Além das Salvias escrita por AnandaArmstrong


Capítulo 5
Capítulo 5 - Animals that play pretend.


Notas iniciais do capítulo

AEEEEE CAPÍTULO NOVOOOOOOOO Õ/ Nem sei se ainda tem leitor com saco pra acompanhar Misguided Ghosts, mas pros que já ainda resistem, esse capítulo está incrível *-* Eu adorei. Todo mundo sabe que MG demora PRA PORRA pra atualizar euri



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Animals - Neon Trees
“(…) Oh, oh, I want some more
Oh, oh, what are you waiting for?
What are you waiting for?
Say goodbye to my heart tonight

Here we are again, I feel the chemicals kicking in
It's getting heavy and I want to run and hide
I want to run and hide
I do it every time, you're killing me now
And I won't be denied by you, the animal inside of you

Oh, oh, I want some more
Oh, oh, what are you waiting for?
Take a bite of my heart tonight (…)”

O cheiro de cigarro e vários tipos de bebida alcoólica eram dominantes no lugar. E ah, eu podia sentir também aquela essência. Era “A essência”. Todo mundo conhecia. O Steve fazia questão dela e sempre dava um jeito de espalhar pela casa para suas festas. Não importa quanto aquele bando de animais esquizofrênicos sujem a casa e a deixem fedendo, o delicioso e sedutor cheiro de algum perfume cítrico leve o suficiente para não enjoar sempre estará lá.

Más fontes dizem que é o perfume dele. Até quando ele está suado depois do treino de futebol americano e... Naquelas horas divertidas. A hora H. Se é que vocês me entendem.

A música Animals da banda Neon Trees berrava extremamente alto nos meus ouvidos e eu acho que toda a vizinhança num raio de 50 km podia ouvi-la. Também acho que uma música nunca foi tão apropriada para certas pessoas.

“(...)Oh, oh, I want some more
Oh, oh, what are you waiting for?
What are you waiting for?
Say goodbye to my heart tonight

Hush, hush, the world is quiet
Hush, hush, we both can't fight it
It's us that made this mess
Why can't you understand?

Whoa, I won't sleep tonight
I won't sleep tonight
Here we go again (…)

Aquele lugar estava apinhado de gente, muita muvuca, corpos suados, conversas altas, muita putaria e indecência. Pessoas se amassavam no sofá, vários tipos de entretenimento agradavam todo o tipo de público, e eu aposto que os papaizinhos desses filhinhos de papai teriam um infarto se soubessem o tipo de lugar que eles frequentam.

O meu tipo de lugar favorito.

O habitual sorriso malicioso se recusava a sair dos meus lábios, e eu balançava meu corpo junto com a música, junto com as pessoas ao meu redor, agora todos sentiam o mesmo tipo de sensação: a tão conhecida adrenalina. O sangue começa a correr mais rápido, o suor começa a se apoderar do seu corpo, sua visão turva e sua mente mais aguçada. O prazer é a única coisa que importa. Seja pra esquecer os problemas de uma realidade turbulenta ou para criar ainda mais em uma vida completamente perfeita.

Fazer o que? Vivemos em uma sociedade absolutamente hedonista.

Eu estava cercada das pessoas mais bonitas de toda NY, e eu também sabia que elas escondiam dentro de si as mais podres que se pode imaginar. Mas agora nada disso importa, eu não ia casar com elas, ia?

Ri com escárnio com esse pensamento.

Dei mais um gole de alguma bebida colorida que segurava, e pude senti-la descer rasgando por minha garganta. Uma explosão aconteceu em minha mente, e deixei uma exclamação de prazer escapar pelos meus lábios. Respirei fundo e tentei ficar de pé corretamente, mas isso parecia bem difícil.

Quem sabe com mais um shot de tequila isso não se corrige?

Um garçom passou ao meu lado com uma bandeja cheia de pequenos shots de tequila, e eu aproveito e pego dois. Encaro o fundo do copo na minha mão direita e uma vontade enorme de rir surge de dentro de mim. Engulo todo o conteúdo doce e prazeroso, que assim como a outra bebida, desce direto para baixo da minha garganta. O mundo começa a girar mais devagar, e eu começo a observar as pessoas ao meu redor para conferir se eles estão tão altos quanto eu.

Uma garota com uma excêntrica roupa completamente laranja fazia uma dança esquisita bem no meio da pista e tentava equilibrar o seu cigarro, uma garrafa de cerveja e os dois garotos que a acompanhavam. Ela aparentava estar um pouco pior que eu.

