– Me desculpe...

– Não estou interessada.

– Me desculpe!

– Poupe seu fôlego!

Era noite. Lilian, de robe, estava parada de braços cruzados diante do retrato da Mulher Gorda, à entrada da torre da Grifinória.

– Eu só sai porque a Scarlet me disse que você estava ameaçando dormir aqui - Ela disse.

– Estava. E teria feito isso. Nunca quis chamar você de sangue-ruim, simplesmente me...

– Escapou - Não havia piedade na voz de Lilian - É tarde demais. Há anos dou desculpas para o que você faz. Nenhum dos meus amigos consegue entender sequer por que falo com você. Você e seus preciosos amiguinhos Comensais da Morte: está vendo, você nem nega! Nem nega que é isso que vocês pretendem ser! Você mal pode esperar para se reunir a Você-Sabe-Quem, não é?

Severo abriu a boca, mas tornou a fechá-la sem falar.

– Não posso mais fingir, você escolheu seu caminho, eu escolhi o meu... - Ela murmurou, fazendo que ia entrar de volta.

– Não... Escute, eu não quis...

– Me chamar de sangue-ruim? Mas você chama de sangue-ruim todos que nasceram como eu, Severo, por que comigo seria diferente?

Ele queria falar algo que pudesse fazer Lilian entende-lo, mas não tinha motivos. Nesse momento de silêncio, ela, sem dar satisfação, virou as costas e entrou na torre da Grifinória.

* * *

– Vem aqui!

– Nós estamos atrasados, Tiago! Imagina se o trem vai embora sem a gente! - Lilian sussurrou, preocupada.

– Seria perfeito. Só teria nós dois aqui...

– E onde você quer me levar?

– Aqui tá bom - Ele parou no corredor do quinto andar, vazio aquela hora. Ele pigarreou - Lily... Eu queria te falar uma coisa.

– Ora, então fale!

– Eu vou ser bem direto... Ok? - Ele disse.

– É bom mesmo, até porque o Expresso já vai sair e nós estamos aqui.

– Ah, certo... Lilian, eu gosto muito de você. Demais da conta. Eu realmente não sei o que eu seria sem você. Ainda mais agora, que estamos tão próximos. E hoje... Na verdade desde sempre... Eu percebi que te amo. E eu não quero que nada que eu faça contigo não tenha significado. Quero que isso seja parte da gente. Eu quero alguém... Você... Pra chamar de namorada.

Lilian já sabia o que viria a seguir. Seu coração palpitou, suas mãos começaram a suar e ela corou profundamente. Porém, não interferiu, para não estragar o momento.

– Lily... Namora comigo? De verdade? - Ele parecia tão pequeno ao lado dela, apesar de ser alto. Lilian não sabia o que dizer. Por que seu lado timidez tinha que aparecer logo naquele momento? Não queria pensar em dizer nada. Segurou na nuca de Tiago e beijou-lhe intensamente. Ao terminar, sussurrou em seu ouvido, como fez diversas outras vezes:

– Sim.

Do outro lado da sala, escondido atrás de umas estantes, o garoto de cabelos longos e oleosos deixou uma lágrima cair. Ele perdera sua chance. E sabia que seria para sempre.

* * *

– Corram, depressa! - O guarda-caça gritava, empurrando o resto dos aluno no Expresso de Hogwarts.

– Cadê o Pontas? - Perguntava Sirius, olhando com a cabeça para fora do compartimento o corredor - Ele não pode perder o trem!

– Calma - Remo, que lia um livro tranquilo, disse - Ele deve estar por aí.

– Eu estou com fome... Vocês não? - Informou Pedro, a cara grudada na janela, esperando saírem da estação.

– Putz, Rabicho! Ainda nem começamos a viagem! - Exclamou Sirius.

– Mas vou comprar alguma coisa mesmo assim - Ele saiu da cabine, procurando a moça com o carinho de doces. Minutos depois, a porta se abriu novamente.

– Achei vocês! - Era Tiago, com o maior sorriso do mundo, de mãos dadas com Lilian. Remo e Sirius se entreolharam.

– Oi meninos - Lilian falou, tímida.

– O-oi - Murmuraram.

– Bom... Ér... A Lilian aceitou namorar comigo! - Ele avisou, saltitando de alegria, quase flutuando.

– Sério?

– Verdade?

– Sim... - Ela falou - Me sinto tão... Leve.

– Parabéns, Pontas... - Disse Remo, voltando sua atenção ao livro. Depois de um silêncio comovente, onde Sirius olhava pela janela, Lilian para os seus sapatos e Tiago para o nada. Ela sussurrou para ele:

– Ah... Melhor procurarmos uma cabine vazia.

Tiago aceitou a ideia na hora. Por quê não?

Encontraram uma bem no fim do trem. Tiago mal fechara a porta quando viera para cima de Lilian, dando-lhe beijos e mais beijos. Ela achava muito estranho, mas ria o tempo todo, pois o entendia. Era o melhor sentimento do mundo. E Lilian podia dizer para si mesma: Agora, ele seria dela, e não precisava mais ter medo, nem vergonha.

* * *

Todos desembarcaram na estação de King's Cross á noitinha, eram despedidas para todo o lado, e gente carregando malas aqui e ali. Lilian levou Tiago, totalmente envergonhado, para conhecer seus pais (Petúnia fez cara de nojo). Depois, eles se afastaram para um canto.

– Ah... Lily? - Ele chamou - Eu queria saber se você podia... Você sabe, passar um tempo dessas férias lá em casa. Você vai ficar um pouco confusa mas... O Sirius vai estar lá e tudo mais...

– Claro - Ela o surpreendeu - Com certeza. Agora eu tenho que ir, querido. Te mando umas cartas.

Eles se beijaram. Antes de se separar, ela murmurou:

– Te amo.

E correu para os seus pais e sua irmã, com cara de muxoxo. Tiago ficou parado ali, durante quase anos, enquanto seu amor ia embora. Não para sempre, é claro. Mas... Mesmo assim, era um fim. Um buraco em seu coração. Talvez aquelas palavras curassem o pouco tempo que ficariam separados, mas ele viveria. Sirius deu um tapinha em suas costas, e o chamou, pois sua mãe já havia chegado para buscá-los.

Eles eram um só.

A Corça, o Cervo e o Príncipe.