Como Ser Um Pegador Em 12 Lições. escrita por Jess B


Capítulo 2
Capítulo 2 - Todo trabalho pra um cigarro?




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Fred

Era tempo de Ed. Física e todos os alunos dos terceiros e segundos anos estavam fazendo essa aula. Todos, com exceção de nós.
Já era quarta-feira e eu não tinha a mínima ideia de como ia me aproximar de Júlia Torres. Os caras e eu ficamos na arquibancada, vendo o resto fazendo exercícios idiotas. As meninas praticavam handball e os meninos, futebol. Já era costume a gente não fazer nada nessa aula. Atrapalhávamos todos nesses jogos estúpidos.
Fui olhar pro lado onde as meninas estavam jogando. Claro que eu não ia ver marmanjo chutando bola, quando podia ver meninas com shorts apertados.
Foi aí que eu vi quem tava jogando também.
from hell.
- E aí, já sabe o que vai fazer pra ficar com a Torres? – Davi apontou a cabeça na mesma direção que eu olhava, preocupado. Ele sabia mais que eu que André não estava brincando com aquela aposta. Achei legal da parte dele ter aflição com os meus problemas. 
- Olha, que lindo, todo preocupadinho comigo! – falei com a voz afeminada e ele riu. 
- Seu gay! Eu to preocupado, porque ninguém sabe o que essa doida é capaz de fazer com você. Imagina se a Júlia descobre dessa apos... 
- de Sousa! Cala a boca! Depois ainda pergunta se as indiretas de ficar com a boca fechada são pra você. Esse assunto a gente só pode falar em casa. Para todos os efeitos, ela tem que achar que eu realmente estou afim dela. – eu acho que falei com tanta raiva que ele assentiu sem titubear. 
Davi foi conversar com os outros dois em uma das arquibancadas de baixo, me deixando com os pensamentos sobre Júlia Torres. 
Júlia era assustadora. Fazia parte dos excluídos que vestiam preto e usavam coturnos, seus amigos me davam medo.Nunca que iria mexer com nenhum deles, e principalmente com ela. Ouvi dizer que entrou em várias casas para jovens problemáticos e que vendia drogas. 
Outra história de Júlia, ou Jú, é que ela era lésbica. E isso está me deixando nervoso. Como vou conquistar uma menina que gostava de menina? 
Nunca procurei saber se era verdade, mas também nunca a vi com um menino. 
Júlia era famosa – por incrível que pareça – por suas notas e sua performance em lutar a favor dos direitos dos alunos, principalmente os das meninas. 
Estudei com ela no primeiro ano e presenciei várias brigas com professores e coordenadores. Todos os dias, ela chegava atrasada e com cara de sono. 
Usava muita blusa preta e esmalte da mesma cor. Já me falaram que tinha feito pacto com diabo, não duvido. 
Eu não a achava bonita e nem feia, mas com certeza não fazia meu estilo de garota. 
Foi quando eu ouvi uma gritaria e um aglomerado de pessoas – no meio, uma em especial. 

Júlia
Babado, confusão e gritaria. 
Essa frase resumia o que rolou naquele momento. 

Flashback’s on:
Eu tinha acabado de jogar Handball, meu time havia ganhado de quinze a onze e eu estava exausta. Fui ao bebedouro, enxugando a testa suada e nojenta. Abaixei a cabeça pra beber a água. Ouvi uma voz conhecida. 
- Olha, mesmo sendo punk é gostosa. – John, o ogro, falou se aproximando com seus amigos enormes e fedorentos. Não dei valor e continuei bebendo a minha água linda. 
Foi quando aconteceu. 
- Quando estou falando com você, é pra olhar pra mim! – John alisou minha bunda. 
Ele não fez isso.

