Heat-Haze Days escrita por Bacon


Capítulo 2
Névoa de Calor


Notas iniciais do capítulo

Yay, o primeiro capítulo~ ♥
Espero que esse compense o prólogo, mesmo que também não seja tão longo assim X3
Ele fala um pouquinho da história de Len, nosso amado protagonista~
Boa leitura!



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 Era 15 de agosto, perto meio dia e meia. A luz do sol batia em meu corpo, vinda da janela de meu quarto. Um dia realmente bonito. Bonito até demais. Raios de sol quentes e brilhantes que batiam sem dó no meu rosto, queimando. Parecia que eu ia ficar doente com aquilo.

Eu havia acabado de acordar. Virei a noite jogando video game e só agora acordei. Não que isso fizesse alguma diferença aqui em casa. Desci da cama e fui para o banheiro, me aliviar e escovar os dentes. Não tinha o hábito de tomar um banho matinal, então me dirigi para a cozinha.

– Você não pode fazer isso, Guilherme! – ouvi minha mãe gritar da sala.

– Cale a boca! – meu pai respondeu, seguido do som de um tapa e de algo grande e pesado caindo na mesa de jantar e soluços abafados de mulher.

Ah, meus pais. Já faz um tempo que eu deixei de me meter nas discussões deles. Sempre que me intrometia, acabava saindo machucado fisicamente, ou pior, emocionalmente. Desde que minha irmã mais velha, Rilla, morreu, ambos discutiam quase que diariamente. Meu pai culpava a si mesmo por sua morte, e acabava descontando sua raiva em minha mãe, que por sua vez tentava afogar suas mágoas com as bebidas. Mas a culpa não foi de ninguém, apenas minha. Se eu não tivesse trapaceado para ganhar a aposta, nada daquilo teria acontecido. Rilla não teria pagado sua prenda, tendo que correr o mais rápido que pudesse pela rua e, consequentemente não teria cruzado o destino daquela bala perdida. Eu teria.

Eu que deveria ter morrido naquele dia.

Tentando fazer o mínimo barulho o possível, fui para a cozinha, fiz meu típico pão com manteiga e saí de casa pela porta dos fundos, comendo meu “café da manhã”. Em dias como aquele, eu só queria me desligar do mundo e pensar, pensar e pensar.

Em dias como aquele, eu só tinha um lugar para me esconder.

Andando pela pacífica rua de paralelepípedos marrons, comecei a me lembrar do pior dia da minha vida. Estávamos brincando, eu, Rilla e nossa melhor amiga, Miky, com suas marias-chiquinhas e maravilhosos cabelos acinzentados, que, ora pareceriam azuis, ora verdes, dependendo da luz. No parquinho, brincávamos de qualquer joguinho idiota, como as crianças inocentes que éramos. Mas... Quanto mais tentava, menos conseguia me lembrar dos rostos de Rilla e Miky. Meus pais haviam destruído ou guardado todas as fotos delas... Eu tinha quatro anos. Já se passara tanto tempo assim?

Dez anos. Os piores dez anos da vida de alguém.

Rilla morreu no parquinho e o corpo assassinado de Miky foi encontrado lá. Mas, por mais incrível que pudesse parecer, era daquele lugar amaldiçoado que eu fazia de esconderijo. Tudo começou naquele local, e tudo acabou lá. As únicas lembranças boas que eu tinha para me confortar aconteceram ali, mesmo que dilaceradas por piores. Era aquilo que eu amava no lugar: o contraste entre o bom e o ruim.

Quando encontraram o corpo de Miky naquele parquinho, pouco depois da morte de Rilla, o lugar foi abandonado. Ninguém mais o visitava. Todos achavam que era amaldiçoado, trazia má sorte ou era assombrado pelos espíritos delas. Menos eu. Era meu esconderijo, o lugar em que eu podia refletir e sussurrar novamente o velho “amanhã será melhor”, mesmo que nunca fosse.

Soube que estava perto quando comecei a ouvir o som das cigarras, aquele som irritante e estúpido que estava naquele parquinho todas as horas e todos os dias. Mas algo estava errado.

