A Canção De Hohen escrita por MrMartins


Capítulo 4
Primeiros Encontros - Parte II




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Vance desembainhou sua espada e correu contra a criatura. Karl o seguiu de perto, retirando do bolso pedaços de papel. Obedecendo à ordem, Hart armou-se e se dirigiu à Princesa.

— Temos que sair daqui! — ele a disse.

Ellienne acedeu. Hart se pôs a correr para longe da batalha, de quando em quando olhando para trás, procurando ver se Ellienne o seguia. E ele então a via, correndo segurando as barras do vestido, e logo atrás dela as duas guarda-costas. Ao fundo ressoava a batalha — o impacto pavoroso dos golpes da besta alada e os gritos desesperados, raivosos, assustados e ensandecidos dos soldados que a enfrentavam. Todos ali estavam arriscando suas vidas contra uma abominação, pondo-se em risco como um soldado deveria fazer.

Por um instante, Hart se voltou para trás, apertando a espada em suas mãos — ela a sentia tremer e arder dentro da sua bainha, ansiosa de batalha. As espadas dos outros soldados dançavam na noite, refletiam em suas lâminas a lua, cortavam e furavam, mas a fera as ignorava e sem descanso dava golpes que estremeciam a terra.

Ellienne parou de correr quando viu Hart imóvel, encarando o conflito que se desencadeava.

— Senhor Wagner? — ela chamou.

Hart sentia sua espada pesar em suas mãos, debater-se enlouquecida, sem poder escapar. Num ímpeto de força, ele deu as costas ao combate e voltou a correr e não parou até não mais conseguir ouvir a batalha. Estava fora da ponte, em meio às árvores que cercavam a estrada. Olhou para trás e viu Ellienne, Emma e Hilde o encarando. Respirou fundo e embainhou sua espada.

— O que é aquela coisa? — Hart falou.

— Uma Sombra Caçadora — Ellienne disse.

A Princesa começou a desfazer seu penteado, deixando os cabelos caírem até as costas, enquanto caminhava para entre as árvores, seguida de perto pelas duas guarda-costas. Hart a seguiu, confuso.

— Princesa, tem certeza? — Hilde disse.

— Não há razão alguma em esconder isso do senhor Wagner — Ellienne falou. — Devo acreditar que ele está conosco e, se assim o é, ele tem de saber o tipo de ameaça com o qual estamos lidando.

— E com qual tipo ameaça estamos lidando? — Hart perguntou.

Ouviu-se uma explosão que estremeceu a terra, seguido de um rugido brutal e dolorido, um grito de agonia e fúria pavoroso. E enquanto ele ecoava, nem Hart, nem Ellienne, nem as guarda-costas disseram uma palavra sequer.

— Já fomos atacadas por essas… criaturas antes — Emma falou assim que o silêncio retornou.

— Espera, você não pode estar falando sério! — Hart protestou. — Como não ficamos sabendo disso? Olha o tamanho dessa coisa!

— Bem, nem todas às vezes foram eles. Houve assassinos comuns. Além disso, nem sempre as Sombras têm essa forma.

— O quê?

— Eles se transformam — Hilde falou. — Mudam de forma dependendo da situação.

— Achei que só os Drarut conseguissem fazer esse tipo de coisa!

— Eu também achava isso até ver as Sombras.

— Eles já atacaram quando atravessávamos um rio e até no meio de uma floresta — Emma falou. — Não existe um lugar seguro deles.

— Mas conseguimos matá-los — Ellienne disse. — Não foi fácil, admito, porém conseguimos.

— Mas de onde essas coisas vêm?

— Eis o que gostaria de saber. Um único indivíduo que conta com tamanha força a seu lado é um ameaça que deve ser neutralizada assim que possível. Entretanto não sabemos de quem se trata e está aí o maior de nossos problemas. Não fazemos ideia de quem é nosso inimigo, embora eu desconfie de algumas coisas.

— Como por exemplo?

— Temo que isso não seja algo que lhe possa contar. Por favor, entenda. Sei que pode ser ofensivo, não posso contar ainda tudo que sabemos. Não é pessoal, apenas acho que não seria prudente espalhar desconfianças infundadas.

Hart sorriu e levou a mão ao peito.

— Não se preocupe — ele disse. — Fico feliz de saber que Vossa Grandeza é o tipo de pessoa que toma esses cuidados.

— Agradeço sinceramente o cumprimento — Ellienne disse.

Ellienne, cada vez mais, impressionava Hart. Por mais que soubesse que ela era a herdeira do trono e, como tal, devia ter sido preparada para governar, os modos respeitosos, a calma e a aparente inteligência da princesa não eram algo que imaginara.