Fechei meus olhos com raiva e me virei. 
- Você não fez isso! 
- Que foi? Não sabe o que é carinho de homem não? – respirei algumas vezes tentando manter a calma, mas não me segurei. 
Fechei meu punho e sem pensar duas vezes, dei um soco em seu nariz. 
Todos gritaram e se juntaram. 
- Você tá louca? – João falou com as mãos no nariz que agora estava sangrando. 
- Isso é pra você aprender a nunca mais mexer comigo! – falei com toda a raiva contida por muito tempo. Cuspi nele, que ainda estava com as mãos no nariz. 
A verdade era que João mexia comigo desde que eu entrara naquela merda de colégio. Tinha preconceito por meus gostos musicais, minhas roupas e adorava me encher o saco. A gota d’água foi ter alisado a minha bunda. 
Ninguém podia tocar em mim.
Não daquele jeito. 
Flashbacks’s off

A merda estava feita. 
Roendo a unha, sentada na cadeira da diretora Beth – uma gorda amante de rosquinhas com cobertura de chocolate – esperando o veredicto. 
- Torres , faz tempo que não vem à minha sala. – a gorducha sentou em sua cadeira e eu jurava que ia pular da minha. Tá, parei com piadas chatas. – Eu fiquei sabendo o que houve com a senhorita e com o Sr. Stranford. Achei muito corajoso de sua parte bater num menino daquele tamanho. 
- A gente faz o que pode. – dei uma risadinha nervosa – Mas diretora, ele passou a mão em mim e isso eu não admito. Tive que Fredar minhas próprias providências... 
- Eu sei que como mulher é horrível ter que passar por isso e não fazer nada. Porém,não foi uma atitude muito boa, Júlia. Você bateu em alguém, machucou o próximo, e isso não é adequado. Tinha que chamar o responsável pela aula, ou seja, o professor Marcos. Antes que pergunte, dei a ele três dias de suspensão. 
- Só três dias? – falei me levantando – Como assim três dias? O menino ME ALISA E VOCÊ SÓ DÁ TRÊS DIAS? ISSO É UM ABSURDO! 
- Calma, Júlia Torres! Senão a sua detenção vira uma suspensão também! 
- DETENÇÃO? 
- Você, além de bater em uma pessoa, cuspiu. Uma semana de detenção. 
- Uma semana? – perguntei sem acreditar. Eu vou passar uma semana com gente que eu não conheço numa sala. 
- Diretora, por favor, eu nunca fui de pedir nada. Me deixe livre dessa detenção. Eu posso fazer um trabalho,olha aí. – fiz força pra chorar pra ver se ela tinha peninha de mim, mas nem rolou. 
- Não. Desculpe-me, você vai cumprir essa detenção. Vai pensar no que fez. 
Mano, saí de lá tão puta que quase a mandei Fredar naquele lugar. 

Fred

Que merda era aquela? A menina desceu a mão no cara três vezes maior que ela? 
Porra, ela era barra pesada. 
E eu não vou mentir: to com um puta medo de me chegar nela. 
O intervalo chegara. Os caras e eu ficamos na mesma mesa de sempre. Peguei meu cigarro, nervoso e pensando no que ia fazer em relação à Menina de Ouro. 
- Fiquei sabendo que a Júlia pegou detenção. – André sentou perto de mim – E aí, conquistador, já sabe como vai domar a fera? 
- Estou pensando em alguns ataques, mas calma... To chegando lá. 
- Só quero ver, tu pegando a mina estranha! – Guto falou. 
- Obrigado, por sua causa estou nessa situação. Só não acho justo que só eu tenha que sofrer. – falei revirando os olhos. Mundo injusto. André injusto. 
- Calma, pequeno gafanhoto. Os outros vão sofrer as consequências também, dê tempo ao tempo. Se eu fosse você, ficaria preocupado na missão pega-a-doida. 
- É, eu sei. – falei passando a mão no cabelo em sinal de nervosismo. 
- Porra, to me mijando. Vamos lá no banheiro. – Davi, com sua bexiga frouxa, falou e fez com que a gente fosse ao banheiro. 

No banheiro...
- Mano, eu tava muito apertado. – Davi disse lavando as mãos. 
- Não queremos saber da situação da sua bexiga. – André falou. Saí da cabine do vaso sanitário. Olhei pra baixo e vi um rolo de papel higiênico. 
Papel higiênico.

