Sombras No Espelho: Parte 1 - Terra escrita por Lucas Iraçabal


Capítulo 1
Prólogo




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Há muito tempo, uma assembléia foi formada. Uma assembléia de seres poderosos e aparentemente imortais. Uma assembléia que teve de ser desfeita quando uma profecia dividiu as opiniões destes seres. Uma profecia trazida por ninguém menos que o Destino.

Este se apresentou no salão principal do palácio dos Senhores Eternos durante uma comemoração, dizendo, com urgência, que precisavam lhe escutar. Quando conseguiu a atenção dos fundamentais e dos demais Senhores Eternos, respirou fundo e disparou:

― Os humanos são uma maldição! Temos que parar de tratá-los como se fossem de nossa mesma raça.

Terra, a mãe dos humanos, se levantou de seu trono com imponência. A enorme coroa de ouro em sua cabeça, cheia de entalhes e de penduricalhos, que lhe recaíam sobre a testa e as laterais do rosto, reluzia e quase ofuscava a visão dos outros Senhores Eternos. Ela encarava o Destino com certo ceticismo.

― Como pode dizer isto? ― perguntou enfim. A voz tão profunda que parecia vir da própria terra.

― Tu não viste o que eu vi ― rebateu o Destino, mas com respeito. Temia a Senhora Eterna Elemental da Terra.

― Não, não vi mesmo ― disse ela balançando levemente a cabeça, fazendo os penduricalhos sacudirem e tilintarem. ― Mas sei que meus filhos são até mais úteis do que alguns Senhores Eternos.

― Pois mudará de idéia ao saber o que vi ― disse Destino.

― Então nos conte, o que viu? ― perguntou ela e voltou a se sentar, sem tirar os olhos do Senhor Eterno à sua frente.

― Acabei de checar os astros ― disse ele. ― E uma ameaça, descendente destes que vocês protegem, está para nascer.

Um rumor se espalhou entre os Senhores Eternos, que riam com desdém.

― Como podem esses seres tão pequenos e quase sem poderes ser para nós uma ameaça? ― perguntou a Senhora Eterna da Sabedoria. ― Mal conseguem fazer um feitiço de teletransporte.

― Escutem, por favor ― outra voz foi ouvida no salão. O Senhor Eterno do Tempo trazia seriedade no rosto e os olhos estavam fitados nas três figuras sentadas em seus respectivos tronos ao fundo do salão. ― Meu filho tem razão. Eu mesmo vi as estrelas e elas falam de um bruxo poderosíssimo. Um mestiço. Filho do dia e da noite.

O rumor aumentou. Os Senhores Eternos começavam a ficar preocupados.

― Acha mesmo que alguém poderia lutar contra as Leis Eternas? ― perguntou Sabedoria erguendo uma sobrancelha, cética.

― Não só acho como tenho certeza disso, milady ― respondeu o Tempo com respeito e preocupação no olhar. ― E isso pode estar acontecendo nesse exato instante.

Todos os Senhores Eternos ficaram em silêncio, trocando olhares tensos uns com os outros. Sabiam que o Tempo estava dizendo a verdade.

― E o que sugere que façamos? ― perguntou Terra voltando a se levantar, mas desta vez com agressividade na voz, fazendo a terra tremer. ― Quer que matem meus filhos enquanto eu assisto e não revido?!

Todos na sala estavam encolhidos de medo. Terra poderia colocar o salão abaixo a qualquer momento, se continuasse a gritar.

― Não quis dizer isso, minha Senhora, apenas... ― ia dizendo o Tempo com a cabeça levemente curvada.

― Não quero saber! ― vociferou novamente a Terra com os olhos fitados no Tempo, que se encolhia mais a cada palavra. ― Não irei permitir que matem meus filhos e ponto!

No trono ao lado do seu, o Senhor Eterno do Céu se levantou e segurou sua mão, lhe lançando um olhar doce e um sorriso calmante. Acenou com a cabeça uma vez e a Terra assentiu, segurando para as lágrimas não rolarem.

― Esse assunto está encerrado ― disse o Céu com a voz alta o suficiente para que todos no salão ouvissem. ― E será proibido entre os nossos e entre os humanos, com pena de morte para quem infringi-lo. Enquanto eu estiver vivo, esse assunto deve morrer.

