Annie’s POV

Chegou a minha vez, chegou minha hora. Minha missão aqui na Terra estava comprida, as dores, insuportáveis. Estava na hora de dar meus últimos passos em direção a morte. Eu não queria me despedir. Eu não queria olhar nos rostos das pessoas que eu mais amo no mundo.

– Uma troca de almas, a minha pela dela. Você deixa ela viver e eu vou no lugar dela, que tal?

Eu parei, confusa e olhei para trás, esperando que o que eu ouvi fosse só imaginação. Mas não era. Passei meus olhos cansados pelas pessoas da sala. Todos encaravam um só.

Jake.

– Não Jake, eu não vou deixar – meus olhos marejaram só de olhar para ele.

– Aceita Tânatos? – ele perguntou sem me olhar.

Virei me repreendendo Tânatos, este que coçava o queixo e fazia uma cara pensativa. Não, ele não podia estar considerando essa proposta. Eu passei tanto tempo me preparando psicologicamente e aceitando que eu tinha que partir.

– Eu vim aqui buscar uma alma, não importa quem seja. Se você quer tomar o lugar dela... Tudo bem, agora eu tenho que levar vocÊ, sem mais trocas.

Quase caí de joelhos, olhei para Jake suplicante e ele tinha um sorriso frio e quase louco no rosto.

– Está bem, peço cinco minutos para a despedida.

Tânatos assentiu com a cabeça, cansado. Jake caminhou até Piper, que tinha lágrimas nos olhos, ela o abraçou compulsivamente, dizendo:

– Você não pode estar fazendo isso, não pode...

Jake sorriu com ternura e limpou uma lágrima de Piper.

– É o meu destino Pips, cuide dela tudo bem? E do Valdez também.

Piper sorriu e o abraçou. Ele caminhou para o lado e parou na frente de Leo.

– Escuta cara, cuida dela pra mim tá? Se você machucar a Pips eu volto aqui e arranco teu pescoço – Leo soltou uma gargalhada sem humor – Foi bom estar com você Valdez, obrigado por tudo cara.

Os dois trocaram um abraço e Jake parou na frente de João.

– Eu não gosto de você, nunca gostei. Cuide bem da Annie, ela merece um cara que lhe entregue café na cama e que cante para ela dormir. Merece um cara que lhe diga “eu te amo” todos os dias, que a abrace, que a beije com amor. Entendeu? Eu estou te dando uma última chance de se redimir com ela. Não faça com que eu tenha me matada a toa.

João apenas assentiu e disse:

– Farei o possível.

Jake sorriu feliz e caminhou até mim.

– Jake, não faz isso. Eu não conseguiria viver sabendo que você deu a vida por mim, sua vida vale mais que a minha, não me deixe mais culpada...

Eu fui interrompida por um abraço dele, um abraço forte. Por um momento só existia eu e ele, o garoto que estava prestes a dar sua vida por mim.

– Eu estou pronto para o que der e vier. Assim você poderá me perdoar de verdade Annie. Só receio que eu não poderei estar aqui para ver você chegar ao acampamento como uma heroína. Apenas fico triste por não poder cumprir minha promessa com você. Mas saiba Annie, que eu te amei, eu te amo e sempre vou te amar – eu chorava compulsivamente no peito nu dele.

“Sinto-me honrado por ter passado todos esses momentos juntos com você. Espero realmente que você nunca se esqueça de mim, pois eu nunca vou me esquecer de você. Tudo o que eu já fiz de ruim para você... Eu estraguei um relacionamento, eu fiz você brigar com o cara que você mais amava. Sim Annie, você nunca me amou, você sempre amou João. Sabe disso. Eu sempre fui um idiota, eu não merecia nem estar te abraçando agora. Desculpe gordinha, desculpe por tudo o que eu já te fiz.”

Ele se afastou um pouco e mexeu no braço esquerdo, quando percebi o que ele estava fazendo eu quis gritar, quis morrer.