Tive uma ideia. 
- Galera, peguem todos os rolos de papel higiênico que puderem. Tive uma ideia! 
- Qual o objetivo disso tudo? – Davi ia perguntando enquanto abria os armários do banheiro. 
- Vou pra detenção, fazer amizade com a querida e amada Júlia Torres. – dei um sorrisinho. 
Os guys me ajudaram com os rolos e ouvi o sinal tocar. Saímos do banheiro e eu já sabia o que fazer. 
- Tudo certo? – assentiram com a cabeça – Ótimo! Me ajudem a enrolar os papéis no corrimão e vamos jogar alguns pro alto, ok? 
E assim foi. Pegamos uns dez rolos de papel higiênico e fizemos o que havíamos planejado. Davi enrolou o máximo que pôde nos corrimãos do corredor principal – a gente só fez nesse corredor, porque né! – depois foi a vez de André jogar pro alto os outros rolos, e Guto me ajudou a fazer um zigue zague interligando um corrimão no outro. 
Tava lindo. 
- O que você não faz pra ter uma menina... - Guto disse enquanto pegava mais rolos. 
- Não, querido Andrielli. O que eu não faço pra ter uma menina e um dinheiro fácil. Gente, podem sair. Valeu pela ajuda, mas não quero que vocês saiam prejudicados. – disse por fim, percebendo que o trabalho tava mais que satisfatório. 
- Tá, vou mandar alguém avisar à diretora. Boa sorte. – André falou. Acho que ele sentiu que eu estava levando um pouco a sério a aposta e pela primeira vez, sentiu pena. 
Fui andando com o último rolo de papel na mão quando ouvi: 
- Frederico Maia! – parei na hora e juro, tava me cagando de medo. 
- Pois não, querida diretora. 
- Que furdunço é esse? – a gorda pôs as mãos em sua cintura enorme. 
- Estava com problemas e meu psicólogo falou que seria importante eu liberar o estresse. Olhei pros papeis higiênicos e pensei: por que não? 
- O único problema aqui, mocinho, é a falta de comunicação que tenho com seus pais! – ela levantou o dedo indicador. – Quero que limpe essa porcaria e vá até a minha sala. Teremos uma conserva séria. 
E o boi loiro se foi, bufando. 
Conversa séria... 
E se ela, ao invés de mandar pra detenção, me manda fazer que nem o John e ir pra casa com um bilhete de suspensão? 
Eu tinha que correr o risco! 
Tirei todo o papel e o joguei no lixo. Demorou, já que tinha muito papel. Fui pensativo pra sala da Diretora, com medo de levar uma suspensão e meu tiro sair pela culatra. 
Respirei fundo. 
Bati na porta e ouvir um “entre”. 
- Estou ao seu dispor. – falei com uma voz de galanteador. 
- Sente, Sr. Maia. Vamos conversar. – fiz o que ela mandou e a esperei abrir a boca – Frederico, eu sei que você mora sozinho com seus amigos e sem supervisão dos pais. Isso é um problema... – até aí, tudo tranquilo – Mas aqui é diferente. Para toda ação, há uma reação. E o que você fez com certeza vai ter uma conseqüência. – sim, sim, sim! 
- E seria uma...? 
- Detenção. – prendi o riso e fiz cara de decepcionado – É claro que você esperava uma suspensão pra ficar livre da escola, mas como eu digo, aqui não, violão! Se seus pais não lhe criam, eu vou criar! – quase disse “mamãe!”, mas deixei pra lá. –Agora vá pra aula e não se esqueça que sua detenção será durante a semana, depois das aulas, na sala de estudos. 
Parte um: completa.

