Fiquei lá parada, estática. O quê eu poderia fazer? Sair correndo chorando igual a uma criancinha? Disfarçar e ir para o banheiro chorar escondida? Tentar seguir adiante como se nada tivesse acontecido e fingir que não me importo se Daniel beija outras garotas? Não. Definitivamente não daria esse gostinho a ele.

- Isa... –Bianca disse com a voz e o olhar de pena sobre mim. Parei de encarar Daniel e a garota que ele estava beijando e olhei para Bianca.

- O quê foi? –tentei falar indiferente, mas minha voz ainda saiu meio trêmula.

- Bem... –ela me encarou indecisa do que falar, não sabia se me consolava, ou fingia que não era nada porque Carlos Eduardo estava ali também. – Quer ir lá ao banheiro comigo? –perguntou. Respirei fundo. Não vou chorar pelo Daniel, não mais.

- Tem certeza? –perguntei. – O filme já não vai começar Cadu? –perguntei olhando para Cadu que me analisava tentando entender alguma coisa, deve ter achado estranho o fato de que, em vez de eu ter rido da piadinha que ele havia feito sobre Daniel estar ocupado, apenas fiquei encarando o idiota.

- Bom, acho que dá tempo de ir ao banheiro antes do filme começar... Podem ir, enquanto isso vou lá soltar o casal. –ele disse esboçando um sorriso magnífico, mas que não chega nem perto do de Daniel. Bianca sorriu de volta, mas eu apenas me dirigi ao banheiro. Como disse, não vou chorar e nem fingir que não ligo para isso, vou apenas tentar ser eu mesma, o que inclui ficar destruída por dentro e por fora.

Logo depois que entramos no banheiro Bianca começou a me analisar.

- O quê foi? –perguntei.

- Você realmente está bem depois de ter visto aquela cena? –ela perguntou indecisa. Respirei fundo e mexi na minha franja tentando colocá-la no lugar certo.

- Não... –respondi olhando para pia enquanto me apoiava na mesma. – Nem um pouco pra falar bem a verdade... Só que estou cansada disso. Sempre a mesma coisa! Quando acho que estamos a um passo de ficarmos próximos, ou eu faço alguma coisa pra impedir, ou ele. De manhã, na aula, ele me pediu desculpas, na hora não aceitei muito bem, mas depois corri ao seu encontro pra disser que poderíamos tentar construir uma amizade novamente, mas ele me esnobou e jogou mentiras na minha cara. Cheguei em casa e desabei em lágrimas... Já é o terceiro dia seguido que eu choro por aquele Traste Infeliz! –falei com raiva. – E não vou mais chorar... E nem fingir que está tudo certo e que não ligo... Não conseguiria... Porque por mais que eu não goste e suporte a ideia, o amo... –disse impedindo as idiotas das lágrimas que queriam cair.

- Isa... Então eu estava certa... –disse uma voz na porta do banheiro assustando a mim e Bianca.

- Roberta? –eu perguntei incrédula olhando-a e reparando que ela estava com uma blusa verde escura (quase verde-bosta pra falar a verdade) igual a da garota que estava com Daniel. – Certa de quê? –perguntei com rancor.

- De que desde quando eu namorava Daniel, você gostava dele e não suportava me ver junto a ele, por isso sempre fazia de tudo para nos separar... –ela disse cuspindo as palavras. Ah, fala sério! De novo essa história? De quê eu odiava o namoro deles, quando na verdade só tentava alertá-la do Traste que o Daniel era (e sempre será)? Apenas fiquei encarando-a descrente. – Ai que boba que eu sou... Ainda me achava culpada por não acreditar em você, não acreditar na nossa amizade, mas olha aqui a prova! Eu ouvi tudo, do início ao fim, eu ouvi você confessando!! –ela disse quase gritando, sorte que não tinha quase ninguém no banheiro.

- Primeiro, abaixa o tom. Você não tem o direito de gritar comigo. Segundo, eu não confessei culpa alguma, e se você acha que a culpada da nossa amizade ter acabado sou eu, pensa melhor em quem estragou tudo do início ao fim... Não fui eu, muito menos você. Foi Daniel, e se você não acredita, analisa os fatos... E se eu gosto dele ou não, o problema é meu! –falei incrivelmente com o tom de voz “normal” (um pouco mais elevado, mas que não chegou a ser um grito). Ela ficou me encarando com os olhos faiscando de pura raiva. Junto com a blusa verde-bosta ela usava uma calça marrom, e sapatilhas verde-escuro. Misturando o cabelo preto, a maquiagem em excesso, o figurino e o olhar de raiva, ela daria um perfeito trasgo, daqueles bem feios. Par perfeito, o Traste e o Trasgo.

