Capítulo 19

A verdade

Nunca uma viagem de avião tinha sido tão exaustiva e desconfortável como aquela. Edward e eu pouco tínhamos falado desde aquele beijo nefasto, apenas pronunciávamos as palavras necessárias um ao outro. Sabia que não era por mal, não estávamos chateados, apenas constrangidos, por não nos ser permitido demonstrar certo tipo de sentimentos que ainda nutríamos um pelo outro.

Conseguia ouvir Edward a recriminar-se vezes sem conta por aquilo que tinha ocorrido no arquivo, e praticava mentalmente o melhor discurso para se desculpar perante Bella.

«Edward aquele beijo não significou nada, foi apenas fruto de uma memória, um impulso, não estragues o teu casamento por causa de um sentimento humano estúpido que veio ao de cima por causa de uma lembrança do passado», tinha sido apenas uma das tantas desculpas que eu tinha inventado para demover Edward de contar sobre o beijo a Bella. Mas sabia que era impossível, era contra aquilo que Edward acreditava, contra aquilo que Elizabeth lhe tinha ensinado.

Carlisle acabara de estacionar o seu carro à porta da grande casa dos Cullen, onde todos nos esperavam à entrada de casa. Renesmee correu para os braços de Edward, que a envolveu num abraço forte e carinhoso.

Após as boas vindas, dirigimo-nos para a sala, Renesmee foi brincar para as traseiras da casa, enquanto os restantes Cullen se sentaram nos sofás, excepto Edward e eu que ficamos, em pé, de frente para todos eles. Tínhamos decidido contar a Carlisle e Esme o que tínhamos descoberto em Illinois, ao mesmo tempo que contaríamos aos restantes. Todos estavam de olhos postos em nós, o que me transmitia uma certa insegurança, não gostava de ser o centro das atenções em caso algum. Bella encontrava-se na ponta de um sofá perto de Edward, estalava os dedos, talvez premeditando o que estava para vir.

O silêncio reinava na sala. Edward lançou-me um olhar, ao qual me limitei a responder com um aceno e um sorriso encavacado, como que em incentivo para ele começar a falar.

Edward mirou novamente todos os presentes na sala, e antes de começar a falar tossiu, não que necessita-se, mas provavelmente para afugentar os receios e o nervosismo. Algo tão comum nele. Sorri com a lembrança que só a mim pertencia.

-Pois bem! Como todos sabem, eu, a Caroline, o Carlisle e a Esme fomos a Illinois descobrir o passado da Caroline e, quem sabe, o meu passado também. – Fez uma pequena pausa, provavelmente para arranjar as palavras certas. Engoliu em seco, e prosseguiu. – E sim de facto descobrimos algumas coisas. Uma delas, foi o Carlisle e a Esme que descobriram no arquivo do hospital. – Enquanto falava dirigiu-se a Esme, que lhe entregou o dossier com o registo das visitas hospitalares daquela altura. Edward abriu-o e fez com que este passa-se pelas mãos de todos, enquanto explicava. –Esse dossier contém o nome das visitas que eu recebi no hospital enquanto estive internado. Como podem verificar, contém apenas um nome.

-A Caroline! – Disse Bella com uma voz amargurada e sem nunca tirar o olhar do dossier que jazia agora no seu colo.

-Sim, a Caroline. – Edward disse tais palavras sem um pingo de alegria. Sabia que ele estava a sofrer por ver Bella sofrer. E eu sofria por vê-lo sofrer, e saber que em parte eu era a causa desse sofrimento.

Um silêncio ensurdecedor instalou-se novamente na casa, conseguia ouvir todas as mentes a trabalhar, com novas teorias, no entanto nenhuma conduzia á resposta correcta, que eu era a noiva de Edward. Quando começavam a ponderar tal ideia, afastavam-na como se temessem que só o simples facto de a imaginar, se tornasse realidade. A ideia de Edward com outra mulher, que não a Bella, era algo completamente descabido. A minha vontade era sair dali, sabia que me estavam a fazer um género de raio-X, eu conseguia ler nas suas mentes, todos me analisavam ao pormenor. Uns procuravam as minhas semelhanças com Edward, outros simplesmente procuravam um sinal que lhes mostrasse o porquê de apenas eu ir visitar Edward ao hospital.

