Fake Diamond escrita por Luan


Capítulo 3
Capital


Notas iniciais do capítulo

Eu não morri.
Mas morro de vergonha por ter aparecido só agora.
Enfim, eu vou postar em dia agora, isso é a minha palavra. De verdade, eu juro. Vamos lá.



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Ninguém veio.

Todo o tempo destinado para pequenas despedidas que acontecem entre os tributos e familiares, antes de partir para a Capital, fora consumido. Meus pais e mais ninguém apareceu para dizer um simbólico adeus.

Sentado na confortável, porém minúscula sala do Edifício da Justiça, fiquei imaginando como seria minha morte iminente. Eu queria que fosse rápida, indolor e digna. O banho de sangue era uma boa maneira de isto acontecer.

Será que eu tinha agido certo?

Sim, havia. Querendo ou não, já era um ato de heroísmo se oferecer como tributo no lugar de uma pessoa indefesa, sempre admirei isso. Lembro exatamente como uma vez uma garota se ofereceu no lugar da pura e angelical irmã. Uma atitude digna, que resultou a sua vitória.

O tempo passou. Não sei o quanto, poderia ter sido três minutos ou cinco horas. Quando um Pacificador entrou no ambiente, meus olhos se abriram. Ardiam dolorosamente. Meus músculos estavam rígidos e o aperto em meu coração fazia reforçar cada segundo a mais que eu não voltaria para meu lar.

Meus pais. Esses eu não sentiria falta. Agora, deveriam estar muito ocupados realizando entrevistas sobre seu filho amado. Minha mãe devia estar em torpor, absorta em opções de vestimentas que poderia utilizar em cada evento ligado aos Jogos.

O homem de branco, com capacete, agarrou meu braço. Seus dedos se fecharam com força demasiada. Mais tarde aquilo deixaria uma roxa marca.

– Vamos – ele disse, me levando por um caminho que não salvei na memória.

Quando voltei a raciocinar, estava dentro de um carro. No banco traseiro, sozinho. As portas não apresentavam puxadores para abri-las e a parte do motorista e carona era protegida por uma divisória espelhada. Estava preso, em movimento, indo para um lugar no qual desconhecia o paradeiro.

Observei o reflexo à minha frente. Era lamentável. Os olhos estavam úmidos e com o escarlate prevalecendo. Me encarei, estava sem vida. Apenas no sentido figurado, porque no real seria mais no futuro.

O automóvel para. A porta direita se abre e me tiram de lá. Um curto espaço de tempo me limita para deslumbrar o ambiente em volta, uma estação de trem, e já estou no interior da enorme locomotiva.

É luxuoso. Nada no Distrito 1, ou que eu já tenha visto, chegue aos pés disto. É magnifico.

Estou em um compartimento em que mesas estão dispostas com os mais variados tipos de alimentos, alguns são coloridos demais, formas estranhas e sabores que não consigo imaginar. Não sinto fome, é algo estranho, perante aquela fartura toda.

Por entre as mesas de alimentos, encontra-se outra com jarras e copos de cristal, portadoras de líquidos com as mais variadas cores possíveis, até mesmo com mais de uma.

Pequenas e altas janelas permitem uma iluminação vacilante, mesmo com a luz solar entrando no local e com as lamparinas acesas.

Poltronas estão disponíveis por todo o compartimento e no canto mais distante de mim, existe uma pequena mesa circular e com três elegantes cadeiras. Sendo que uma já está ocupada.

Ela me vê. Um displicente ato de levar o guardanapo até os lábios cheios e então ela se levanta, se dirigindo na minha direção. É uma jovem, de beleza admirável. A pele é brilhante, natural e não pálida como a minha. Os olhos são escuros, juntamente com os cabelos caramelados.

– Olá – sua voz soa melodiosamente angelical.

Não consigo responder imediatamente, pensando no ato de falar, como se não o praticasse durante anos.

– Oi – respondo.

– Eu sou Andrômeda Feristeff, sua mentora. Vencedora da Septuagésima Terceira Edição, prazer.