Júlia
Hora da saída. Peguei minhas coisas e vi Mike me esperando na porta da sala. Fui em direção a ele e me encontrei com as meninas. 
- Fiquei sabendo. Poxa, o que você tinha na cabeça de socar o John? –Sophie me perguntou. Ok, hora de falar de Sophie, a menos estranha de todas. Ela era a mais meiga do grupo. E eu me perguntava o motivo pelo qual ela andava conosco. Ela era linda, vestia roupas normais – para os padrões do colégio – mas nunca quis fazer amizade com as outras meninas. Um dia, ela disse que se sentia deslocada apesar de ser bonita, vestir roupas boas e essas coisas. 
- Eu não me aguentei, tinha que fazer isso. 
- Mas nem rola de você fazer essa detenção! Super injusto. O cara te alisa e você ainda paga o pato. Que mundo é esse, meu Deus? – Beatriz levantou as mãos. 
- Bia, você não é ateia? 
- E só porque não acredito em Deus, não posso citá-lo? – Bia revirou os olhos. 
- Enfim, segundo a diretora, socar e cuspir não são atitudes legais e preciso pensar nelas na detenção. Tentei explicar que podia pensar nas minhas atitudes em casa, mas ela não quis ouvir essa proposta... 
- Júlia, tá na hora da detenção! – Mike gritou do outro lado do corredor. 
- Ih, teu pai tá te chamando! – Cris falou e as outras riram. Elas sempre zoaram minha amizade com Mike. Elas o chamavam de meu pai ou irmão mais velho. 
Eu nem ligava, de certo modo, ele era mesmo um pai, um irmão mais velho pra mim. 
- To indo! Meninas, tenho que ir! De noite rola reuniãozinha lá em casa? 
- Pode deixar, a gente dá uma passada lá. 
Fui até Mike e descemos pela escada em direção à sala de estudos. 
- Vou ficar na casa de um brother meu esperando você sair. Me liga que eu venho te buscar, tá bom? – Mike falou e eu balancei a cabeça positivamente. 
- Mike, se for na casa do amigo que eu to pensando... Cuidado, ouça bem o que eu to te dizendo! – falei e ele me olhou rindo. 
- Não é ele. Depois do que rolou, eu nem quero saber dele. – nós já estávamos perto da sala e Mike me beijou na testa – Prometo que não vou me envolver com esse tipo de gente. Por mim e por você. Vai, que o povo mais louco que a gente ta te esperando. – ele bateu na minha bunda em sinal de incentivo. 
- Olha que da última vez que fizeram isso, teve gente que quase saiu com nariz quebrado. 
- Nem me lembre. A sorte dele é que eu não estava lá. Mas vai ter volta! 
- Isso, meu super-herói! Me proteja! To indo. – dei um beijo em sua bochecha e entrei na sala. 
Não havia professor, nenhum responsável. Só umas quatro pessoas sentadas em pontos totalmente diferentes. 
A primeira pessoa era uma menina loira com uma blusa rosa e um diadema rosa bebê. Acho que ela soltou um pum e veio pra cá, só pode. 
O segundo elemento era um dos caras do lado sombrio do colégio, o Adam. Ele olhou pra mim, fez uma cara de poucos amigos e continuou a brincar com seu isqueiro. O terceiro era o Philip, o cara dos computadores. Provavelmente, entrou em algum sistema proibido do colégio. O quarto era nada mais nada menos que Frederico Maia, que provavelmente foi pego comendo alguém. 
Sentei na última cadeira,peguei minha bolsa a colocando na mesa e fazendo dela um travesseiro.Abaixei a cabeça e daqui a minutos tiraria um cochilinho maravilhoso. 
Falei muito cedo. 
Ouvi a porta se abrindo e depois se fechando. Reconheci meu professor lindo de música colocar seu material na mesa e sentar na sua cadeira. 
Uma semana com aquela visão perfeita? 
To amando a detenção. 
- Bom pessoal, vocês devem perguntar o motivo que me trouxe aqui, mas a pergunta certa é: porque vocês estão aqui? Começando por Philip! 
- Entrei mais uma vez no sistema do colégio e fui pego. 
- Hm... Há um hacker entre nós. Vou ficar de olho no meu Notebook. Agora você, Heather. 
- Cabulei aula de matemática pra ficar lendo revista sobre Colíros. – acéfala. 
- Júlia? 
- Bati em um cara cinco vezes maior que eu e não me arrependo. Posso ir embora? 
- Eu soube dessa história e não, não pode sair. E você, Maia? 
- Rolos de papel higiênico, longa historia. – Frederico falou e eu ri. De repente, ele olhou por cima do ombro e meu olhar se encontrou com o dele. 
Me assustei, virando o rosto pra baixo. 
Constrangedor. 
Ok, assumo que ele não era de se jogar fora, mas nunca olharia pra mim e nem se interessaria por mim. 
- Professor, o que vamos fazer? – perguntei tentando tirar o assunto Fred-não-me-pega-porque-sou-estranha-e-feia da minha cabeça. 
É, eu me acho feia. Tenho problemas de auto-estima, como toda menina normal. 