- Isabela... –ela disse com raiva, mas deixou uma lágrima escapar. Rapidamente ela limpou o rosto e saiu do banheiro deixando uma Bianca confusa e uma Isabela mais acabada do que já estava.

- Calma. Respira fundo. Solta a sua mão. –Bianca disse bem devagar tentando me acalmar. No que ela falou “solta a sua mão” foi que reparei que estava com os punhos fechados, espremendo meus dedos para conter a dor e a raiva. Lentamente minha raiva se esvaziou, e respirei fundo segurando as lágrimas novamente. Não vou chorar, não mais.

- Agora vamos, que temos um filme pra assistir com o gato do Cadu! –Bianca disse rindo para levantar meu astral. Concordei com a cabeça, e fomos em direção aos três garotos que nos esperavam em frente à sala quatro.

- Oi. –cumprimentei os três de uma vez (Cadu, Daniel e Fabiano que também apareceu por lá, pelo visto). – Cadê a Roberta? –perguntei.

- Oi Isa! –respondeu Fabiano antes de Cadu, já que Daniel fingia olhar pro lado contrário ao meu- Íamos perguntar isso a você... Ela foi lá ao banheiro falar com você e depois não deu mais as caras... –falou olhando nos meus olhos. Olhei para o chão, não queria contar que discutimos e ela provavelmente foi embora...

- Ah... É que ela discutiu com a Isa lá no banheiro. Ela insiste em acreditar em uma coisa que é mentira, e joga toda a culpa nela quando na verdade a culpa é do... –Bianca começou a responder por mim com raiva enquanto fitava Daniel. Ta certo que ela está tentando me ajudar e me defender, mas aquilo não ia dar em nada, só faria com que outra discussão começasse, então cortei-a.

- De ninguém. A culpa não é de ninguém. Vamos perder o filme se ficarmos aqui fora... Vamos Bianca, Cadu, Fabiano? –perguntei enquanto enlaçava meu braço ao de Bianca indicando para que ela não fizesse nada precipitado. Claro que não falei o nome do Daniel, não vou fingir que estou de bem com ele.

- Vamos. –Cadu disse sorrindo enquanto enlaçava seu braço ao meu livre. Achei estranha a aproximação, mas nem me dei ao trabalho de fingir que não gostei. Fala sério, ele é lindo, porque eu não gostaria?

Entramos na sala e fomos para a fila 12, nas cadeiras 14, 15, 16, 17 e 18. Tentei sentar ao lado de Bianca, mas Fabiano sentou antes de mim, então fiquei ao seu lado e ao lado de Cadu. O filme em si era bem engraçado, e romântico, mas não consegui prestar muita atenção já que toda hora Fabiano tentava puxar assunto comigo. Sempre respondia curta e grossa. Cara, a gente estava lá pra ver filme, não conversar! E se ele acha que ainda tenho algum interesse por ele, está completamente enganado... Às vezes Cadu dava uma olhadinha muito mal disfarçada para mim, o que me deixou desconfortável, como já disse antes, odeio ser observada, sei lá, é incomodo. Daniel ficou quieto o filme inteiro (tirando a vez que Bianca puxou papo com ele), e de vez em quando lançava um olhar irritado a Fabiano enquanto ele falava comigo. O olhar transmitia um sinal do tipo: Cala a boca, quero ver o filme. Não: Cala boca, ela é minha. O que me deixou desapontada por alguns minutos, até eu voltar a ter ódio dele e ignorar esse fato. Bianca, que teve que sentar do lado de Daniel, em uma parte do filme não aguentou e conversou baixinho com ele. Fiquei morrendo de medo... O que aquela louca ia falar? E se ela dissesse que eu gosto dele? E se ela dissesse que ele deveria investir em mim? Juro que mato a Bianca se ela falar algo desse tipo...

- Vamos comer alguma coisa? –perguntou Cadu depois de o filme ter terminado e já estarmos fora da sala.

- Não vai dar, tenho que ir embora, minha mãe me ligou. –Daniel respondeu encarando o chão.

- Mas já? Cara, pede pra ela deixar você ficar mais um pouco... Ainda são 19:30 horas. –Cadu disse insistindo para Daniel ficar.