Havia uma criança no meu parquinho, uma garota que não conhecia. Ela estava sentada em um dos dois bancos do balanço, brincando com um gato preto em seu colo. Era loura e parecia ter mais ou menos a minha idade. Eu achei que até poderíamos ser irmãos perdidos, de tão semelhantes. Era-me familiar.

Mas era bobagem. A velha história trágica de irmãos perdidos que se encontram anos depois era tão clichê que dava nojo. E eu não tinha irmã. Rilla estava morta, os miolos estourados por uma maldita bala. Era só mais uma garota bonita, uma infeliz garota que descobriu meu santo parquinho.

Sentei-me no outro banco do balanço, ao lado da menina, e resolvi conversar com ela, por não ter nada para fazer, além de que queria descobrir como ela encontrara o lugar.

– Oi. – chamei.

– Olá! – respondeu ela, animadamente.

– Hm... O dia está muito bonito hoje, não é mesmo? – perguntei. É o quê? Você tá falando do tempo, criatura? Procurar assunto nunca fora o meu forte, principalmente quando se tratava de conversar com meninas bonitas. Mas falar do tempo também era o fim da picada... – Pena que o verão está acabando, né? É uma época tão boa... – uma época boa. O contrário do inverno. O contrário do clima em que Rilla morreu.

A menina, que antes tinha olhares apenas para o gato em seu colo, finalmente levantou sua cabeça e olhou para mim. Tinha lindos olhos azuis celestes. Ficamos a encarar-nos por alguns instantes. Ou foram minutos? Não poderia dizer. Mas depois daquele tempo indeterminado, ela sorriu um sorriso triste.

– Sim, mas... eu meio que o odeio o verão.

Ao dizer isso, acariciou o gato um pouco forte demais, o que pareceu assustá-lo. Ele pulou de seu colo e correu para a rua. Ao contrário da menina, não fiz um sequer movimento para tentar recuperá-lo. A garota, que levantou-se apressadamente, começou a correr atrás do bicho, sem prestar uma mísera atenção no sinal de pedestres que acabava de ficar vermelho.

O gato correu para o meio da rua. Ela o seguiu.

– Não! Espera! Não! – gritei, levantando-me do balanço e tentando alcançá-la. Por um instante, ela parou e olhou para trás.

Foi nesse mesmo instante que um caminhão em alta velocidade a atingiu em cheio.

Sangue quente voou pelos ares e algumas gotas salpicaram meu rosto. O único som que fui capaz de ouvir foi o grito agoniante dela. O motorista do veículo fugiu, nem sequer parou o carro para tentar ajudar, o que deixou uma trilha de sangue por alguns metros. Aquilo estava acontecendo de novo. Por minha causa. De novo.

Forcei-me a olhar para a rua, para a menina, mas a primeira coisa que vi foi um braço separado do corpo. A visão, o cheiro de sangue, o cheiro dela me fizeram vomitar. Respirei fundo, limpei a boca e olhei para frente, encarando todo o desastre. Aquilo não era possível... Era como se...

– Não é mentira – disse a névoa de calor.

Era um garoto igual a mim, não, era eu, porém translúcido e alaranjado. Eu podia ver o outro lado da calçada suja de sangue através dele. Senti um vento forte e quente bater contra meu corpo e fechei os olhos por um instante, pensando que vomitaria de novo. Ao abri-los, a névoa estava na minha frente, sorrindo um sorriso debochado e que parecia dizer: “Coitadinho”.

Cambaleei para trás e acabei tropeçando em meus próprios pés, caindo de costas no chão. A névoa disse alguma coisa, mas eu não pude escutar, pois tudo começou a desaparecer, lentamente com o som das cigarras.


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Notas finais do capítulo

E aí, gostaram?
Por favor, não me matem por causa da história da irmã e tals, porque TEM relação com a música e clipe, ok?
Só gostaria de dizer que eu estou escrevendo isso de acordo com a minha interpretação, não li teorias nem nada XD
Mereço reviews? :3