Num estalo, me lembro dela. Me lembro da mesma correndo, colhendo suprimento e agindo furtivamente. Ela venceu sem matar ninguém. Ela seguiu seu objetivo, viver. E conseguiu êxito no que fazia, pois agiu perfeitamente. Andrômeda evitou alianças e sempre prosseguiu sozinha, conseguindo se livrar das artimanhas dos Idealizadores dos Jogos e resistiu, deixando com que os outros se acabassem, para ela ser a única a continuar em pé.

– Sou Cassius Ellshot, prazer – sorri timidamente e minhas bochechas doeram com isso.

O som de algo se abrir e deslizar me fez girar para trás. Alanys, a garota que foi selecionada comigo, entrava. Sua aparência se assemelhava com a minha.

Alanys se apresentou para Adrômeda e a outra fez o mesmo. Conversamos, em pé, com Andrômeda destacando sempre que éramos fortes o bastante para conseguirmos sair vivos da arena. Eu não acreditava.

Por fim, ela pediu para que fossemos para nossos quartos-compartimentos e nos trocássemos para o jantar, que se aproximava e seria no restaurante-compartimento, ás oito horas da noite.

Achei meu quarto com facilidade. Pressionei o polegar em um painel que proferiu meu nome com uma voz robótica e abriu a porta, me dando passagem.

Era um quarto simples, porém bem arrumado e elegante. Não passei muito tempo analisando as condições de conforto e nem de beleza e me dirigi para a espaçosa cama de casal. Me lancei nela, mergulhando nos lençóis brancos, feitos de algodão e afundei minha cabeça nos macios travesseiros. Afogando-me no mar de sonhos.

Estou correndo. A mata me cerca e minha perna machucada não permite que eu alcance uma velocidade maior, me limita a correr e ter que parar vez ou outra para analisar se houve algum estrago no ferimento, causado por um tributo do Distrito 2, onde abriu uma notável ferida com sua espada.

Eles estão atrás de mim. Os lobos gigantes, os bestantes. Seus uivos metálicos em conjunto com o ressoar de suas patas contra o solo terrestre da mata, sinaliza que estão mais próximos que eu possa distinguir. Estão com sede de vida, sede de retira-la de alguém.

Minhas costas estão carregando a aljava com duas flechas e na mão suada, eu porto o arco dourado. Em breve terei que usa-los e isso é mais rápido do que posso imaginar.

Enquanto corro, posso ver as figuras gigantes e negras passarem ao meu lado, ainda em um ponto distante, com velocidade incrivelmente alta. Eles delineiam um caminho por entre as árvores.

Quando tenho uma esperança de vida, me cercam.

Observo em volta, tendo noção de como será minha morte. Ao total são doze criaturas que me rodeiam, criando um circulo perfeito em minha volta, arreganhando suas presas úmidas da baba que escorre por suas faces. Eles ladram e seus olhos vermelhos ficam atentos aos meus movimentos. Suas garras metálicas estão enterradas na terra dura e seus corpos arqueados, em posição de ataque. Todos eles possuem cores que oscilam entre um marrom escuro até o caramelo claro.

Sei que tenho duas flechas na aljava e uma pequena faca presa à minha perna. Meu armamento é ridículo e fraco. Mesmo que tivesse granadas, o mínimo movimento poderia atiçar os bestantes.

Mas eu arrisco.

Puxo uma flecha da aljava e o primeiro lobo pula sobre mim. Rolo, no chão, na direção aonde a criatura pulou, utilizando do espaço que está desprotegido do circulo. Ainda no chão e de costas, consigo por a flecha no arco, nem mirando, soltando a flecha.

Por sorte, ela atinge o coração do próximo lobo que salta na minha direção. O lobo geme de dor e cai ao meu lado. Enquanto os outros se aproximam com uma velocidade terrível, puxo a flecha do peito do animal. Uma pequena corrente elétrica atinge meus dedos quando realizo contato com a flecha dourada.

Me jogo no chão novamente, e com a flecha na mão, ergo-a, atingindo a barriga de outro monstro, em pleno voo sobre meu corpo. A flecha se perde nos pelos da criatura, que cai metros distantes de mim. Uma flecha perdida.

Coloco-me em pé e avalio a situação. É deplorável ter alguma chance de me livrar disto. Os lobos restantes correm na minha direção, mais ferozes que nunca.