E os dois Senhores Eternos elementais voltaram a se sentar, enquanto os outros Senhores Eternos se entreolhavam. Água, sentada em seu trono ao lado do trono do Céu, sorria e lhe dava leves tapinhas no ombro, sinalizando de que o apoiava em tudo o que dissera.

― Está certíssimo, irmão ― disse Água.

Céu assentiu com um sorriso e, virando-se novamente para frente, bateu palmas duas vezes, para que a comemoração continuasse. A música continuou a tocar e as comidas e bebidas continuaram a ser servidas, enquanto o Tempo e seu filho, o Destino, se olhavam com pesar.

― Vão se arrepender ― sussurrou Destino e saiu do salão porta afora, pisando duro.

O Senhor Eterno do Poder, que ainda permanecera na comemoração, tinha a cabeça trabalhando a mil por hora. E se o Tempo e o Destino tivessem razão? Isso poderia significar o fim de tudo! Inclusive da deliciosa bebida que estava em suas mãos naquele momento.

― Poder? ― chamou sua irmã, a Senhora Eterna da Misericórdia, mais conhecida como A Apaziguadora. ― Está tudo bem?

Poder, acordando de seus devaneios, lançou um olhar preocupado para os três elementais em seus tronos.

― Lá fora ― sussurrou ele e começou a caminhar para as portas, sendo seguido de perto pela irmã.

Assim que passaram pelas portas, Poder segurou a irmã pela cintura e a guiou para longe das portas, seguindo o aqueduto.

― O que há, irmão? ― perguntou Misericórdia preocupada com a confusão evidente no rosto do Senhor Eterno.

― Acha que isso foi uma boa idéia? ― perguntou ele.

― Isso o quê?

― Desprezar o aviso do Destino.

― Só acho que os humanos não merecem morrer como animais ― respondeu sinceramente. ― Seria injusto.

― Injusto? ― perguntou o Poder cético. ― Eles representam uma ameaça!

― Isso é o que o Destino disse ― rebateu Misericórdia com desdém. Depois de notar a expressão do irmão, perguntou: ― Você acredita nele?

― Talvez. Quando foi que a provisão dele estava errada?

Misericórdia abaixou o olhar. Sabia que isso nunca acontecera antes.

― Falando sobre isso tão abertamente, irmãos? ― outra voz foi ouvida, vinda de trás de Misericórdia.

― O que quer Terror? ― perguntou Misericórdia secamente, virando-se para ele. Odiava o irmão mais que tudo.

― Nada, só quero me manter informado no assunto ― respondeu o Senhor Eterno do Terror, mais conhecido como O Facínora.

Misericórdia bufou infeliz e cruzou os braços. Poder encarava o irmão com as sobrancelhas franzidas. Não gostava de ver Misericórdia desconfortável. Na verdade, ele a amava. E a prova disso estava nas Senhoras Eternas da Vida e da Morte, filhas dos dois.

― Terror, não tem nada melhor para fazer? ― perguntou Poder.

― Na verdade, não ― respondeu ele com ironia. ― Eu quero mais é conversar com meus irmãos sobre o futuro.

― Olhe aqui Terror, eu estou... ― ia dizendo Misericórdia, quando um estrondo sacudiu a cidade inteira.

― O que foi isso? ― perguntou o Poder virando o olhar para os portões da cidade, que estavam em chamas.

― Precisamos avisar os elementais ― disse Misericórdia segurando as barras de seu longo vestido e correndo de volta ao palácio, onde todos os Senhores Eternos já estavam do lado de fora, só observando o que se passava.

― Posso senti-lo ― sussurrou Terra assustada, enquanto apertava a mão de Céu.

― Quem? ― perguntou Céu preocupado.

― Leviatã ― respondeu alarmada. ― Ele está para invadir a cidade.

Assim que terminou de dizer isto, os portões da cidade explodiram. Poder e Terror chegaram até o palácio ofegantes.

― Rápido, precisamos tirar os elementais daqui! ― disse Poder e lançou um olhar para Terror, que assentiu. Depois se virou para a irmã. ― Misericórdia, mantenha os outros Senhores Eternos dentro do salão. Ouvi dizer que o Leviatã só quer os elementais.

― Deixe comigo ― respondeu Misericórdia auxiliando todos a entrar.

― Vamos? ― perguntou Poder se virando novamente para os três elementais.

Água e Céu se entreolharam e assentiram. Terra, que ainda segurava a mão de Céu, seguiu o Poder e o Terror para o outro lado da cidade, enquanto Leviatã atacava, sem pudor, o vilarejo. Assim que chegaram a um deserto, bem mais ao leste, Poder parou.

