Kit Black: Viajantes De Mundos escrita por Dama dos Mundos


Capítulo 22
A calmaria que precede a tempestade: Duelo em alto mar/Parte I


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura :3



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O Diamante Negro atravessava o oceano sem qualquer impedimento. Se Haradja houvesse colocado algum obstácu-lo, isso talvez não tivesse feito muita diferença. Kit Black estava pronta para varrer o primeiro idiota que aparecesse em sua frente o para outro lado do mundo. Para distrair sua cabeça e mantê-la ocupada, ela passava o tempo de viagem ajudando o quanto podia nas atividades dos tripulantes. Amarrava cordas, ajudava a inflar velas, lavava o convés. Pescava. O irmão via-a passar de um lado a outro sem nunca se deter, e começou a ficar preocupado. Afinal, ela ainda tinha ferimentos recentes das batalhas entre-dimensões.

Nicolas também estava abatido. Mais uma vez falhara em defender a Sede Black. Uma vez mais, não estava lá para impedir o desastre. Não importava o quanto os outros afirmassem que, se ele estivesse lá, teria sofrido o mesmo destino. O controle que conseguia manter era exclusivamente para que sua irmã não desmoronasse. Afinal, se ela se preocupava com todo mundo em vez de si mesma, alguém tinha de cuidar dela.

–Hei, tampinha, suba na torre de vigia e veja se não há nenhuma embarcação inimiga. -Edmond ajeitou os óculos escuros sobre a face. Por estarem em território de Farem, e o tempo estava a favor da navegação, ele era forçado a usar os óculos o dia inteiro. Não parecia mais feliz que seu normal com relação a isso. -Embora eu duvide que consiga ver além da proteção com essa sua altura.

–Você podia ser um pouco mais simpático com ela, irmão. -Laurent levou uma mão a testa, soltando por alguns segundos o timão.

–Se ele fosse uma garota estaria sofrendo de TPM eterna... até parece que você não sabe disso. -Lyra replicou do seu canto, erguendo a cabeça para gritar com Ed, afinal ele estava na outra ponta do navio praticamente. -Por Ajax, a vigia aqui sou eu!

–Você é outra nanica, salva-vidas de aquário.

Enquanto os dois soltavam imprecauções de um lado a outro do navio, fazendo os marinheiros mais antigos suspirarem, Kit deu de ombros e se dirigiu a torre. Debruçou-se, pegando uma luneta e olhando em 360 graus para ter certeza de que não havia inimigos a vista. Depois de comprovar isso umas três vezes, se apressou em descer as escadas de corda novamente.

Ela bem sabia que a intenção de Ed, por mais estressado que este fosse, era justamente ajudá-la a se manter distraída. O capitão não era tão ruim quanto parecia. Ele só não demonstrava sua boa vontade sempre. “Ficar triste não vai fazer as coisas voltarem a ser como eram antes. Entrar em depressão não vai melhorar os ferimentos de nenhum deles. O que pode fazer agora é juntar todas as suas forças para chegar à Capital e poder encontrá-los. Estão contando com isso. Que vai voltar sã e salva. Melhor não decepcioná-los.” Foi mais ou menos esse discurso que ele fez quando encontrou-a sozinha no convés, na noite do dia em que chegara a bordo, depois de receber a noticia.

Não podia negar que isso servira de alguma coisa. Saltou, ignorando o pouco que faltava da escada para chegar ao convés e dando de cara com Nicolas. Ele lia alguma coisa... talvez fosse um diário de bordo, talvez um livro qualquer de anotações. Quando reparou nela, fechou-o de imediato e abaixou seus olhos para mirá-la.

–Oi, pequena...

–Oi... o que é isso?

–Diário de Bordo. Têm referências a nós aqui. -ele abriu o livrinho numa página em especial e entregou a ela. A garota percorreu as linhas escritas com os olhos e sorriu, achando graça. Aquele trecho provavelmente era obra de Ed.

Hoje é o dia marcado para deixarmos o porto. Aqueles que vamos proteger já estão a bordo. Estamos acostumados ao Nicolas, mas a Salvação de Diamond é extremamente pequena. Parece uma anã de jardim. Duvido muito de suas habilidades, no entanto isso não deve mudar em nada.

–Isso realmente deve ter sido escrito por ele.

–Sem sombra de dúvida.

