Eu estava intratável. Meu mau humor afastou todos da casa, nem Nicole falou comigo de manhã. Mas eu não consegui deixar de ficar brava. Decidi que era melhor dar uma volta para organizar os pensamentos antes de dar a notícia a Harry e Mary Jane. Fiquei com raiva ao pensar neles. Primeira coisa que me ocorreu: eu estava com raiva. Do quê? Não era de meu pai. Eu sabia que não dependia dele, já havia me acostumado. Mas por que eu estava com raiva? Eu nunca havia reagido assim antes. A resposta veio rápida: Mary Jane e Harry. Eu não devia ter me aproximado deles assim. Por que eles tinham que ser tão maravilhosos? Eu estava com raiva de mim mesma, por ter me apegado demais, coisa que eu não devia ter feito. Sente-me na calçada. Eu não conseguiria dar a notícia aos dois sem chorar, de jeito nenhum. Mas eu daria separadamente.

Eu estava revoltadíssima, mas é claro que eu não moraria com Harry ou Mary Jane. Eu ficaria com meu pai. Olhei a rua deserta. Eu sentiria falta da paz da cidade também. Peguei meu celular e mandei uma mensagem para Harry.

Estou passando na sua casa xx

Levantei-me e fui andando. Logo meu celular vibrou em meu bolso.

Esperando você (: xx

Ah, Harry, isso não é motivo de alegria. Com certeza não.

Cheguei a sua casa e abri a porta sem bater. Harry e Anne já haviam me dado a liberdade para entrar sem pedir, então entrei e gritei.

– Harry!

– Em meu quarto! – respondeu.

Entrei e ele me deu um beijo na testa.

– Dormiu bem? – perguntou feliz antes de ver meu rosto.

Ele olhou para mim.

– O que foi?

Eu com certeza devia estar com cara de quem estava pensando na morte de alguém.

– Preciso falar com você – respondi.

Sua expressão mudou.

– Meu Deus, o que aconteceu?

– Ontem meu pai deu uma notícia.

Meus olhos ficaram marejados. Harry levantou as sobrancelhas, impaciente.

– Eu... Nós... Você – decidi o pronome – já sabe que o trabalho de meu pai é instável. E que eu já morei em vários lugares por causa disso.

Ele assentiu.

– Então, eu... Eu... – uma lágrima escorreu e ele a secou – terei que me mudar daqui.

Seus olhos se arregalaram um pouco. Ele levantou as sobrancelhas de novo. Respirou fundo.

– Quando?

– Tenho mais um mês aqui.

Harry parecia ter ficado um pouco confuso com a informação. Esperei ele se acostumar com a ideia. Então ele me abraçou.

– Tudo bem? – perguntei. Ele estava muito quieto.

– Não.

Concordei.

– Eu sei – respondi. Encostei a cabeça em seu ombro – Ainda tenho que contar a Mary Jane – lembrei-me.

– Vou com você.

– Não, eu quero contar sozinha.

Ele concordou.

– Já vai agora? – perguntou.

– Acho que sim.

Harry me beijou.

– Tchau – ele disse baixo.

Sorri desanimadamente.

– Tchau.

Fui à casa de Mary Jane sem avisá-la.

– Mary Jane! – chamei.

Logo Maria apareceu na porta.

– Ela está dormindo – ela disse.

– Eu preciso falar com ela.

– Sinta-se à vontade para acordá-la.

Entrei na casa. O lugar estava diferente da última vez que eu havia estado lá. Os móveis haviam sido reorganizados e parecia que uma grande faxina havia acontecido. Fui para o quarto de minha amiga.

– Mary Jane – chamei. Eu sabia que era maldade acordá-la, mas eu perderia o controle se não contasse logo. Além disso, ela tinha o resto da gravidez para dormir.

Ela abriu os olhos.

– O que foi? – perguntou atônita.

– Preciso falar com você.

Mary Jane se sentou. Então contei tudo de novo. Ela começou a chorar e eu chorei junto. Não consigo evitar, sempre que vejo alguém chorando meus olhos começam a marejar.

– Não acredito. Não. Você vai morar comigo.

– Mary Jane, não posso. Tenho que ficar com meu pai.

– Mas... – ela se interrompeu – Tudo bem. Eu entendo.

Abracei-a.

– Eu prometo que vou fazer de tudo para não nos separarmos.

Ela assentiu.

– Também prometo.

Meu celular vibrou. Mensagem de Harry.

Vamos à praia. Eu, você, Mary Jane e Nicole xx

Respondi.

Como assim?

– O que foi? – Mary Jane perguntou.

– Harry disse que vai nos levar à praia.

Ela franziu a testa. Logo meu celular vibrou novamente.

Preciso me despedir de você. E quero me despedir com classe xx

Sorri e Mary Jane tomou o celular de minha mão para ver a mensagem. Ela sorriu também.

– Eu topo – ela disse.

– Não podemos viajar com você assim! E se alguma coisa acontecer?

– Nada vai acontecer.

– Você sabe que é arriscado.

– Se alguma coisa acontecer, vamos ao hospital!

– Você é louca – falei.

– Qual a graça de ser normal? Além disso, não vou perder a viagem. Vai ser minha última chance de viajar com os amigos em paz.

– Louca – falei de novo. Mas ela tinha razão, apesar de ser loucura.

Respirei fundo.

– Você tem razão – falei rindo – Tenho que ir.

– Tchau. Mas nós vamos à praia, não é?

– Vou perguntar a meu pai. Mas acho que ele deixa. E tenho que ver se Nicole pode ir também porque, apesar de não parecer, ela está na faculdade, lembra?

Fui para casa, ainda triste, mas ao mesmo tempo animada. Harry e Mary Jane conseguiram me deixar um pouco menos triste e ansiosa para a viagem.

– Pai! – cheguei gritando.

– Em meu quarto! – ele respondeu.

Cheguei e entrei sem bater na porta.

– Harry me chamou para ir à praia. Na verdade, chamou Mary Jane, Nicole e eu – acrescentei quando vi a careta que ele fez.

– Quando?

– Não sei – franzi a testa.

Mandei uma mensagem para Harry.

Quando vamos?

Ele respondeu imediatamente.

Nesse final de semana xx

– Nesse final de semana – respondi para meu pai.

Ele pensou um pouco.

– Tudo bem – respondeu sorrindo.

Sorri de volta. Eu não deixaria minha partida ofuscar minha felicidade do final de semana.