Cartas de Fogo e Água escrita por José Vinícius


Capítulo 18
Carta 13 - Água




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Zuko,

Nossas vidas estão entrelaçadas agora. Consegue sentir a força dessa união? Eu sou capaz de sentir alguma coisa. Queria sentir tudo, a proximidade entre nós aumentando, nossas cabeças se tocando, as ondas do mar se quebrando... Mas para isto eu teria que estar mais próxima de você.

Faz bastante tempo que não trocamos cartas – desde quando nos vimos, algum tempo atrás. Foi... Algo estranho. Pelo menos, é assim que eu classifiquei a experiência. Quando estávamos juntos, isto é, no mesmo lugar, não foi como se nós ainda fôssemos os mesmos. Havia algo diferente. Como se compartilhássemos um segredo.

Acho que não existe segredo nenhum. Todo mundo sabia do que estava acontecendo, afinal.

Acho que deixamos transparecer um pouco as coisas, ou pelo menos, não fomos muito discretos. Mas eu simplesmente adorei tudo o que passamos, mesmo que tenham sido poucos momentos. É estranho mantermos algo vivo com essa distância, mas eu acho isso necessário. Não por que é aquela coisa antiga de manter vivo algo ou demonstrar fidelidade, mas por que nós erguemos isso sobre esse fato – a distância. Claro que queremos ficar juntos, mas nós ainda precisamos nos manter afastados um do outro. Eu vejo isso como uma necessidade, entende? Pelo menos, eu penso assim.

(No fundo, acho que não estou tão preparada para seguir em frente. Acho que é medo que ficarmos juntos e perdermos esse encanto todo.)

Desculpe-me se não preenchi suas expectativas sobre nós. Tenho medo que nós dois tenhamos uma visão diferente das coisas. Espero que você seja compreensível neste ponto.

O tempo está passando mais rápido do que nunca. Acordo, e a minha antiga aldeia, que era só uns iglus escondidos atrás de um muro de neve, agora mais parece que se tornou uma simples vila. Um dia, vai se tornar grande como uma cidade, e eu espero estar viva para vê-la assim, grande.

O Pólo Sul tem ficado cada vez mais aquecido. É verão, e os dias são repletos de sol e calor. Mas o frio ainda reina. Estou tão acostumada com a neve que, o tempo que eu fiquei viajando com os outros mais parecem memórias de um passado distante – não muito distante, admito – e não vivências recentes. Sei que se eu quiser voltar a conhecer todas aquelas coisas que eu conheci, todas as pessoas, todos os lugares, eu posso. Só preciso arranjar os meios, e pronto. Mas não tenho tempo suficiente. Estou muito atarefada, e você também.

Nunca me senti assim, leve, só de pensar que tudo está bem entre nós. Mas eu confesso que não criei coragem para ver o Aang. Falar com ele. Algo em mim diz que não estou pronta – e meu medo é que nunca esteja. Dói, mas ao mesmo tempo, eu fico indiferente com isso. É tão estranho vindo de mim! Sempre me vi como alguém carinhosa, alguém que sabe perdoar e que consegue superar as coisas, mesmo com algum custo. Mas eu vejo que não. Ainda existem coisas aqui dentro que eu provavelmente não vou superar nunca, e mesmo sabendo os meios para fazê-lo, sou incapaz disso. Se começo, nunca termino. É como se fosse apertar o dedo num espinho venenoso. Quanto mais aperto, mais dói.

Eu tento acreditar que eu vou superar estas dores, Zuko. Às vezes me vem na cabeça umas idéias românticas, mas nada demais. Tudo depende de mim, e, se eu quiser superar isto, tenho que ter forças para dar o primeiro passo.

Você tem tido notícias da Mai?

Não estranhe esta pergunta, mas ela é uma das incógnitas que mais me perturba. É difícil explicar para você porque exatamente eu me preocupo com ela, mas eu me preocupo bastante com o que aconteceu com ela. Vou ser sincera: eu consegui superar a culpa que eu sentia por ter... Achado que eu era o motivo da briga de vocês dois – mas eu só aceitei a verdade, e aprendi a lidar com ela. Eu sei que fui eu, mas isso não vai mudar em nada.

O que eu gostaria que você fizesse, Zuko, é que fosse atrás dela, e tentasse conversar. Começar por admitir que realmente havia um sentimento entre nós, mas não tivemos coragem de admitir um ao outro. Pedir desculpas a ela por (de alguma forma), ter cometido o mesmo erro que eu – dado margem para algo falso, e ter sustentado isso por um bom tempo. Sei que se você fizer isso, eu terei coragem para fazer o mesmo.

As coisas entre nós se estagnaram, não acha?

Reli suas últimas cartas, e eu vi que o sentimento parece ter abrandado um pouco. Devemos estar mudando. Amadurecendo.

Às vezes eu penso que poderíamos continuar sustentando a turbulência que existia entre nós, até porque, ela nos mantinha juntos. Mas nós preferimos vencê-la, e ficar juntos em meio à tranqüilidade. Se escolhemos erguer isso assim, então nossa relação (é cedo para dizer isso?) vai durar bastante.

Eu ainda sinto que preciso te conhecer melhor. Preciso passar mais tempo contigo, Zuko. Eu quero te conhecer o bastante, senão todo, senão além, para que então você me conheça, e possamos ser felizes juntos. Não é assim que as coisas funcionam? Precisamos conhecer um ao outro melhor, de maneira muito mais nítida. Saber os gostos, os desgostos, os jeitos, os pensamentos... Tudo na medida do possível, é claro.

Sinto saudades das nossas metáforas. Eram tão belas...

Agora estou olhando para o céu enquanto escrevo. Senti essa vontade. Não há lua, mas as estrelas estão tão belas que quase chego a tocá-las, em pensamento. O espaço é lindo, não acha? Milhões de diamantes no céu, cintilando. Para mim, cada estrela é uma pessoa, um cintilar de memórias tão vivas que tangem nossa pele e entram em nossa alma.

O mar sente saudades da lua. Não está tão movimentado como costuma ser – acho que o escuro está me impedindo de ver isto.

Lembro-me de uma história que minha avó contava quando eu era criança. Quando o mundo ainda era virgem, havia luzes no céu, um tipo de luz esverdeada, às vezes colorida, viva, que dançava tão alegremente que chegava a animar os corações uns dos outros. As pessoas eram mais unidas por causa dessas luzes. Elas tocavam nos nossos corações e nos davam um motivo para vivermos em harmonia.

Eu queria ver estas luzes, Zuko. Queria admirá-las contigo.

Um abraço, da sua, eterna e constantemente sua,

Katara.


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Notas finais do capítulo

Sem nada a declarar, por ora. Apenas que demorei muito tempo, e voltei.



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