Mas eu tava cagando no balde sobre a opinião de todas as pessoas daquele colégio, principalmente a de Fred. 
Certo? 
Acho que sim. 
- Boa pergunta, Júlia. Ainda não sei o que vou fazer com vocês. A senhora Beth me chamou pra supervisionar de última hora e ainda por cima, passar um trabalho relacionado à arte e música. Por enquanto façam o que quiserem. Mas é só hoje, amanhã trarei alguma atividade que valerá nota. 
O professor-gostoso falou e vi a galera comemorando por não fazer nada durante o dia naquela merda de sala. Se eu quisesse passar o dia fazendo nada, iria pra casa e dormia. 
Vida de merda. 
Enfim, peguei minha mochila, a fiz como travesseiro, liguei meu Ipod,abaixei a cabeça e fui dormir. Dormir faria o tempo mais rápido e expulsaria meus pensamentos sobre o quão sou feia pro Fred. 
Senti algum me cutucar. Não levantei a cabeça. 
Senti de novo. Levantei a cabeça dessa vez e limpei uma pequena baba que saía da minha boca. 
- Todos já saíram, só falta você. – ouvi uma voz pouco conhecida falando e ainda sonolenta olhei pro relógio em cima da lousa. 
15h30min. 
Ótimo. O professor nem pra me chamar... 
- Tá me ouvindo? – virei pro lado ainda com o cérebro devagar e fiquei assustada. Demorei pra processar quem estava falando comigo. – Você tá... 
- Já ouvi e já to indo. – me levantei pegando a mochila e saindo da sala o mais rápido que pude. Eu não sei o motivo do meu desespero pra sair daquela sala, mas ficar sozinha com Frederico Maia me deixava nervosa. 
Muito nervosa.
- De nada! – o ouvi ainda gritar dentro da sala. 
O que eu sabia de Frederico Maia era a mesma coisa que todos. Riquinho metido à besta, morava com seus amigos, e seus pais faziam todos os seus agrados. Ele era o típico cara bonito que tinha todas aos seus pés. Se estalasse os dedos, vinham cinco meninas na hora. 
Passava por cima de todos pra conseguir o que queria e quem queria. Isso é um absurdo. Você passa por cima de alguém e não tá nem aí? Que tipo de gente era ele? 
Sem caráter. 
As meninas não ligavam em serem usadas, pelo contrário, batiam no peito pra dizer que já ficaram com Frederico Maia. 
Ele tinha uma banda junto com seus fiéis escudeiros, eles faziam parte de uma banda chamada Go Lola!Eu já ouvi o lixo que eles chamam de música e é muito ruim. Tenho certeza que essa banda era mais uma tática pra arranjar mulher. Sempre é. 
Fred – como era conhecido – estudou comigo no primeiro ano e nunca conversamos, nunca trocamos bom dia, ele nunca olhou pra minha cara, nem pra das minhas amigas. E hoje ele me acorda me cutucando como se fôssemos amiguinhos. 
Perdi alguma coisa? 
Saí do colégio e a primeira coisa que fiz foi tirar meu maço de cigarros, pegando um e o acendendo com o meu isqueiro do Batman. 
Presente do Mike. 
Dei uma tragada forte, nervosa com o nosso pequeno diálogo. Eu não sei por que estava assim. 
Só foi uma acordada básica, chega de drama! 
Com esses dizeres em pensamento, abri a bolsa pra pegar meu celular. Fui apertar o número dois pra discagem rápida, ia ligar pro Mike me buscar. 
- Não precisava correr daquele jeito... – Fred estava perto do portão de ferro do colégio. 
- Se você quer ouvir um  obrigada por ter me acordado... Obrigada. – falei, e depois soprei a fumaça do cigarro. 
- Eu não queria ouvir nada. Só vim pra pedir um cigarro, rola de ou não? – ele falou de um jeito engraçado. 
Mantenha o foco. 
- Sempre uma coisa em troca. Mas quem nega um cigarro, nega um pão. – abri o bolso da minha bolsa, onde estava o maço, e tirei do mesmo um cigarro. – Pega e vê se some. – falei de uma forma assustadora. 
Meninas podem ser assustadoras quando se sentem ameaçadas em qualquer situação. 
E no meu caso, ser assustadora era motivo de sobrevivência. Como você acha que ninguém mexe comigo ali? 
Apesar do João.. Mas aquilo foi uma exceção. 
Fred pegou o cigarro da minha mão e passou os dedos suavemente pelos meus. Senti um arrepio na espinha. 
- Valeu. – ele falou com uma voz rouca. Engoli em seco. 
Mas que merda tava acontecendo? 
- Ótimo, eu já te agradeci, você já me agradeceu. Agora, podemos voltar ao mundo normal, onde você não fala comigo e eu não te dou cigarros? – falei, me virando e saindo. 
Se eu fosse a Júlia de manhã estaria ali falando e poucas e boas pra ele, mas não sei por que decidi sair. 
Fiquei embaixo de uma árvore enquanto Fred saía de perto do portão e ia em direção a uma EcoSport preta em frente do colégio. 
Entrou no carro, ligou e buzinou pra mim, dando tchauzinho. Viadinho. 