–Aqui tem outra. -ela voltou algumas páginas e mais uma vez leu o que estava escrito. -Quando vocês se conheceram.

–Hum... não sabia que esse tipo de coisa estaria gravado aqui. -aparentemente Nicolas não havia reparado. Afinal só estava folheando o diário antes. Chegou mais perto para ler o que estava escrito.

O Senhor do Palácio de Granito finalmente saiu de lá. Não dava para imaginar que ele era tão jovem. Está verificando os navios para formar uma frota contra Haradja... não creio que o nosso vá realmente estar na lista.

Esse garoto... eu me pergunto se ele sabe o quanto seus olhos são melancólicos. Seja qual for a marca que carrega em seu coração, deve ser muito extensa.

O resultado sairá amanhã... veremos o que nos aguarda...

–Você perdeu. Essa melancolia. -Kit murmurou para si mesma, fechando o livreto. -Acho melhor devolvermos isso, não é?

–É. acho que sim. -ele respondeu, embora ela não tenha certeza se fora a sua afirmação ou a pergunta.

–Eu espero que todos fiquem bem...

–Eles estão esperando por nós. Não irão a lugar nenhum.

Kit apenas acenou com a cabeça. Viu Lyra se aproximar e mais que depressa estendeu-lhe o diário de bordo.

–Hum? O que vocês estão fazendo com isso?

–Er... prevendo o padrão dos ataques de Mid Night pra saber se ele está por perto? -Nicolas tentou escapar pela tangente. Se a fada-noturna reparou, não demonstrou isso. Abraçou o caderno e olhou em volta, abaixando a voz. -Os rapazes estão nervosos. Não houve nenhum sinal da frota de Haradja a dias. Isso está muito estranho.

–Mas isso nos dá tempo para organizar e nos preparar, certo? -perguntou a jovem, ao que Nick retrucou.

–Mas pode muito bem ser uma armadilha. -antes que pudesse externar seu pensamento completamente, viu algo despencar do céu em sua direção. Quando Kit ergueu as mãos para segurar a coisa, ele conseguiu apenas suspirar de alívio. Era apenas Draco, voltando de seus voos rotineiros. Mas ele parecia muito agitado.

“Eles estão bem mais a frente! Fizeram um bloqueio.” o pensamento dele praticamente gritou em suas cabeças. Kit automaticamente levou ambas as mãos as orelhas.

–Mas... eu acabei de...

–Devem estar fora de alcanse visual...

Lyra se apressou em assumir seu posto. Alguns minutos mais tarde ela já estava gritando a plenos pulmões. -Bloqueio a frente! Preparem os canhões!

–Uma pena... bem que eu queria albordoar alguém. -Laurent parecia realmente sentido com relação a isso.

–Calculando a probabilidade do navio ser transformado em uma peneira. -Edward fez uma careta descrente. -noventa e nove vírgula nove por cento...

–Ainda temos um décimo de chance...

–Muito animador.

Agora os navios inimigos já eram completamente visíveis. Havia pelo menos cinco, e no principal, o famoso e não tão amado “Devorador de Almas”, havia um par de oficiais mais a frente. De um lado Cassandra, neutra, a expressão indecifrável. Do outro, o pirata demoniaco, o capitão do Devorador de Almas e um dos generais de Haradja: Mid Night. Sua aparência era bizarra. Ele parecia uma colcha de retalhos, tantas cicatrizes que passavam pelo seu copo. A pele tinha um tom nauseante de verde, e devia medir pelo menos dois metros de altura. Quando chegou a conclusão que o Diamante Negro estava perto o suficiente, ergueu a voz poderosa para ser ouvido. O tom rasgou o ar de tal forma que Reidh ficaria muito ofendido. Cassandra, em um gesto sutil, tampou o ouvido do lado em que ele estava e suspirou.

–Não vão passar daqui!

–Isso é você que está dizendo não é, Mid? -Laurent parecia bem humorado novamente. O irmão tamborilou de maneira apática os dedos no timão.

–Apenas tire suas banheiras deformadas da frente para podermos passar. O Oceano não é exclusividade sua.

–Minha mestra controla metade do seu Reino estúpido. Isso é uma questão de tempo. Mas vocês estão muito animadinhos... não percebem a clara desvantagem em que se encontram?

–Números não significam nada. -atalhou o loiro com vivacidade, ao passo que Ed abriu um sorriso muito, mas muito estranho. -Se não sair, iremos afundá-lo.