- Eu sei, eu sei... Mas se eu não for minha mãe não deixa eu sair mais o restante da semana... Depois a gente combina outro dia, aproveita que suas companhias são boas... –disse Daniel piscando para Cadu enquanto o cumprimentava para ir embora. Depois ele deu um beijinho no rosto de Bianca e sussurrou algo em seu ouvido. Se eu fiquei irritada com a cena? Imagina... Depois ele cumprimentou Fabiano, e chegou à vez de dar tchau a mim. Bobo, eu sei, mas meu corpo começou a tremer, minha barriga parecia entrar em combustão e minha mente ficou completamente embaralhada. Por mais que eu queira distância dele, por mais que eu queira vê-lo o mais longe possível de mim, gosto de sentir isso, digo, de estar perto dele. Gosto de sentir seu perfume, de sentir sua presença ao lado da minha. Mas ele gosta da presença da Roberta, então em vez de deixá-lo dar um beijinho na minha bochecha, digo um “tchau Daniel” e vou ver a vitrine mais próxima de mim. Ele nem se quer responde meu tchau, apenas deu de ombros e vai embora, bom pelo menos foi o que vi pelo reflexo da vitrine.

- Perdi alguma coisa? –pergunta Cadu tão próximo de mim, que me assusta.

- Am... não. Exatamente. –digo. – O quê vamos comer? –perguntei saindo daquela aproximação excessiva e indo perto de Bianca e Fabiano.

- Eu quero um Bob’s... –disse Fabiano.

- Eu quero Mc Donalds! –exclama Bianca rindo.

- Decido lá... –respondeu Cadu me olhando de cima a baixo. – E depois quero umas respostas... –completou, e eu fingi ignorá-lo.

Fomos andando até a praça de alimentação com Cadu e Fabiano conversando sem parar e Bianca me observando enquanto eu olhava para o chão. Estou triste, e isso não é novidade pra ninguém, e agora que Bianca tem segredinhos com Daniel, estou irritada. E ainda tem o fato de que Roberta deu as caras e começou a me culpar novamente por conta da nossa amizade besta ter acabado. Isso, porque ela me ouviu confessando que eu amava Daniel... Espera!!!!! AI MEU DEUS! Agora que me dei conta de que ela ouviu... To perdida, definitivamente perdida! Isso na boca da Roberta, que me odeia nesse minuto (e nos próximos), pode muito bem ser espalhado para a escola... Ai Jesus... E agora, se minha memória não me falha, eu tinha a suspeita de que a música que Daniel havia feito era para Bianca, e ele ainda chegou a mencionar que precisaria de minha ajudar pra chegar à menina que ele estava interessado... E essa troca de segredo dos dois, começada pela Bianca! Fala sério, ela sabe que eu gosto do Daniel e vai fazer isso? Sério mesmo?

- Isa, o quê vai querer? Eu peço pra você... –Bianca disse quando chegamos à praça de alimentação. Ao olhar em seus olhos vi que aquele meu ciúme era idiota, muito idiota. Bianca é minha amiga, ela não estragaria nossa amizade por nada, e não deve ter falado nada de mais para Daniel, eu que sou louca e psicótica e comecei a imaginar coisas.

- Um x-salada qualquer... –disse sem animação me sentando em uma mesa vazia. A raiva momentânea que senti de Bianca já estava indo embora, dando lugar a um sentimento ruim, o de culpa. Se eu não fosse tão cabeça dura, era capaz de eu já estar namorando Daniel. Se eu não fosse tão cabeça dura, não estaríamos brigados. Se eu não fosse tão cabeça dura, ainda teria a amizade de Roberta...

- Pronto, agora pode me contar o que está havendo entre você e o Daniel. –disse Cadu me tirando do meu raciocínio culposo. Ele havia aproveitado que Fabiano foi pegar os lanches junto com Bianca, e se sentou na mesa junto comigo.

- Nada... Só que ele não me suporta e vice-versa. –menti olhando o mármore da mesa.

- Ah, Isa, deixa disso, me conta, vai! To curioso... –insistiu. Olhei atentamente para seu rosto muito bem definido. Os olhos castanhos brilhavam de curiosidade e os lábios esboçavam um sorriso meio malicioso.

- O quê isso vai adiantar na sua vida? –perguntei grossa. Sei que foi injusto, mas minha cabeça está explodindo de dor.

- Bem, quero ver se a área está limpa... –ele disse sem ligar para o meu tom grosseiro, mantendo a mesma expressão de curiosidade. De primeira não entendi muito bem o que ele quis dizer, mas depois que minha mente funcionou um pouquinho me limitei a corar.