Fred
Todo um trabalho e concentração pra entrar numa detenção com objetivo de conseguir uma menina e só consegui um cigarro?UM CIGARRO? 
Tava perdido. Totalmente perdido. 
Mas calma, vou segurar na mão de Deus e ir. 
Sem brincadeira nenhuma. 
Fui pra casa ao som de No You Girls, Franz Ferdinand, batendo no volante. De repente, me veio o rosto de Júlia dormindo. 
Ri. 
Quem a visse dormindo daquele jeito suave, nunca ia dizer que era a filha do capeta. 
Júlia dormindo não parecia a maligna menina do terceiro ano, não parecia a menina que batia num cara de trezentos quilos, não parecia a filha do capeta. 
Naquela hora, parecia um ser doce, sensível, uma pessoa totalmente diferente. 
E além de tudo, ela estava linda. Beleza que teve baba, mas quem não baba quando dorme? 
Lick your cigarette then kiss me.
Prestei atenção na música e ri me lembrando da cena em que Júlia me dava um cigarro. Ela fumava! Ganhou pontos comigo. Meninas que fumam são sexies. 
Tudo bem que eu nunca falei com ela e nunca quis ter contato mais próximo que dez cadeiras de diferença, mas não precisava ser tão grossa como foi antes de ir pra baixo de uma árvore. 
Era assim que ela fugia das pessoas, ficando debaixo de uma árvore? 
Muito madura. 
Cheguei e estava um silêncio. Os meninos deviam estar dormindo. Fui pra cozinha e peguei alguma comida congelada no microondas. Sentei na cadeira, colocando as mãos na cabeça. 
- O que vou fazer? Preciso ser mais enérgico. – falei pra mim mesmo em relação à Torres. Senti uma mão no meu ombro e vi André. Ele puxou a cadeira e sentou na minha frente. 
- E aí, como vai o caso com a princesa da escuridão? – ele riu. 
- Ainda sem progressos, mas consegui um cigarro. – falei me levantando e pegando o prato quente – Caralho, tá quente! – passando o prato pra uma mão pra outra e assim, com muita dificuldade, sentei. 
- Pegou um cigarro com ela? Já é um passo. 
- Sou cauteloso. Não tenho pressa. 
Amanhã é outro dia, outra história.