–Pago pra ver.

A tensão era palpável. Kit esperava uma troca de tiros de canhão a qualquer minuto, enquanto os capitães se encaravam. Só então, a voz de Cassandra subiu mais alto que as ondas, atravessando tudo em seu caminho.

–Poupem suas vidas, elas não precisam ser desperdiçadas. Queremos a garota. Apenas isso.

–O QUE? SÓ A FEDELHA? TÁ BRINCANDO COMIGO NÉ!? -a explosão de Mid Night dava para ser ouvida sem muito esforço.

–Eu nunca brinco. -a Deusa fechou os olhos, aparentando tédio. -A menina é o foco. Tudo além disso é perda de tempo. Se ela não for entregue... -voltou a abri-los, de maneira lenta. -Então está livre para matar todos...

–Tsc... estraga prazeres. -o troglodita virou-se novamente para o navio inimigo e levantou sua voz de lixa. -E então? Qual é a resposta de vocês?

–É fácil... nunca! -os irmãos gêmeos gritaram praticamente juntos. Ed ajeitou seus óculos e ainda provocou mais: -Se querem a salva-vidas-de-áquario, vão ter de vir pegar.

–Bom... se preferem assim... -Mid deu de ombros, sua expressão começando a ficar insana. -Todos os canhões no inimigo. Abrir fogo ao meu comando!

Com certo receio, Kit viu dezenas de bocas de canhão se convergindo na direção em que estava. Laurent gritava comandos em revide, mas estava claro quem ia ganhar. Mesmo com toda a confiança que eles demonstravam, o medo fazia morada em seus corações.

–Esperem... -no primeiro momento sua voz saiu sussurrada. Precisou lutar para erguer a voz, e ser ouvida em meio a tanta balbúrdia. -Parem! Parem agora!

A movimentação parou. Do outro lado, Cassandra, sempre atenta aos rivais, erguia uma mão, num pedido mudo para que esperassem. Kit sentiu mais uma vez a conversão de olhares em sua direção, da mesma forma que acontecera tempos antes, no Caminho da Ilusão. A diferença é que desta vez ela estava sendo ouvida. Não parou seu olhar no irmão. Não parou-o em ninguém. Caminhou até ponta da proa e ergueu o seu tom como jamais tinha feito antes. E a explanação foi direcionada para os cinco navios do lado oposto.

–Não vou deixar que bombardeiem esse navio! Eu sei que a maioria de vocês está torcendo para que isso termine assim, mas não vai rolar.

–Então irá se entregar? -a mulher do outro lado questionou, calando a boca de Mid Night a força com um mero estalar de dedos.

–Eu daria minha vida para que todos os outros ficassem bem. -segurou a grade de segurança com força o suficiente para machucar as mãos. Com o canto dos olhos, viu seu irmão abrindo a boca num claro sinal de protesto, e só então continuou. -Mas não. Hoje não. -agora era a vez dela de ficar assustadora. Não era dificil. Ela estava zangada. Estava muito, muito zangada, e queria descontar em alguém, por mais que soubesse que isso era errado. -Vocês machucaram outras pessoas das quais gosto.Vocês trapacearam e fizeram um desastre acontecer. Vocês acordaram um lado meu que ninguém deveria ver. -o sorriso que sempre dava, tão doce, se transformou em algo beirando a loucura. -Eu vou chegar até eles, nem que seja passando por cima dos seus cadáveres!

Por incrível que pareça, não se ouviu uma risada sequer. Talvez estivessem amendrontados... talvez achassem que aquele discurso não merecia a minima atenção. Kit não se abalou. Ela estava em um estado alterado demais para se dar a esse luxo. -Eu proponho um desafio. Uma luta justa, um contra um. Eu irei enfrentar o reprentante de vocês. Se me querem tanto assim, eu mesma vou brigar pela minha liberdade!

Cassandra estava interessada, mas nem tanto. Algo naquela situação a incomodava. Segurou o braço do comandante ao seu lado com força, suprimindo um movimento amplo que significava o seu consentimento para a batalha. -Espere...

–Esperar o que!? Melhor chance do que essa é impossível! Ela perderá dos dois jeitos.

A mulher mordeu o lábio, pensativa. Seu olhos buscaram a menina ao longe. Parecia que ela também não estava numa boa situação do lado de lá... obviamente estava em uma disputa acalorada com Nicolas para ver quem tinha razão.

