Ok. Posso fazer isso. Não deve ser tão difícil assim. Só preciso esticar o braço, apalpar umas tetas de meia dúzia de vacas, analisar seus traseiros e o porte e partir para o abraço. Fácil. Moleza. Virando o rosto para o lado oposto, como quem não quisesse ver, tateei até encontrar a primeira vítima. Minhas mãos encontraram uma coisa mole e comprida. Isso, garota! Vamos lá. Puxei com força e ouvi um mugido alto para, em seguida, sentir o rabo da vaca atingir meu rosto.

- Mimosa, mimosa, shhhhiu. – falou o caubói, afastando-me o bastante para me deixar segura. 
- Ela deve ter ficado nervosa porque mexi nas tetas dela sem avisar, não é, Mimosa? – disse eu, sorrindo falsamente. Vaca estúpida! Como se eu tivesse gostado de botar as mãos naquilo, para ainda receber uma rabada. 
- Ah, não é com o Inácio que eu estou falando. – ele respondeu, com um riso cretino no rosto. Maldito seja.
- Espere aí. Inácio? – perguntei num fio de voz.
- Você não pôs a mão numa teta, dona Rachel.

Puta que pariu.

Depois de muito apalpar tetas (tetas de verdade, dessa vez), olhar traseiros imundos e fedorentos e analisar seus portes, acabei optando por uma vaca branquinha de nome Trude e olhos brilhantes, que mugiu quando me viu e foi a única a não espalhar leite pelas minhas botas. Esperava ter feito a escolha certa e que o boi não preferisse as morenas. Mas, ah, quem liga? Dane-se o que ele prefere, é o que tem pra hoje. 
Muito ao contrário do que eu esperara, escolher uma das vacas me rendeu horas de trabalho árduo, e quando notei já passava das duas da tarde. Voltei ao escritório, adiantei a burocracia do encontro dos ruminantes e telefonei para o cliente (ou o dono dele, melhor dizendo) para avisar o horário do encontro. Antes que eu me desse conta, já era hora de voltar para o conforto do lar... De ônibus.

- Quer uma carona? – uma voz conhecida me perguntou, e antes que eu me virasse, já sabia de quem se tratava. Sorri, tímida, antes de responder: 
- Ah, oi, sr. Hudson. Não, vou te atrapalhar e... 
- Qual é, Rachel. Me chame de Finn! E você não vai me atrapalhar. – interrompeu-me, sorrindo para mim e destravando as portas do carro. – Vamos?

Sentindo todo o sangue de meu corpo concentrar-se em minhas bochechas, assenti, num meio sorriso, antes de abrir a porta e entrar. 
Os olhos de Finn permaneciam focados no trânsito, e seus dedos tamborilavam no volante enquanto o semáforo continuava com a luz vermelha piscando. Como se soubessem que eu estava encarando-o, suas orelhas de pronto ficaram vermelhas. Bom, ou talvez não fosse por isso. Claro que não era por isso. Desviei o olhar e relaxei, indicando o caminho. 

- Pode me deixar aqui mesmo. – falei, indicando a esquina. Andaria mais duas quadras a pé, mas quem liga? Seria melhor que ficar naquele carro, naquele silêncio. Qual é, que hospitalidade fajuta era aquela?! 
- Não seja boba, te levo em casa. – respondeu, as orelhas ainda mais vermelhas. – Rachel, será que você... Hm, será que você se importaria se entrássemos e saíssemos do carro, só um pouco? Rapidinho.
- Er, tudo bem. – respondi, confusa.

Antes que eu pudesse entender o que acontecia, um alarme disparara e as portas foram destravadas; Finn soltou-se do cinto de segurança num instante e, no segundo seguinte, me jogou para fora do carro, respirando forte. E, como se nada disso parecesse assustador o bastante, empurrou-me de volta, apertou um botão esquisito no painel e deu partida, as orelhas de volta à cor normal, sua respiração indicando alívio. O curto percurso até minha casa foi feito em silêncio; meu pavor inicial deu lugar à confusão e Finn parecia ter voltado à calmaria.

- Está entregue. – disse, piscando um olho para mim. Ou talvez fosse um tique, sei lá. Grande ilusão a minha, achar que as orelhas do cara estavam vermelhas pela minha presença. Sorri em resposta e murmurei um agradecimento baixinho, antes de saltar para fora do carro o mais depressa que pude.