Júlia: 
Cris, Beatriz e Sophie estavam no meu quarto. Sophie na mesinha do computador, mexia no seu Face. Cris mudava estação de rádio pra uma de rock. Bia estava na minha cama fazendo carinho em minha cabeça enquanto eu estava deitada em seu colo. 
- Meninas, vocês não sabem quem falou comigo na detenção! – me levantei toda animadinha e elas pararam o que estavam fazendo. 
- Já to curiosa com toda essa animação... Me conta quem foi! – Cris, a mais curiosa piou. 
- Frederico Maia. – disse sem rodeios .Todas abriram a boca. 
- Hã? 
- Como assim? 
- Ele sabe que você existe? 
- Calma, meninas. São muitas perguntas e não tenho nada a declarar. – brinquei. Pelas caras de indignação, elas não levaram na brincadeira. – Relaxem! Só to zuando... Ele falou comigo, na verdade me cutucou... 
- CUTUCOU? COMO ASSIM? – Bia me interrompeu. 
- Se você me deixar terminar... 
- Grossa. 
- Enfim, Frederico tinha me cutucado pra acordar porque a parada tinha acabado. Foi estranho, porque eu devo ter acordado com uma cara de retardada, e depois, só socializei a voz com a pessoa quando olhei pra ele. E sabem o que fiz? – as meninas me escutavam atentamente. – Simplesmente corri pra fora da sala que nem uma atriz de novela mexicana. Horrível. 
- Queria ter visto isso! Nunca vi Júlia Torres correndo de nada e nem de ninguém. – Cris falou comendo um biscoito em seguida. 
- Escutem a melhor parte! Na hora da saída, lá estava eu, cansada, fumando meu humilde cigarro, quando o Maia chega e pede um. Quase faleço no meio da calçada. – todas riram. 
- E o que você fez? Foi educada? Deu um cigarro? – Sophie subiu na cama, toda serelepe. 
- Falei com ele. Não fui educada e sim, dei. Uma coisa que eu não faço é negar cigarro. 
- Não foi educada? Jú, é a primeira vez que um menino gato fala com você e você é grossa? 
- Beatriz, desde quando você acha o Maia bonito? Bom, isso não tem importância... Mas o fato de eu ser grossa é bem simples, na verdade. O cara me “conhece” – fiz aspas – por dois anos, quase três, e nunca falou comigo, nem olhou na minha cara. E agora, do nada, pede um cigarro? Vocês tem que concordar que é estranho. 
- Ah, para de ser chata! Beleza que ele não é flor que se cheire, mas se ele quer, quem sabe, uma amizade... Não precisa de tanto. – Cris falou. 
- Maia e eu, amigos? Não mesmo! Acho que esse não é o caso. Ele só queria um cigarro, suprir uma necessidade. Por azar, eu estava com o que ele queria. Por favor, vamos mudar de assunto? 
- Tá, garota problema. E aí, tudo certo pro show no sábado? Já avisou à sua mãe? 
Outch.
A minha mãe. Um problema constante. Ela não gostava das roupas que eu usava, dos meus amigos, das músicas que eu ouvia, do modo que eu falava, das coisas que tinham no meu quarto, e principalmente, de Mike. 
Com isso, tínhamos muitas discussões, muitas brigas. Eu acho que ela só não me põe pra fora de casa por eu ser sua única filha. O nosso diálogo era o básico dos básicos. Um bom dia, boa tarde e boa noite. Tinham vezes em que nem isso a gente falava. 
Eu não sei o que fiz. Só sei que ela sempre botava a culpa em mim pra tudo relacionado àquela casa. Tudo. E eu estava de saco cheio disso. 
- Bem, ainda não. Vocês sabem que não é tão fácil assim pedir a ela pra ir a shows... 
- Jú, mas você tem que ir, vai ser o show! A nossa banda preferida vai tocar e eu não acredito que não vai. – Bia falou com tristeza na voz. Ela tava certa. Minha banda preferida... Eu tinha que ir. 
-Sophie, você vai? – perguntei pra menina que estava fazendo trança em seus cabelos. 
- Não, eu não gosto desse estilo de banda, vocês sabem! Acho que vou fazer compras com a minha mãe, sei lá... – típico. Sophie era a mais patricinha de todas. Sempre usava o que queria, incluindo roupas da moda e coturnos.Ela dizia que mudava de roupa de acordo com o seu humor. 
- Eu sei, meu bem. Só perguntei por educação mesmo – falei rindo e ela deu a língua. 
Ficamos rindo, ouvindo música, conversando e falando sobre como seria o show. 
Eu só queria que essa semana passasse rápido, que essa historia de detenção acabasse logo, e mais importante: que Maia esquecesse de mim. Me deixasse no meu canto. 
Mas eu sentia que isso não ia acontecer. 
 cigarro só foi o começo.


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