–Pode ser... -virou-se para um marujo atrás de si e fez um sinal com a cabeça. -Traga-me as armas.

O ser correu para atendê-la. Quando retornou, trazia uma almofada de veludo negro, com duas espadas de lâmina igualmente escura e cabo vermelho, adornado com uma cabeça de demônio. Cassandra as retirou com cuidado absoluto.

–A senhorita que vai lutar? -ele ergueu uma sobrancelha, descrente.

–Não... são para ti. -ela as segurou pelo cabo, com a ponta virada para baixo, e as estendeu. -Faça bom proveito, são espadas muito especiais.

Kit tamborilou os dedos nos ombros, parecendo estressada. Erguia a cabeça para encarar seu irmão, que não parecia muito melhor.

–Eu sei que você é mestra em arrumar confusão mas isso é demais... sabe quem eles podem mandar? Cassandra... se mandarem ela, tenha certeza, estamos condenados.

–Obrigada pela fé em mim... ela é recompensadora... -revirou os olhos, carregando a ironia na resposta. -Eu sei muito bem. Mas esperava o que? Que eu cruzasse meus braços e esperasse o navio ser bombardeado? Eu não preciso de outro peso na consciência...

–Francamente, você... -ele massageou as têmporas, em dúvida. -Não há garantia nenhuma de que vão cumprir com o lado deles do acordo SE você ganhar.

–Nesse caso vou saber que fiz o que estava a meu alcanse...

–Um a menos pra gente matar depois... -Ed protestou, balançando a mão. -Podem decidir isso rápido? Não estou gostando da forma em que os imediatos demoniacos estão olhando pra cá.

Kit o ignorou por um tempo. -Nick... eu estou cansada disso. “Você tem de lutar contra Haradja, você é nossa campeã”. Frases assim não estão me ajudando. Cada dia que passa eu sinto como se só servisse pra isso. Eu não quero acreditar. -ela estreitou os olhos e manteve o contato visual. -Não quero acreditar que isso é tudo. Então deixe-me fazer o que posso aqui e agora. -segurou as mãos dele entre as suas e abriu um timido sorriso. -Okay, irmãozinho?

–Não tem maneira de te convencer, não é...-é bem capaz que Nicolas Black já conhecesse tão bem a irmã a ponto de saber que qualquer argumento, por mais justo que fosse, não ia demovê-la. Ele havia protegido-a de todas as formas possíveis, mas com o transcorrer do tempo e das viagens que faziam juntos, acabou percebendo que tinha de deixá-la agir também. Desprendeu suas mãos e ergueu uma delas para bagunçar de leve os cabelos da garota. -Faça picadinho deles...

–Pode contar. -ronronou baixinho, movendo as já presentes orelinhas de gato, mas algo passou pela sua cabeça, o que fez com que olhasse para o outro barco e voltasse a erguer a voz. Dessa vez, porém, ela não saiu poderosa. -Hey... considerando que vocês tenham aceitado... qual será o campo?

–Tsc... e eu achando que uma luta valeria a pena... -Mid Night já tinha ambas as espadas em suas mãos, e parecia mais do que preparado. Ergueu alto a voz, dando um comando em uma língua que Kit não conhecia. Um dos navios de seu bloqueio moveu-se, e de maneira lenta e ritmada, foi levado afrente, parando de forma que ficasse entre a pequena frota de demonios e o Diamante Negro.

–Um dos seus? E como saberemos que não há armadilhas ai dentro? -Laurent interviu.

–Não há. Tem a minha palavra como Deusa. -Cassandra respondeu prontamente, com seu tom cantado. Parecia bem séria quanto a isso. -Um a um. O Lamento da Tempestade será a arena. Sem intervenções de nenhum dos lados. Não será considerado um empate. O duelo só findará quando um dos campeões morrer ou ficar incapacitado de lutar. Se perdermos, estarão livres. Se ganharmos, preparem-se para morrer. -cruzou os braços. -Esses são os termos. O que me diz, senhorita Black?

A jovem pôde sentir o desconforto dos adversários em sua própria pele ao ser chamada pelo sobrenome. Eles serviam a uma Lady Black, afinal. Chamar uma bastarda qualquer de tal nome na embarcação de sua própria mestra era quase uma heresia. -Concordo. Vamos começar.


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