Outro garoto magrelo já estava só de cueca rebolando em cima da mesa e várias pessoas riam ao seu redor. Alguns colocavam notas de cem em sua cueca, e outras mais corajosas escreviam alguma coisa nas suas costas e na sua perna. Aposto que não era nada legal.

Duas garotas que eu reconheci sendo ex-colegas de sala do curso de alemão estavam indo com alguns garotos e umas garotas pro quarto. A maior parte deles já estava de calcinha e sutiã e cueca. Tenho impressão que isso vai dar merda.

Everybody Talks - Neon Trees (Loxevan Remix)

Minha visão estava cada vez mais turva e a música entrava no meu cérebro como se fosse uma droga. Eu movia meu corpo de acordo com a batida e fazia o possível para tentar sair daquela multidão. A música da vez era Everybody Talks, da mesma banda Neon Trees. Surpreendi-me pela minha capacidade de discernir músicas no estado em que estou. Desviei-me de alguns pés, pisei em alguns, também, e finalmente senti a sensação abafada sair de mim, já estava um pouco longe da confusão.

Fui até o bar e sentei no balcão. Respirei fundo algumas vezes, e quando me senti pronta, engoli com avidez o outro shot. Senti um sorriso de alivio brotar nos meus lábios e quando menos esperava um cigarro já estava entre os meus lábios.

– Quando você vai largar esse cigarro, morena? – Uma voz profunda perturbou a minha paz. Eu não precisava piscar pra saber quem era.

– Quando você largar também, me mande um pombo-correio. – Retruquei, prendendo a fumaça um pouco e a soltando aos poucos em anéis de fumaça. – Ninguém nunca te disse que é falta de educação interromper alguém desfrutando o seu cigarro em paz?

– Olha pra mim, morena. – Respirei fundo e resisti. – Clair, deixa de ser cabeça dura. – Ele já estava sentado ao meu lado. Seu nariz passeava pelo meu pescoço e seus dedos já se trançavam no meu cabelo. Meu corpo estava todo arrepiado e eu tive que respirar fundo para manter meu autocontrole. A tática correu por água abaixo, pois assim que inspirei, seu perfume encheu a minha mente e me entorpeceu. Superava até o cheiro da festa. Era maravilhoso.

– Olha, você sabe que quer também. – Nós estávamos muito perto, perto até demais. Uma distância não tão segura para o meu coração. – Morena, vai resistir? – Sua voz aveludada acariciava meus ouvidos e na minha própria luta interna, eu acabei perdendo.

Eu olhei. E aqueles olhos deliciosamente atraentes também me olharam de volta. Não daquele tipo de olhar que você dá a atendente da cafeteria quando vai comprar seu cappuccino matinal. Ou ao entregador de jornal. Ou a qualquer pessoa que você vê pelas ruas.

Ele me enxergou. E eu o enxerguei de volta.

Eu olhei de verdade naqueles olhos pela segunda vez na minha vida, e me perdi tanto quanto fiz na primeira vez. Ele fez novamente aquela coisa de observar a minha alma. Erguia a sobrancelha e me recriminava mentalmente por todas as coisas que fiz.

Eu retribuí. Abri um sorriso malicioso que declarava muito bem o que todos nós de NY City sabíamos.

Aqui na Cidade Perdida, ninguém é um santo.

Eu acordei suada novamente. Meu coração estava bem apertado de saudades e a sensação de nostalgia se apoderou de mim. Recriminei-me novamente por sonhar com essas coisas.

– Você dormiu no sofá novamente, Clair. Cuidado com o bebê e com a sua coluna. – Minha tia estava na cadeira de balanço lendo um livro qualquer. Usa óculos de leitura e parecia realmente uma senhora indefesa com eles. Quem vê até pensa.

– Certo, está tudo bem, fique tranquila. – Falei, me levantando devagar. Acho que estou sendo uma mãe um pouco fresca, mas pelo menos não enjoo tanto.

– Quer que eu faça alguma coisa pra você? – Perguntou sem tirar os olhos do livro.

– Não. Pode ficar tranquila. – Já de pé, espreguicei-me e fui ao meu quarto trocar de roupa.

O ambiente era de um estilo neoclássico com tons pastéis e alguns acessórios de cor mais forte (esses foram colocados por mim). A cama parecia aquelas camas de princesa de conto de fadas e também tinha um dossel cujo tecido se parecia com uma espécie de renda. Era um degradê de azul médio até um azul claro, mas com as cores mais claras predominando.