Hart estava tomado por esse tipo de pensamento quando sentiu algo lhe agarrar o ombro e o atirar para longe. Sua visão escureceu. O brandir de uma lança, os rugidos e os gritos eram as únicas coisas que rompiam o confuso véu do escuro. Por um momento, o mundo ameaçou desaparecer, porém, antes que pudesse, uma explosão arrancou Hart das garras da inconsciência.

Semidesperto, Hart viu, em meio a dezenas e dezenas de árvores derrubadas, a Sombra Caçadora investindo cegamente contra Hilde, que se esquivava dos ataques e tentava contra-atacar com uma lança de luz. Ellienne e Emma estavam mais afastadas, imóveis por atrás de uma redoma azul translúcida.

A Sombra rugiu e avançou contra Hilde com suas asas esticadas, tentando-a atingir com golpes de suas patas dianteiras. Hilde rolou para perto Hart e o golpe da Sombra explodiu no chão.

— Levanta! — ela gritou para o soldado.

A cabeça de Hart ainda girava, seu corpo demorava a responder. Mesmo o momento em que Hilde agarrou-o pelo braço e arrastou para longe só ficou claro para ele quando, olhando para trás, viu a Sombra a mergulhar contra o lugar onde estavam.

— Vamos! — Hilde voltou a gritar. — Eu não posso te carregar! Fica de pé e luta!

Mesmo confuso, Hart obedeceu. Pondo-se de pé, sacou sua espada e a segurou firme com as duas mãos. Seus dedos tremiam, seus olhos não encontravam foco.

Ele sorriu.

A Sombra Caçadora rosnou mostrando suas duas fileiras de dentes afiados e bateu suas asas, levantando uma cortina de poeira e folhas a seu redor. Hart virou o rosto para se proteger e, nesse instante, a Sombra o atacou. Ele se atirou no chão, escapando do ataque, e então, levantando-se num salto, atacou a fera. Quando a espada cortou a carne da Sombra, por um momento, uma leve luz azul pareceu surgir em sua lâmina. A Sombra rugiu enfurecida e numa investida violenta derrubou Hart no chão. Ela então se ergueu sobre suas patas traseiras, pronta para pisotear o soldado. Hilde aproveitou-se do momento, correu e cravou no peito da fera a lança. Sangue jorrou quando a besta recuou bruscamente, partindo em pedaços a lança de luz.

Hilde recuou num pulo, estendeu sua mão direita recitando um encantamento enquanto outra lança surgia-lhe nas mãos.

A Sombra Caçadora novamente avançou. A terra tremia sob seus passos, o ar se agitava com sua respiração. Hart e Hilde se esquivaram da investida no último instante e num golpe surpreendentemente harmonizado, atingiram ao mesmo tempo as duas patas centrais da fera, desequilibrando-a a ponto de fazê-la cair no chão. Mas a Sombra ainda não estava vencida. Erguendo-se nas patas traseiras, ela rugiu e um trovão pareceu explodir. O horror alado alçou voo e num instante ultrapassou a copa das árvores.

— Ela está fugindo? — Hart falou.

— Não… isso não — Hilde murmurou.

Ela correu até Hart, nervosa, e agarrou-o pelo braço arrastando-o junto a si em direção a Emma e Ellienne.

— O que você está fazendo? — Hart gritou.

— Se não nos escondermos essa coisa vai transformar nós dois em pó!

Entre os dentes da Sombra, uma luz azul celeste ganhava força, crescia até tornar-se tão brilhante quanto a lua. Hilde aumentou o passo e Hart a acompanhou como podia. Em poucos instantes, os dois cobriram a distância de quase cinquenta metros que os separava de Ellienne e Emma.

— Abre! — Hilde gritou quando se aproximaram.

Num instante, o escudo de energia desapareceu.

Num instante, a Sombra Caçadora disparou um raio de aterrador poder contra a terra.

Num instante, dezenas de metros quadrados de terra, árvores e pedras foram reduzidos a uma cratera carbonizada. Não restou pó, não restou cinza. Tudo aquilo atingido pela energia foi completamente obliterado. A explosão se ergueu sobre as árvores, iluminando quilômetros, espalhando o estrondo qual o de uma montanha a despencar.

Quando a luz e o barulho cessaram, em meio à devastação, restavam apenas quatro pessoas, assustadas e desprotegidas. Hart, já ferido, estava no chão, assim como Emma, que de joelhos pingava suor. De pé, Ellienne e, à frente dela, Hilde, ofegante, mas ainda em posição de combate. Todo o ambiente ainda era dominado pelo ruído estridente de estática e lampejos de pequenos raios.

E então a Sombra Caçadora pousou e pôs-se a lentamente caminhar até seus oponentes, sorrindo de dentes abertos, encarando cada um nos olhos. E no fundo daqueles olhos, Hart entendeu o que era o horror.


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