― Aqui, no meio de um deserto? ― perguntou Céu confuso. ― Como pretende nos proteger aqui?

Poder deu um meio-sorriso maligno.

― É aqui que vocês ficarão selados ― e bateu o pé no chão.

Logo, a Senhora Eterna da Terra começou a afundar. Com desespero, ela tentou lutar para se libertar da areia movediça que a cobria rapidamente. Céu tentava a puxar, mas sem sucesso algum. Com um último grito horrível, a Terra fora totalmente engolida.

― Poder, o que pensa que está fazendo?! ― perguntou Céu com autoridade e os olhos úmidos.

Terror apenas observava a tudo aquilo com um meio-sorriso maligno e os braços cruzados. Gostava do rumo que aquilo tomava.

― Exterminando os elementais ― respondeu ele simplesmente. ― Aqui começa a minha era. A Era do Originário.

― Não vou permitir! ― vociferou Céu e avançou na direção de Poder, que o deteve apenas com uma mão.

― Não há nada que possa fazer ― respondeu ele desafiadoramente.

Poder então estendeu a outra mão para o céu, que começou a formar nuvens de tempestade. Um funil então se formou e puxou para dentro o Senhor Eterno do Céu, que nem teve tempo de reagir, sumindo nas nuvens.

― Poder, mas o que é isso? ― perguntou Água totalmente abismada. ― Já parou para pensar no que está fazendo? O planeta entrará em colapso.

― Não ― disse Poder simplesmente. ― Eu estou apenas ajudando-o. Sem vocês, elementais, os humanos estarão desprotegidos.

― Então, isso tudo foi um plano seu? ― perguntou Água descrente. ― Simulou o próprio Leviatã para poder distrair e prender o Céu e assim anular a Lei Eterna que acabara de criar? ― Poder apenas sorria. ― Você é podre!

― Está na hora de ficar presa também ― disse Poder e correu na direção da Senhora Eterna, que não teve tempo para desviar.

Poder a segurou pelos braços e, com um salto gigantesco, a lançou no mar que era possível ser visto longe no horizonte. O mar a engoliu e a afundou para as áreas abissais mais profundas e intransponíveis.

― Resolvido ― disse Poder ao voltar para perto de seu irmão.

― Belo trabalho ― admitiu Terror.

― Eu sei ― se gabou Poder com um sorriso sádico. ― Mas eu não quero que os outros saibam que fui eu que criei aquela simulação do Leviatã, entendeu? Prefiro que continuem pensando que era ele próprio.

― Eu entendi ― respondeu Terror e apertou a mão do irmão.

Os dois selavam um acordo de segredo.

Em seguida, voltaram para o palácio dos Senhores Eternos, onde todos estavam reunidos, completamente desesperados.

― Acalmem-se ― disse Poder, a voz ecoando pelo salão. O tom nem se aproximava da profundidade do da Terra, mas todos se silenciaram. ― Eu estou assumindo os poderes sobre as Leis Eternas para nos salvar e nos tirar daqui, alguém discorda?

Todos os Senhores Eternos arregalaram os olhos.

― E onde estão os elementais? ― perguntou Sabedoria.

― Eles resolveram tirar umas férias ― respondeu Poder e riu.

― Nunca o colocaríamos no lugar deles! ― protestou o Vento, filho do Céu.

Com um estalar de dedos do Poder, Vento fechou os olhos e desabou sobre o piso de mármore, desacordado.

― Alguém mais? ― perguntou ele.

Ninguém ousou discordar. Poder começava a erguer seu trono sobre o medo dos Senhores Eternos. Com um meio-sorriso vitorioso, Poder saiu do palácio e estendeu as mãos para os portões, onde a ilusão do Leviatã ainda permanecia. Mas algo já estava acontecendo antes. Oito bruxos sobrevoavam a cidade e controlavam o mar, para expulsar o Leviatã e formar um espelho d’água sobre a cidade, utilizando do feitiço de transporte para transportar a cidade inteira para outra dimensão. Uma dimensão alternativa que ficou conhecida como A Dimensão de Atlântida.


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Notas finais do capítulo

Sejam bem vindos a Atlantis e ao mundo de Rodrigo, espero que tenha gostado. Fiquem a vontade para mandar Reviews se tiverem ou duvidas ou comentários. Até quinta ^^