O papel de parede era cinza, mas se assemelhava a prata, e sua estampa era como um vendaval. Riscos mais claros que o plano de fundo dominava as paredes e remetiam a um dos muitos furacões que os EUA já passaram. Apesar disso, não era triste. Lembrava-me também que é importante recomeçar e reconstruir as coisas do zero. A mobília era de uma madeira clara, que segundo a minha tia, era bem antiga.

– Certo, uma roupa confortável e que não te faça ficar parecendo uma mendiga. – Pensei em voz alta de frente para o guarda-roupa aberto. Por fim, peguei uma calça jeans rasgada e de lavagem clara, um moletom preto do AC/DC e um Vans vermelho. Saí silenciosamente sem me despedir da senhora sentada no sofá, eu realmente não quero falar muita coisa no momento. Ainda bem que ela respeita esse tipo de coisa.

Fui andando pela cidade sem um rumo definido, chovia com pingos finos e ventava um pouco. O vento batia no meu rosto e os pingos finos de chuva também, é uma sensação agradável que eu não aproveito já há um tempo. Podia sentir uma voz dentro de mim me indicar pra onde ir, eu simplesmente sabia o caminho. Talvez fosse a minha consciência, isto é, se a voz dela for uma voz tão grave e bonita.

Só percebi que já estava um pouco afastada quando senti um elevado sob os meus pés e me dei conta que estava subindo um monte. Continuei subindo até chegar ao topo e me deparei com uma paisagem fantástica, era possível ver todas as ilhas daqui de cima. O marzão se estendia azul à minha frente e o sol se punha em uma fantástica bola gigante de luz alaranjada que coloria todo o céu dessa cor, junto com diferentes tons rosados e amarelados.

Mas eu não estava sozinha.

Uma garota meditava ao som de uma música oriental que eu identifiquei com sendo uma música japonesa. O que é confuso, porque o que ela estava praticando era tai-chi, que é uma arte marcial chinesa. Certo, sem esse tipo de identificação agora, Clair.

Aproximei-me da garota devagar, mas fiquei parada a certa distância, pois não queria atrapalhar. A música mudou para uma mais agitada, mas que continuava sendo do mesmo tipo calmo da anterior, e aos poucos ela pareceu finalizar o que estava fazendo. Ao fim, fez uma reverência e ereta com uma postura corretíssima que eu nunca vi em ninguém.

– Pode se aproximar, Clair, eu não mordo. – Uma voz suave falou, rompendo o silêncio.

– C-Como você sabe o meu nome? – Perguntei assustada.

Resistance - Muse

Ela virou devagar, e eu finalmente pude ver o seu rosto, mas não foi por ele que eu consegui reconhecê-la. A tatuagem... Era aquela. Era uma tatuagem igual a minha e a de Louise, viva e com uma cor tão vibrante que parecia querer pular fora da nossa pele. Foi impossível não reconhecer o corvo muito negro estampado no seu braço, ele olhava dentro dos meus olhos e me observava e analisava pacientemente. Meu coração disparou no peito, a adrenalina corria rápida pelo meu corpo e eu pisquei forte várias vezes, tentei assimilar os flashs que vinham sem parar na minha mente, não importa o quanto eu tentasse fazê-los parar. Chocada e sem ter muito como impedir, me desliguei do muito real e voltei para as costumeiras lembranças. Outro flash, outra recordação da minha antiga vida.

Era tarde da noite, e eu corria sem parar. Não sabia exatamente do quê, mas sabia que se eu não aumentasse o ritmo, o que quer que estivesse atrás de mim iria me transformar em patê. Meu corpo, que já era viciado em adrenalina há um tempo, estava começando a achá-la incômoda. Eu suava frio, estava ensopada com a chuva e com o suor. Meus pés escorregavam no chão e os meus saltos batiam um contra o outro em minhas mãos, eu havia tomado uma grande queda alguns metros atrás e quase torci o pé. Tive que tirá-los.

Um rugido tomou conta da noite, e ecoou nos céus em toda a cidade, junto com tentativas frustradas de segurar lágrimas. Elas começaram a descer pelo meu rosto, e o meu coração estava tomado pelo desespero, preocupação, medo e angústia. Um grito foi abafado por outro rugido, e a dor intensa na minha garganta indicava que eu havia gritado.

Isso, Chapeuzinho Vermelho, corra do lobo mau.

Eu precisava achar o Joseph, mas não sabia o que fazer, onde procurar, e o que fazer para me livrar da coisa atrás de mim. Olhava para todos os lados procurando uma saída, mas tudo que eu via era uma viela escura iluminada somente pela luz da lua e por alguns postes que piscavam fracamente. O chão era de paralelepípedo, e aumentava mais ainda as minhas chances de tomar um tombo e quebrar a cabeça feito ovo cru. Minha coordenação motora travava uma guerra contra os cacos de vidros quebrados no chão, garrafas e outros objetos pontudos. Era complicado vê-los e tentar desviar a tempo.