Foi então que Edward quebrou aquele silêncio, olhando directamente para Bella, e como quem pedia desculpa pelo olhar, ele apenas proferiu.

-A Caroline era minha noiva. Eu fui transformado dias antes do meu casamento. Do…nosso…casamento. – Disse lançando-me um olhar de relance.

Ninguém falava, todos estavam chocados, o maior medo deles tinha-se confirmado. Nós éramos noivos. E ele foi tirado de mim dias antes do nosso casamento. Bella apenas fitava Edward, e este devolvia-lhe o olhar cheio de culpa e um pensamento cheio de “desculpa”.

-Grande maluco maninho, e eu a pensar que tu eras um santo. De casamento marcado com uma e casas com outra, sim senhor! – Rosalie torceu um dedo da mão a Emmett, que fez com que este se calasse e pedisse desculpa.

Alice ainda tinha um grande “O” nos seus lábios, ela não tinha conseguido visualizar este final, provavelmente devido às minhas interferências. Todos miravam agora Bella e Esme simplesmente colocou a sua mão sobre uma mão dela e apertou-a, como quem passa uma corrente de força para ela aguentar aquela notícia.

Já eu, eu apenas queria sair dali. Sentia-me a mais, senti que ali não era o meu lugar. Sentia-me culpada pelo que estava a fazer. Sentia-me humana, como há muitos anos não me sentia.

Comecei a recuar, devagar, de forma que ninguém se apercebesse que eu me afastava. De repente um formigueiro apoderou-se de mim. Olhei para Jasper, este estava a usar o seu poder. Estava a tentar acalmar toda a gente.

“Por favor, fica!”, suou na minha cabeça quando eu já estava perto da porta. Lancei um olhar na direcção de Edward, este não tirou os olhos de Bella, no entanto eu sabia que ele tinha noção do que eu estava a fazer.

“Peço-te Caroline, fica!”, suou novamente.

Mas eu não podia ficar ali, não naquela sala, não com a família dele.

“Eu vou só dar uma volta. Eu fico por aqui perto. Agora fala com a Bella!” foi apenas o que lhe deixei ouvir dos meus pensamentos.

Quando saí consegui ouvir o riso contagiante da pequena Renesmee, porém, segui o meu caminho, embrenhei-me na floresta que rodeava a casa dos Cullen. Parei a cerca de 2 quilómetros da casa, como tinha prometido a Edward.

Peguei no telemóvel e digitei o número de Angel, como já vinha ser hábito, a minha chamada foi dar ao voice mail.

-Angel, é a Caroline! Quando puderes liga-me! Necessito falar contigo. Beijinhos. – Não lhe disse que já sabia de tudo, não era, definitivamente, algo que gostaria de lhe contar por telemóvel, muito menos por uma mensagem de voz.

Recostei-me no manto verde que cobria a floresta de Forks e fiquei ali a contemplar as nuvens que cobriam o céu. Era capaz de ficar assim horas a fio, a imaginar formas nos pequenos farrapos flutuantes.

Ao fim de um tempo ouvi um barulho, alguém se dirigia para o local onde eu estava a grande velocidade, um vampiro. Tentei escutar alguma coisa, um pensamento quem sabe. Não consegui ouvir nada, presumi então que fosse Bella.

Lentamente comecei a endireitar-me e a questionar-me o que estaria ela ali a fazer? Não era suposto estar a conversar com Edward? Foi ai que vi o seu olhar, ele era de pura tristeza, e a forma como olhava para mim parecia que parte dela me odiava, mas a outra como se sentisse culpada por algo.

-Tu sabes! – disse eu chegando á conclusão que muito provavelmente Edward já lhe teria contado sobre o beijo.

-Sei! – Bella continuava a fitar-me com os seus tristes olhos dourados. Senti-me mal, senti-me péssima. Aquele beijo nunca devia ter ocorrido, a minha vinda para Forks foi um erro. Estar perto de Edward era um erro, no entanto um erro bom. Um erro que eu ansiava por voltar a cometer.

