro! Dentro de um mês estávamos aqui nos EUA. (Relembrando que faz dois meses que estamos aqui). Quando chegamos no aeroporto já havia uma pessoa nos esperando. Era uma mulher muito bonita. Parecia se destacar no meio das demais. Essa impressão aumentava mais ainda por ela usar roupas coloridas. Mas a combinação das roupas a deixava elegante e não esquisita. Nos apresentamos e ela disse que se chamava Irís. Entramos em um carro e ela nos mostrou um pouco da cidade, nos falou do apartamento e da empresa. Um pouco mais tarde, Iris disse que tinha de ir porque iria chover e depois ela teria de ir trabalhar. Eu sinceramente boiei, não vi a relação de uma coisa com a outra, mas tudo bem. Chegamos em nosso apartamento. Ele era simplesmente maravilhoso. Um apartamento enorme, na cobertura, em um bairro nobre e chique e ficava perto da empresa em que eles trabalhariam e perto do colégio. Por falar em colégio, vou para cama ver se pego no sono. Quero ver se começo razoavelmente bem as aulas, mas, aqui entre nós, a respeito dessa nova vida aqui nos Estados Unidos, estou com um mau pressentimento.