Tentava aguçar a minha visão, expert em enxergar no escuro em festas e outros lugares ilícitos. Aos poucos eu conseguia distinguir algumas formas nas sombras á alguns metros de mim, e cada passo desesperado que eu dava, me sentia mais aliviada ao perceber quem era. Era ele, minha busca estava acabada. Senti um sorriso gigante se formar em meu rosto, mas ele foi apagando aos poucos quando eu percebi o que estava acontecendo.

– JOSEPH! – Gritei seu nome, que ecoou entre os prédios altos e soou por toda vizinhança. Se alguém estava nos procurando, já havia achado. Repeti o grito, e ele parecia querer dizer pra eu dar o fora dali. Negou com a cabeça, parecia aterrorizado. Eu nunca havia visto-o desse jeito, com medo. Estava muito machucado, sua camisa estava em farrapos e mostrava talhos enormes de garras e dentes pelo corpo. Sangue escorria feito água, eu sabia que estava fraco e não agüentaria muito tempo. Tentei avisar para ele parar, queria perguntar o que estava acontecendo e como ele conseguiu se meter nessa confusão, o que era aquilo que nos perseguia e milhões de outras coisas.

Mas quando eu menos esperava, ele sumiu novamente em uma sombra. Uma parede de tijolos surgiu na minha frente e eu freei bruscamente. Fiquei desesperada, aquilo ia me pegar e eu não tinha saída. Uma sombra negra de 1,5 metros se aproximava cada vez mais, parecia ser puramente feita de trevas, aquilo exalava maldade e pânico. Tentei pegar alguns cacos de vidro no chão, mas não imaginei como aquilo ia ser útil: As sombras eram como espectros feitos de fumaça. Não entendia muito disso, mas sabia o suficiente sobre filmes de terror pra saber mais ou menos o que era aquilo e como isso iria acabar.

Eu já havia rezado todas as orações que conhecia, e meus olhos estavam fechados com força, eu estava pronta esperando a morte. Não havia saída. Eu estava completamente ferrada. Minhas costas começaram a formigar e uma dor lancinante veio, eu achava que era um efeito do espectro, mas quando eu abri os olhos novamente eu tive uma surpresa gigante.

Um corvo e um lobo estavam lutando com o espectro. Eu soube imediatamente que eles não eram normais, pois além de ambos medirem quase 2 metros, eram transparentes. Digo, eu podia ver através deles. Aqueles estranhos e gigantes animais brilhavam como NY á noite, eram tão reais quanto um animal em carne e osso, e pela primeira vez nessa noite, eu senti paz.

O mundo começou á escurecer ao meu redor e eu fui sentando no chão lentamente, afastando os objetos do chão para poder sentar. Encostei-me à parede, e apertei com força os cacos em minhas mãos. Se eu dormisse agora iria desmaiar, e essa é a última coisa que eu gostaria que acontecesse, com certo esforço a dor me manteria acordada. Podia sentir o sangue escorrer por entre os meus dedos, mas não me importei.

Eu observava uma garota que não havia notado antes. Ela estava poucos metros á minha frente, com uma leggin escura, algo como sapatilhas de balé negras e uma regata preta. A lua batia nos seus cabelos negros em corte Chanel, eles eram tão bonitos. Sua pele muito branca estava iluminada, e uma tatuagem totalmente diferente do que eu já havia visto até agora estava ressaltada, era um corvo muito negro que segurava algum ramo com o bico. A cor era mais escura do que as tatuagens comuns, e os tons mais vibrantes, ele era tão real. Minha mente fez uma conexão rápida e eu comparei o corvo no braço da garota com o que lutava com o espectro. Eram iguais.

Assim como o lobo, era o mesmo lobo que apareceu repentinamente nas minhas costas alguns dias antes. O mesmo lobo que desapareceu misteriosamente das costas de Joseph. Agora tudo se encaixava, mas não fazia sentido algum.

A garota se virou em minha direção e veio ao meu auxílio. De costas para a luz, ela estava iluminada por trás, como um anjo. Antes de apagar pude olhar nos seus olhos, reconhecendo uma ancestralidade japonesa muito recente, e ouvi sua voz dizendo:

– Tudo vai dar certo, confie em mim.

E então eu voltei para o mundo real.


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Notas finais do capítulo

É isso, deixem um comentário se gostarem por favor çç



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