Bella dirigiu-se a um tronco de uma árvore caído e sentou-se lá. Ela estava absorta nos seus pensamentos, e não me cabia a mim interromper tais pensamentos. Por isso voltei a vislumbrar as nuvens, agora via uma girafa a fazer ballet, tal ideia fez-me soltar um sorriso.

-Que foi? – perguntou Bella.

-Nada, apenas gosto de ver as nuvens e imaginar aquilo que elas nos tentam mostrar. Por exemplo, ali está um coelho com um chapéu de pai natal, aquela é um gelado, e ali é uma girafa a dançar ballet.

Bella também sorriu e começou a ver as nuvens comigo, ambas começamos a discutir sobre o que nos parecia a nuvem, até nos estávamos a divertir.

-Eu já sabia. – disparou Bella do nada. Depois desprezando um elefante de duas pernas no céu lá me dirigiu o olhar. – Que tu e o Edward tinham algo muito forte, como um namoro, ou noivado. Eu sabia.

-Sabias? – como é que ela sabia, sem nem mesmo nós sabíamos.

-A forma como vocês interagiam, como olhavam um para o outro. A forma como vocês se conhecem. Caroline, tu conheces o Edward melhor do que ninguém, atrevo-me a dizer, melhor do que eu. – Bella encontrava-se agora sentada.

-Isso não é verdade, tu conheces o Edward de agora. – Imitei Bella e também me sentei ao lado dela – Eu apenas conheço o Edward de á 100 anos atrás. Com certeza que ele mudou, da mesma forma que eu mudei. Não somos os mesmos. Aliás, eu não o conheço assim tão bem. Amnésia, lembras-te? – disse apontando para a minha cabeça.

-Mas ainda há algo muito forte que vos une. – Bella fitava agora o chão.

-Bella, o que nos une são lembranças do passado só isso! – o que mais lhe poderia dizer eu? Que sim, que ainda havia algo? Que eu ainda amava Edward? E será que amava mesmo?

-Se fossem só lembranças do passado vocês não se teriam beijado, pois não? Nem o Edward teria ficado tão abalado com tal beijo.

-O beijo foi um erro, foi o fruto de uma memória estúpida que decidiu aparecer na hora errada e no momento errado. Ele está abalado porque te magoou e não o queria fazer. E agora está a arrependido.

Bella sorriu, ia responder á minha pergunta, mas ponderou e decidiu guardar a resposta para ela. Ambas ficamos ali, sem saber o que dizer. Se ela não fosse a mulher de Edward acho que me iria dar bem com ela, mas iria sempre haver alguma coisa que ia impedir que esta amizade crescesse, o Edward.

-Sabes, acho que ele nunca te esqueceu. Ele podia não se lembrar do teu nome, nem de ti, mas nunca te esqueceu. - Bella tinha decidido não olhar para mim enquanto falava, a verdade é que era mais fácil termos esta conversa sem olhar-mos uma para a outra e ver o sofrimento que ambas estávamos a sentir. – Quer dizer, ele teve quase 100 anos sem encontrar uma mulher, certo? E já viste bem por quem ele se foi apaixonar? Por uma humana de cabelos castanhos com uns reflexos ruivos, de olhos castanhos, pele clara, desajeitada, estatura normal, magra. Aposto que coincide perfeitamente com o teu retrato em humano, ah já para não falar na mordida que ambas temos no braço. A única diferença é que a ti foi feita por um cão e a mim por um vampiro. E para finalizar, o Edward não consegue ouvir os nossos pensamentos, a menos que nós deixemos, claro! Já viste, as únicas pessoas que ele não consegue ouvir, e somos logo nós as duas, as mulheres por quem ele se apaixonou.

Bella no final olhava para mim, para ver a minha reacção. A verdade é que nunca tinha reparado naquilo que ela tinha dito, de facto tínhamos muitas parecenças. A mais bizarra era a marca de dentes que ambas tínhamos quase no mesmo local. Não sabia o que pensar, nem o que dizer.

-Não percebes Caroline? Eu sou tu, se é que isto faz sentido. Ele “viu-te” em mim. Ele ainda te ama.