À Francesa escrita por Nana San


Capítulo 18
Capítulo 10




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Ela lembra do sangue escorrendo, da música parando, dos senhores se amontoando a sua volta. Dos braços de Calvin a envolvendo, suspendendo-a no ar. Lembra-se o vestido sendo tingido do vermelho puro de seu sangue, das lágrimas escorrendo e da espera. A espera de que Matias voltasse com Eduardo daquele corredor tão longo.

Mas ele voltou sozinho e sua dor ardeu nos olhos e no ferimento. Eduardo... Por que ele não veio?

- Lívia? Minha filha! Oh, senhor, eu a deixei perfeita antes de sair de casa! – Exclamava a mãe segurando o filho mais novo pela mão.

Pedrinho segurava a mão da mãe com uma mão e com a outra um ursinho de pelúcia, com o olhar perdido, enevoado. Observava as pessoas gritando, rezando, chorando ao seu redor e não entendia absolutamente nada. A irmã tinha machucado o braço. Era só passar o remédio, colocar band-aid do bob esponja e dar beijinho que passava. Por que ela estava num hospital? Por que a mamãe chorava tanto?

- Mas você é o Calvin? – Perguntou a mãe aproximando-se do rapaz – Onde estava quando ela caiu? Hein?

- Eu não sei. Eu não a vi por alguns minutos, conversava num instante com o Eduardo e depois escutei o grito das senhoras que a viram cair. 

Calvin mexia nos cabelos nervosamente, tirava e recolocava os óculos, limpando-os na gravata quadriculada. Matias estava sentado num banco, imobilizado numa pose de pensador.

O pai de Lívia segurou a esposa pelos ombros e tentou acalmá-la, em vão, mas o suficiente para fazê-la entender que culpar o rapaz não mudaria nada, só o fato dele ter um ataque cardíaco. Ele ficava cada vez mais vermelho, mais trêmulo.

- E esse Eduardo, cadê ele? – Insistiu a mãe.

- Ele não veio. – Respondeu Matias perdendo parte da expressão congelada.

- E por que ele não veio?

- Eu faço uma ideia. – Disse levantando-se da poltrona, sacando o celular do bolso da calça.

Enquanto eles discutiam, Lívia sentia álcool etílico limpando seu ferimento. O corte tinha a extensão de seu antebraço e nem o médico sabia ao certo quantos pontos seriam.

- Vamos, menina, aguente firme. Devolva o braço. – Disse o médico ficando impaciente com o seu recuar.

- Vai doer muito. – Disse ela tentando conter as lágrimas.

- Quanto mais cedo começarmos, mais cedo irá acabar. Vamos, menina, o medo só aumenta a dor. – Disse o médico encarando-a por trás da máscara.

Ela balançou a cabeça como forma de assentir e sentiu a primeira agulhada atravessando a carne. Segurou com as unhas o lençol da cama e cerrou os olhos imaginando estar segurando as mãos grandes e mornas de Eduardo, sabe-se lá por que.

Contou quantas vezes o suor escorreu pela testa e recordou do gato enroscando-se em suas pernas. Se se esforçasse muito, conseguiria igualar as situações e talvez esquecer da dor.

Do lado de fora Matias tentava se enfiar contra a parede enquanto cochichava no telefone. Calvin não soube com quem era e nem o assunto, tentava distrair-se brincando com Pedro e o ursinho.

- O ursinho é seu? – Perguntou agachando-se.

Pedro se escondeu atrás das pernas da mãe e balançou a cabeça negativamente.

- Era dela, mas Pedro sempre foi muito agarrado com ele... Ela deu para ele na semana passada.  – Respondeu a mãe acariciando a cabeça do pequenino.

- E você garotão? Não fala? O gato comeu sua língua?

- O Lancelot só come ração. – Respondeu Pedro deixando uma brecha do corpo aparecer para Calvin.

- Quem é Lancelot? – Perguntou Calvin levantando-se do chão.

- É o gato da Lívia. – Respondeu o pai rindo da resposta do filho mais novo.

Sentaram-se nos bancos, serviram-se de café e esperaram em silêncio a aparição do médico. Não demorou muito para que Matias desligasse o telefone, ruborizado, cuspindo fogo, irritadiço.

- Vou beber uma água. Qualquer notícia, avisem-me.

- Olha o coração, pai. – Alertou Calvin.

- Já estamos num hospital, fique tranquilo. – Respondeu Matias ironicamente batendo as mãos.

Poderia voltar para casa no mesmo dia, nada de dormir no hospital, afinal de contas, o corte pode ter sido monstruoso, mas era apenas um corte aberto. O que para os médicos era muito mais simples do que o drama que a família estava fazendo. 

- Lívia já está bem, um pouco alterada, mas bem. - Disse o médico aparecendo na salinha de espera do hospital.

Pedro abriu os olhinhos no mesmo instante e esticou as pernas para pular do colo da mãe. Agarrou o jaleco do médico e disse:

- Cadê a Lívia? 

O médico, sensibilizado pegou o garotinho pela mão e levou-o até o quarto da irmã. Uma enfermeira já estava enfaixando o braço, escondendo os pontos negros.

- Lívia, eu trouxe o Tobi pra ficar com você. - Disse pondo-se na ponta dos pés, debruçando-se sobre a cama, mostrando o ursinho molenga.


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Notas finais do capítulo

Pedrinho lindo *----*