- Ah... Eu... É que não tenho uma amizade muito instável com ele, e hoje discutimos duas vezes na escola. Não passa disso. Ele não me suporta, e eu não o suporto. Digamos que o sentimento que nos define, é o ódio. –disse dando de ombros voltando a olhar o mármore da mesa.

- Sei... E você não gosta nem um pouquinho dele...? –perguntou cauteloso.

- Gosta de quem? –perguntou Fabiano chegando com seu lanche e o de Cadu. Suspirei aliviada por não ter que responder.

- De x-salada... –menti rindo um pouco. – Vou lá ver se Bianca quer ajuda pra trazer os lanches... –falei me levantando da mesa e indo até minha amiga.

- Quer ajuda? –perguntei quando cheguei perto dela.

- Quero sim, pega aqui sua bandeja. –ela disse me entregando a bandeja.

- Então, o que você conversou com Daniel? –perguntei não conseguindo segurar minha curiosidade, enquanto voltávamos à mesa.

- Nada de mais... –ela respondeu dando de ombros, mas quando olhou minha expressão de descrença, cautelosa acrescentou: - Falei que a Roberta tinha brigado com você por causa dele, porque ela ouviu uma conversa nossa, mas entendeu errado. Pedi pra que ele conversasse com Roberta, e explicasse para ela que não tinha nada a ver o que ela ouviu com ele, e que ela não precisava fazer todo aquele pampeiro à toa. E ele falou que conversaria com Roberta, e que a faria pedir desculpas a você... Só isso, juro. –Bianca disse em sua defesa.

- Ai meu Deus... Você só se esqueceu de um detalhe... –falei angustiada- O que a Roberta ouviu, não é mentira, e ela pode muito bem falar isso a Daniel... –comentei assustada com a ideia. - Ai meu Deus, estou perdida!! –exclamei me sentando à mesa.

- O que houve? –Fabiano perguntou me observando.

-Am... Esqueci da hora! Minha mãe vai me matar, ela queria me queria em casa às 20:00 horas, e só falta alguns minutos pra isso... –menti falando a primeira coisa que veio à mente.

- Se quiser eu te acompanho até sua casa... E daí explico que o filme era grande, ou sei lá, pra livrar sua barra... –disse Cadu. Só que se minha mãe visse Cadu lá em casa ela iria querer todo tipo de explicação, já que pensa que só estou aqui com Bianca.

- Não, não precisa. Eu como rapidinho e depois pego um táxi. –falei começando a comer. Bianca olhou para mim e soltou uma risadinha. Credo, mentira tem perna curta mesmo! Agora eu ia ter que ir embora daqui a pouco... Também, nem saber mentir eu sei...

Depois que acabei de comer, dei um tchau rápido pra todo mundo e segui em direção a entrada principal, onde ficam os táxis, mas no meio do caminho parei. Porque eu tenho que ir embora, afinal? Só porque menti? (na verdade é). Decido que em vez de ir embora, iria para a Livraria Curitiba, pra ver os novos lançamentos, e depois pegaria um táxi e iria embora.

Chegando lá, entro e vou diretamente a para a parte onde se encontra os livros juvenis, entre eles: Harry Potter, Percy Jackson e os Olimpianos, Fazendo meu filme, etc... Quando cheguei aos livros me deparo com Daniel observando alguns.

- Pensei que você já tinha ido embora... –comentei sem olhá-lo, observando os livros também. Pelo visto ele também havia mentido igual à mim. Cada qual com a sua mentira.

- Pensei que você não estava falando comigo... –ele respondeu calmamente.

- Tooche! –comentei. Continuei olhando a variedade de livros de lá, mas depois me dirigi a outra ala, deixando Daniel de lado.

- Amanhã você tem alguma coisa pra fazer à tarde? –Daniel perguntou me seguindo. Assustei com a pergunta e com o fato dele ter me seguido.

- Além da aula de dança, não. –respondi indiferente olhando a parte das revistas.

- Podemos fazer o trabalho então... –ele disse ainda seguindo meus passos. – Você já terminou os dois livros, não é? –perguntou.

- Sim. Tudo bem, onde vamos fazer? –perguntei ainda sem lhe dar atenção, demonstrando que tudo isso era uma questão “profissional”.

- Pode ser lá em casa. As 14:00 horas ta bom pra você? -perguntou.- E depois do trabalho seguimos juntos para a aula de dança. –completou me encarando.

- Tudo bem. –respondi. –Tchau. –disse saindo de perto dele e indo para a saída da livraria, mas antes consegui ouvir o tchau abafado e triste que ele respondeu. Droga, porque quase nada da certo entre a gente?