Não tenho tempo de puxar a faca nem a última flecha e o lobo que vem na dianteira pula na minha direção. Seu olhar voraz se prende em mim e em seu salto ele ergue suas patas, para me derrubar. Quando está próximo o bastante para me atingir, ainda no ar, solto um suspiro de derrota e um grito distante e agudo me faz arrepiar.

– Cassius – diz a voz.

Acordo.

– Cassius? – a voz repete.

Estou na minha cama, com a mesma roupa que me deitei e perdido nos lençóis. Minha camisa está úmida devido ao suor e as juntas de meus dedos estão manchadas, cravadas nas extremidades do colchão.

– O que foi? – pergunto, com a voz perdida.

– Já está pronto para o jantar? – reconheço a voz de Andrômeda.

Dormi demais, penso.

– Eu já estou indo, obrigado – respondo.

Então ouço passos se distanciando. Ergo os olhos para um relógio que está preso á uma parede próxima e tenho surpresa. São sete horas e cinquenta minutos.

Saio da cama, vacilando, e retirando a roupa enquanto vou à direção do banheiro. Quando chego no local, já estou completamente nu. Passo os dedos na perna, na coxa, abaixo da virilha e sinto minha pele lisa, macia e sem feridas, sem machucados. Porém no braço está a marca que eu saberia que viria.

Tomo um demorado banho e me visto com roupas simples que foram dispostas em cima da cama. Penso que minutos antes eu estava sem roupas aqui. Não gosto muito da liberdade de como as pessoas da Capital agem com o nudismo, sem pudor.

Chego ao restaurante quando são oito e meia, sentando-me com Alanys e Andrômeda.

– Boa noite – digo, enquanto estendo o guardanapo sobre o colo.

– Boa noite – as duas respondem.

Ambas já estão se alimentando. Sinto-me culpado pelo atraso, mas para uma pessoa que irá morrer em alguns dias, não é uma coisa que me preocupe muito.

Opto por um peixe desconhecido, seu sabor é bem exótico. A especiaria é servida com um molho de cor azulada e alguns cogumelos complementam o prato.

Comemos em silêncio e quando nossos desejos são saciados, resolvemos conversar um pouco, a respeito de nossos destinos.

– Água, abrigo e calor. Isso resulta em vida. Alimentos são fáceis de encontrar – diz minha mentora. – Alianças. Como são tributos do Distrito 1, obviamente não irão faltar candidatos e aí está o ponto positivo, vocês terão opção, o negativo é que aqueles que vocês negarem a ajuda, vai resultar em certa inimizade. E o segredo é: poucas pessoas.

– Não é quanto mais, melhor? – pergunta Alanys, receosa.

– Não – diz Andrômeda, polidamente. – Pessoas demais, ideias diferentes e preferencias desiguais, vai resultar em desentendimento e no final um vai desejar cortar a garganta do outro.

Alanys assente.

– Aqui fora, é meu trabalho e desejo ensina-los como viver na arena, mas dentro dela será vocês que decidiram o futuro de suas vidas – diz a mulher. – Eu aconselho que cada um de vocês consiga realizar aliança com outro tributo, além de vocês mesmos e só. Quatro será um grupo bom, decidam bem seus aliados.

Ela está certa. Não é fácil criar laços com pessoas que futuramente teremos que tirar suas vidas.

No final da noite, Anvangeline aparece, janta em uma mesa distante da nossa, ingerindo alimento que não parece ter lugar em seu corpo. Tão silenciosa como ela entra, a mesma sai.

Quando as instruções de Andrômeda cessam, vou para meu quarto e passo grande parte da noite acordado, sem sono. Mas em certa parte da noite adormeço e não tenho sonhos.

...

Por um pequeno instante acredito que ainda estou em casa, no meu quarto e com Ghorian retornando de sua caçada noturna, porém continuo no vagão do trem da Capital, indo para os Jogos Vorazes.

Me aproximo da janela translúcida que está na parede ao lado da cama. Vejo prédios correrem com grande velocidade, uma enorme cidade se estende em limites que meus olhos não alcançam. A imensidão de tecnologia e casas é evidente.

– A Capital – um sussurro escapa dos meus lábios trêmulos.


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