– Não pode estar me dando a sua pulseira Jake, não pode.

Ele sorriu e colocou a pulseira em minha mão.

– Ela não me pertence mais Annie, você deverá entregar ela a uma pessoa que nunca vai te abandonar. Eu te amo Annie, sempre se lembre disso. Sempre.

Ele me deu um longo beijo na testa e me soltou. Caminhou lentamente até Tânatos. Nesse momento eu percebi o quanto aquele garoto havia marcado minha vida, o quanto ele era corajoso, o quanto ele era amável.

Jake andava sorrindo, como se fosse o dono do mundo. Eu não duvidava nada que ele fosse realmente o dono do mundo. Se não fosse, eu daria o mundo para ele. Jake abriu os abraços e Tânatos fez a mesma coisa, os dois se abraçaram e eu vi Jake dar seu último suspiro.

O momento depois foi indescritível.

Tânatos simplesmente sumiu, a sala inteira ficou em silêncio, a não ser por um barulho estrondoso. O barulho de um corpo sem vida caindo no chão. O corpo de Jake caindo no chão.

Eu corri com todas as minhas forças até o corpo vazio de Jake. As lágrimas rolavam pelo meu rosto sem parar. Eu gritava em plenos pulmões, eu gritava para que o mundo ouvisse que havia perdido um herói. Eu gritava porque eu havia perdido uma das pessoas mais importantes da minha vida, se não a mais importante.

O corpo de Jake estirado no chão, frio, sem vida. Os braços cheios de marcas de cortes. Seus olhos azuis sem o habitual brilho. Sua boca sem o habitual sorriso malicioso. Eu me recusava sair de perto dele, mesmo sabendo que eu não poderia fazer nada. Ele estava morto.

Ele tinha dado a própria vida por mim.

Parei por um segundo para me analisar, eu não sentia mais dor. Olhei para minha perna, o pano da camisa de Jake não tinha mais sangue, eu a desenrolei com cuidado e olhei para meu ferimento, que não estava mais lá.

Jake não tinha dado sua vida por mim, ele tinha dado a sua saúde para mim, havia dado sua força vital.

Levantei a minha camiseta e abafei um grito quando vi que não tinha mais nenhuma marca negra em minha barriga. Eu havia sido curada, e o preço tinha sido caro. Mais caro do que deveria.

Levantei-me com cuidado e fitei meus amigos. Piper estava aninhada no peito de Leo, ela chorava descontroladamente e ele sussurrava algo no ouvido dela, enquanto afagava seus cabelos. Meus olhos pararam em João, que estava sem reação, mas me fitava intensamente.

– Temos que sair daqui, nossa missão foi comprida. Vamos voltar para o Acampamento Meio-Sangue.

Não foi difícil voltar ao Argo II, Leo carregava o corpo de Jake. Eu evitava olhar para ele. João caminhava ao meu lado em silêncio, esse era outro que eu não queria olhar mais na cara.

Os dias passaram relativamente rápido quando estávamos no Argo II, eu não deixei absolutamente ninguém entrar na minha cabine. Eu saía cinco minutos no meio da madrugada para roubar algo da geladeira ou tomar alguns goles de água. Eu não queria fazer nada, eu queria remoer todas as dores e como eu me sentia culpada por ter deixado Jake ir.

[...]

Fomos desembarcando um a um quando chegamos ao acampamento, decidi ser a última. Uma multidão já esperava na praia, nos olhando atentamente e esperando para ver se os boatos da “garota com a maldição” havia mesmo morrido.

Apareci e escutei um grande coro de “oh” vindo dos campistas. Quíron chegou cavalgando, ele parecia assustado ao me ver ali, mas sorriu.

– Annie! – Quíron abriu os braços sorrindo largamente – Como... Como você está viva? E onde está Jake?

– Ele se foi Quíron e a culpa foi minha – eu disse, me sufocando em seu abraço e enterrando minha cabeça em seu peito.